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Breve discussão sobre terrorismo internacional e direitos humanos

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O terrorismo afeta a democracia, empobrecendo a sociedade complexa em todo seu conjunto, constituindo uma das principais ameaças às democracias contemporâneas. Mas não se pode admitir ações desproporcionais em relação às ameaças à segurança que se pretende supostamente combater.

1. FINALIDADE

Esta análise não pretende constituir transcrição do livro publicado por Agustín Zbar.[1] A perspectiva será apresentar os pontos mais relevantes do primeiro capítulo da obra, correlacionando-a com o Direito penal do inimigo[2] e com o garantismo.[3] Destarte, nem mesmo uma resenha será elaborada, mas um texto sucinto que visará ao desenvolvimento jurídico-criminal de quem faz a análise.

O estudo fez parte de módulo do curso de doutorado desenvolvido na Universidad Nacional de Lomas de Zamora, no qual o objeto de estudo foi o Terrorismo Internacional, tendo por professor o Dr. Gustavo Carrizo, um excelente docente.


2. ESCLARECIMENTOS PRÉVIOS

A Fundação Abravanel publicou o livro, sendo que é uma instituição sem fins lucrativos que nasceu do intercâmbio de judeus de diversos níveis (profissionais, acadêmicos e periodistas).[4]

Não é razoável afirmar como sempre se faz, no sentido de associar o terrorismo ao narcotráfico, in verbis: “Además, la alianza entre organizaciones terrorista e narcotráfico que reconoce larga data en todo el mundo y en especial en Medio Oriente, también en esta región tiene su expresión local y internacional”.[5]

O Direito penal do inimigo também comete tal equívoco, conforme salienta Cancio Meliá, dizendo que tal Direito encontra maior aceitação na América Latina, especialmente Colombia.[6]

O terrorismo rompe com as regras de confrontação justa ao tender à aniquilação total do outro, isso sem qualquer discurso político, sem busca do diálogo.[7] Citando Michael Walzer, o autor afirma que a obrigação do terrorista a uma pessoa decorre unicamente do fato dela pertencer a determinado grupo, identificando-a pelo que é, não pelo que faz: “identidade corresponde à responsabilidade”.[8]

Em concepção terrorista, o Direito penal do inimigo (um “não Direito”) tem a opção pelo autor, apresentando incompatibilidade com o princípio do fato. Devemos observar o que está por detrás da teoria do Direito penal do inimigo, a qual inicia com ameaça aos terroristas e depois amplia exageradamente seu alcance, o que nos deve fazer refletir sobre o risco de sermos incluídos, por algum motivo, no rol dos inimigos.[9]

Os pensamentos sistêmicos de Luhmann e de Habermas são extremamente abertos e, portanto, inseguros. Daí a preferência de enriquecer a análise com alguns aspectos do garantismo.

O magistrado Luigi Ferrajoli publicou sua obra “Diritto e ragione: Teoría del Garantismo Penale” na Itália, no ano de 1989. Magistrado experiente, em 1.034 páginas, examinou a crise do pensamento juspositivista dominante e sem abrir mão de critérios científicos, delineou um modelo garantista.[10]

A proposta garantista emergiu em momento oportuno porque grassa a idéia de que há efetiva crise do Direito, verbi gratia, Habermas entende que há uma crise de legitimação do Direito, dizendo que a teoria funcionalista proposta por Luhmann é insuficiente. Ele afirma na conclusão de seu livro “A crise de legitimação no capitalismo tardio” que a estabilização de um sistema social pode conduzir à ofensa da dignidade humana.[11]

 


3. TERRORISMO E DIREITO INTERNACIONAL ANTITERRORISTA

É interessante notar que a Liga das Nações, mediante manifestações de vários especialistas de diversos Estados, sancionou, em 16.11.1937, a Convenção para a Prevenção e Punição do Terrorismo, a qual foi o primeiro instrumento sobre terrorismo internacional, mas que nunca chegou a entrar em vigor.[12] Tal norma obriga os Estados a estabelecerem em seus meios internos, leis que punam o terrorismo. Assim como a convenção não entrou em vigor, muitos países não adotaram qualquer medida a esse respeito. O Brasil, por exemplo, embora haja previsão constitucional (Constituição Federal, art. 5º, inc. XLIII) não tem um crime de terrorismo em sua legislação criminal.

Logo após a Segunda Grande Guerra foi criada a Organização das Nações Unidas (ONU), tendo ressurgido a discussão em torno do terrorismo internacional. Porém, o início do processo de libertação das colônias fez nascerem lutas armadas, o que dificultou o avanço do tema. Corroborou a guerra fria entre os Estados Unidos da América (EUA) e a extinta União Soviética (URSS).[13]

Não há nenhuma convenção da ONU que estabeleça uma definição completa de terrorismo, o que existe é a proibição de determinados atos considerados terroristas.[14] Nem mesmo o Estatuto de Roma, que é de 1998 e institui a Corte Internacional Criminal (CIC) tipifica o crime de terrorismo.

Essa lacuna é ruim e contrária ao garantismo. Este é, em primeiro lugar, um modelo normativo de direito, na medida de modelo de “estrita legalidade”, portanto, assegurador de direitos individuais. Em segundo lugar, é uma teoria que se prende à validade efetiva, com uma praxe operativa da norma. E, por último, o garantismo é uma filosofia política que requer do Direito e do Estado o ônus de justificar sua base externa, que provém de bens e interesses, de cujas tutelas as normas visam.[15]

Existem convenções da ONU que procuram prevenir o terrorismo ao mitigar seu impacto e ao criar incentivos para os Estados estabelecerem normas e mecanismos para prevenir e punir o terrorismo. Assim, o enfoque das convenções tem sido o de fomentar os Estados a estabelecerem normas antiterroristas em seus territórios.[16]

Na ONU, há uma tentativa de aprovar a Convenção Geral sobre Terrorismos Internacionais, a qual seria suplementar aos diversos instrumentos já existentes. Pelo que se pode verificar do livro, os tipos serão abertos, dependentes de resultados, a saber: (a) morte ou lesões graves; (b) danos graves; (c) danos com o fim de intimidação da população.[17]

É oportuno enumerar as normas que versam sobre terrorismo internacional: (I) Convênio para o apoderamento ilícito de aeronaves, de 1970; (II) Convênio sobre as infrações e outros atos cometidos a bordo de aeronaves, de 1973; (III) Convênio para repressão dos atos ilícitos contra a segurança da aviação civil, de 1971; (IV) Protocolo para a repressão de atos ilícitos de violência nos aeroportos que prestem serviço à aviação civil internacional da Convenção internacional para a repressão de atos ilícitos contra a aviação civil, de 1988; (V) Convenção sobre a prevenção e a punição de delitos contra pessoas institucionalmente protegidas, inclusive os agentes diplomáticos, de 1973; (VI) Convenção internacional contra a tomada de reféns, de 1979; (VII) Convenção para proteção física dos materiais nucleares, de 1980; (VIII) Emenda à Convenção sobre a proteção física dos materiais, de 2004; (IX) Convênio para a repressão de atos ilícitos contra a segurança da navegação marítima, de 1988; (X) Protocolo do Convenio para a repressão de atos ilícitos contra a segurança da navegação marítima, de 2005; (XI) Protocolo para a repressão de atos ilícitos contra a segurança das plataformas fixas localizadas na plataforma continental, de 1988; (XII) Protocolo do Protocolo para a repressão de atos ilícitos contra a segurança das plataformas fixas localizadas na plataforma continental, de 2005; (XIII) Convênio sobre a marcação de explosivos plásticos para fins de detecção, de 1991; (XIV) Convênio Internacional para repressão de atentados terroristas cometidos com bombas, de 1997; (XV) Convênio Internacional para a repressão ao financiamento do terrorismo, de 1999; (XVI) Convenio Internacional para a repressão aos atos de terrorismo nuclear, de 2005.[18]

Todos os tratados enumerados obrigam os Estados a legislar, perseguir e a tipificar criminalmente os atos neles descritos. Tais normas acabam por aparelhar os Estados de mecanismos suficientes para prevenir e combater de forma mais efetiva o terrorismo.

O implemento do terrorismo provocou a melhoria da legislação de combate ao terrorismo internacional, o que se dá em relação aos termos conceituais das normas, bem como no que se refere ao alcance e à profundidade dos documentos internacionais antiterroristas. Tais normas são reativas, uma vez que surgem como respostas aos ataques terroristas que as distintas comunidades vêm sofrendo ao longo dos anos.


4. CADA UM DOS TEMAS ESPECÍFICOS DAS NORMAS INTERNACIONAIS ANTITERRORISTAS

4.1 Introdução

Nesta seção se procurará demonstrar que as normas antiterroristas enumeradas decorrem da atitude reativa da ordem internacional contra atentados terroristas. Todavia, a solução é falaciosa, como ocorre também no Direito Criminal.

Todo ordenamento jurídico-criminal incorre no erro de pretender enfrentar o problema (crime) por meio do seu efeito (pena). A crescente inflação legislativa criminal decorre da reação de determinada ordem jurídica contra fatos graves que a atingem. No Brasil, mais do que em diversos países, são fartos os exemplos de leis criminais que surgiram como a panacéia para delitos graves que causaram grande clamor público, merecendo destaque o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n. 8.069, de 13.7.1990), a Lei dos Crimes Hediondos (Lei n. 8.072, de 25.7.1990), a Lei da Tortura (Lei n. 9.455, de 7.4.1997), dentre muitas outras.

4.2 Sabotagem aérea

Conforme enumeração constante do presente texto, existem cinco tratados internacionais que se ocupam da sabotagem aérea porque o modus operandi terrorista, nesse setor, tem provocando grande padecimento das comunidades.

A sabotagem aérea é muito utilizada pelos terroristas porque ataques espetaculares à aviação civil trazem, por si mesmos, a propaganda da “causa” que move o grupo terrorista, o que provoca a reiteração dessa prática ao longo do tempo.

Um dos mais notáveis exemplos de ataques terroristas violentos é o que atingiu as Torres Gêmeas, em 11.9.2001. Aqui é oportuno lembrar que Jakobs faz referência expressa ao referido ataque para defender o tratamento de inimigo a determinadas pessoas.[19]

Os exemplos de ataques terroristas que chocaram as Nações Unidas são vários, inclusive, com operações militares resultantes nas mortes de terroristas. Tais ações não podem ser recriminadas porque exercidas no âmbito da legítima defesa. Porém, uma vez presos os terroristas, devem ser tratados como sujeitos de direitos e não como objetos do Direito.

4.3 Ataques às pessoas internacionalmente protegidas

Esta convenção, de 1973, surgiu como respostas aos inúmeros ataques realizados por meio de cartas-bombas enviadas aos diplomatas e políticos no ano de 1972, especialmente, israelenses. Em razão de tais ataques, o adido de Israel à agricultura em Londres, foi assassinado.

4.4 Tomada de Reféns

O mais eloquente exemplo de que os tratados emergem da atitude reativa das Nações Unidas é o tratado de 1979, instituído logo depois que um grupo de estadunidenses foi feito refém em Theerã, isso por ocasião da revolução islâmica do Aiatolá Khomeini.

A prática é recorrente, contando com diversos exemplos, como o “massacre de Munich”, ocorrido por ocasião das olimpíadas de 1972 e os reféns da Embaixada do Japão no Peru, em 1996.

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4.4. Materiais nucleares

A convenção de 1980 se coloca no contexto dos acordos de não proliferação nuclear da “guerra fria” havida entre os Estados Unidos da América e a extinta União Soviética. Assim, a convenção tem como determinante o contexto político internacional.

Havia, no momento da edição da convenção, o que é mantido ainda hoje, o temor de que grupos terroristas adquirissem capacidade nuclear para aplicá-la em suas ações.

Muitos filmes apresentam a hipótese de, após a queda da União Soviética, militares terem vendido ogivas nucleares aos grupos terroristas. Tais películas decorrem da certeza de que a hipótese não é inverossímil. Daí o temor de que ataques terroristas tenham potencial para atingir milhões de pessoas.

Do livro que possibilita o presente estudo, é possível extrair:

Quizá sobre este tema en particular, la Comunidad Internacional pueda dejar de lado su tradicional accionar “reactivo” y avanzar en términos normativos preventivos sin que sea necesario que previamente haya consumado un atentado nuclear con las nefastas consecuencias que podría tener para la humanidad.[20]

Foi terrível, aquilo que fizeram com o Oriente Médio. Traçaram retas para estabelecimento dos novos territórios, criando um sério problema de separação de uma única nação ou reunião de várias nações num mesmo território, como é o caso do Iraque.[21] A equivocada decisão política de outrora não pode ser corrigida pela simples edição de normas internacionais antiterroristas, o que torna oportuna a doutrina construída no sentido de que a maioria das soluções dos problemas da sociedade complexa é metajurídica.[22]

4.5 Proteção da navegação marítima

Os quatro documentos que versam sobre a proteção da navegação marítima decorrem da atitude reativa das Nações Unidas. O navio civil Achille Lauro foi sequestrado, em 1985, e mataram o judeu-norteamericano Leon Klinghoffer, um portador de necessidades especiais que foi atirado ao mar na sua própria cadeira de rodas.

4.6 Ataque com explosivos

O convênio de 1991 é consequência direta do ataque contra o avião da Pan American Airlines, ocorrido em 1988, no qual foram utilizados explosivos plásticos indetectáveis. Depois, em 1997, houve novo convênio, também como resposta aos ataques com bombas contra civis.

4.7 Financiamento do terrorismo

Este assunto ganha contornos especiais quando estados fomentam o terrorismo, patrocinando suas ações. Outrossim, é preocupante porque se tem como possível que, na tríplice fronteira (Brasil, Argentina e Paraguai) se patrocina o Hezbollah.


5. RESPOSTAS INTERNACIONAIS AOS ATENTADOS DE 11.9.2001

Em 28.9.2001, o Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas aprovou a Resolução n. 1.373, pela qual chama todos os Estados a envidarem esforços para eliminar o terrorismo internacional. Porém, esta resolução também deixa a cargo dos estados a definição de terrorismo, bem como sua tipificação ao nível interno. Mesmo assim, a resolução é considerada, em nível internacional, como uma ferramenta uma fundamental porque deu novo impulso para que os organismos internacionais e os Estados fortaleçam suas normas e ações antiterroristas.[23]

Nos últimos anos, as Nações Unidas, em especial, o Conselho de Segurança, vem realizando muitos esforços sobre o terrorismo, verbi gratia, em 2.005 foi estabelecida uma equipe especial para a luta contra o terrorismo (Task Force), integrada por diferentes órgãos e agências das Nações Unidas para a luta integral contra o terrorismo.

As ações da referida equipe especial podem ser acompanhadas eletronicamente (http://www.un.org/spanish/terrorism/cttaskforce.shtml). Note-se que a “histórica Resolução 60/288, de 8.9.2006” aprovou a Estratégia Global das Nações Unidas Contra o Terrorismo e, pela primeira vez, os 192 Estados Membros respaldaram o uníssono marco comum. Sobre isso, o Secretário Geral das Nações Unidas afirmou: “todos os governos enviaram a mesma mensagem crítica: o terrorismo nunca é justificável, seja por motivos políticos, filosóficos, ideológicos, raciais, étnicos, religioso ou de qualquer índole”.

No Brasil, não é rara a referência elogiosa à Presidente da República eleita, Dilma Roussef, e aos demais integrantes da resistência que praticou atos de terrorismo em nome da democracia. Todavia, o que se verifica é que as ações da resistência pouco ou nada contribuiram para que os militares deixassem o poder.

Os militares iniciaram um processo de transição para devolver o governo aos civis no início da década de 1980, sendo que as razões foram várias, sem qualquer ligação com os conflitos armados das décadas de 1960 e 1970.[24] Tal constatação me faz refletir sobre a importância histórica dos atos terrorista para as conquistas manifestadas pelos discursos subjacentes neles contidos.

Assim como a pena cruel e as execuções espetaculares da pena traziam em si discursos de poder economicamente menos onerosos,[25] os atentados terroristas trazem discursos em favor de uma “causa”. No entanto, a cultura de dominação pelo terror não é e nem pode ser considerada razoável.


6. CONTEXTOS REGIONAIS DE ALGUMAS NORMAS

6.1 Convenção Interamericana Contra o Terrorismo

Os trabalhos tendentes à produção de uma norma interamericana contra o terrorismo se iniciaram em 1994, quando houve a declaração de Miami, o que provocou a primeira conferência antiterrorismo, ocorrida em Lima, no ano de 1996.

A segunda conferência foi realizada na cidade de Mar del Plata, no ano de 1998. E, em 1999, foi instituido o Comitê Interamericano Contra o Terrorismo. Tais discussões foram alavancadas pelo ataque terrorista de 11.9.2001. Tal comitê elaborou a Convenção Interamericana Contra o Terrorismo, adota pela Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos (Resolução n. AG/RES n. 1840).

Referida convenção, ao exemplo das normas internacionais mundiais, não tipifica o terrorismo, apenas detalhando condutas terroristas. Ela faz, também, um chamado contra o financiamento do terrorismo internacional e contra a lavagem de dinheiro.

É oportuno transcrever pequeno trecho do livro que que dá base ao presente texto:

Por último, corresponde destacar el espíritu de legalidad que caracteriza a esta Convención, la que expresamente refiere que “...la lucha contra el terrorismo debe realizarse con pleno respeto al derecho nacional e internacional, a los derechos humanos y a las instituciones democráticas en el hemisferio...”, garantizándose así no discriminación y el derecho a un debido proceso, de todas las personas investigadas por actos terroristas.[26]

Considero importantíssimo o que foi transcrito porque Jakobs afirma que os delitos continuam delitos, ainda que se cometam com intenções radicais e em grande escala. Porém, os cidadãos tem um direito e aos terroristas haveria de aplicar outro que deveria chamar de Direito penal do inimigo.[27]

Mesmo os terroristas são titulares de direitos fundamentais, não se podendo impor a eles tratamento desumano e degradante. No Brasil, a Presidente da República eleita, Dilma Roussef, integrou grupos classificados como terroristas e eles fizeram ataques a bancos e organizações militares em nome de uma “causa”, postura que é ovacionada por muitos acadêmicos brasileiros. Destarte, o simples, rótulo ou etiquetamento como terrorista não pode ser suficiente para admitir a proposta feita por Jakobs, no sentido de que não se deve assegurar garantias processuais em favor dos inimigos.[28]

A proposta, no sentido de suprimir garantias processuais em desfavor dos inimigos, leva ao etiquetamento e à ruptura do estado de inocência, sendo oportuna a lição de Ferrajoli:

Disso decorre – se é verdade que os direitos dos cidadãos são ameaçados não pelos delitos, mas também pelas penas arbitrárias – que a presunção de inocência não é apenas uma garantia de liberdade e de verdade, mas também uma garantia de segurança ou, se quisermos, de defesa social: da específica ‘segurança’ fornecida pelo Estado de direito e expressa pela confiança dos cidadãos na justiça, e daquela específica ‘defesa’ destes contra o arbítrio punitivo.[29]

Com isso, é oportuno dizer que, assim como terrorismo ofende direitos humanos fundamentais, determinadas medidas antiterroristas podem levar aos mesmos efeitos, ou seja, violar direitos humanos fundamentais, razão de ser necessária a racionalidade no tratamento dos acusados de terem praticado terrorismo.

6.2 União Europeia

A União Europeia vem trabalhando sobre a questão do terrorismo, tendo editado a Convenção Europeia Sobre a Supressão do Terrorismo, em 21.1.1977, em Estrasburgo. Esta convenção foi emendada em 2.003 e (em face dos ataques terroristas de Madrid, ocorridos em 11.3.2004, e de Londres, concretizados em 7.7.2005) foi novamente alterada no ano de 2.005.

A convenção de 1977 tem uma previsão que merece destaque, que a inserção de um rol exemplificativo de condutas que sempre serão consideradas como atos de terrorismo, vedando-se considerar infrações políticas, a saber: captura de aeronaves, sequestro e tomada de reféns, utilização de bombas, granadas, foguetes, armas de fogo automáticas ou cartas ou pacotes com explosivos na medida que apresente perigo para pessoas.[30]

A Europa, no início deste século, se viu diante de ameaças significativas porque houve o incremento do potencial terrorista de pessoas e grupos, mormente diante das novas tecnologias desenvolvidas, o que ficou evidenciado diante dos ataques de 11.9.2001. Somente dez dias depois, o Conselho da Europa editou o road map, o qual implementa mais de duzentas medidas concretas de antiterrorismo.

Poucos meses depois, em 27.12.2001, foi editada a “Posição Comum” do Conselho da Europa, como uma declaração de princípios em que se afirmou “que o terrorismo é um verdadeiro insulto grave para o mundo e para a Europa e que a luta contra o terrorismo seria um objetivo prioritário da União Europeia”.[31]

A União Europeia editou a Decisão Marco do Conselho Sobre a Luta Contra o Terrorismo, de 13.6.2002, introduzindo pela primeira vez na história comunitária uma definição comum do delito de terrorismo para todos os Estados membros, obrigando a todos a adotarem nos seus respectivos Códigos Penais.

Os atentados de Madrid (2.004) e de Londres (2005) provocaram a atualização das normas de 2.001, sendo que as últimas muito se assemelharam às anteriores. Porém, a Europa ainda convive com ameaça de várias organizações, tais quais, HAMAS, FARC, ETA, HEZBOLLAH, Conselho Revolucionário Al Fatah, Partido dos Trabalhadores do Kurdistán etc.[32]

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Sobre o autor
Sidio Rosa de Mesquita Júnior

Procurador Federal e Professor Universitário. Graduado em Segurança Pública (1989) e em Direito (1994). Especialista Direito Penal e Criminologia (1996) e Metodologia do Ensino Superior (1999). Mestre em Direito (2002). Doutorando em Direito. Autor dos livros "Prescrição Penal"; "Execução Criminal: Teoria e Prática"; e "Comentários à Lei Antidrogas: Lei n. 11.343, de 23.8.2006" (todos da Editora Atlas).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa. Breve discussão sobre terrorismo internacional e direitos humanos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3370, 22 set. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22661. Acesso em: 26 abr. 2024.

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