5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A lide é um prélio volitivo, com regras próprias e bem definidas, em que o árbitro é o Estado-Juiz. No entanto, está longe de ter aquela vileza da guerra, na qual todas as armas são válidas para alcançar a vitória. Assemelha-se mais a um jogo, como na excelente lição de CALAMANDREI[23], onde até mesmo a derrota, quando justa a competição, é digna de mérito. Aqui, a trapaça não pode ter vez.
Logo, o processo jurídico deve ser pautado sempre na honestidade do pleito, ser integro, probo; sem nunca se curvar ao sabor da vontade alheia. O instrumento processual quando utilizado em consonância ao simples alvedrio termina por perder sua natureza mais imanente – a de fazer Justiça. E nesse passo, ao exemplo do julgado em pesquisa, o que era uma prerrogativa – o direito de recorrer no caso – passa a um excesso de direito – o abuso processual em recorrer.
Para evitar esta jaça jurídica, há de existir um esforço mútuo entre todos os participantes do processo. Dos procuradores em nortear com integridade seus representados, auxiliando na condução de uma lide intemerata; das partes em proceder e instigar uma Justiça tal qual idealizada pela própria mente social, livre de conspurcações dos interesses pessoais; e, não se esqueça, do Estado, e da coletividade, personificados na demanda pelo Magistrado e Ministério Público, respectivamente, dotando o Direito daquela fração necessária de moralidade, fiscalizando a ordem para a lealdade processual.
Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal foi preciso no julgado, examinando o recurso e punindo com a potência necessária o abuso cometido de forma manifesta, acordando com todos os fatores de análise aqui discutidos ao descobrimento de uma conduta abusiva.
A ocorrência de tais condutas viciosas, acrescente-se, apenas confere ao Judiciário um agravamento de sua famigerada morosidade, ocupando plenos e julgados com atos processuais desmerecidos.
O acesso a Justiça, claro, deve ser amplo sem comportar quaisquer comezinhas restrições. Mas tal acesso também precisa ser fundado, com caráter leal a legalidade e objetividade do fim de cada ato, perfazendo da atuação judiciária um caminho para todos os legítimos interesses, excluindo-se aqueles voltados à protelação e tantas mais características não compatíveis á boa-fé jurídica.
REFERENCIAS:
a) Doutrina
BARBI, Celso Agrícola. Comentários ao Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: editora Forense, vol. 1
CAVALI, Luiz Octávio David. Abuso do processo civil: critérios para sua constatação. Revista da ESMESC, v. 16, n. 22, 2009.
DINAMARCO, Cândido Rangel, A Reforma do Código de Processo Civil, 3a ed., São Paulo, Malheiros, 1997, pág. 22.
GRINOVER, Ada Pellegrini. Paixão e morte do ‘contempt of court’ brasileiro” – art. 14 do Código de Processo Civil, in Direito Processual: inovações e perspectivas. Estudos em homenagem ao Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira. Coordenadores Eliana Calmon & Uadi Lammêgo Bulos. São Paulo, Saraiva, 2003, p.1.
LUCON, Paulo Henrique dos Santos. “Abuso do exercício do direito de recorrer”. in Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001, v. 4.
MEDINA, Paulo Roberto Gouvêa. “O direito de recorrer e seus limites”, in Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2000.
OLIVEIRA, Ana Lúcia Lucker Meirelles de. Litigância de má-fé. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000.
SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 3ª. ed., Rio de Janeiro: Forense, 2001.
THEODORO JÚNIOR, Humberto. O Processo Civil Brasileiro no Limiar do Novo Século. Rio de Janeiro: Forense, 1999.
---------------. “Abuso de Direito Processual no Ordenamento Jurídico Brasileiro”, in Abuso dos direitos processuais, Rio de Janeiro, Forense, 2000, coord. José Carlos Barbosa Moreira.
-----------------. “As alterações do Código de Processo Civil introduzidas pela Lei n. 9.756, de 17.12.98”, in Ciência Jurídica, v. 85, Síntese, Porto Alegre.
b) Jurisprudência
MYLENE PEREIRA RAMOS, Juíza Federal, da 63ª Vara do Trabalho, da Seção Judiciária da Comarca de São Paulo, in processo nº 02784200406302004.
CELSO DE MELLO, Ministro do Supremo Tribuna Federal, in AI 342.393 – AgR – ED – EI/SP.
Notas
[1] COUTURE, Eduardo. Os Mandamentos do Advogado. Tradução de Ovídio Baptista da Silva e Carlos Otávio Athayde. Sérgio Antonio Fabris Editor, Porto Alegre, 1979.
[2] Graduando em Direito pela Universidade Estadual de Feira de Santana.
[3] Vale transcrever a letra da lei: Art. 333. Cabem embargos infringentes à decisão não unânime do Plenário ou da Turma:
I - que julgar procedente a ação penal;
II - que julgar improcedente a revisão criminal;
III - que julgar a ação rescisória;
IV - que julgar a representação de inconstitucionalidade;
V - que, em recurso criminal ordinário, for desfavorável ao acusado.
Parágrafo único. O cabimento dos embargos, em decisão do Plenário, depende da existência, no mínimo, de quatro votos divergentes, salvo nos casos de julgamento criminal em sessão secreta.
[4] Art. 18. O juiz ou tribunal, de ofício ou a requerimento, condenará o litigante de má-fé a pagar multa não excedente a um por cento sobre o valor da causa e a indenizar a parte contrária dos prejuízos que esta sofreu, mais os honorários advocatícios e todas as despesas que efetuou.
[5] DINAMARCO, Cândido Rangel, A Reforma do Código de Processo Civil, 3a ed., São Paulo, Malheiros, 1997, pág. 22.
[6] THEODORO JÚNIOR, Humberto. “Abuso de Direito Processual no Ordenamento Jurídico Brasileiro”, in Abuso dos direitos processuais, Rio de Janeiro, Forense, 2000, coord. José Carlos Barbosa Moreira.
[7] GRINOVER, Ada Pellegrini. Paixão e morte do ‘contempt of court’ brasileiro” – art. 14 do Código de Processo Civil, in Direito Processual: inovações e perspectivas. Estudos em homenagem ao Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira. Coordenadores Eliana Calmon & Uadi Lammêgo Bulos. São Paulo, Saraiva, 2003.
[8] Cleon Oliphant Swaysse, apud Ada Pellegrini Grinover, op. cit., p. 5
[9] Assim aquiesce COUTURE apud CAVALI, Luiz Octávio David. Abuso do processo civil: critérios para sua constatação. Revista da ESMESC, v. 16, n. 22, 2009: “Em nosso modo de ver, o dever de dizer a verdade existe, porque é um dever da conduta humana. Porém, o que o processo precisa não é somente a verdade formal, precisa da lealdade, do jogo limpo e não do subterfúgio”.
[10] Apud CAVALI, Op. Cit.
[11] LUCON, Paulo Henrique dos Santos. Abuso do exercício do direito de recorrer. In Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001: “(...) se é certo que muitas vezes o advogado se envolve excessivamente com a causa, colaborando com isso o cliente que a todo momento pressiona seu constituinte, é também certo que o julgador deve levar em conta esses elementos no momento de decidir por impor ou não determinada sanção processual. É preciso lembrar, mais uma vez, que a efetiva constatação do dolo ou da culpa grave é imperativa para a aplicação de toda e qualquer sanção por abuso de direito processual.”
[12] CAVALI, Luiz Octávio David. Abuso do processo civil: critérios para sua constatação. Revista da ESMESC, v. 16, n. 22, 2009.
[13] Apud CAVALI, Op. Cit. p. 16.
[14] Apud CAVALI, Op. Cit. p. 17.
[15] Idem, ibidem: “A falta de seriedade encontra semelhança com o dispositivo do mero capricho do Código de Processo Civil de 1939 (art. 3º). O que caracteriza essa conduta é o propósito injustificado que, obviamente, não se coaduna com os fins do processo.”
[16] Idem, p.20: “(...) entendemos que as hipóteses de abuso processual não podem ser taxativas, podendo vir a ocorrer um abuso do processo não previsto no art. 17 do CPC. Nessa situação, como o legislador não presumiu a má-fé, deverá ser verificado se houve desvio de finalidade na situação subjetiva exercida. Ocorrendo tal desvio, há de ser verificado qualquer dos outros elementos que em conjunto com o desvio de finalidade configuram abuso do processo.”
[17] SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 3ª. ed., Rio de Janeiro: Forense, 2001.
[18] O Código de Processo Civil passado, Decreto-Lei nº. 1.608, de 18 de setembro de 1939 em seu artigo 810 estatuía que: "Salvo a hipótese de má-fé ou erro grosseiro, a parte não será prejudicada pela interposição de um recurso por outro, devendo os autos ser enviados à Câmara, ou Turma, a que competir o julgamento."
[19] THEODORO JÚNIOR, Humberto. O Processo Civil Brasileiro no Limiar do Novo Século. Rio de Janeiro: Forense, 1999.
[20] MEDINA, Paulo Roberto Gouvêa. “O direito de recorrer e seus limites”, in Aspectos polêmicos e atuais dos recursos, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2000.
[21] OLIVEIRA, Ana Lúcia Lucker Meirelles de. Litigância de má-fé. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000.
[22] Nesse sentido, relacionando o recolhimento da multa como condição para a interposição de novo recurso, THEODORO JÚNIOR, Humberto. “As alterações do Código de Processo Civil introduzidas pela Lei n. 9.756, de 17.12.98”, p. 359.
[23] Apud BARBI, Celso Agrícola. Comentários ao Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: editora Forense, vol. 1, p. 99: “O processo não é apenas a ciência do direito processual, nem somente a técnica de sua aplicação prática, mas também leal observância das regras desse jogo, isto é, fidelidade aos cânones não escritos da correção profissional, que assinalam os limites entre a habilidade e a trapaça”.
A BRIEF STUDY ABOUT THE ABUSE OF PROCEDURE IN THE LIGHT OF A PARTICULAR CASE OF THE JURISPRUDENCE OF THE SUPREME COURT
Abstract:The present work aims to analyze and discuss the subject of procedural abuse, specifically referring to the right to appeal, in the Brazilian legal system through a case study brought by the jurisprudence of the Supreme Court confronted to the lessons of the doctrine, as well as demonstrate the repressive measures used more as a result. Also treats the applicability of the fungibility of appeals in cases of gross error in appeal. Finally, will the classic repressive measures used by-law aimed at the removal of the occurrence of abuse of procedure.
Keyes-words: Procedural Abuse; Supreme Court; Doctrine; Fungibility of Appeals.