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Da impossibilidade da ação monitória contra a Fazenda Pública

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Na audácia inerente a um aluno do Curso de Direito, procurarei através de poucas, mas esclarecedoras palavras, discorrer sobre esse assunto polêmico e distante de se tornar pacífico.

Em 1995, através da Lei n.º 9.079, o Código de Processo Civil foi acrescido em um capítulo; o Capítulo XV que se tornou responsável pela introdução da chamada Ação Monitória em nosso ordenamento jurídico.

O artigo 1.102-A é muito claro ao trazer que aquele que assevera não ter recebido pagamento referente ao cumprimento de obrigações contratuais[1] poderá buscar a cobrança da quantia devida, esquivando-se do rito ordinário.

Não podem ser esquecidos alguns requisitos e caracteres desta Ação. Um deles é a necessidade de uma prova escrita, que pode ser desde uma carta, um bilhete, a uma nota promissória sem data de emissão. Um segundo, é a prescrição. O já citado artigo fala da "...prova escrita sem eficácia de título executivo...", uma vez que ainda eficaz como título executivo, este seria objeto de um processo de execução.

Como funciona o procedimento monitório?

Evidente que, se o maior objetivo deste procedimento é buscar a celeridade na efetividade de uma cobrança, deve imbuir-se de tamanha agilidade processual.

Aquele que possui um título executivo (escrito e prescrito) apresenta-o em juízo anexado a uma Ação Monitória; o M.M. Juiz a quem couber a distribuição deverá expedir o Mandado Monitório (inaudita altera pars) que poderá ser respondido de três formas: 1) o demandado cumpre o mandado (dispensando-se das custas e da verba honorária) ; 2) o demandado nada faz e, com isso, automaticamente o mandado converte-se em título executivo; e 3) o demandado pode opor embargos (a doutrina diverge se este tem natureza de contestação ou de recurso).

Ab initio há de se verificar o que a nossa Carta Magna institui quanto a forma da Fazenda Pública efetuar os pagamentos devidos: se dará "em virtude de sentença judiciária, na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim". Adiante retornaremos a esta letra.

Sobre o tema "Ação Monitória", o Juiz Federal de Brasília, Novély Vilanova da Silva Reis, publicou no Caderno "Direito e Justiça", do Correio Braziliense de 28 de agosto de 1995, que "se o réu for pessoa jurídica de direito público interno, será citado apenas para oferecer embargos/defesa. Porque o pagamento só será possível mediante precatório em virtude de sentença".

É bem verdade que a Lei nº. 9.079/95, que introduziu este instituto ao sistema processual brasileiro, é completamente omissa no que concerne ao uso deste contra a Fazenda Pública.

Apoiando esta linha de pensamento – falha ao nosso ver, está o Professor Carreira Alvim ao ensinar que "inexiste qualquer incompatibilidade entre a ação monitória e as pretensões de pagamento de soma de dinheiro contra o Poder Público".

Data venia, a lacuna da redação disciplinadora da Ação não permite a criação de hipóteses para o alcance do instrumento, principalmente, por já haver em nosso ordenamento jurídico, além da doutrina a respeito, o entendimento de que o Poder Público realmente está submetido a características especiais (art. 100, CF), privilegiando-se material e processualmente de forma indiscutível, como é o caso da impenhorabilidade de seus bens, a não incidência dos efeitos da revelia, e até mesmo do artigo 730 do CPC.

Esse dispositivo específico, acrescido ao artigo 731 do mesmo código, enseja uma argumentação sobre três itens:

1_ imprescindibilidade da sentença judicial;

2_ a imperiosidade da obediência ao sistema precatório;

3_ a obrigatoriedade do duplo grau de jurisdição obrigatório.

Torna-se impraticável permitir a emissão de uma ordem de pagamento exarada dentro das peculiaridades da ação questionada, dirigida contra a Fazenda Pública, uma vez que estas peculiaridades não se amoldam ao real procedimento estabelecido para a execução de quantia certa contra a Fazenda.

Dois grandes processualistas, dentre tantos outros, podem ter seus pensamentos destacados. Um deles, o já citado Porfessor José Rogério Cruz e Tuci: "... a execução contra a Fazenda Pública somente pode lastrear-se em título judicial, de modo que o detentor de título extrajudicial, como uma verdadeira exceção à regra geral prevista no Código de Processo Civil, mas justificada pela peculiaridade dos princípios que informam o direito público, deve propor ação de conhecimento para a obtenção de título judicial, para tão-só em seguida, promover a respectiva execução." (grifamos). O outro, o Professor HumbertoTheodoro Júnior: "... a orientação em tela não pode ser transplantada para o direito brasileiro, em face das características de nosso regime de execução contra a Fazenda Pública, que pressupõe precatório com base em sentença condenatória (CF, art. 100), o que não existiria, no caso de ação monitória não embargada " (grifamos).

Este último, de forma brilhante, faz menção ao conteúdo expresso na Carta Maior, que em seu artigo 100 define como procedimento específico e exclusivo para a efetivação de pagamentos devidos pela Fazenda Pública, a obrigatoriedade de sentença judicial e a apresentação de precatório, o que não ocorre no bojo monitório.

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Há ainda outro mecanismo processual vigente que busca tutelar a demanda contra o Poder Público: o duplo grau de jurisdição obrigatório.

O Professor Rogério Marinho Leite é direto ao ensinar que os privilégios processuais da Fazenda Pública demandam um julgamento de mérito, além de condicionar a eficácia da decisão condenatória ao reexame da matéria pelo tribunal ad quem (tribunal imediatamente superior).

Finalizo e fortaleço tal defesa com as palavras do célebre Professor Vicente Greco Filho: "Contra a Fazenda não se admite ordem para pagamento, como não se admite penhora, devendo, pois, haver processo de conhecimento puro, com sentença em duplo grau de jurisdição e execução nos termos do art. 100 da Constituição e art. 730 do Código".

Diante de todos esses argumentos, vejo que o instrumento da Ação Monitória não está albergado pelo direito objetivo, nem ao menos imbuído dos caracteres necessários, como sendo o meio apropriado para demandar contra a Fazenda Pública, confrontando, assim, os procedimentos especiais destinados ao Poder Público expressos na nossa Constituição.


NOTAS

1.Não aceita-se como objeto passível de Ação Monitória o descumprimento de obrigação de fazer, de não fazer, de dar coisa imóvel e de entregar bem infungível.

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Sobre o autor
Fernando Cabral de Macedo Filho

acadêmico de Direito na Universidade Potiguar, Natal (RN)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MACEDO FILHO, Fernando Cabral. Da impossibilidade da ação monitória contra a Fazenda Pública. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 53, 1 jan. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2524. Acesso em: 23 nov. 2024.

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