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Abrigo Casa Eliza de Blumenau, um modelo de proteção às vítimas de violência doméstica a ser seguido

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16/10/2012 às 11:11
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2 LEVANTAMENTO DE DADOS DAS MULHERES ENTREVISTADAS

Com relação aos casos de violência contra a mulher ocorridos em Blumenau, esta pesquisa vislumbrou uma entrevista com 16 mulheres, algumas delas encontravam-se abrigadas com seus filhos na Casa Eliza. Além destas mulheres que estavam abrigadas, foram ouvidas outras mulheres que já sofreram violência doméstica, as quais responderam ao questionário elaborado.

Seguem-se os dados relacionados às informações prestadas pelas entrevistadas referentes aos perfis das mulheres em situação de violência, bem como dos agressores. Também foram colhidas respostas sobre como foi o atendimento nos vários órgãos de apoio pelos quais as mulheres foram atendidas, no que tange às situações de violência intrafamiliar.

Os nomes das mulheres e seus agressores não serão divulgados, mas serão dados apelidos, apenas para condução e levantamento de dados da pesquisa.

O primeiro dado levantado, diz respeito à idade das vítimas e seus agressores:

Tabela 5 – Idade

NOME

IDADE DA VÍTIMA

IDADE DO AGRESSOR

Sil

46

45

Mi

39

40

Josi

28

31

Deni

37

38

Léa

35

24

Clara

20

33

Brenda

23

24

Mari

35

25

31

22

Cléo

41

56

Graci

32

43

Léo

35

37

Sissi

29

29

Eli

31

21

Fati

38

47

Kati

39

40

Fonte: Entrevistas realizadas

Numa análise preliminar, podemos perceber que a idade das mulheres varia numa faixa de idade entre os 20 e os 50 anos, sendo que a predominância entre as 16 mulheres fica na faixa etária dos 30 aos 40 anos, representando 62,5% das mulheres entrevistadas. Já no caso dos homens agressores, a maioria se encontra na faixa etária entre os 20 e 30 anos, com 37,5%, seguidos pelos homens entre 30 e 40 anos de idade (31,25%). A partir destes dados e de seus cruzamentos, verifica-se que em 50% dos casos estudados, os homens estão numa faixa de idade de aproximadamente de 10 anos de diferença (para mais ou para menos) em relação a suas companheiras, o que pode sugerir o choque entre as gerações.

Quanto à renda mensal dos casais envolvidos na pesquisa, foi feita a soma dos salários de ambos, sendo assim, obteve-se os seguintes dados, elencados na Tabela 6:

Tabela 6 – Renda Mensal dos Casais

NOME

Rendimento Mensal

Sil

1 a 2 salários mínimos

Mi

1 a 2 salários mínimos

Josi

1 a 2 salários mínimos

Deni

2 a 3 salários mínimos

Léa

1 a 2 salários mínimos

Clara

2 a 3 salários mínimos

Brenda

4 a 5 salários mínimos

Mari

2 a 3 salários mínimos

1 a 2 salários mínimos

Cléo

3 a 4 salários mínimos

Graci

3 a 4 salários mínimos

Léo

3 a 4 salários mínimos

Sissi

Acima de 5 salários mínimos

Eli

1 a 2 salários mínimos

Fati

2 a 3 salários mínimos

Kati

Acima de 5 salários mínimos

Fonte: Entrevistas realizadas

Quanto à renda salarial dos casais envolvidos na pesquisa, percebemos que 37,5% dos casais inseriam-se dentre aqueles que recebiam de 1 a 2 salários mínimos mensais, já, na faixa de 2 a 3 salários mínimos, obteve-se um resultado de 25% dos casais. Entre 3 e 4 salários mínimos, inseriam-se nesta faixa 18,75% dos casais entrevistados. Apenas 1 casal recebia de 4 a 5 salários mínimos (6,25%), enquanto dois deles (12,5%) recebiam acima de 5 salários mínimos.

O terceiro questionamento a ser estudado está relacionado ao nível de escolaridade das vítimas e também de seus companheiros. No tocante a essa questão, obteve-se os seguintes dados:

Tabela 7 – Nível de escolaridade

NOME

ESCOLARIDADE DA VÍTIMA

ESCOLARIDADE DO AGRESSOR

Sil

Semi-alfabetizada

Semi-alfabetizado

Mi

Semi-alfabetizada

Ensino fundamental

Josi

Ensino fundamental

Ensino médio

Deni

Ensino fundamental

Ensino fundamental

Léa

Ensino fundamental

Ensino fundamental

Clara

Ensino médio

Ensino fundamental

Brenda

Ensino fundamental

Ensino fundamental

Mari

Ensino fundamental incompleto

Ensino fundamental

Ensino médio incompleto

Ensino médio incompleto

Cléo

Ensino fundamental incompleto

Ensino médio

Graci

Mestrado

Superior incompleto

Léo

Pós-Graduação

Ensino médio

Sissi

Superior incompleto

Superior incompleto

Eli

Ensino fundamental

Ensino fundamental incompleto

Fati

Superior incompleto

Superior incompleto

Kati

Superior

Ensino fundamental

Fonte: Entrevistas realizadas

Quanto à escolaridade das entrevistadas, temos que 25% das vítimas não conseguiram completar o ensino fundamental, as mulheres que têm o ensino fundamental completo chegam à soma de 31,25%; já aquelas que chegaram a frequentar o ensino médio são apenas 12,5%; as mulheres que freqüentaram cursos superiores somam 18,75% e duas delas cursaram pós-graduação (12,5%).

Em relação aos agressores, conclui-se que em sua maioria (43,75%) completaram o ensino fundamental; dois deles não completaram o ensino fundamental (12,5%); já aqueles que chegaram ao ensino médio somam 25% e finalmente, três deles possuem ensino superior incompleto (18,75%).

O próximo questionamento está relacionado à profissão das mulheres e também de seus companheiros. Apresentaram-se os seguintes dados:

Tabela 8 – Profissão dos casais envolvidos

NOME

PROFISSÃO DA VÍTIMA

PROFISSÃO DO AGRESSOR

Sil

Do lar

Desempregado

Mi

Operária

Operário

Josi

Camareira

Cobrador

Deni

Do lar

Mecânico

Léa

Serviços gerais

Servente de pedreiro

Clara

Costureira

Mecânico

Brenda

Do lar

Mecânico soldador

Mari

Costureira

Pedreiro

Costureira

Ajudante de caminhão

Cléo

Passadeira

Mestre de obras

Graci

Professora

Corretor de seguros

Léo

Professora

Representante

Sissi

Vendedora

Operário

Eli

Auxiliar de bordado

Desempregado

Fati

Funcionária pública

Funcionário público

Kati

Funcionária pública

Desocupado

Fonte: Entrevistas realizadas

Dentre as mulheres entrevistadas, apenas três não trabalhavam fora de casa, o que soma 18,75%. As mulheres que exerciam profissões relacionadas ao comércio e indústria são 56,25%, enquanto 25% delas exerciam profissões relacionadas ao serviço público e educação.

Quanto às profissões dos homens, 12,5% eram operários, 25% trabalhavam no setor de mecânica e metalurgia, 18,75 estavam empregados na construção civil; um deles era cobrador de ônibus (6%), assim como outro era ajudante de caminhão (6%). Três deles trabalhavam em profissões relacionadas ao comércio (18,75%), dois deles estavam desempregados (12,5%) e um deles, devido aos problemas com vício em drogas e álcool era desocupado e não exercia nenhuma profissão.

Em relação ao tipo de relacionamento que estes casais mantinham, foi questionado sobre o estado civil dos envolvidos na pesquisa. Verificou-se os seguintes dados:

Tabela 9 – Estado Civil dos Envolvidos

NOME

ESTADO CIVIL DA VÍTIMA

ESTADO CIVIL DO AGRESSOR

Sil

Casados

Mi

União Estável

Josi

União Estável

Deni

Casados

Léa

Casados

Clara

União Estável

Brenda

Solteira

Solteiro

Mari

Solteira

Separado

União Estável

Cléo

União Estável

Graci

União Estável

Léo

Solteira

Casado

Sissi

Casados

Eli

União Estável

Fati

Casados

Kati

União Estável

Fonte: Entrevistas realizadas

Em sua grande maioria (62,5%) os casais envolvidos na pesquisa mantinham União Estável ou estavam casados, somente em três casos havia relação de namoro e os casais não viviam na mesma casa, sendo que apenas uma das mulheres mantinha um relacionamento extraconjugal com um homem casado com outra mulher.

Nessa esteira, seguiu-se com a pergunta a respeito do tempo de relacionamento entre os casais, bem como a quantidade de tempo juntos até que houvesse a primeira situação de violência. Nesse sentido, verificou-se que, em sua maioria (44%), os relacionamentos duraram de 1 a 5 anos. Mas temos vários casos (37,5%) em que os relacionamentos, mesmo numa situação de constante violência, duraram de 10 até mais de 20 anos. O que está demonstrado na Tabela 10 e comprova que há vários motivos que levam as vítimas a demorarem em denunciar seus agressores.

Tabela 10 – Tempo de relacionamento / tempo de início da violência

NOME

TEMPO DE RELACIONAMENTO

INÍCIO DAS AGRESSÕES

Sil

15 a 20 anos

2º ano

Mi

15 a 20 anos

1º ano

Josi

05 a 10 anos

1º ano

Deni

01 a 05 anos

3º ano

Léa

01 a 05 anos

1º ano

Clara

01 a 05 anos

2º ano

Brenda

01 a 05 anos

1º ano

Mari

01 a 05 anos

1º ano

01 a 05 anos

2º ano

Cléo

10 a 15 anos

Menos de 1 ano

Graci

10 a 15 anos

Menos de 1 ano

Léo

01 a 05 anos

4º ano

Sissi

10 a 15 anos

Na época de namoro

Eli

Menos de 1 ano

2º mês

Fati

15 a 20 anos

10º ano

Kati

Mais de 20 anos

6º ano

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Fonte: Entrevistas realizadas

Outro questionamento de grande importância na pesquisa está relacionado ao fato de as vítimas e seus agressores fazerem ou não uso de drogas, álcool e medicamentos antidepressivos. Concluiu-se que em relação ao álcool e drogas, nenhuma das mulheres fazia uso e quanto aos antidepressivos, apenas 5 delas faziam uso desses medicamentos (31,25%). Quanto aos homens envolvidos na pesquisa, dez deles eram alcoólatras (62,5%), sendo que dentre estes, 4 deles usavam drogas (25%). Os demais homens não faziam uso de drogas, álcool ou medicamentos (37,5%).

Nos casos acompanhados nesta pesquisa, em 100% das mulheres a violência era imputada às vítimas por parte de seus maridos, companheiros ou namorados. Em alguns casos os homens eram também violentos com seus filhos(as) ou enteados(as), mas em sua maior parte as mulheres eram os maiores alvos de todos os surtos de violência por parte de seus companheiros.

Quanto ao tipo de violência sofrida pelas mulheres, chegou-se aos seguintes dados:

Tabela 11 – Tipo de violência sofrida

NOME

FÍSICA

PSICOLÓGICA

SEXUAL

MORAL

PATRIMONIAL

Sil

X

X

 

X

X

Mi

 

X

 

X

 

Josi

X

X

 

X

 

Deni

X

 

X

X

 

Léa

X

X

 

X

X

Clara

 

X

 

X

 

Brenda

X

X

 

X

X

Mari

X

X

 

X

 

X

X

X

X

X

Cléo

X

X

X

X

 

Graci

X

X

 

X

X

Léo

X

X

X

   

Sissi

X

X

   

X

Eli

X

X

X

X

 

Fati

 

X

 

X

X

Kati

 

X

 

X

X

Fonte: Entrevistas realizadas

De acordo com as respostas das entrevistadas, podemos verificar que em relação ao tipo de violência praticado pelos agressores, a violência psicológica é a que está presente praticamente em todos os relacionamentos, ou seja, 15 dos 16 estudados (93,75%), seguida pela violência moral em 14 dos casos pesquisados (87,5%); a violência física está presente em 12 dos casais (75%); e por fim, a violência sexual, praticada por 5 dos agressores (31,25%).

Um dado bastante relevante, mas que não estava elencado no questionário elaborado está relacionado ao fato de os homens rejeitarem sexualmente suas parceiras, transformando-as em vítimas de violência psicológica, pois diminuindo sua autoestima, usando frases como: “Eu não escolhi uma gorda para casar!” ou “Você ficou velha e feia, não quero uma mulher horrorosa como você!”, ou ainda, “Você acha que se eu te deixar, vai encontrar algum homem que te queira com esse corpo cheio de banha?”.

A partir destas respostas das vítimas, verificou-se a necessidade de fazer apresentar as respostas das vítimas ipsis literis e demonstrar como se sentiam, relatando algumas de suas falas.

2.1 ANÁLISE DAS RESPOSTAS DAS VÍTIMAS

Estas situações de violência têm seu fundamento em várias circunstâncias e sentimentos. Na maioria das vezes, o ciúme é a mola que dispara as primeiras demonstrações de violência.

Em outros casos, está a frustração do homem por não ser o provedor do lar e ver a mulher crescendo profissionalmente; outro motivo é a decepção em ver que a mulher, como qualquer ser humano, muda fisicamente com o tempo, ou seja, engorda, envelhece, perde o viço da juventude. Isso nos levou a perguntar sobre qual a frequência com que sofria tais situações quanto tempo levou para buscar ajuda, sobrevieram as seguintes respostas:

Tabela 12 – Frequência das agressões / quando buscou ajuda

NOME

FREQUÊNCIA DAS AGRESSÕES

BUSCA DA AJUDA

Sil

Diariamente

Após várias agressões

Mi

Semanalmente

Após várias agressões

Josi

Mensalmente

Após várias agressões

Deni

Diariamente

Após várias agressões

Léa

Mensalmente

Após 3ª vez

Clara

Mensalmente

Após 3ª vez

Brenda

Mensalmente

Após várias agressões

Mari

Mensalmente

Após 2ª vez

Diariamente

Após várias agressões

Cléo

Diariamente

Após várias agressões

Graci

Diariamente

Após 3ª vez

Léo

Mensalmente

Após 2ª vez

Sissi

Mensalmente

Após 2ª vez

Eli

Diariamente

Após várias agressões

Fati

Mensalmente

Após várias agressões

Kati

Mensalmente

Após várias agressões

Fonte: Entrevistas realizadas

O que se depreende da Tabela 12 é que, de certa forma, as mulheres levaram algum tempo para buscar ajuda. Mesmo aquelas que conviviam há pouco tempo com seus agressores, responderam que demoraram muito tempo para denunciá-los, pois pensavam que aquilo era momentâneo e que eles poderiam mudar.

Quanto aos motivos para a demora na denúncia das agressões, em sua maioria responderam que tinham medo, principalmente porque eram ameaçadas por seus agressores. Seguem algumas de suas falas:

Jô – “Tinha medo que ele levasse minha bebê embora. Ele sempre dizia que iria levar minha filha com ele para viver no Paraguai, onde moram os parentes dele.”

Cléo – “Tinha medo por causa do meu filho, ele dizia que ia me deixar pobre e levar meu filho embora”

Graci – “Eu não sabia que havia ajuda da Secretaria de Assistência Social, se eu soubesse ele nunca raptaria minha filha, eu teria fugido antes dele. Ainda por cima, ele tratava muito mal a ... (filha mais velha, somente dela). Eu tinha muito medo das ameaças.”

Le – “Pra mim ele era o único que ia me querer, eu me sentia gorda e feia, achava que se não fosse ele, nenhum homem iria ficar comigo.”

Kati – “Se dependesse dele, a vida não ia mudar nunca. Por isso, eu resolvi fazer um concurso e melhorei de vida. Aí começou o inferno, ele virou um inútil e só me xingava das piores coisas. E eu tinha muita vergonha... Acho que eu estava cega... Até hoje me pergunto por que aguentei tanto tempo!”

Quanto à forma de ajuda que as mulheres buscaram, foram de várias formas, apesar de terem sido colocadas somente 4 opções, as mulheres complementaram com outros tipos de apoios que buscaram. Sendo assim, obteve-se as seguintes respostas:

Tabela 13 – Formas de apoio buscadas

NOMES

FORMAS DE APOIO

 

DPCAMI

SEMASCRI

PROF. LIBERAL

PARENTES OU AMIGOS

CONSELHO TUTELAR

COLEGAS DE TRABALHO

Sil

X

X

       

Mi

 

X

   

X

 

Josi

   

X

     

Deni

 

X

X

X

   

Léa

 

X

 

X

X

 

Clara

X

 

X

     

Brenda

X

     

X

 

Mari

 

X

       

X

   

X

   

Cléo

X

X

   

X

 

Graci

X

   

X

 

X

Léo

X

 

X

X

 

X

Sissi

X

 

X

X

   

Eli

     

X

X

 

Fati

X

 

X

   

X

Kati

   

X

X

 

X

Fonte: Entrevistas realizadas

O que se depreende das respostas das vítimas é que, em sua maioria, elas buscam a ajuda dos órgãos de apoio oferecidos pelo Estado, representados aqui pela Delegacia de Proteção à Mulher, à Criança e ao Adolescente e ao Idoso (DPCAMI), pelo Conselho Tutelar e pela Secretaria da Assistência Social, da Criança e do Adolescente (SEMASCRI).

Pelas respostas das entrevistadas e também, em contato com a Coordenadora da Casa Eliza, verifica-se que, ao procurar um desses órgãos, principalmente o Conselho Tutelar e a DPCAMI, as mulheres são encaminhadas ao Programa de Prevenção e Combate à Violência Doméstica e Intrafamiliar – PPCVDIF, e passam a participar das atividades do mesmo, inclusive, se necessário, sendo encaminhadas à Casa Eliza.

Algumas mulheres buscam apoio primeiramente na família, nos amigos ou nos colegas de trabalho, mas isso acontece tardiamente, pois elas confessam não ter coragem de buscar esse apoio, por vergonha, por medo das ameaças sofridas e também por se sentirem humilhadas; como demonstram em suas próprias palavras:

Kati – “Eu tinha vergonha, vergonha dos amigos, dos meus colegas de trabalho... Nos últimos tempos ele vivia drogado e ainda me ameaçava de ir no meu trabalho pra contar pra todo mundo como eu era...” (Nesse momento seguiram-se as palavras de baixo calão proferidas pelo agressor).

Fati – “Depois de várias ameaças, só consegui conversar e denunciar pra Promotoria Pública porque tive uma colega de trabalho que testemunhou as agressões dele no... (local de trabalho). Depois disso me deram uma medida protetiva para ele se afastar por 1 mês, mas eu fui obrigada a sair da casa, porque ele me infernizava todos os dias”

Sissi – “Mesmo depois de me separar, ele foi na casa dos meus pais me ameaçar, chegou a passar atirando para cima... Eu morria de medo, pela menina (Filha), mas também pela minha família... Tinha medo de morrer, ele chegou a jogar o carro em cima de mim, fiz vários BOs, mas a polícia não fazia nada, porque ele era conhecido na cidade... Até comprei uma arma com autorização para me defender... Foi só quando mudei de cidade que consegui ter paz. Mas não demorou muito e ele e a sogra pediram a guarda da menina. Perdi meu emprego, minha casa, minhas coisas que estavam lá dentro, ainda por cima, quase perdi minha vida e minha filha”.

Léo – “Eu me sentia revoltada, porque não conseguia sair daquela relação, somente as amigas me davam apoio para largar dele. Mas eu achava que um dia ele podia mudar e eu sentia vergonha de buscar ajuda... Ele me humilhou várias vezes, por eu ser gorda e eu me achava horrível... Foi somente quando eu já tinha tentado terminar com ele várias vezes, que ele foi lá em casa uma vez e me violentou, que eu fui na delegacia pedir ajuda.Eu morri de vergonha de ter que ir lá e denunciar... Foi um horror (choro compulsivo).

Algumas mulheres inicialmente buscaram ajuda em profissionais liberais, principalmente advogados e psicólogos. Algumas obtiveram apoio de assistentes sociais que estavam relacionadas, de alguma forma, ao Conselho Tutelar e à SEMASCRI. Em suas falas, percebemos quais foram os encaminhamentos dados por estes profissionais:

Clara – “Eu primeiro procurei a psicóloga do... (Instituição que fornece serviços à servidores ligados a um determinado ramo de trabalho), ela foi muito legal, me ajudou muito e me fez levantar a cabeça e ver que eu não merecia ouvir aquelas coisas dele. Ele me dizia que eu não servia pra nada e ainda falava mal de mim pra todo mundo, dizendo que eu andava com todos os vizinhos. Falava que eu vivia na rua e não cuidava da casa, e a casa tava sempre arrumadinha. A psicóloga me fez ver que era ele quem estava errado e não eu... Aí na última vez que ele saiu berrando na rua e me xingando pra todo mundo ouvir, ela me disse pra ir na delegacia dar queixa dele, e foi o que eu fiz.”

Kati – “Foi a advogada quem me orientou para dar o carro pra ele, em troca da minha liberdade, porque eu já não aguentava mais ver ele caído dentro de casa, bêbado e drogado, dando um péssimo exemplo para os filhos. Ela o chamou no escritório dela e propôs dele ficar com o carro e sair de casa, ele perguntou onde que tinha que assinar. Foi ali que eu descobri que a minha liberdade valia um carro zero, que ele detonou em um poste 3 meses depois. Mas pelo menos, nunca mais me incomodou.”

Josi – “Eu fui agredida e procurei um advogado, ele me ajudou e eu resolvi minha vida. Eu quis mudar e realmente mudei, hoje estou bem feliz sozinha com meus filhos”

Sissi – “Foi graças à assistente social que veio aqui em casa e viu como nós tratávamos minha filha, que eu não perdi a guarda dela, porque ele tinha falado um monte de mentiras para o Juiz, aí as assistentes sociais vieram conhecer minha casa e ver como eu educava a menina. Só assim que consegui a guarda definitiva.”

Outro lugar bastante procurado pelas mulheres é o Conselho Tutelar, que geralmente encaminha à DPCAMI ou à SEMASCRI. Quanto à opinião das entrevistadas sobre o Conselho Tutelar, expressaram-se da seguinte forma:

Mi – “Quando procurei o Conselho Tutelar, eles chamaram meu marido pra conversar com ele, lá me deram atenção, e ajudaram ele mandando pra assistência social. Hoje ele está num grupo que ajuda os homens que agridem a mulher. Agora está bem melhor, ele nunca mais falou alto comigo, me trata bem. Agora está tudo bem.”

Cléo – “Quando cheguei no Conselho com o... (filho), eles compraram até lanche, porque a gente não tinha nem almoçado e já eram 4 horas da tarde. Fui muito bem tratada eles são muito bom pra gente. Me encaminharam aqui para o abrigo, foi tudo muito bom. Foi o melhor dia da minha vida.”

Eli – “Quando o meu vizinho chamou o Conselho Tutelar, eu fiquei com medo que eles me tirassem a menina, mas que nada. Eles foram muito bons e me ajudaram a vir pra cá (abrigo). Agora eu estou melhor e tomando meus remédios.”

Uma das formas de ajuda procurada pelas vítimas de violência doméstica é busca pela SEMASCRI e por extensão, muitas delas são encaminhadas à Casa Eliza, pois em muitas situações a mulher está vulnerável e em risco de morrer pelas mãos de seu agressor. Em todos os casos, as mulheres se sentiram seguras e protegidas, como se verifica em suas respostas:

Sil – “Eu fui lá na Delegacia fazer o BO e eles me mandaram pra assistência social, porque eu tinha que ser mandada pro abrigo. Lá na secretaria o pessoal é muito bom, me deram atenção e me ajudaram com as crianças. Eu fui pro abrigo e lá eu e as crianças ganhamos comida, roupas e uma casa. Gostei muito de lá, me ajudaram a encontrar uma casa pra mim e as crianças. Depois o... (ex-marido) sossegou porque eles chamaram ele lá e agora não me procura nem me incomoda mais.”

Jô – “O ambiente da Casa é ótimo, as crianças são muito bem tratadas pelas educadoras, mas com os adultos, cada educadora trata dum jeito diferente. Tem umas educadoras que são bem legais, mas tem outras que só fazem o trabalho delas, mas não são tão legais. Agora eu não tenho mais pesadelos, nem sonho mais que estava matando ele, eu tinha medo de ser uma assassina, porque sempre sonhava e pensava em matar ele.”

Cléo – “Aqui na Casa Eliza é maravilhoso. Fui muito apoiada, são pessoas incríveis que resgatam a gente do fundo do poço. Tem gente que diz que se sente numa prisão aqui, porque a casa é muito fechada e não podem sair lá fora. Mas eu estou me sentindo livre, pela primeira vez eu estou respirando sem medo. De noite eu durmo. Faz 24 dias que eu estou dormindo sem medo de morrer. Melhorei do lúpus e da psoríase, minha pele está muito melhor. Aqui eu e meu menino podemos falar e ver televisão, sem medo de ouvir o pai gritando, nem batendo na gente, como ele fazia quase todo dia.”

Eli – “Aqui tenho muito apoio, a mulher aqui é bem tratada e perde a tristeza e o sentimento de medo. Aqui eu me sinto segura e protegida, tenho muito medo de sair lá fora. Quando estava com ele só pensava em me matar (a coordenadora da Casa Eliza comentou posteriormente que a entrevistada já havia tentado o suicídio três vezes). Aqui no abrigo tenho alegria de viver, estou aprendendo a cuidar da minha filha sem ficar nervosa e não tenho mais medo.”

Sissi – “Quando as assistentes sociais vieram na minha casa para dar um parecer sobre a guarda da minha filha, foram muito justas e foi graças a este parecer delas, que a Juíza entendeu que eu deveria ficar com ela. Com base nos BOs que eu havia feito contra ele e também, vendo como ela era educada e amada por mim e meu segundo marido, elas entenderam que seria melhor para ela ficar conosco. Hoje, meu ex-marido nem procura a filha, só fez tudo aquilo de pedir a guarda, para me atingir. Foi isso que as assistentes sociais colocaram no parecer delas para a Justiça.

Por fim, verificam-se alguns depoimentos sobre o atendimento na DPCAMI, o que pode se depreender das respostas das vítimas é que as mulheres nem sempre se sentem seguras e apoiadas neste órgão do Estado, na verdade, algumas das mulheres consideraram o atendimento péssimo. Seguem-se os depoimentos:

Cleo – “Antes da Lei o atendimento era péssimo, eu era mal tratada e eles não faziam nada. Depois da Lei eles até atendem melhor, mas continuam não fazendo nada. As coisas só se resolveram quando eu procurei o Conselho Tutelar, se dependesse da polícia eu ia continuar apanhando.”

Jô – “Na Delegacia o atendimento sempre foi frio, e na segunda vez que fui fazer um BO, a escrivã foi muito grosseira comigo. Não conseguiram resolver nada pra mim.”

Eli – “Na delegacia me trataram bem, mas não fizeram nada para me ajudar, precisou o meu vizinho denunciar pro Conselho Tutelar, pra eles fazerem alguma coisa”.

Clara – “Quando procurei a delegacia, eles me trataram bem, fui bem atendida, me senti protegida, eles me deixaram bem tranquila, e cuidaram de mim e do meu filho.”

Mari – “Não gostei, não foi bom o atendimento. Não me deram atenção.”

Graci – “Depois que fui lá na delegacia, senti uma grande desilusão, eles não fizeram nada e ele tinha tentado me matar. Só depois de eu fazer uns quinze BOs que eles começaram a me dar atenção. Porque a juíza tinha dado a medida protetiva para ele não chegar a 500 metros de casa, aí quando ele se aproximava, eu ligava para a polícia e eles vinham para levá-lo embora.”

Fati – “Fui muito mal atendida, me sentia culpada por estar lá, só depois de várias vezes que eles me encaminharam para a Justiça e a juíza deu uma medida protetiva para ele não chegar perto da minha casa por 1 mês.

Léo – “Não sei se foi porque eu disse que ele era casado e eu tinha sido amante dele, mas fui mal atendida. Me senti um lixo, estava me sentindo suja, porque ele me forçou a ter relações com ele. Foi o pior dia da minha vida, não gosto de lembrar do jeito que a mulher que me atendeu me olhou, parecia que ela pensava que eu tinha merecido aquilo.”

O que se percebe, após terem sido analisadas todas as entrevistas é que todas estas mulheres buscaram ajuda em vários locais diferentes.

Esta pesquisa tem como foco o atendimento prestado pelo Estado nos casos de violência doméstica por parte do homem para com a mulher, quando há uma relação afetiva entre ambos. Quer sejam estas situações de violência com maior ou menor gravidade, o que se leva em conta neste estudo é como estas vítimas têm sido atendidas no município de Blumenau.

Através da entrevista feita com vítimas de violência intrafamiliar, pode-se estabelecer um panorama do atendimento às mulheres, feito pelos órgãos de controle e combate à violência doméstica contra a mulher.

2.2 DO ATENDIMENTO PELOS ÓRGÃOS DE APOIO

2.2.1 SEMASCRI

“A Secretaria de Assistência Social, da Criança e do Adolescente presta atendimento às pessoas e às famílias mais necessitadas, dentro de uma visão de resgate social”. Além de atender a todas as carências da população menos favorecida de Blumenau, também dá apoio às vítimas de violência intrafamiliar, elencando neste segmento não somente as mulheres, mas também as crianças e adolescentes e os idosos.[11]

Quanto às mulheres entrevistadas, verifica-se que o atendimento apresentado pela equipe da SEMASCRI foi sempre impecável, dando todo o apoio, proteção e segurança que estas mulheres necessitavam, encaminhado não somente ao Abrigo Casa Eliza, como também a serviço médico, psicológico, capacitação para o trabalho.

Da mesma forma, a equipe vem trabalhando junto aos agressores, separadamente ou em grupo, para que estes tratem de seus desvios comportamentais, auxiliando inclusive no encaminhamento a grupos de AA, quando é necessário.

A Casa Eliza é uma referência a ser seguida, todas as mulheres entrevistadas que passaram por lá e estavam abrigadas no momento de nossa visita elogiaram o tratamento dado às famílias lá abrigadas. Pôde-se perceber durante a visita que o abrigo tem alguns problemas estruturais, como falta de pintura, mas estes são compensados pela dedicação e carinho dos profissionais que lá trabalham.

2.2.2 Conselho Tutelar de Blumenau

Foi desenvolvida uma pesquisa por um grupo de acadêmicos e professores da FURB – Universidade Regional de Blumenau, a qual teve por objetivo[12] elaborar um diagnóstico da situação da criança e do adolescente na cidade, a partir da análise da rede de serviços do setor, em 2000, divididas em três eixos:

a) Políticas executadas (incluindo ONGs) nas áreas de Infraestrutura, Habitação, Meio-Ambiente, Assistência Social, Saúde, Educação, Esporte, Cultura e Lazer;

b) Funcionamento dos Mecanismos de Controle e de Participação Social – Conselhos Gestores do município e respectivos fundos e orçamento;

c) Sistema de Garantias – Programas Sócio-educativos, Conselhos Tutelares, Poder Legislativo, Justiça da Infância, Promotoria Pública e Delegacias.

Quanto aos comentários apresentados pelas mulheres entrevistadas, o atendimento nos Conselhos Tutelares é excelente, em todos os casos houve o encaminhamento à SEMASCRI ou à DPCAMI. O Conselho Tutelar em Blumenau, apesar de uma instância de defesa dos direitos das crianças e dos adolescentes, tem sido um dos melhores meios de apoio à mulher em situação de violência intrafamiliar.[13]

2.2.3 DPCAMI – Delegacia de Proteção à Criança, Adolescente, Mulher e Idoso

A princípio, para se falar da Delegacia da Mulher em Blumenau, se faz necessário entender como se deu a criação destes órgãos no Brasil. Apesar de haver poucas pesquisas e informações sobre as delegacias da mulher no Brasil.[14]

Foi somente após a década de 90 que, a partir de contextos nacionais e internacionais, em que as demandas jurídico-políticas exigiam uma melhor adequação das instituições, surgiram os “marcos legais e institucionais, assim como os modelos de funcionamento das delegacias da mulher”[15].

De acordo com o site da Secretaria de Segurança Pública do Estado do Paraná, as Delegacias da Mulher seguem determinados Princípios, os quais deveriam ser seguidos por todas as instituições do país.[16]

A Delegacia da Mulher em Blumenau foi instalada em catorze de junho de 1989, inicialmente atendendo apenas à mulher, mas com os anos e as novas demandas foram sendo implementados os serviços de atendimento a crianças, adolescentes e idosos.[17]

No que tange ao atendimento prestado pelos servidores da DPCAMI às vítimas de violência doméstica entrevistadas nesta pesquisa, verificou-se a falta de treinamento no contato com as mulheres. O que mais se observou no âmbito da pesquisa foi que as mulheres se sentiam “tachadas” de serem culpadas por aquela situação de violência, que elas eram a razão principal da ira de seus companheiros, ou seja, provocavam tanto, a ponto de serem maltratadas, espancadas, xingadas etc.

Segundo a coordenadora da Casa Eliza, muitas vezes elas fazem vários Boletins de Ocorrência até que seus pedidos sejam atendidos, mas em contrapartida, muitas delas não registram a queixa e mantêm o relacionamento por muito tempo. Este é um dos motivos que levam os atendimentos a serem frios e algumas das vezes com certo ar de desdém, ou até mesmo, grosseria.

O que se percebeu através das falas das vítimas é que o atendimento tem sido precário, e não há um treinamento dos profissionais que trabalham na delegacia, para lidar com as questões de gênero. A partir de pesquisa realizada pelas alunas do curso de Serviço Social da FURB, obtivemos mais dados que reiteram esta percepção[18].

Finalmente, o que se depreende a partir de todos os dados levantados nesta pesquisa, a respeito da DPCAMI, é que a Delegacia tem uma necessidade evidente de reestruturação e reorganização, além do treinamento de seus profissionais para lidarem com as questões de gênero, de violência intrafamiliar e com a efetiva adaptação aos trâmites exigidos na Lei Maria da Penha.

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Sobre o autor
Rodrigo Fernando Novelli

Advogado e Professor de Direito Penal e Processo Penal da FURB - Universidade Regional de Blumenau, e Professor de Processo Penal do Morgado Concursos

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

NOVELLI, Rodrigo Fernando. Abrigo Casa Eliza de Blumenau, um modelo de proteção às vítimas de violência doméstica a ser seguido. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3394, 16 out. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22812. Acesso em: 24 nov. 2024.

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