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A Defensoria Pública no âmbito dos Juizados Especiais

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01/08/2013 às 16:14
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6.Lei ainda constitucional

Quanto à prerrogativa de prazo em dobro para a Defensoria Pública, no processo penal e, consequentemente, nos Juizados Criminais, surge outra problemática, qual seja a possível inconstitucionalidade desta prerrogativa.  

Conforme já destacado, a Lei Complementar nº 80/94 dispõe que é prerrogativa dos membros da Defensoria Pública receber intimação pessoal em qualquer processo e grau de jurisdição, contando-se-lhes em dobro todos os prazos. Há, porém, aqueles que acreditam que a prerrogativa do prazo em dobro para a Defensoria Pública é inconstitucional no âmbito criminal, já que – ao contrário do Processo Civil, onde o Ministério Público e a Fazenda Pública dispõem de prerrogativa equivalente[10] – no Processo Penal o Ministério Público não possui prazo em dobro.

Os adeptos da corrente pela inconstitucionalidade da prerrogativa entendem que a Defensoria ter os prazos contados em dobro enquanto os do Ministério Público são contados normalmente fere a isonomia e o devido processo legal. A questão chegou ao STF, que no julgamento do HC 70.514 [11] entendeu pela constitucionalidade da referida regra até que a Defensoria esteja devidamente habilitada e estruturada, como já está o Ministério Público. Surgiu assim a chamada “Lei Ainda Constitucional”, já que, quando a Defensoria Pública estiver eficazmente organizada, a regra que prevê prazos em dobro no processo penal será inconstitucional. Trata-se, conforme destaca Pedro Lenza, de uma norma em trânsito para a inconstitucionalidade. A respeito do tema, destaque-se parte do voto proferido pelo Ministro Moreira Alves:

“A única justificativa que encontro para esse tratamento desigual em favor da Defensoria Pública em face do Ministério Público é a de caráter temporário: a circunstâncias de as Defensorias Públicas ainda não estarem, por sua recente implantação, devidamente aparelhadas como se acha o Ministério Público. Por isso, para casos como esse, parece-me que deva adotar-se a construção da Corte Constitucional alemã no sentido de considerar que uma lei, em virtude das circunstâncias de fato, pode vir a ser inconstitucional, não o sendo, porém, enquanto essas circunstâncias de fato não se apresentarem com a intensidade necessária para que se tornem inconstitucionais. Assim, a lei em causa será constitucional enquanto a Defensoria Pública, concretamente, não estiver organizada com a estrutura que lhe possibilite atuar em posição de igualdade com o Ministério Público, tornando-se inconstitucional, quando essa circunstância de fato não mais se verificar.” (grifou-se)

Desta forma, enquanto não alcançar o nível de organização do respectivo Ministério Público, a Defensoria Pública gozará de prazo em dobro no Processo Penal, inclusive nos Juizados Criminais, não havendo que se falar em inconstitucionalidade.


 Conclusão

Os Juizados Especiais regem-se por diversos princípios que buscam dar celeridade aos procedimentos. Os Juizados Federais, em especial, vedam que qualquer pessoa de direito público desfrute de prazo diferenciado nos processos sob seu procedimento. Desta forma, mesmo a Defensoria Pública da União tem seus prazos contados normalmente; desta forma também têm entendido os Tribunais. Em que pese o entendimento jurisprudencial que não estende à atuação da Defensoria Pública nos Juizados Federais a prerrogativa da contagem em dobro de todos os prazos, essa prerrogativa deveria subsistir, notadamente quando consideradas questões como as espécies normativas em conflito, vez que a prerrogativa é dada por uma Lei Complementar e a é uma Lei Ordinária que impede o prazo diferenciado. Ademais, a Defensoria Pública patrocina os interesses dos cidadãos, acumulando volume excessivo de trabalho, sendo importante, desta forma a contagem em dobro de seus prazos processuais, possibilitando que se atenda um maior número de pessoas e diminuindo a chance de que prazos sejam perdidos e os assistidos sejam prejudicados.


Referências

Almeida, José Eulálio Figueiredo de. “A Importância dos Juizados especiais para a Solução dos Litígios”, disponível em http://www.fonaje.org.br/2006/doutrina9.asp

LENZA, Pedro. “Direito Constitucional esquematizado”, 13 ed. rev., atual. e ampl..ed. Saraiva, 2009.

Reis, Gustavo Augusto Soares dos. “A Importância da Defensoria Pública em um Estado Democrático e Social de Direito”, disponível em https://www.metodista.br/revistas/revistas-ims/index.php/.../998

Silva, Holden Macedo da., “Prazos diferenciados para o Defensor Público da União nos ritos dos juizados especiais federais?” disponível em http://www.ibap.org/rdp/00/17.htm

Soares, Evanna. “Juizados Especiais Cíveis”, disponível em www.prt22.mpt.gov.br/artigos/trabevan27.pdf


NOTAS

[1] Antes da Constituição da República de 1988 já existiam os Juizados Especiais de Pequenas Causas, criados pela Lei no 7.244, de 1984, com competência para julgar as causas de reduzido valor econômico.

[2] Lei 9.099/95, art. 2º O processo orientar-se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação ou a transação.

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[3] Lei 9.099/95, art. 13, § 3º Apenas os atos considerados essenciais serão registrados resumidamente, em notas manuscritas, datilografadas, taquigrafadas ou estenotipadas. Os demais atos poderão ser gravados em fita magnética ou equivalente, que será inutilizada após o trânsito em julgado da decisão. 

[4] Retirado do texto “A Importância dos Juizados especiais para a Solução dos Litígios”, disponível em http://www.fonaje.org.br/2006/doutrina9.asp

[5] Art. 3º O Juizado Especial Cível tem competência para conciliação, processo e julgamento das causas cíveis de menor complexidade, assim consideradas:

        I - as causas cujo valor não exceda a quarenta vezes o salário mínimo;

        II - as enumeradas no art. 275, inciso II, do Código de Processo Civil;

        III - a ação de despejo para uso próprio;

        IV - as ações possessórias sobre bens imóveis de valor não excedente ao fixado no inciso I deste artigo.

[6] Lei 9.099/95, art. 3º, § 3º A opção pelo procedimento previsto nesta Lei importará em renúncia ao crédito excedente ao limite estabelecido neste artigo, excetuada a hipótese de conciliação.

[7] Art. 4º São funções institucionais da Defensoria Pública, dentre outras: XIX – atuar nos Juizados Especiais;

[8] Nesse sentido, segue entendimento do Supremo Tribunal Federal: EMENTA: Habeas Corpus. 2. Juizado Especial Criminal. 3. Apelação por termo nos autos. Art. 600 do C.P.P. 4. Razões apresentadas após o prazo do art. 81, § 1o, da Lei no 9.099, de 1995. 5. Defensoria Pública. Prerrogativas de intimação pessoal e de contagem do prazo em dobro para recorrer. 6. Apresentação tardia das razões de apelação. Mera irregularidade que não compromete o conhecimento do recurso. Art. 601 do C.P.P. 7. Ordem concedida (HC 85006 / MS, STF - 2ª TURMA,Relator: Min. GILMAR MENDES, publicado no DJ em 11-03-2005 PP-00044)

[9] Holden Macedo da Silva, “Prazos diferenciados para o Defensor Público da União nos ritos dos juizados especiais federais?”  disponível em http://www.ibap.org/rdp/00/17.htm

[10] Art. 188, CPC: Computar-se-á em quádruplo o prazo para contestar e em dobro para recorrer quando a parte for a Fazenda Pública ou o Ministério Público.

[11] HC 70.514, julgado em 23 de março de 1994.

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Sobre a autora
Diane Jéssica Morais Amorim

Graduada em Direito pela Universidade do Estado da Bahia. Servidora Pública Federal, trabalha como assessora jurídica na Defensoria Pública da União – núcleo Petrolina/Juazeiro e é pós-graduada em Direito Civil e Processual Civil na especialização lato sensu promovida pela ESA/OAB em parceria com a Faculdade Maurício de Nassau

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

AMORIM, Diane Jéssica Morais. A Defensoria Pública no âmbito dos Juizados Especiais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3683, 1 ago. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/25063. Acesso em: 20 abr. 2024.

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