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Tutelas inibitórias coletivas: reflexões sobre as razões ideológicas e científicas sobre a extinção sem julgamento de mérito de ACPs com fundamentação fática individual e pedido inibitório genérico

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17/05/2013 às 08:58
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Conclusões:

Os receios esposados pelo Ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho de que falamos alhures, sobre o mau uso das ações coletivas pelo Ministério Público do Trabalho ainda demonstram-se atuais.

Nas Ações Civis Públicas promovidas, nos casos específicos estudados, nota-se que o Procurador do Trabalho, é sabente que o fato subjacente individual, apurado em autos de infração, guardará essa natureza, para sempre, e não atinge ou atingirá o grupo, categoria ou classe.  

Outros fatos futuros também, ainda de assemelhados àqueles, não poderiam, só por isso, dar margem a ferimento de direito ou interesse coletivo (transindividuais de natureza indivisível, como diz o inciso II do artigo 81 do Código de Defesa do Consumidor) por serem individuais as situações jurídicas de cada um deles, a partir do descumprimento da lei e, portanto, jamais adquiriam a qualidade da indivisibilidade. Isso é tão evidente, que há a necessidade de inserção em todos os TACs de cláusula em que a astreinte incidirá “por trabalhador em situação irregular!”

Quando muito, dependendo do caso concreto, poderiam ser aglutinados aqueles direitos individuais, se decorrentes de uma origem comum (inciso III, do artigo 81 do Código de Defesa do Consumidor) para ajuizamento da chamada Ação Civil Coletiva pelo rito dos artigos 91 a 100 do Código de Defesa do Consumidor. Mas esse rito não permite pedidos de obrigação de fazer e não fazer com aplicação de astreintes, por ter natureza eminente reparatória, além de que se reduzida  a quantidade de titulares do direito, não justificar nem mesmo a atuação ministerial  para tentar a feitura de TAC, como deixa antever o Precedente nº 17 do Conselho Superior do Ministério Público do Trabalho.

Todavia, a Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público (CCR), encarregada do controle dos arquivamentos, incentiva a continuidade das investigações de casos individuais para que sejam forçados Termos de Ajustamento de Conduta com obrigação genérica, havendo receio dos Procuradores do Trabalho, principalmente, dos recém empossados, em contrariar a posição daquele órgão. Resta então a eles obter- às vezes até com certa truculência, o que amiúde redunda em denúncias pelos investigados à Corregedoria Geral- o TAC, remédio para todos os males.

Não obtendo sucesso, e resistindo o investigado, só resta a propositura da Ação Civil Pública, e com alguma criatividade é possível deixar escondido o fato puramente individual, argumentar que há ou haverá risco de repetição de outros fatos individuais- sem qualquer prova da ameaça a direitos coletivos, que é imprescindível, como demonstrado- e postular providência genérica cuja eficácia será para sempre e para todos. É a passagem mágica de ofensa individual- às vezes gerada por culpa do próprio empregado, que se atrasou no banheiro, por exemplo, e marcou a saída após dez horas de trabalho ou corrompeu o porteiro para que marcasse o cartão antes de sua entrada na empresa- para ser considerada ofensiva a direito coletivo, mas a astreinte continua a incidir, bastando que nova situação jurídica individual ocorra. Vale dizer, ocorrência de novo fato individual.

Evidentemente, que raras vezes, esses defeitos não são percebidos pelo Judiciário, pois é óbvio que a sentença de procedência que proferisse- sem considerar se o direito vindicado foi provado ou havendo certeza que está ameaçado seriamente, é difuso, coletivo ou individual homogêneo- se assemelharia em menor espaço geográfico, mas com a mesma eficácia aos titulares, à genérica decisão punitiva de Deus, a partir da desobediência individual de Eva que ludibriou Adão a comer uma fruta proibida, mas, ainda assim impôs a todos os homens que já viviam ou que viveriam no futuro que para comerem pão é necessário suar o rosto.

Definitivamente, nos casos aqui tratados, os fatos individuais subjacentes, não poderiam sequer ser elevados à categoria de direitos homogêneos, mas se transformam em coletivos sem nenhuma das características exigidas pelo inciso II do artigo 81 do CDC, segundo as iniciais de ACPs promovidas pelo Ministério Público do Trabalho. Seriam  elas então,  pelo processo tradicional, ineptas ou sujeitas a carência por ilegitimidade de parte ativa, falta de interesse e até impossibilidade jurídica do pedido. Defende-se, todavia, com embasamento “Princípio do interesse jurisdicional do conhecimento de mérito do processo coletivo” e no “Princípio da presunção da legitimidade ad causam ativa pela afirmação do direito” que devam ser evitadas as extinções sem julgamento de mérito e proferir-se sentença meritória de improcedência[24], observando-se caso concreto “por meio da regra hermenêutica da proporcionalidade ”[25] como quer Luiz Guilherme Marinoni. Tal desfecho de cunho meritório, por o fato descrito no exórdio, ainda que ilícito, não ser lesivo aos titulares do direito pertencente ao “grupo, categoria ou classe”, responderia à dúvida de Rodolfo de Camargo Mancuso,observando o rito da Ação Popular, reportando-se a estudos de Cândido Rangel Dinamarco pergunta:

Ainda, valendo-nos do exemplo da ação popular, se o ato impugnado, apesar de ilegal, não se revelou lesivo, o caso configura falta de condição da ação (ausência de interesse ou de possibilidade jurídica) ou se trataria, já de “requisito de procedência” / “prejudicial de mérito”, hipóteses justificadoras de improcedência da ação? [26]


REFERÊNCIAS:       

ALMEIDA, Gregório Assagra de. Direito Processual Coletivo Brasileiro: um novo ramo do direito processual (princípios, regras interpretativas e a problemática de sua interpretação e aplicação). São Paulo: Saraiva, 2003.

ANDRADE, Letícia Queiroz de. Regulação do poder de polícia: distinções concentuais juridicamente relevantes. In: PIRES. Luiz Manoel Fonseca; ZOCKUN Maurício (Coord.). Intervenção do Estado. São Paulo: Quartier Latin, 2008.

ARENHART, Sérgio Cruz. Perfis da tutela inibitória coletiva, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003 (Temas atuais de direito processual civil, v. 6).

MANCUSO. Rodolfo de Camargo. Ação Civil Pública. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 6. ed. 1999.

MARINONI, Luis Guilherme. Técnica processual e tutela dos direitos. São Paulo: RT, 2004.

MARTINS FILHO, Ives Gandra. A importância da ação civil pública no âmbito trabalhista. Disponível em  http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/revista/Rev_25/artigos/Art_MinistroIves.htm. Acesso em 25 de março de 2013.

MELO.  Raimundo Simão de.  Ação civil pública na justiça do trabalho. São Paulo. Editora LTr, 2002.

SILVA NETO. Manoel Jorge. Proteção constitucional dos interesses trabalhistas- difusos, coletivos e individuais homogêneos. São Paulo: Editora LTr. 2001.

SPADONI, Joaquim Felipe. Ação inibitória: a ação preventiva no art. 461 do CPC 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007 (Coleção estudos de direito de processo. Enrico Túlio Liebmam, v. 49)

ZAVASCKI, Teori Albino. Processo Coletivo: tutela de direitos coletivos e tutela coletiva de direitos. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.


Notas

[1]Disponível em: http://gazetaonline.globo.com/_conteudo/2013/03/noticias/dinheiro/1419105-proconpodera-multar-empresas-que-nao-cumprem-a-lei.html. Acesso em 25 de março de 2013.

[2] MARINONI, Luis Guilherme. Técnica processual e tutela dos direitos. São Paulo: RT, 2004, p.222. Poderíamos entender como absolutamente invioláveis todas as normas que se espraiam na Carta Magna e mesmo as infraconstitucionais que tem como suporte os valores protegidos a partir dos artigos 5º e 6º da Carta Magna Esse autor, para fins didáticos, exclui a necessidade de refletir-se sobre prevenção do dano para incidir a norma de natureza inibitória do ilícito nas obrigações de fazer e não fazer. E de certa forma, deixa antever que não é o ato ilícito-que depende da culpa do agente para que o dano efetivado seja reparado gerando a obrigação (artigo 186 do CC)- mas sim a simples probabilidade de descumprimento de um dever jurídico já habilita o aproveitamento da técnica da tutela inibitória preventiva ou de remoção do “ilícito”. Faz, nessa importante obra,  incursões sobre os artigos 273 e 461 do CPC, além do artigo 84 do CDC, para justificar os poderes alargados do juiz em dar solução ao caso concreto não ficando nessas ações ,  adstrito ao pedido. Deve, diz, conformar o processo segundo as necessidades do caso concreto, podendo escolher a melhor forma de tornar efetiva a tutela jurisdicional. Esclarece que esse poder do juiz (chamamos de ultrapetição da sentença), que antes era controlado pela lei abstratamente, pelas novas regras que o habilitam a utilizar de meios e soluções variados para tornar efetivo o julgado, o controle do exercício do poder jurisdicional, deve ser feito pela observância da regra da proporcionalidade, requerendo justificação de que a técnica processual foi utilizada de maneira justa e racional.

[3] Não se quer com isso, dizer que a atuação do Ministério Público como órgão agente, deva se restringir com a marca da transindividualidade, ao combate ao trabalho escravo; combate à discriminação e busca da igualdade no trabalho; combate a exploração de crianças e adolescentes; defesa do meio ambiente do trabalho; combate às irregularidades trabalhistas na Administração pública; combate às fraudes nas relações de trabalho e exploração do trabalho portuário e aquaviário. Há, realmente, outras questões, ainda pertinentes a direito disponível que por conveniência social, devam ser tratadas coletivamente, ainda que o interesse ofendido não se encontre dentre aqueles valores fundamentais constitucionalmente previstos na Carta Magna, dentre os quais, a vida, saúde, liberdade, dignidade, igualdade que são transpostos dos artigos, 1º 3º, 5º e 6º da Constituição Federal, para as especificações do artigo 7º da mesma Carta.

[4]  MARTINS FILHO. Ives Gandra. A importância da ação civil pública no âmbito trabalhista. Disponível em  http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/revista/Rev_25/artigos/Art_MinistroIves.htm. Acesso em 25 de março de 2013.

[5] Sustentaremos ao final- com base nos princípios do “interesse jurisdicional no conhecimento do mérito do processo coletivo” e” presunção da legitimidade ad causam ativa, pela afirmação do direito “- que se o pedido (objeto) genérico em ACP, para a tutela inibitória preventiva ou de remoção do ilícito se embasa em fato individual (fundamentação fática incongruente com o pedido) podem ser superadas a inépcia e ilegitimidade (esta pela presunção da legitimidade ativa ditada pelo artigo 129, III da Constituição Federal), e no mérito avaliar se o pedido é adequado, proferindo um julgamento de procedência ou improcedência, de acordo com o princípio da razoabilidade, ao verificar se os fatos individuais narrados são decorrentes de conduta genérica, repetida e de grave ofensividade aos demais trabalhadores ou não.   Queremos dizer que, independente de o autor afirmar que os direitos defendidos são individuais homogêneos, coletivos ou difusos, se a causa de pedir fática descreve fatos individuais puros (que em tese levaria a extinção do processo sem julgamento de mérito), a sentença de improcedência se justificaria, justamente, por não haver prova suficiente que esses direitos metaindividuais pudessem ser ameaçados ou feridos.  

[6] ANDRADE. Letícia Queiroz de. Regulação do poder de polícia: distinções concentuais juridicamente relevantes. In: PIRES. Luiz Manoel Fonseca; ZOCKUN Maurício (Coord.). Intervenção do Estado. São Paulo: Quartier Latin, s008. p.56.

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[7] MARINONI, Op. Cit. P.327, concorda que a tutela inibitória para a proteção de direitos qualificados é exercida pela lei, abstratamente, e pela Administração, pelo poder de polícia, através da fiscalização e repreensão quanto às práticas nocivas a direitos fundamentais e os protegidos por normas de ordem pública.

[8] A ciência do Direito esclarece que a norma jurídica, exerce coação psíquica sobre os jurisdicionados, ou seja, uma coerção, de maneira que a preocupação do sujeito não é tanto com a norma, mas com conseqüências de sua transgressão. Na ordem trabalhista a coerção da norma para inibir o ilícito ou sua repetição, no plano administrativo, é efetivada pela ameaça da utilização de medidas preventivas e repressivas, estas, através de multas, interdições etc., pela atividade do Ministério do Trabalho e Emprego; no plano da autonomia privada coletiva, através das multas a favor do empregado pelo descumprimento de cláusulas de Convenções Coletivas e, através do próprio Judiciário, seja qual for a natureza da eficácia da sentença que proferir. 

[9] Note-se que se nesses casos de ferimento a direitos individuais divisíveis, com poucos ofendidos, se o fundamento utilizado na ACP fosse respeitante a direitos homogêneos (defensáveis pela Ação Civil Coletiva, segundo o sistema) como às vezes até o são, por sua natureza reparatória, não poderiam constar pedidos de obrigações positivas ou negativas de fazer ou não fazer e aplicação de astreintes. Na prática, o Ministério Público, chama de ACP essas verdadeiras ações que deveriam ser individuais, por, no mais das vezes tais direitos violados aos nominados, nem mesmo serem homogêneos- por não terem nascido de uma origem comum (inciso III, do artigo 81 do CDC) e pedem providência obstativa de atos, ou imposição de fazer em relação a todos os empregados e às vezes, até condenação em dano moral coletivo. 

[10] É sabido que na atividade de custos legis em processos individuais, que tratam de horas extras, intervalos e até pedidos de insalubridade e periculosidade, ou mesmo de pedidos de indenização por danos acidentários e até casos envolvendo menores, o Ministério Público, não emite, na condição de custos legis, parecer circunstanciado, por entender a maioria não existir interesse público primário. Paradoxalmente, quando há denúncia com o mesmo objeto, a CCR, contra posições do próprio CNMPT, adota entendimento rígido, como se dissesse, que o mesmo interesse individual, a respeito de horas extraordinárias e jornadas, não é público para a atividade de custos legis, mas torna-se público e deve ser investigado se sujeito à atividade de ministerial de órgão agente.   Antes, na 15ª Região, onde atuamos como Procurador Regional do Trabalho, a maioria dos procuradores devolvia cerca de 90 por cento dos processos chegados do tribunal, através de uma bem elaborada cota, depois por simples colagem de etiquetas informando que por não haver interesse público, não seria emitido parecer, tudo isso com o beneplácito e incentivo do Conselho Superior do Ministério Público do Trabalho e mesmo da Corregedoria Geral, nada obstante, alguns recebessem cerca de 300 processos por mês e, em alguns meses, emitiam tão só cerca de 20 pareceres.   Essas incongruências deixam a própria magistratura em dúvida, pois se o Ministério Público do Trabalho, não emite parecer sobre determinada questão sobre fatos individuais por não haver interesse público ou social, como poderia dizer que há esses interesses nas Ações Civis Públicas que propõe, submetidas à mesma fundamentação fática, ainda que escondida, pela fundamentação jurídica ? . 

[11] A olhos vistos, como se sabe, ao contrário daquela decisão, o Ministério Público do Trabalho deve atuar, precipuamente, quando se torna impossível ou difícil a solução de questões graves pelo Ministério do Trabalho e Emprego, que não deve ser leniente, pena de a União sofrer Ação Civil Pública, por não cumprir a atividade fiscalizatória a contento. A Constituição Federal e as leis infraconstitucionais são suficientes, para chegar-se a conclusão que há casos que só a instituição a que pertence a Relatora Maria Aparecida Gugel pode defender para tornar efetivos os direitos sociais que transcendem a esfera individual, principalmente os indisponíveis tais como: liberdade (incluindo-se aqui o trabalho escravo e o assédio sob suas diversas nuanças), intimidade, acessibilidade às funções públicas, proteção do meio ambiente do trabalho, proteção do trabalho indígena, discriminação no trabalho (em suas diversas nuanças), inserção no mercado de trabalho de portadores de necessidades especiais e aprendizes, dentre outras.

[12] ALMEIDA, Gregório Assagra de. Direito Processual Coletivo Brasileiro: um novo ramo do direito processual (princípios, regras interpretativas e a problemática de sua interpretação e aplicação). São Paulo: Saraiva 2003.

[13] Na realidade, por outra perspectiva, nas Ações Civis Públicas de que estamos tratando, o Autor, descreve na inicial o fato subjacente individual, mas ele fica obnubilado e obscurecido pela fundamentação jurídica embasada no processo de índole coletiva e no pedido genérico. O defeito processual, se bem investigado é grave, mesmo porque, já vimos alguém defender até tutelas antecipadas, sem análise do fato -ao final deste artigo inseriremos a fundamentação de um julgado de primeira instância nesse sentido, após cassado por aviamento de Mandado de Segurança- que possível condenação definitiva e até tutelas antecipadas em ACP, possam ser deferidas independentemente de o fato ser incongruente com a fundamentação e o pedido, por não haver prejuízo algum ao réu se a condenação repete os textos da lei, como geralmente consta do pedido. Sob esse prisma, absurdamente, qualquer autuação individualizada da SRTE, comunicada ao Ministério Público do Trabalho, ensejaria de pronto a promoção da Ação Civil Pública, independente da tentativa anterior de assinatura do TAC, com a finalidade de coibir ou prevenir ofensa coletiva com objeto indivisível, como querem os incisos I e II, do artigo 81 do CDC. 

[14] ALMEIDA. Ob. Cit., p. 572

[15] ALMEIDA. Ob. Cit., p. 574.

[16]  Inexistindo a indeterminação dos titulares do direito, impossível pensar- se que o simples pedido com escopo genérico, possa dar suporte a argumentação de que só a pretensão esposada no exórdio, pelo MPT ou sindicato, habilite condenações fulcradas no conceito legal de direito coletivo que considera não só uma pluralidade de sujeitos indeterminados, ainda que determináveis, mas também a indivisibilidade da obrigação e por conseqüência, da própria prestação que deverá também ser indivisível. Evidentemente, que tais ações no plano abstrato, trazem a informação do fato individual subjacente ocorrido, mas ele fica escondido com a fundamentação jurídica extraída do processo coletivo e do pedido só embasado na causa próxima. Se no plano do direito abstrato de ação isso seja tolerável, como já sustentamos, no plano do mérito não há condições de o autor produzir prova do fato de que há risco para a coletividade, tão só a partir do fato isolado descrito, mesmo porque a prova, simplesmente indiciária em relação ao pedido, se embasa em fatos jurídicos afetos a sujeitos determinados e, então, nova prova deveria ser produzida para que o judiciário pudesse inferir haver riscos sérios de que o réu pretenda impor a todos os empregados aquela conduta. A condenação se adviesse, s.m.j, implicaria em presunção sobre uma espécie de reserva mental inversa por parte da empresa, considerando que todo descumprimento de deveres individuais é uma preparação para o descumprimento de deveres jurídicos coletivos.

[17] Na nota anterior pontuou-se a determinabilidade dos sujeitos do fato subjacente, como elemento determinante para a descaracterização do pedido de ações com provimento genérico, mas se alargarmos o raciocínio, infere-se que nos casos tratados por esse trabalho, tampouco há a característica da indivisibilidade do objeto, que é também critério limitativo da qualificação de direitos coletivos. Na realidade os interesses do “todo” indivisível que sofre a ação ilícita, não pode ser afetado tão só pela lesão individualizada a interesses e direitos de alguns de seus integrantes.

[18]  ARENHART, Sérgio Cruz. Perfis da tutela inibitória coletiva, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003 (Temas atuais de direito processual civil, v. 6). p. 230.  Realmente, a jurisprudência do mundo ocidental, mencionada pelo d. autor, é irrespondível, se os fatos forem individuais e constam da causa de pedir, como justificar um pedido genérico sem outros elementos razoáveis e hábeis, para que o julgador se convença da possível violação genérica que habilita o pedido amplo?

[19]SPADONI, Joaquim Felipe. Ação inibitória: a ação preventiva no art. 461 do CPC.2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007 (Coleção estudos de direito de processo. Enrico Túlio Liebmam, v. 49). p. 50.

[20] MELO.  Raimundo Simão de.  Ação civil pública na justiça do trabalho. São Paulo. Editora LTr, 2002.p.35, critica a posição adotada por Carlos Henrique Bezerra Leite, o qual na p. 110 de sua obra -O ministério público do trabalho-doutrina, jurisprudência e prática. São Paulo: Ltr. 1998, por este autor entender, ao contrário daquele, serem casos típicos de direitos homogêneos: a exigência de atestados de esterilização; procedimento lesivo do empregador contra empregados que contra si tenham ajuizado reclamação trabalhista; permissão de trabalho perigoso ou insalubre a menores de 18 anos; tratamento discriminatório do empregador no tocante ao trabalho manual, técnico ou intelectual.

[21] SILVA NETO. Manoel Jorge. Proteção constitucional dos interesses trabalhistas- difusos, coletivos e individuais homogêneos. São Paulo: Editora LTr. 2001. P. 206.

[22]Disponívelem:http://www.trt4.jus.br/portal/portal/trt4/consultas/consulta_lista/ConsultaProcessualWindow?svc=consultaBean&action=e&windowstate=normal&mode=view, Acesso em 25.03.2013.

[23] A R. decisão monocrática, se vê, apoiou-se em fatos individuais e proferiu decisão inibitória genérica, quando na verdade, se o pedido foi genérico aquela prova anterior quando muito, serviria de indício sobre a probabilidade de ocorrência de outro fato mais amplo do que aquele ser praticado, e esse novo fato para aferir-se a ameaça a direitos coletivos, logicamente deveria ser provado na instrução, como deixou antever no V. Acórdão proferido no Mandado de Segurança.

[24]  É a única solução possível segundo nos parece- afora a extinção sem julgamento de mérito, como vem julgando alguns Tribunais Regionais - se não provada a ameaça a direitos transindividuais de natureza indivisível, cujos sujeitos são de difícil determinação, a partir dos fatos individuais subjacentes, ainda que repetidos por outros sujeitos de direito, se forem os únicos fundamentos dos pedidos mandamentais, inibitórios e até de responsabilização por danos morais coletivos.

[25]  MARINONI. Op. Cit. P. 297.

[26] MANCUSO. Rodolfo de Camargo. Ação Civil Pública. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 6. ed. 1999. P. 46.

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Sobre o autor
J. N. Vargas Valério

Consultor jurídico. Advogado associado à Chohfi Advogados. Mestre em direito pela PUC/SP. Ex-Juiz do Trabalho. Procurador Regional do Trabalho aposentado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VALÉRIO, J. N. Vargas. Tutelas inibitórias coletivas: reflexões sobre as razões ideológicas e científicas sobre a extinção sem julgamento de mérito de ACPs com fundamentação fática individual e pedido inibitório genérico. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3607, 17 mai. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24457. Acesso em: 24 abr. 2024.

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