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Da não violação do princípio da unicidade sindical pelo desmembramento de sindicato preexistente.

Apontamentos doutrinários e jurisprudenciais à luz da OJ 15 do TST e do Enunciado 677 da súmula de jurisprudência do STF

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06/02/2013 às 13:41
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5 - O desmembramento de sindicatos preexistentes à luz do princípio da unicidade sindical: discrime da jurisprudência do STF

Partindo dessas premissas, a jurisprudência tem buscado delimitar, com maior precisão jurídica, os contornos da unicidade. Nesse sentido, uma importante diferenciação que vem sendo feita pelos tribunais diz respeito ao desmembramento de sindicatos preexistentes. A questão gira derredor da hipótese do sindicato com base territorial a abarcar a área de vários municípios. Em tais casos, poderiam os sindicalizados decidirem desmembrar a entidade, para constituir outros entes coletivos, representativos da mesma categoria, porém em bases geograficamente menores? Ou, nessa hipótese, ter-se-ia por fulminado o núcleo do princípio da unicidade sindical?

Para o STF, que já se debruçou incontáveis vezes sobre o busílis, a resposta é positiva. Inclusive, há jurisprudência farta da Corte Suprema admitindo o desmembramento, senão vejamos (grifos meus):

EMENTA: I. Sindicato: unicidade e desmembramento. 1. O princípio da unicidade sindical (CF, art. 8º, II, da Constituição) não garante por si só ao sindicato a intangibilidade de sua base territorial: ao contrário,a jurisprudência do STF está consolidada no sentido da legitimidade constitucional do desmembramento territorial de um sindicato para constituir outro, por deliberação dos partícipes da fundação deste, desde que o território de ambos não se reduza a área inferior à de um município (v.g., MS 21.080, Rezek, DJ 1º.10.93; RE 191.231, Pertence, DJ 06.08.99; RE 153.534; Velloso, DJ 11.06.99; AgRgRE 207.910, Maurício, DJ 4.12.98; RE 207.780, Galvão, DJ 17.10.97; RE 180222, Galvão, DJ 29.08.00). 2. No caso, o Tribunal a quo assentou que não houve superposição sindical total, mas apenas um desmembramento que originou novas organizações sindicais regionais cuja área de atuação é menor do que a do agravante, o que não ofende a garantia constitucional da unicidade. II. Recurso extraordinário: descabimento: ausência de prequestionamento do art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal: incidência das Súmulas 282 e 356” (RE nº 154.250/SP-AgR, Primeira Turma, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence, DJe de 8/6/07).  

EMENTA: Agravo regimental EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. SINDICATO. DESMEMBRAMENTO. ALEGAÇÃO DE AFRONTA AO PRINCÍPIO DA UNICIDADE SINDICAL. IMPROCEDÊNCIA. 1. É firme a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal no sentido de que não implica ofensa ao princípio da unidade sindical a criação de novo sindicato, por desdobramento de sindicato preexistente, desde que o território de ambos não se reduza a área inferior a de um município. 2. Agravo regimental desprovido. (STF, Segunda Turma, RE 573.533 AgR/SP, Rel. Min. Ayres Britto, j. 14/02/2012, p. DJe 19/03/2012).

EMENTA Agravo regimental no recurso extraordinário. Constitucional. Negativa de prestação jurisdicional. Não ocorrência. Desmembramento. Novo sindicato. Princípio daunicidade sindical. Violação. Não ocorrência. Precedentes. 1. A jurisdição foi prestada pelo Tribunal de origem mediante decisão suficientemente motivada. 2.Segundo a jurisprudência desta Corte, a criação de novo sindicato por desmembramento de sindicato preexistente não viola o princípio da unicidade sindical, desde que respeitada a base territorial mínima de um município. 3. Agravo regimental não provido. (STF, Primeira Turma, RE 608.304 AgR/MG, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 28/08/2012, p. DJe 13/09/2012).

Exemplificando o que a jurisprudência cimentou, poder-se-ia pensar em um sindicato de trabalhadores da construção civil cuja representatividade alcançasse 10 municípios. Se os sindicalizados de um desses municípios decidirem desmembrar-se do sindicato ao qual se encontram vinculados, reduzindo a abrangência de representação da entidade, o STF entende como sendo medida perfeitamente legítima, não havendo que se falar em violação do princípio da unicidade sindical, desde que - e isto é o mais importante para assegurar a inteireza eficacial principiológica - o ente coletivo resultante do desmembramento não tenha área territorial inferior a de um município. 


6 – Conclusão

Considerando ser o Direito Coletivo o segmento do Direito do Trabalho que se propõe a discutir as relações trabalhistas iuscoletivas, é notório o protagonismo dos sindicatos - associações civis, com personalidade jurídica de direito privado, cuja nota distintiva perspícua relaciona-se aos fins de representação dos interesses de uma determinada categoria profissional ou econômica, no que também se destaca a imprescindibilidade de sua interveniência na normatização das relações coletivas de labor. 

Com a Constituição de 1988 e a conseguinte consagração do Estado Democrático de Direito, inaugurou-se, no Brasil, um novo sindicalismo, tendo por bases fundamentais o respeito ao princípio da liberdade sindical, visto em uma dimensão dicotômica: positiva (de associação, de filiação) enegativa (faculdade de desassociar-se do sindicato). 

Entretanto, paradoxalmente, o texto constitucional democrático manteve determinados aspectos autoritários do regime jurídico de organização sindical tal como se encontrava disposto no Estado de Direito pretérito, isto é, a ditadura pré-Constituição de 1988. Exemplos cabais disso são a contribuição sindical (tributo, portanto, de exigência compulsória a todos os integrantes da categoria) e, com especial ênfase, o princípio da unicidade sindical.

O princípio da unicidade sindical fundamenta o sistema do sindicato único, decorrente de imposição de lei (norma constitucional), no Brasil. Segundo referido vetor principiológico do Direito Coletivo, ex vi do inc. II do art. 8º da CF/88, em uma mesma base territorial, que nunca pode ser inferior à área de um município, é vedada a criação de mais de uma organização sindical, em qualquer grau, representativa de categoria profissional ou econômica. Portanto, é um mandamento autoritário-corporativista, antitético aos valores democráticos que inspiraram a redação da atual Constituição. Sendo assim, a doutrina é prenhe de críticas a esse dispositivo, reclamando a reforma do texto constitucional vigente, a fim de permitir que o Brasil possa inserir-se no rol dos países que encampam o sistema da pluralidade sindical, muito mais consentâneo a um Estado de índole democrática, que, inclusive, conta, no plano do Direito Internacional, com apoio na Convenção 87 da OIT.

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Firmadas essas premissas, a jurisprudência do STF (enunciado 677) definiu competir, administrativamente, ao Ministério do Trabalho e Emprego chancelar a pretensão de trabalhadores ou empregadores que desejem fundar um ente coletivo, mediante a expedição da carta sindical. O TST, por seu turno, delimitou que, caso a entidade não tenha adquirido a personalidade jurídica sindical por meio do registro administrativo junto ao órgão competente (in casu, o MTE), será considerada desprovida de legitimidade ad processum (SDC, OJ 15).

Essa mesma jurisprudência, contudo, houve por bem estabelecer algumas balizas que determinam hipóteses nas quais não há que se falar em violação ao princípio da unicidade sindical. É o que ocorre, exemplificativamente, no caso de sindicato preexistente cuja base territorial abranja mais de um município. Se os sindicalizados desejarem desmembrar-se do ente coletivo, pulverizando a abrangência geográfica da representação em bases territoriais menores, a jurisprudência do STF é pacífica em considerar tal desiderato legítimo, à luz do princípio da unicidade sindical. A única exigência feita pela Corte é que os novos sindicatos assim formados, resultantes do desmembramento, não tenham área inferior a de um município.  


REFERÊNCIAS

BRITO FILHO, José Cláudio Monteiro de. Direito sindical. 2ª ed. São Paulo: LTr, 2007.DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 9ª ed. rev. atual. São Paulo: LTr, 2010. 1373 p.FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil: parte geral e LINDB, vol. 1. 10ª ed. rev. ampl. e atual. Salvador: JusPODIVM, 2012. 856 p.GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Manual de Direito do Trabalho. 3ª ed. rev. atual. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2011. 775 p.

NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito do Trabalho: história e teoria geral do direito do trabalho; relações individuais e coletivas do trabalho. 26ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011. 1469 f.

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Sobre o autor
Rafael Theodor Teodoro

Graduado em Direito pela UFPA. Especialista em Direito Constitucional, Direito Tributário e Ciências Penais pela Universidade Uniderp/Anhanguera. Ex-Advogado. Ex-Analista Judiciário. Atualmente atua como Analista/Assessor de Promotor de Justiça, função que exerce após aprovação em concurso público.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

TEODORO, Rafael Theodor. Da não violação do princípio da unicidade sindical pelo desmembramento de sindicato preexistente.: Apontamentos doutrinários e jurisprudenciais à luz da OJ 15 do TST e do Enunciado 677 da súmula de jurisprudência do STF. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3507, 6 fev. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23660. Acesso em: 5 mai. 2024.

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