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Desaposentação e solidariedade

20/01/2013 às 15:04

Resumo:


  • A Previdência Social brasileira é um sistema solidário, inclusivo e sustentável, pagando aproximadamente R$ 35 bilhões em benefícios previdenciários a 30 milhões de beneficiários mensalmente.

  • O debate sobre a desaposentação envolve a revisão da aposentadoria de quem continua trabalhando para aumentar a renda mensal, aguardando decisão do STF, porém, levanta questões sobre a sustentabilidade e princípios do sistema de Seguro Social.

  • A desaposentação pode gerar insegurança jurídica, impactar os custos da Previdência Social, criar aposentadorias precoces e reduzir postos de trabalho, questionando se a sociedade brasileira se beneficiaria com essa prática.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Em que medida a sociedade brasileira se beneficiaria com a desaposentação? Se a resposta não parece simples, mais fácil talvez seja lembrar da nossa Constituição Federal e dos princípios sobre os quais foram construídas a base de nossa democracia, notadamente o da solidariedade.

A Previdência Social brasileira foi criada e se mantém sob a égide de um sistema solidário, inclusivo e sustentável. Para que se tenha a noção de sua importância econômico-social, a cada mês o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) paga aproximadamente R$ 35 bilhões, relativos aos 30 milhões de benefícios previdenciários implementados por tempo de contribuição, idade avançada, doença, invalidez, morte, entre outras contingências sociais.

No debate acerca da sustentabilidade do regime previdenciário, surge a chamada “desaposentação”. Na prática, trata-se da revisão da aposentadoria daqueles que continuaram a trabalhar, a fim de aumentar a renda mensal com a consideração do período contribuído enquanto já aposentado. Várias ações nesse sentido aguardam a palavra final do Supremo Tribunal Federal (STF), que decidirá ser ou não possível a renúncia à aposentadoria vigente, a incorporação do tempo contribuído enquanto aposentado, bem como a devolução dos valores recebidos até então.

A tese favorável à desaposentação possui, todavia, algumas inconsistências. Em uma primeira análise, deve-se ter em conta que a discussão não pode ter um cunho meramente financeiro, no qual se preocupa tão somente com um benefício que seja mais favorável a um indivíduo, mas sim de entendimento do próprio sistema do Seguro Social.

A Previdência Social Brasileira é regida pelo sistema de repartição simples, no qual cada segurado contribui não apenas para financiar o seu próprio benefício (característica dos regimes de capitalização), mas sim para compor um fundo social responsável pelo custeio de todos os benefícios do Regime Geral de Previdência Social (RGPS). Esse sistema de repartição simples, fundado na solidariedade social, justifica o recolhimento de contribuição social por parte dos aposentados.

Outro aspecto que merece melhor debate é a insegurança jurídica que a desaposentação pode gerar no sistema previdenciário brasileiro. Isso porque, ao se retirar o caráter da definitividade da prestação previdenciária, cria-se a possibilidade de o aposentado requerer a sua desaposentação infinitamente, toda vez que contribuísse após a jubilação.  Vale ressaltar também que o segurado que reúne os requisitos para a obtenção da aposentadoria por contribuição faz uma “opção financeira” de sua inteira responsabilidade: requerer a aposentadoria ou continuar contribuindo para o sistema podendo obter um valor mais elevado de benefício.

Paralela às questões legais e de possível admissibilidade da desaposentação, há de se fazer uma estimativa dos custos que isso poderia acarretar à Previdência Social e ao próprio Estado. Estamos falando hoje de cerca de 500 mil brasileiros aposentados que trabalham e contribuem com a Previdência Social, sendo que, segundo cálculos do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), cerca de 70 mil aposentados já procuraram a justiça para solicitar a desaposentação.  Estudo do INSS estima que apenas no benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, 481.120 benefícios apontariam para um volume de recursos para custeio do regime previdenciário de quase R$ 50 bilhões. Isso se considerarmos apenas o cenário estático dos benefícios atuais, sem mencionar o impacto no comportamento dos futuros segurados.

Na seara social há de se analisar que a admissão da desaposentação poderia acarretar a aposentadoria precoce, já que a data da mesma perderia sua importância, a resistência a sair do trabalho após a primeira aposentadoria e a consequente redução da oferta de postos de trabalho, e o aumento do número de aposentados buscando trabalho.

A pergunta que precisamos fazer é: em que medida a sociedade brasileira se beneficiaria com a desaposentação? Se a resposta não parece simples, mais fácil talvez seja lembrar da nossa Constituição Federal e dos princípios sobre os quais foram construídas a base de nossa democracia, notadamente o da solidariedade.

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Sobre o autor
Fernando Maciel

Procurador Federal em Brasília, Coordenador-Geral de Matéria de Benefícios da Procuradoria Federal Especializada do INSS. Especialista em Direito de Estado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e Master em Proteção de Riscos Laborais pela Universidade de Alcalá (Espanha). Autor do livro Ações Regressivas Acidentárias (LTr).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MACIEL, Fernando. Desaposentação e solidariedade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3490, 20 jan. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23500. Acesso em: 22 dez. 2024.

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