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Da (im)possibilidade jurídica de concessão de tutela antecipada em ação previdenciária de benefício salário-maternidade

11/02/2013 às 12:56
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É impossível conferir efetividade à decisão que concede a tutela de forma antecipada em ação judicial em que se pleiteia a concessão de benefício previdenciário salário-maternidade.

Resumo: analisa-se a impossibilidade jurídica da concessão de tutela antecipada em ação judicial em que se pleiteia a concessão do benefício previdenciário salário-maternidade previsto no art. 71 da Lei nº 8.213/91, à luz dos dispositivos legais e constitucionais que regem a matéria, bem como a jurisprudência dos Tribunais Regionais Federais.

Palavras-chave: tutela antecipada; salário-maternidade; precatórios; trânsito em julgado.

Sumário:  1. Benefícios previdenciários: considerações iniciais sobre a forma de concessão e pagamento; 2. Do procedimento para pagamentos das dívidas da Fazenda Pública; 3. A antecipação de tutela e o pagamento de prestações vencidas de benefício previdenciário; 4. O salário-maternidade; 5. Considerações finais.


1. Benefícios previdenciários: considerações iniciais sobre a forma de concessão e pagamento

Com a superação do modelo liberal clássico pelo social o Estado passa a ser responsável pela promoção de políticas públicas vocacionadas a estabelecer uma igualdade material entre seus cidadãos. Dentre as ações desse “Estado do bem-estar social”, depositário de significativa parcela das demandas da sociedade, destaca-se a implantação de um sistema de seguridade social.

No Brasil, a previdência social é um dos componentes do sistema de seguridade social, ao lado da saúde e da assistência social. Ao contrário desses dois, que em princípio se estendem a todos os necessitados independente de contribuição financeira ao sistema, a previdência social é marcado pelo caráter contributivo. Assim é que para usufruírem dos benefícios previdenciários, os segurados devem, via de regra, verter contribuições ao sistema, bem como preencher outros requisitos estabelecidos em Lei.

O Instituto Nacional do Seguro Social – INSS é a entidade administrativa encarregada de efetuar a análise do requerimento de benefício previdenciário. Verificado o preenchimento dos requisitos legais, o benefício é deferido com efeitos financeiros retroativos à data em o requerimento administrativo foi realizado.[1] Se a conclusão for pela ausência de direito ao benefício, não será efetuado qualquer espécie de pagamento.

É possível, no entanto, que o benefício negado na esfera administrativa seja concedido judicialmente como, por exemplo, no caso de divergência de interpretação da legislação previdenciária. A sentença judicial que declara procedente o pedido de concessão de benefício previdenciário veicula duas espécies de condenação: uma obrigação de fazer, consubstanciada na ordem para a implantação do benefício previdenciário; a outra é uma condenação ao pagamento de quantia certa, referente aos valores atrasados, que são devidos, via de regra, no montante correspondente aos meses transcorridos entre a data do requerimento administrativo e a data da decisão judicial.

A implantação do benefício tem como efeito o pagamento mensal do valor da prestação previdenciária nas competências seguintes, além do acumulado entre a data da decisão judicial e a efetiva implantação. Contudo, o montante devido entre a data do requerimento administrativo do benefício (ou outra fixada em sentença) e a data da decisão judicial constitui dívida de valor da Fazenda Pública e, dessa forma, deve ser cobrada por meio do procedimento de execução contra a Fazenda Pública, prevista no art. 730 e seguintes do CPC. Em outras palavras, as parcelas futuras são pagas administrativamente, através de depósito em conta bancária em favor do segurado ou dependente previdenciário. As parcelas atrasadas submetem-se às regras legais e constitucionais que estabelecem a forma pela qual a Fazenda Pública paga suas dívidas.


2. Do procedimento para pagamentos das dívidas da Fazenda Pública

O procedimento de execução contra a Fazenda Pública não foi alterado pela Lei nº 11.232/2005, que unificou num mesmo processo “sincrético” as fases de conhecimento e execução. Assim, permanecem aplicáveis as regras estatuídas nos artigos 730 e seguintes do CPC, inclusive quanto à necessidade de citação do devedor, e não a sua mera intimação:

Art. 730. Na execução por quantia certa contra a Fazenda Pública, citar-se-á a devedora para opor embargos em 10 (dez) dias; se esta não os opuser, no prazo legal, observar-se-ão as seguintes regras:

I- o juiz requisitará o pagamento por intermédio do presidente do Tribunal competente;

II- far-se-á o pagamento na ordem de apresentação do precatório e à conta do respectivo crédito”.

Conforme se depreende do dispositivo legal, o pagamento das dívidas da Fazenda Pública é efetuado pelo próprio Tribunal ao qual esteja vinculado o juiz da execução, segundo a ordem de apresentação do precatório.

O precatório surgiu no ordenamento jurídico pátrio na Constituição de 1934. (CUNHA: 2006, p. 231). Atualmente é o art. 100 da Constituição Federal de 1988 que cuida do regime de precatório e requisição de pagamento de pequeno valor (RPV), por meio do qual a Fazenda Pública realiza os pagamentos decorrentes de condenação judicial:

Art. 100. Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim.

(...)

§ 3º O disposto no caput deste artigo relativamente à expedição de precatórios não se aplica aos pagamentos de obrigações definidas em leis como de pequeno valor que as Fazendas referidas devam fazer em virtude de sentença judicial transitada em julgado.

(...)

§ 5º É obrigatória a inclusão, no orçamento das entidades de direito público, de verba necessária ao pagamento de seus débitos, oriundos de sentenças transitadas em julgado, constantes de precatórios judiciários apresentados até 1º de julho, fazendo-se o pagamento até o final do exercício seguinte, quando terão seus valores atualizados monetariamente.

§ 6º As dotações orçamentárias e os créditos abertos serão consignados diretamente ao Poder Judiciário, cabendo ao Presidente do Tribunal que proferir a decisão exequenda determinar o pagamento integral e autorizar, a requerimento do credor e exclusivamente para os casos de preterimento de seu direito de precedência ou de não alocação orçamentária do valor necessário à satisfação do seu débito, o sequestro da quantia respectiva.

Percebe-se que a Constituição Federal estabeleceu dois instrumentos para o pagamento das dívidas de valor da Fazenda, quais sejam, o precatório (art. 100, caput e § 5º) e as requisições de pequeno valor (art. 100, §3º). Na esfera federal,  consideram-se de pequeno valor as dívidas cujo montante seja inferior a 60 (sessenta) salários mínimos, nos termos do §1º do art. 17 da Lei nº 10.259/2001. Assim, as condenações proferidas pela Justiça Federal ou por juízes estaduais investidos na competência delegada de que trata o art. 109 da CF, quando inferiores a 60 salários mínimos dispensam a expedição de precatório, mas não prescindem do trânsito em julgado. É dizer, a requisição de pequeno de valor (RPV) somente poderá ser emitida após o trânsito em julgado da decisão condenatória. Nas palavras de  DIDIER, CUNHA, BRAGA e OLIVEIRA (2011, p. 718),  “a expedição de precatório ou a requisição de pequeno valor depende do prévio trânsito em julgado (CF/88, art. 100, §§ 3º e 5º), de sorte que somente pode ser determinado o pagamento, se não houver mais qualquer discussão quanto ao valor executado.”

Tem-se, portanto, que os precatórios inscritos até 1º de julho serão pagos até o final do exercício financeiro subsequente (art. 100, §5º da CF). Por sua vez, as requisições de pequeno valor, na esfera federal, serão pagas no prazo de 60 dias, nos termos do art. 17 da Lei nº 10.259/2001:

Art. 17. Tratando-se de obrigação de pagar quantia certa, após o trânsito em julgado da decisão, o pagamento será efetuado no prazo de 60 (sessenta) dias, contados da entrega da requisição, por ordem do Juiz, à autoridade citada para a causa, na agência mais próxima da Caixa Econômica Federal ou do Banco do Brasil, independente de precatório.

Nota-se que o dispositivo transcrito acima menciona que a requisição de pagamento deverá ser quitada por instituição financeira após intimação de autoridade (administrativa) pelo Juiz. Ocorre que as Leis de Diretrizes Orçamentárias editadas a cada ano vêm cuidando da matéria, estabelecendo que o pagamento seja efetuado diretamente pelo Poder Judiciário. É nesse sentido que dispõe o art. 28 da Lei nº 12.708/2012, a Lei de Diretrizes Orçamentárias para o exercício 2013:

Art. 28. As dotações orçamentárias destinadas ao pagamento de débitos relativos a precatórios e requisições de pequeno valor, aprovadas na Lei Orçamentária de 2013 e em créditos adicionais, deverão ser integralmente descentralizadas aos Tribunais que proferirem as decisões exequendas, ressalvadas as hipóteses de causas processadas pela justiça comum estadual.

Portanto, as dotações destinadas ao pagamento das requisições de pequeno valor são disponibilizadas diretamente ao Poder Judiciário. Na prática, o juízo federal da execução, ou o juízo estadual no exercício da competência federal delegada (art. 109, §§3º e 4º, da CF), expede um “ofício requisitório”, dirigido ao presidente do Tribunal Regional Federal, que por sua vez determinará ao agente financeiro oficial (Banco do Brasil ou Caixa Econômica Federal) que realize o pagamento à conta da respectiva dotação orçamentária, mediante depósito bancário em conta aberta em favor do beneficiário[3]. Todo esse tramite não costuma demorar mais que o prazo de 60 dias estipulado no art. 17 da Lei nº 10.259/2001.

Da análise dos dispositivos legais e constitucionais citados acima, dois pontos são curiais para a compreensão do tema em exposição: 1) o pagamento das condenações impostas à Fazenda Pública Federal, mesmo as inferiores a 60 salários mínimos, são efetuadas diretamente pelo Poder Judiciário, mediante dotação orçamentária consignadas para tal fim; 2) o trânsito em julgado da decisão condenatória é indispensável para desencadear o procedimento de registro de precatório ou de expedição da requisição de pequeno de valor (RPV).


3. A antecipação de tutela e o pagamento de prestações vencidas de benefício previdenciário

O procedimento da ação judicial segue uma lógica: primeiro o autor apresenta suas razões e formula o pedido; o réu apresenta sua defesa; são produzidas outras provas, além daquelas apresentadas junto com a petição inicial; o juiz decide após apreciar todas as provas produzidas.

Ocorre que os reclames por uma prestação jurisdicional mais célere e efetiva levaram o legislador a permitir, por meio da Lei nº 8.952/94, o que já era admitido pela jurisprudência. Assim, passou a existir no direito positivo brasileiro a possibilidade de concessão da tutela judicial de natureza satisfativa de forma antecipada, desde que preenchidos os requisitos elencados no art. 273 do Código de Processo Civil, quais sejam, prova inequívoca que ateste a verossimilhança das alegações do autor e fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação ou, ainda, quando restar caracterizado o abuso do direito de defesa ou manifesto propósito protelatório do réu.

Uma vez concedida a antecipação da tutela requerida pelo autor, o processo deve prosseguir de acordo com o rito e o procedimento previsto em Lei, até mesmo para que seja permitido ao réu o exercício do contraditório (THEODORO JÚNIOR: 2004, p. 340). Assim, não importa se a antecipação da tutela é veiculada em decisão interlocutória ou se está inserida no bojo de sentença, o processo continuará em seus termos, não havendo que se falar em trânsito em julgado (§5º do art. 273 do CPC).

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Conforme registrado acima, a ausência de trânsito em julgado da decisão condenatória é óbice intransponível à expedição de requisição de pequeno valor ou registro de precatório. Não é objeto deste ensaio a celeuma acerca da possibilidade jurídica de concessão de tutela antecipada em face da Fazenda Pública e as respectivas vedações legais [2]. Assim, a análise será restrita às hipóteses de antecipação de tutela em ações previdenciárias.

Foi relatado no tópico anterior que a sentença que declara o direito ao benefício previdenciário contém, via de regra, duas espécies de condenações, quais sejam, uma obrigação de fazer – a implantação do benefício – e uma obrigação de pagar quantia certa – parcelas atrasadas, vencidas no período compreendido entre o requerimento administrativo e a data da concessão judicial.

Quando é conferida a antecipação de tutela em matéria previdenciária, a ordem de implantação do benefício pode ser cumprida imediatamente, pois se consubstancia em mera obrigação de fazer. O cumprimento da decisão segue as regras estabelecidas no art. 461 do CPC:

Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.

Os pagamentos que serão efetuados nas competências seguintes são decorrência da implantação e referem-se às parcelas vincendas. Dessa forma, não se caracterizam como “dívida de valor”, diferente das parcelas vencidas, que só podem ser cobradas através do processo de execução contra a Fazenda Pública, com a observância da sistemática de precatório e requisição de pequeno valor prevista no art. 100 da CF.


4. O salário-maternidade

Segundo a lição de ROCHA e BALTAZAR JUNIOR (2009: p. 291), a finalidade do benefício salário-maternidade é “oferecer um amparo econômico às seguradas que se tornam mães, possibilitando a dedicação exclusiva das mães ao novo membro da família, o qual reclama cuidados especiais”.

Importa para o presente estudo registrar que o salário-maternidade é benefício de duração limitada, disciplinado nos artigos 71 a 73 da Lei nº 8.213/91. O período em que o salário-maternidade é devido foi fixado pelos artigos 71 e 71-A da Lei de Benefícios Previdenciários:

Art. 71. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade.

Art. 71-A. À segurada da Previdência Social que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção de criança é devido salário-maternidade pelo período de 120 (cento e vinte) dias, se a criança tiver até 1(um) ano de idade, de 60 (sessenta) dias, se a criança tiver entre 1 (um) e 4 (quatro) anos de idade, e de 30 (trinta) dias, se a criança tiver de 4 (quatro) a 8 (oito) anos de idade.

O §3º do art. 93 do Decreto 3.048/99, conhecido como Regulamento da Previdência Social, autoriza a prorrogação do prazo previsto no art. 71 da Lei nº 8.213/91 em duas semanas, anterior ou posterior ao repouso, desde que justificada a necessidade de dilação por atestado médico. Por fim, em caso de aborto não criminoso a segurada terá direito ao benefício pelo prazo de duas semanas (art. 93, §5º, do Dec. 3.048/99).

Portanto, o salário-maternidade deve ser pago dentro dos marcos temporais fixados em Lei [4]. Caso não seja pago no período em que é devido, converter-se-á em dívida de valor da Fazenda Pública, que somente poderá ser paga através da sistemática constitucional de precatório e RPV.

É diferente do que ocorre, por exemplo, no caso da concessão judicial de um benefício de aposentadoria por idade, em que após a implantação o segurado passará a perceber a prestação mensal do benefício, ao passo que deverá mover processo de execução contra a Fazenda Pública para receber as prestações pretéritas. No caso do salário-maternidade, não existem prestações futuras a serem pagas como consequência da implantação do benefício. O tempo necessário à concessão de uma tutela judicial, ainda que de natureza antecipatória, em regra será maior que o prazo máximo que o benefício é devido. É dizer, entre a data do requerimento do benefício, computado o período necessário à análise administrativa, a ciência da decisão que nega o benefício na seara administrativa, o ajuizamento da ação previdenciária e a prolação de decisão judicial, seja ela interlocutória ou sentença, verificar-se-á o transcurso do prazo de 120 dias.

E uma vez caracterizada a existência de dívida de valor, o seu pagamento somente poderá ocorrer por intermédio da sistemática de precatórios e requisições de pequeno valor, após o trânsito em julgado da ação.

A impossibilidade jurídica do pagamento administrativo de valores relativos a benefício previdenciário salário-maternidade concedidos em sede de tutela antecipada é amplamente reconhecida pela jurisprudência pátria, conforme pode ser averiguado nos seguintes julgados dos Tribunais Regionais Federais:

SALÁRIO-MATERNIDADE. TUTELA ANTECIPADA DE OFÍCIO. IMPOSSIBILIDADE. REVOGAÇÃO. SEGURADA ESPECIAL. COMPROVAÇÃO DA CONDIÇÃO DE TRABALHADORA RURAL NO PERÍODO DE CARÊNCIA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL COMPLEMENTADA POR PROVA TESTEMUNHAL.

1. No tocante a tutela antecipada, é dado ao magistrado concedê-la quando verificados os seus pressupostos. No caso, observa-se que não houve requerimento da parte autora para a concessão do referido provimento jurisdicional, consoante o disposto no art. 273 do CPC, sendo defeso ao Juiz concedê-la de ofício.

2. Além disso, observa-se que, como se trata de benefício de salário maternidade, cujo proveito é limitado no tempo, os valores atrasados a que faria jus a demandante só podem ser pagos, segundo os temos do artigo 100 da Constituição Federal, mediante precatório ou RPV. Assim, nenhum proveito traria à demandante a imediata implantação do benefício, devendo ser revogada a tutela concedida na sentença.

[...]

8. Apelação do INSS parcialmente provida apenas para revogar a antecipação de tutela. (TRF da 5ª Região, primeira turma, AC 49530, Desembargador Federal Rogério Fialho Moreira, DJ 21/05/2010).

PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PRECATÓRIO. TUTELA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. PARCELAS VENCIDAS. OFENSA AO ARTIGO 475 DO CPC.

1. É pacífica a orientação da 3ª Seção deste Tribunal no sentido da possibilidade de antecipação da tutela, sem que isso seja considerado violação ao artigo 475 do Código de Processo Civil. Inexiste qualquer limitação nesse sentido no art. 273 do CPC, que disciplina este instituto.

2. A proibição de antecipação de tutela prevista na Lei nº 9.494/97, reconhecida constitucional pelo STF, não se aplica aos benefícios previdenciários.

3. O pagamento de atrasados de benefícios previdenciários dá-se na forma legal dos precatórios ou requisição de pequeno valor (RPV), conforme seja o montante da execução – jamais pela exigência de pagamento direto pela autarquia previdenciária.

(Agravo de Instrumento n° 2003.04.01.059445-1/RS – 5ª Turma do TRF-4ª Região – Relator Néfi Cordeiro – d.julgamento 04/05/2004)

PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO. SALÁRIO-MATERNIDADE. MULTA DIÁRIA ESTIPULADA EM DECISÃO QUE ANTECIPOU OS EFEITOS DA TUTELA. EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA. PAGAMENTO SEGUNDO O RITO CONSTITUCIONAL.

1. Tendo em vista que o benefício de salário maternidade é um benefício temporário, o seu não pagamento na época própria não enseja mais a execução de obrigação de fazer, mas, sim, a execução por quantia certa contra a Fazenda Pública. Por essa razão, impossível o cumprimento da obrigação estipulada na tutela antecipada, uma vez que ela se transmudou em pagamento de quantia certa.2. Tratando-se de execução por quantia certa contra a Fazenda Pública, nos termos do art. 100 da Constituição Federal, o pagamento deve se dar por meio de RPV ou precatório, hipótese em que descabe a aplicação de multa cominatória para implementação de benefício previdenciário, pois não há como compelir o devedor ao pagamento de modo diverso daquele previsto constitucionalmente.3. Embora a multa tenha sido fixada por meio de antecipação de tutela, não há óbice a que o juízo da execução, observando eventuais modificações fáticas ou mesmo a eficácia concreta do ato coercitivo, deixe de aplicar as astreintes.” (Origem: TRIBUNAL - QUARTA REGIÃO - Classe: AC – APELAÇÃO CÍVEL – 2006.72.99.000353-7 - Órgão Julgador: QUINTA TURMA - Data da decisão: 03/03/2009 - Fonte: DJU DATA:13/07/2009 - Relator(a): ARTUR CÉSAR DE SOUZA; destaques meus).

PREVIDENCIÁRIO - PROCESSUAL CIVIL - AGRAVO DE INSTRUMENTO CONTRA DECISÃO QUE CONCEDEU A TUTELA ANTECIPADA PARA IMEDIATA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO - POSSIBILIDADE CONTRA A FAZENDA PÚBLICA – REEXAME OBRIGATÓRIO - PAGAMENTO DE ATRASADOS - IMPOSSIBILIDADE – AGRAVO PARCIALMENTE PROVIDO

[...]

IV - A antecipação dos efeitos da tutela não pode abranger os fatos patrimoniais pretéritos determinando o pagamento de atrasados, haja vista que o § 3º do art. 100 da C.F. estabelece, como pressuposto da expedição de precatório ou da requisição do pagamento de débito de pequeno valor de responsabilidade da Fazenda Pública, o trânsito em julgado da respectiva sentença. (grifos nossos)

V - Enquanto em trâmite o processo, é vedada a prática de ato que importe em alienação do domínio ou, sem caução idônea, o levantamento de dinheiro, à luz dos expressos termos do CPC 588 II. Ademais, a ADIn nº 675-4 suspendeu os efeitos do art 130 e § único da Lei nº 8.213/91 (hoje vigente com outra redação), na parte que permitiam a execução provisória do julgado e exoneravam os beneficiários de restituir os valores indevidamente recebidos em caso de reforma da decisão.

VI - Não se pode confundir os efeitos patrimoniais da determinação de pagamento de atrasados com a imposição de obrigação de fazer, ou seja, a implantação do benefício, que em nada fere o sistema de pagamentos instituído pelo art. 100 da Constituição Federal.

VII - Agravo parcialmente provido.

(Origem: TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO - Classe: AG - AGRAVO DE INSTRUMENTO – 207278 - Processo: 200403000248694 UF: SP Órgão Julgador: SÉTIMA TURMA - Data da decisão: 07/03/2005 Documento: TRF300091136 - Fonte: DJU DATA:07/04/2005 PÁGINA: 398 - Relator(a): JUIZ WALTER DO AMARAL).

Destarte, é inócua a concessão de antecipação de tutela em ação judicial em que se pleiteia a concessão de salário-maternidade, eis que se trata benefício previdenciário temporário, cuja implantação, via de regra, não produzirá o efeito de pagamentos de parcelas vincendas. No caso, a impossibilidade jurídica da concessão da tutela antecipada decorre da própria Constituição, que condiciona o pagamento de valores atrasados ao trânsito em julgado da ação judicial. De nada adianta o preenchimento dos requisitos do art. 273 do CPC pois o óbice é outro, de natureza constitucional.


5. Considerações finais

A concessão judicial de benefício previdenciário implica, via de regra, duas espécies de condenação ao Instituto Nacional do Seguro Social, quais sejam, uma obrigação de fazer consubstanciada na implantação do benefício, e outra para pagar quantia certa, que refere aos valores atrasados.

O pagamento de valores relacionados às parcelas vencidas é efetuado pelo próprio Tribunal ao qual está vinculado o juízo da execução, em regra através de requisição de pequeno valor – devido ao valor do benefício ser inferior a 60 (sessenta) salários mínimos – , em face das dotações orçamentárias descentralizadas aos Tribunais para tal finalidade, conforme previsto no art. 28 da  Lei nº 12.708/2012.

Por se tratar de benefício previdenciário cujo proveito é limitado no tempo, a concessão judicial de salário-maternidade se traduzirá, apenas, numa condenação ao pagamento de quantia certa, não havendo que se falar em pagamentos de parcelas futuras decorrentes da implantação do benefício.

A cobrança das parcelas atrasadas submete-se às regras processuais que regulam a execução contra a Fazenda Pública, inclusive no que diz respeito à exigência de trânsito em julgado da ação como condição para a expedição de requisição de pequeno valor ou precatório, nos termos do art. 100 da Constituição Federal. Dessa forma, não há como proceder à execução provisória do julgado, o que caracteriza a impossibilidade jurídica de se conferir efetividade à decisão que concede a tutela de forma antecipada em ação judicial em que se pleiteia a concessão de benefício previdenciário salário-maternidade.


NOTAS:

[1] Há previsão legal para que o benefício seja devido a partir do início da incapacidade laboral (art. 60 da Lei nº 8.213/91) ou do falecimento do instituidor da pensão (art. 74 da Lei nº 8.213/91).

[2] A Lei nº 9.494/97 cuidou de estabelecer as vedações à concessão de tutela antecipada em face da Fazenda Pública. Atualmente, pode-se afirmar que doutrina e jurisprudência admitem a possibilidade jurídica da antecipação da tutela contra a Fazenda Pública, respeitadas as ressalvas legais.

[3] Sobre o procedimento para expedição e pagamento das requisições de pequeno valor, conferir a Resolução do Conselho da Justiça Federal nº 438, de 30 de maio de 2005.

[4] O pagamento da segurada empregada é feito pela sociedade empresária empregadora, que realizará a compensação dos valores pagos em face do recolhimento a título de contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos pagos ou creditados a quem lhe presta serviços, nos termos do §1º do art. 72 da Lei nº 8.213/91.

 


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

CUNHA, Leonardo José Carneiro da. A Fazenda Pública em Juízo. 4ª edição. São Paulo: Dialética, 2006.

DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de Direito Processual Civil – Execução, v. 5. 3ª edição. Salvador: Juspodivm, 2011.

ROCHA, Daniel Machado da; BALTAZAR JUNIOR, José Paulo. Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social. 9ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009.

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil, vol. 1. 41ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2004.

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Sobre o autor
Rodrigo Matos Roriz

Procurador Federal. Bacharel em Direito e em Ciências Contábeis. Especialista em Direito Público e em Direito Processual Civil. MBA em Gestão Pública.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RORIZ, Rodrigo Matos. Da (im)possibilidade jurídica de concessão de tutela antecipada em ação previdenciária de benefício salário-maternidade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3512, 11 fev. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23696. Acesso em: 19 abr. 2024.

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