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Análise crítica da lei de alienação parental em face da eficácia dos meios alternativos de solução de conflitos familiares

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24/10/2012 às 13:41
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4 Falhas da lei de Alienação Parental

É notório que a edição da Lei de Alienação Parental foi uma grande evolução para a proteção dos direitos dos menores, mas não se pode negar que ao vetar o texto do artigo 9º, o qual previa a possibilidade da mediação nos processos referentes a estes casos, a Presidência “perdeu” a oportunidade de aplicar uma medida alternativa e hoje bastante eficaz no que se refere à solução dos conflitos de família.

O texto original do art. 9º da lei 12.318/2012 assim estabelecia:

Art. 9º  As partes, por iniciativa própria ou sugestão do juiz, do Ministério Público ou do Conselho Tutelar, poderão utilizar-se do procedimento da mediação para a solução do litígio, antes ou no curso do processo judicial. 

§ 1º  O acordo que estabelecer a mediação indicará o prazo de eventual suspensão do processo e o correspondente regime provisório para regular as questões controvertidas, o qual não vinculará eventual decisão judicial superveniente. § 2º  O mediador será livremente escolhido pelas partes, mas o juízo competente, o Ministério Público e o Conselho Tutelar formarão cadastros de mediadores habilitados a examinar questões relacionadas à alienação parental. § 3º  O termo que ajustar o procedimento de mediação ou o que dele resultar deverá ser submetido ao exame do Ministério Público e à homologação judicial.

A redação original possibilitava que o conflito fosse resolvido através da mediação, quando as partes assim o quisessem ou por sugestão do juiz, do Ministério Público ou do Conselho Tutelar, porém somente após exame do MP e a homologação judicial é que os termos da solução resultante da mediação teriam validade. Assim, quaisquer que fossem os termos resultantes da mediação, estes só prevaleceriam caso estivessem de acordo com os direitos e garantias inerentes ao menor, sob pena de não ser homologado pela autoridade judicial.

Em razões de veto, foi alegado que:

“O direito da criança e do adolescente à convivência familiar é indisponível, nos termos do art. 227 da Constituição Federal, não cabendo sua apreciação por mecanismos extrajudiciais de solução de conflitos. 

Ademais, o dispositivo contraria a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, que prevê a aplicação do princípio da intervenção mínima, segundo o qual eventual medida para a proteção da criança e do adolescente deve ser exercida exclusivamente pelas autoridades e instituições cuja ação seja indispensável.”

A mediação, como um meio alternativo de pacificação social, também resulta de lei (Lei 9.307/97 – Lei de Mediação e Arbitragem) e se trata de um procedimento em que as partes são auxiliadas por um terceiro particular em busca da resolução pacífica de uma demanda, buscando principalmente trabalhar o conflito[23].

Este procedimento alternativo, cada vez mais vem sendo utilizada nos casos de conflito no Direito de Família, uma vez que como afirma Jones Figgueirêdo “em juízo de família, não se resolvem apenas os litígios, resolvem-se relações afetivas, portanto pode-se dizer que resolvem-se pessoas”[24].

Desta forma, é notório que formas alternativas de resolução de conflitos desta natureza seriam de extrema importância, porém com o veto retromencionado tirou-se das famílias, incluindo os menores, a oportunidade de não só livrarem-se de uma demanda judicial, mas também por fim em um conflito sentimental, causador de imensuráveis prejuízos para o seio familiar.

Além de consistir em um meio eficaz na resolução dos conflitos familiares, a mediação familiar, por outro lado, como leciona Águida Arruda Barbosa, pode resultar em decisões céleres, com alto grau de eficácia e satisfazendo demasiadamente o interesse da criança[25].

Ponto interessante a ser abordado é que um processo judicial em um conflito de família pode ser encarado como uma afronta ainda aquelas já perpetradas pelos cônjuges ou companheiros durante a convivência. Giselle Câmara Groeninga[26] afirma que no sistema judicial existe a lógica da competição que elegem o ganhador e o perdedor, o culpado e o inocente, a vítima e o algoz, o que fere a compreensão da natureza das relações familiares.

O objetivo da mediação é a resolução de um conflito através da vontade e comum acordo das partes, sem a intervenção de um terceiro impondo uma solução, mas sim a mediação deste com o fito de tornar capaz o entendimento entre os “litigantes”. Neste diapasão leciona Petrônio Calmon[27] que a “mediação é a intervenção de um terceiro imparcial e neutro, sem qualquer poder de decisão”, afirma ainda que “a atuação deste terceiro tem o fim de ajudar os envolvidos em um conflito a alcançar voluntariamente uma decisão mutuamente aceitável”.

Em sentido contrário à justificativa do veto do artigo 9º da lei 12.318, se posicionam especialistas e pensadores do direito por entenderem que a mediação como um método alternativo, eficaz e célere de resolução de conflitos não deveria ser excluída dos conflitos inerentes à alienação parental. É cediço que o judiciário enfrenta dificuldade sem precedente para findar ações judiciais em tempo hábil e a mediação como procedimento informal se mostra uma alternativa viável para a solução deste problema.

Conrado Paulino[28] afirma que “o Poder Executivo perdeu uma boa oportunidade para a disseminação dessa prática na sociedade brasileira e o consequente estabelecimento de uma nova cultura que inclua opções cooperativas e pacíficas para o tratamento dos conflitos existentes no seio familiar”.

É fato que o veto presidencial, em linhas gerais, atribui somente ao juiz a legitimação para mediar o conflito, e como é sabido o tempo necessário para tanto não condiz com a atual realidade em que se encontram nossos magistrados, que convivem diariamente com o judiciário “abarrotado” de demandas que em muitos casos poderiam ser resolvidas de forma menos formal e mais célere.


5 Considerações finais

5 - Conclusão

Do quanto exposto, é possível concluir que a Alienação Parental é uma prática cada vez mais presente na sociedade atual, resultando em diversos prejuízos às suas vítimas. Desta forma, tanto o legislativo, quanto o judiciário vem atuando com bastante rigor no que se refere à alienação.

A proteção ao melhor interesse das crianças e adolescentes vítimas da alienação tem se tornado o principal objetivo dos legisladores, magistrados e sociedade em geral, pois a Síndrome da Alienação Parental, sequela resultante desta prática, compromete principalmente o desenvolvimento psíquico dos menores.

Nota-se que a responsabilidade inerente à sociedade nos casos de Alienação Parental configura-se em grande parte na maneira como o Judiciário vai solucionar cada caso, considerando as questões danosas causadas à criança por todo o tipo de razões.

É preciso que o Poder Judiciário esteja atento, para todas as peculiaridades inerentes à matéria, tarefa que na atual conjuntura brasileira não é possível ser realizada por este. A Alienação Parental já é, em sua natureza, por demais dolorosa e traumatizante para os filhos, a tratativa de forma desproporcional por parte do Estado pode prejudicar ainda mais o bom desenvolvimento psíquico das crianças, influenciando na sua formação.

A origem de todo o processo da prática da alienação é o rompimento de laços afetivos mal sucedidos, o que demonstra a especificidade com que deve ser tratada, pois nestes casos não se trata de disputa material, pecuniária, mas sim de uma “guerra” de sentimentos, sejam os sentimentos de raiva e vingança ou o sentimento de dor da “perda” pelo rompimento do relacionamento. Assim, a adoção de meios alternativos para a solução de demandas envolvendo a Alienação Parental parece ser uma forma bastante eficaz, pois retira o peso de uma determinação judicial, de uma imposição de um terceiro a um conflito de ordem exclusivamente familiar emocional.

Ao editar a Lei 12.318/10, o legislador deu um passo muito importante no que se refere à Alienação Parental, pois definiu o instituto e estabeleceu medidas de proteção aos menores e de punição aos que praticam a alienação. Entretanto, com o veto do art. 9º, que previa a possibilidade da mediação para esses casos, acabou por excluir do processo referente aos conflitos resultantes da alienação, um método extremamente eficaz para o Direito de Família.

A mediação, por se tratar de um método autocompositivo em que se busca a resolução do conflito através do consenso entre às partes e utiliza-se da interdisciplinaridade para resolução dos conflitos pessoais e não só legais, mostra-se bastante adequado, útil e eficaz para os litígios do Direito de Família, pois além de solucionar os conflitos, cria grandes possibilidades de restabelecer relações entre as partes, assim não seria diferente nos casos de Alienação Parental. Em que pese, a falha do legislativo em não permitir a mediação nos conflitos envolvendo a Alienação Parental, não pode resultar na supressão de um método eficaz para a solução destes conflitos, tal norma deveria ser revista incluindo este procedimento também para os casos de alienação.


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Sobre o autor
Luiz Paulo Queiroz e Azevedo

Bacharel em direito pelo Centro Universitário Jorge Amado - Salvador/BA. Estagiário na Defensoria Pública da União do Estado da Bahia.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

AZEVEDO, Luiz Paulo Queiroz. Análise crítica da lei de alienação parental em face da eficácia dos meios alternativos de solução de conflitos familiares. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3402, 24 out. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22882. Acesso em: 26 abr. 2024.

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