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Democracia e partidos políticos

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Resumo:


  • Os partidos políticos são agremiações de pessoas que se propõem a dirigir os destinos do Estado a partir da implantação de seus projetos políticos.

  • Os partidos políticos têm origem na criação de grupos parlamentares, evoluindo para grupos eleitorais e, por fim, se unindo de forma perene para formar os partidos contemporâneos.

  • A evolução das relações sociais, a tecnologia e a falta de representatividade eficaz têm contribuído para a crise dos partidos políticos, levando a novas formas de fazer política e desafios para a democracia.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

8. A crise dos partidos políticos

Quase todas as democracias representativas contemporâneas se baseiam no sistema de partidos. No entanto, é praticamente um consenso de que as estruturas partidárias, em maior ou menor grau, têm se revelado incapazes de filtrar eficazmente as demandas sociais e convertê-las em decisões políticas21.

No modelo do Estado Liberal, o Poder Legislativo tendia a predominar sobre dos demais Poderes. Na verdade, mesmo nos demais modelos de Estado, o paradigma da tripartição dos poderes implica na prevalência do parlamento – já que o Executivo executa as leis por ele elaboradas e o Judiciário julga conforme estas mesmas leis.

No entanto, o que se assiste na esmagadora maioria das nações contemporâneas é a supremacia cada vez maior do Poder Executivo, assumindo o papel de principal elaborador e empreendedor das ações estatais. Nestas situações, ao Parlamento acaba reservada a mera função de chancelador das iniciativas da Administração.

A crise dos partidos políticos se assenta em algumas questões estruturais, conjunturais e sociais. As primeiras se referem aos próprios paradoxos que a teoria dos partidos políticos encerra. As segundas dirigem-se à conformação legal dada aos sistemas partidários por cada ordenamento jurídico. Por derradeiro, surgem as questões ligadas à evolução das relações sociais e, em especial, à velocidade vertiginosa com que elas se apresentam nos dias atuais.

Dentre os problemas estruturais, identificam-se a irresponsabilidade do mandatário pelos seus atos perante o eleitorado. Tal ponderação é importante, na medida em que se lembra que a atuação do parlamentar se orienta para a defesa dos interesses gerais da sociedade civil e não dos interesses particulares de cada categoria (que, eventualmente, tenha-o elegido)22.

Quanto aos fatores sociais, é importante mencionarmos a perda do paradigma da oposição entre capital e trabalho, a pulverização dos interesses sociais, a transitoriedade das agremiações, a perda da importância do relacionamento entre governo e parlamento como ambiente próprio às decisões políticas e, no campo econômico, substituição das políticas públicas pelas meras manobras monetárias. A necessidade de manejar estas novas variáveis de maneira positiva aos seus interesses levaram os grupos sociais a organizarem grupos de pressão.

Dentre as questões conjunturais, identificam-se três primordiais fatores para a precitada crise dos partidos políticos. A primeira, é o desvirtuamento da proporcionalidade parlamentar; a segunda, o total desligamento do parlamentar com seu partido político e a última, a ausência de regulamentação na atuação dos grupos de pressão perante o Parlamento23.

Inicialmente, é de se mencionar que a representação proporcional parlamentar pretende assegurar a cada partido político uma representação no Parlamento correspondente a sua presença numérica na Sociedade. Desta sorte, tenciona-se que a composição do Poder Legislativo retrate fielmente as diversas ideologias presentes na comunidade.

Entretanto, o direito brasileiro impõe grave desvirtuamento à concretização deste intento. Isto porque a Constituição da República determina que nenhum dos estados federados tenha menos de oito ou mais de setenta deputados na Câmara dos Deputado. Tal manobra legal acaba por perpetrar graves distorções em relação à citada proporcionalidade, já que favorece Estados-membros com menor densidade demográfica em prejuízo dos mais populosos. A rigor, fere-se um princípio fundamental da democracia, qual seja, o da igualdade do voto.

Prosseguindo, sublinhe-se que o grave problema do desligamento do parlamentar com seu partido político após a eleição. De sorte a minimizar o impacto de tal fator, faz-se necessário dar cumprimento ao mandamento constitucional que incumbe aos estatutos partidários fixarem normas de fidelidade partidária. A título de exemplo, aponte-se o estabelecimento de uma espécie de quarentena política para o parlamentar que eleito por um determinado partido político – utilizando-se pois de seu coeficiente partidário – muda-se de partido sem uma justificativa plausível. Nessas hipóteses, o deputado ficaria inelegível por determinado tempo. Outra medida, agora mais ortodoxa, seria a adoção do “recall” nos moldes norte-americanos. Tal dispositivo confere ao eleitorado legitimidade para iniciar procedimento de perda do mandato eletivo do representante cuja atuação parlamentar tenha violado os preceitos constitucionais e legais.

Por derradeiro, trate-se dos grupos de pressão. De pronto, fixe-se que o fenômeno dos grupos de pressão não está restrito ao século XX. De fato, a política do “Welfare State” propiciou o surgimento de vários movimentos relevantes, surgidos em função do extraordinário incremento da participação dos poderes públicos na atividades sociais. Tal fenômeno acarreta a progressiva dependência dos governados e de seus interesses no processo decisório político.

Em verdade, os grupos de pressão (“lobbys”) surgiram com o propósito de influenciar os próprios partidos políticos, então entendidos como os principais atores do jogo democrático. Alexandre de Moraes assim comenta o fenômeno:

“Dessa forma, esses grupos de interesse ou de promoção passam por um crescimento quantitativo e qualitativo surpreendente, pois todo grupo social que se veja prejudicado em seus objetivos corporativos, e abandonados em razão do distanciamento de seus representantes no Parlamento, passa a procurar mecanismos, nem sempre legais ou moralmente aceitáveis, para influenciar diretamente as Instituições do Estado”24 (grifos originais).

Em verdade, os grupos de pressão surgem da ineficácia da representação política territorial. Embora o expediente se consagre atualmente, com a conseqüente politização – a partir de então, obrigatória – dos diversos segmentos sociais.

De forma complementar a este processo de fragmentação dos órgãos de representação popular, assiste-se a um incremento da utilização dos instrumentos próprios à democracia direta e semi-direta, tais como o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular de lei.

A Democracia de partidos, portanto, apresenta diversos problemas que devem ser solucionados e adequados aos novos métodos políticos, desde a própria existência de democracia interna até a própria imposição majoritária de suas idéias em respeito aos direitos da minoria.

Os partidos políticos devem reger-se pelos princípios da transparência, da organização e da gestão democráticas e da participação de todos os seus membros.

A incapacidade de servir à sua função representativa aliada à ingerência estatal na ordem econômica leva os partidos políticos de hoje ao incômodo papel de indicadores de burocratas para a ocupação de cargos relevantes25.


9. O futuro dos partidos políticos

Ao cabo deste estudo, faz-se uma breve exposição sobre a perspectiva adotada por Giovanni Sartori26 acerca dos avanços tecnológicos – sobretudo dos meios de comunicação – e sua influência sobre os partidos políticos e sobre a democracia.

De início, mencione-se que Sartori rejeita a possibilidade de que as fontes de informação audiovisual exerçam o papel de formadoras de indivíduos críticos. Anota que as mensagens transmitidas por este meio se mostram superficiais, predominando as imagens sobre o escasso conteúdo. Segundo afirma, tais fontes anulam a possibilidade abstração dos conceitos e, conseqüentemente, de elaboração de novas idéias e rearranjos com os elementos do raciocínio. Desta sorte, anula-se a capacidade de reflexão do ser humano.

Tampouco a internet é capaz de formar consciências reflexivas. Sartori defende que o futuro lhe reserva o papel de mero instrumento de diversão ou, no máximo, de alguma utilidade prática.

Nesse sentido, o autor afirma a predominância da televisão sobre a internet como instrumento de comunicação social de massas. No entanto, Sartori nega à televisão qualquer possibilidade de transmissão de uma opinião pública real. Diversamente, realça que são os próprios meios audiovisuais os criadores das diferentes correntes de opinião.

Por derradeiro, identifica a informação transmitida pela televisão como simplista e, conseqüentemente, incapaz de subsidiar o indivíduo na tarefa de compreender um mundo cada vez mais complexo.

Delineado este quadro, resta a reflexão sobre o papel da televisão sobre os mecanismos democráticos. Nesse ponto, vaticina-se a desaparição dos partidos políticos como base sustentadora de una política determinada. A televisão faz com que as campanhas se construam sobre imagens e não sobre programas políticos. Desta sorte, toma lugar uma nova forma de fazer política, dominada pelo poder dos meios de comunicação.

Assim, segundo Sartori, embora surjam instrumentos tecnológicos hábeis à transição da democracia representativa à democracia direta, no que se refere à politização da população em geral o quadro é desolador. O autor conclui que o “isolamento eletrônico" é o paradigma da sociedade, então dirigida pelos que têm o poder televisivo. Assim, anula-se o valor do meio como instrumento democrático.


CONCLUSÃO

O presente trabalho buscou tratar de alguns dos aspectos fundamentais para que se compreenda a função dos partidos políticos nas sociedades contemporâneas.

A partir das informações e reflexões aqui lançadas, pode-se afirmar que os partidos políticos foram entes historicamente essenciais para que se consolidassem os Estados Democráticos, bem como para que eles tivessem os contornos que hoje apresentam.

Não obstante este papel, aquelas mesmas premissas permitem a identificação de um quadro que coloca em xeque a capacidade das agremiações de responderem eficazmente aos desafios de sociedades cada vez mais complexas. Assim, velhas questões apresentam novos desdobramentos. Como exemplo, mencione-se a problemática do distanciamento entre os representantes e os representados: atualmente, é cada vez mais fácil o acesso a informações que permitam acompanhar a atuação dos representantes; entretanto, os interesses dos representados são cada dia mais voláteis.

De qualquer forma, o que parece irretorquível é que a paz, tão almejada em nossos dias, só poderá ser alcançada com o aperfeiçoamento de instrumentos democráticos que permitam a coexistência dos diversos interesses sociais. Nesse sentido, torna-se imprescindível o aprofundamento dos debates sobre a função dos partidos políticos.


BIBLIOGRAFIA

CASTRO, Carlos Fernando Castañeda. Teoría general de sistema político de Raymond Aron. https://www.geocities.com/politikaperu/sp_aron.htm. Acessado em 26 de maio de 2004.

KELSEN, Hans. A Democracia. 3ª. ed. São Paulo: Martins Fontes. 2002.

MALTEZ, José Adelino. Partidos políticos. https://maltez.info/respublica/topicos/aaletrap/partidos_politicos.htm. Acessado em 25/05/2004.

MORAES, Alexandre de. Reforma política do Estado e democratização. . Acessado em 26/05/2004.

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SARTORI, Giovanni. Homo videns – La sociedad teledirigida. Madrid: Taurus. 1998.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo, 17ª. ed. São Paulo: Malheiros. 2000.


Notas

1 “Curso de Direito Constitucional positivo”, 17ª. ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 395.

2MALTEZ, José Adelino. https://maltez.info/respublica/topicos/aaletrap/partidos_politicos.htm. Acessado em 26/05/2004.

3 SILVA, José Afonso da. “Curso de Direito Constitucional positivo”, 17ª. ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 395.

4 SILVA, José Afonso da. “Curso de Direito Constitucional positivo”, 17ª. ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 396.

5 “Curso de Direito Constitucional positivo”, 17ª. ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 397.

6MORAES, Alexandre de. “Reforma política do Estado e democratização”. <https://jus.com.br/artigos/3022/reforma-politica-do-estado-e-democratizacao>. Acessado em 26/05/2004.

7 SILVA, José Afonso da . Curso de Direito Constitucional positivo, 17ª. ed. São Paulo: Malheiros. 2000. p. 397.

8 “A Democracia”. 3ª. ed. São Paulo: Martins Fontes. 2002.

9 SILVA, José Afonso da . Curso de Direito Constitucional positivo, 17ª. ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 398.

10 Curso de Direito Constitucional positivo, 17ª. ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 399.

11MORAES, Alexandre de. Reforma política do Estado e democratização. <https://jus.com.br/artigos/3022/reforma-politica-do-estado-e-democratizacao>. Acessado em 26/05/2004.

12 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo, 17ª. ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 400..

13 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo, 17ª. ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 406.

14 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo, 17ª. ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 411..

15MORAES, Alexandre de. Reforma política do Estado e democratização. <https://jus.com.br/artigos/3022/reforma-politica-do-estado-e-democratizacao>. Acessado em 26/05/2004.

16 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo, 17ª. ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 407.

17 Curso de Direito Constitucional positivo, 17ª. ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 407.

18 Curso de Direito Constitucional positivo, 17ª. ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 410.

19 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo, 17ª. ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 404.

20 CASTRO, Carlos Fernando Castañeda. Teoría general de sistema político de Raymond Aron. https://www.geocities.com/politikaperu/sp_aron.htm. Acessado em 26/05/2004.

21 MORAES, Alexandre de. Reforma política do Estado e democratização. <https://jus.com.br/artigos/3022/reforma-politica-do-estado-e-democratizacao>. Acessado em 26/05/2004.

22 MORAES, Alexandre de. Reforma política do Estado e democratização. <https://jus.com.br/artigos/3022/reforma-politica-do-estado-e-democratizacao>. Acessado em 26/05/2004.

23 MORAES, Alexandre de. Reforma política do Estado e democratização. <https://jus.com.br/artigos/3022/reforma-politica-do-estado-e-democratizacao>. Acessado em 26/05/2004.

24 Reforma política do Estado e democratização. <https://jus.com.br/artigos/3022/reforma-politica-do-estado-e-democratizacao>. Acessado em 26/05/2004.

25 MORAES, Alexandre de. Reforma política do Estado e democratização. <https://jus.com.br/artigos/3022/reforma-politica-do-estado-e-democratizacao>. Acessado em 26/05/2004.

26 SARTORI, Giovanni. Homo videns – La sociedad teledirigida. Madrid: Taurus, 1998.

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Sobre o autor
Alexandre Magno Borges Pereira Santos

Mestre em Direito Público, Pós-graduado em Direito Processual Civil, Procurador Federal (AGU)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS, Alexandre Magno Borges Pereira. Democracia e partidos políticos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3432, 23 nov. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23084. Acesso em: 22 dez. 2024.

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