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Os honorários advocatícios de sucumbência recursal como prejudiciais ao exercício da boa advocacia

19/02/2013 às 10:34
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Fixar honorários para a sucumbência recursal esvazia a sua essência, porquanto lhes retira o caráter remuneratório e lhes atribui o punitivo, quando, na verdade, já se tem o instituto próprio para tanto, que é o da litigância de má-fé, além de ferir a liberdade de atuação do advogado e o princípio do duplo grau de jurisdição.

O Novo Código de Processo Civil, cujo Projeto de Lei tramita, no Senado Federal, sob o nº 166/10, trará, assim como faz o art. 55, caput, da Lei nº 9.099/95, a figura dos honorários advocatícios de sucumbência recursal, aos casos de inadmissão ou negativa de provimento ao recurso interposto contra sentença ou acórdão (art. 922 combinado com o 73, § 6º, na redação original, ou o art. 87, § 7º, com as alterações propostas).

O intuito nítido de tal dispositivo é a inibição da interposição de recursos, objetivando maior celeridade processual, o que foi constitucionalizado como princípio pela Emenda Constitucional de nº 45/04.

Pois bem. Não pairam dúvidas de que os honorários advocatícios de sucumbência têm a finalidade de remunerar o advogado (pequena parcela da doutrina apenas refere que a intenção de Buzaid era substituí-los pelos contratuais), assim como, especialmente pelo disposto no art. 133 da Carta Política de 1988, não há qualquer discussão de que o profissional da advocacia é essencial à administração da justiça e, por conseguinte, à manutenção do Estado Democrático de Direito.

Desta forma, é inegável que estabelecer a fixação de tais acaba, indubitavelmente, por esvaziar a sua essência, porquanto lhe retira o caráter remuneratório e lhe atribui o punitivo, quando, na verdade, já se tem o instituto próprio para tanto, que é o da litigância de má-fé (tanto multa quanto indenização); todavia, não é apenas este paradoxo que se constata com a denominada sucumbência recursal (também conhecida como em cascata), mas também clarividente ferimento à liberdade de atuação do profissional da advocacia, isto sem falar ao princípio do duplo grau de jurisdição (subsumido no princípio constitucional do devido processo legal).

É que se vê que o legislador utiliza a figura indispensável do advogado como marionete, oferecendo-lhe, em tese, uma maior lucratividade no processo, mas tendo em contrapartida a desoneração do Estado em julgar inúmeros recursos e, consequentemente, atingindo, às avessas, a propalada celeridade processual, tão cobrada nos dias de hoje do Poder Judiciário e que, na verdade, apenas não existe por não haver contratação de pessoal.

Ora, ao mister da advocacia é inerente a liberdade e autonomia (art. 7º, I, da Lei nº 8.906/94), o que traz consigo como embasamento, também, os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa. Então, a partir do momento em que se cria um obstáculo indireto para o exercício deste, evidentemente que está sendo ferido o direito precípuo mencionado.

É nato ao advogado o inconformismo, a irresignação, enfim, a não-aceitação diante de qualquer resultado lhe é apresentado pelo juízo, pelo que não se pode admitir, sob hipótese alguma, que seja o profissional inibido, inclusive, de praticar um dos atos processuais mais basilares, que é o de interposição de recurso de apelação.

Veja que, diante da nova previsão, numa demanda indenizatória por danos morais, por exemplo, o advogado, objetivando a majoração da verba reparatória fixada em primeiro grau de jurisdição poderá ver seu cliente, em caso de desprovimento do recurso, penalizado com a fixação de honorários de sucumbência, assim como, no outro polo, poderá ver-se a parte derrotada receosa de interpor recurso objetivando a minoração do quantum ou até mesmo a improcedência da demanda.

Aliás, procedendo-se uma análise pelo viés do profissional da advocacia e abstraindo o interesse da parte na demanda, tem-se, naquele tipo de ação, um evidente prejuízo nos casos de celebração de contrato de risco, afinal guardam relação sobre o resultado final da demanda.

Não só isto, mas não se pode esquecer da mais do que comum ocorrência de fixação de honorários irrisórios em primeira instância, a qual não guarda, diga-se por passagem, qualquer relação com o texto legal atual, mas sim com problema cultural existente na magistratura.  Isto porque, nestes casos, poderá ocorrer do advogado aviar recurso objetivando ver majorada sua verba honorária e acabar tendo efeito contrário, qual seja, o de condenação de seu cliente ao pagamento dos honorários de sucumbência para a parte adversa, estremecendo, sem sombra de dúvida, a relação existente.

Por fim, não se pode deixar de mencionar a evolução da teoria da responsabilidade civil da perda de uma chance, a qual pode muito bem servir de embasamento para o ajuizamento, em caso de renúncia tácita ou expressa ao direito de recorrer, de ação indenizatória contra a pessoa do advogado ou da empresa de advocacia, não obstante a cientificação do cliente acerca das possibilidades e riscos inerentes à prática da faculdade processual referida.

Destarte, diante das brevíssimas linhas acima, que não têm qualquer pretensão de exaurir a matéria, tem-se que os honorários de sucumbência recursal devem ser analisados pelos profissionais da advocacia cum grano salis, devido ao fato de que, na verdade, mediante uma análise ampla, podem ser mais prejudiciais do que benéficos àqueles.

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Sobre o autor
Emmanuel Reche Becker

Advogado inscrito na OAB/RS sob o nº 84.677. Advogado no Estado do Rio Grande do Sul.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BECKER, Emmanuel Reche. Os honorários advocatícios de sucumbência recursal como prejudiciais ao exercício da boa advocacia. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3520, 19 fev. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23756. Acesso em: 8 nov. 2024.

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