Assistimos a uma peleja escabrosa, verdadeiro absurdo – com tamanha perplexidade! – o desenrolar do assombroso decreto legislativo (apelidado de projeto da cura gay), que tramita no Congresso Nacional.
Tal projeto pede a extinção de dois trechos de uma resolução de 1999 do Conselho Federal de Psicologia (CFP). Um dos itens a ser suprimido é o que cita que “ os psicólogos não colaborarão com eventos e serviços que proponham tratamento e cura das homossexualidades”.
Ora, insta salientar que o psicólogo pode – e deve, quando procurado – receber em seu consultório qualquer pessoa, seja ela hetero ou homossexual, isonomia prevista constitucionalmente, pois todos são iguais perante a lei. O que não se pode é realizar uma reorientação sexual no paciente!
Há exatos 23 anos a homossexualidade deixou de ser considerada doença pela OMS. O Brasil, por meio do Conselho Federal de Psicologia, deixou de considerar a opção sexual como doença ainda em 1985, antes mesmo da resolução da OMS , que se deu em 17 de maio de 1990[1].
Acerca do tema faremos algumas considerações de cunho constitucional.
Vivemos sob a égide de um Estado democrático de direito, que rege-se por uma Constituição Federal – lei máxima de um país.
Estado Democrático de Direito é a uma pessoa jurídica territorial soberana[2] (constituída por povo, território e poder soberano), que tem seu povo representado por mandatários e que se submete ao império da lei –ordenamento jurídico pátrio.
O preâmbulo de nossa Carta Magna assevera que os tais representantes (Constituintes) devem assegurar o exercício de direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, dentre outros valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos.
Afora o preâmbulo seja considerado pela Corte Máxima (STF) como mera posição ideológica do constituinte, a doutrina pátria reconhece o preâmbulo como função de diretriz interpretativa constitucional, por auxiliar na identificação dos princípios e valores primordiais que orientam o constituinte originário na sua elaboração.
Cláusulas pétreas de nossa Constituição asseguram que :
I – ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante (inciso III, art. 5º, CF);
II – é inviolável a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas (inciso X, art. 5º, CF);
III- a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais (inciso XLI, art.º, CF).
Alguns princípios podem ser citados, dentre eles o maior de todos – basilar de nossos regramento constitucional - , a dignidade da pessoa humana (que é é inviolável), que esta sendo esquecido e “pisoteado” no meio desta loucura.
Desejar curar o que não é doença e promover verdadeira discriminação no seio da sociedade é algo inaceitável, fora da realidade mundial, para dizer o mínimo. Projeto ou lei que preveja algo desta monta é inconstitucional, ou seja, vai contra os desejos do povo e entendimentos científicos.
O professor Geraldo Ataliba[3], ao discorrer sobre o papel dos representantes do povo, ensina:
É traição ao povo – e, pois, negação da democracia – consagrar apenas retoricamente os princípios popularmente fixados e, ulteriormente, estabelecer regras que o esvaziem, emasculem ou contravenham. Todas as normas constitucionais devem dispor de modo a dar plena e cabal garantia de eficácia aos princípios.
(...)
Para Tércio Sampaio feraz Jr. “uma Constituição não é apenas o seu texto, mas é, principalmente, uma prática”. Dizia Ruy Barbosa que, ainda que a Constituição fosse tão perfeita, como se tivesse sido baixada dos Céus, o país haveria de ser julgado não pelo seu texto, mas sim segundo o modo pelo qual a pusesse em prática. Importa, assim, conhecer a Constituição, para assegurar-lhe eficácia, realizando seus princípios, como forma de tornar efetivos os desígnios que – bem ou mal – o povo nela expressou.
O que ocorrá com a previsão preambular de sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos? E o que dizer da liberdade preconizada tanto no preâmbulo quanto nas normas constitucionais? A liberdade de opção sexual também não deverá ser levada em conta?
Outros grandes princípios mostram-se aqui presentes: a supremacia do interesse público sobre o privado e a indisponibilidade do interesse público.
Portanto, entendemos que tal projeto é descabido, absurdo e desprovido de propósito, pois numa nação que espera ver de seus representantes atitudes proativas, resolução de problemas não mostra-se lógico a criação de um problema sem pé nem cabeça, de cunho preconceituoso e pessoal.