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A pesquisa como mediação do ensino e instrumento promotor da autonomia acadêmica

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16/10/2013 às 14:51
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A pesquisa analisada em seu caráter educativo e científico é compreendida como mediação pedagógica capaz de concretizar o aprender a aprender, contribuindo para a formação das cabeças-bem-feitas.

Sumário: Introdução. 1 Fatores que interferem na construção da autonomia. 2 A democratização do acesso ao ensino superior e o desafio da aprendizagem significativa. 3 A formação do professor pesquisador como profissional reflexivo. 5 A pesquisa como mediação educativa na construção da autonomia acadêmica. Considerações Finais. Referências.

Resumo: Este estudo esboçou uma reflexão importante, ainda que de modo pontual e exploratório, considerando-se a complexidade do tema em pauta. As concepções e princípios evidenciados refletiram a perspectiva teórica de autores que abordam a educação e o conhecimento – elementos fundadores da dignidade humana -, amparados nos novos paradigmas científicos e sociais da atualidade. No decorrer do texto, as relações pedagógicas promotoras de autonomia e emancipação vão se esclarecendo através de questionamentos que destacam significativamente os fatores que revigoram o exercício da docência e contribuem para a formação do aluno que sabe pensar. A pesquisa analisada em seu caráter educativo e científico é compreendida como mediação pedagógica capaz de concretizar o aprender a aprender, contribuindo para a formação das cabeças-bem-feitas.

Palavras-chave: pesquisa, mediação, ensino, autonomia, conhecimento


INTRODUÇÃO

Torna-se premente assumir, definitivamente, que a melhor maneira de aprender não é escutar aula, mas pesquisar e elaborar com mão própria, sob orientação do professor. Não é mister combater a aula, mas esta mantém apenas a função de promover pesquisa e elaboração própria. Mesmo em se tratando de alunos que fazem curso à noite e já chegam cansados, aproveitam muito melhor seu tempo se não permanecerem apenas receptivos tomando nota e fazendo prova. A maior parte de seu tempo teria de ser utilizada para atividades tipicamente reconstrutivas, nas quais sob orientação do professor, constroem sua autonomia, manejam os métodos científicos e passam a lidar com conteúdos com criatividade. (DEMO, 2001, p.86)[1]

As questões que envolvem a pesquisa e a produção do conhecimento científico têm sido alvo relativamente recente de muitos estudos e críticas, evidenciando as contradições postas pelo desenvolvimento que vem ocorrendo no campo da cultura acadêmica no interior das instituições de ensino superior.

Uma breve análise dos processos de reforma universitária indica como temas recorrentes vinculados à questão da produção do conhecimento científico, aspectos relativos às inovações na organização político-pedagógica das instituições educativas. Estes temas analisam a necessidade de reestruturação curricular, consideram a integração de novas tecnologias de ensino e refletem sobre as formas mais recentes de avaliar a instituição e a aprendizagem. Mas, prioritariamente, reflete sobre os novos paradigmas do conhecimento, no âmbito da trilogia ensino, pesquisa e extensão, como dimensões que integram o ato educativo e, conseqüentemente, exigem um repensar das práticas docentes.

Nesse sentido, saber pensar e aprender a aprender são categorias que compõem hoje o mais recente desafio das instituições de ensino, - em qualquer um dos dois níveis vigentes atualmente – básico e superior. No entanto, radicaliza-se no âmbito do ensino superior, quando se concebe a importância da pesquisa acadêmica como mediação técnico-científica para produção do conhecimento e promoção da maturidade intelectual de professores e alunos no cotidiano de suas práticas sócio-educativas.

A proposta que se defende na busca da qualidade da formação acadêmica, evidencia que a pesquisa deve ser compreendida não só por sua natureza produtiva, mas como uma metodologia ativa, capaz de viabilizar o princípio educativo ao ser assumido como uma estratégia pedagógica contrária à assimilação padronizada do conhecimento.

A pesquisa passa então a ser concebida como espaço aberto à concretização do saber pensar e do aprender a aprender, mobilizando o aluno para entender o conhecimento como um projeto humano inconcluso e sempre aberto a novas experiências. Dessa forma, o conhecimento como fruto do saber pensar, a ser reconstruído na academia por professores e alunos, atuará como elemento de emancipação e autonomia, uma vez que resulta e proporciona, ao mesmo tempo, uma visão mais crítica e mais autêntica da realidade circundante.

É nesse sentido, que o objetivo principal desta reflexão, situa-se na possibilidade de contribuir para que se compreenda o papel da pesquisa na universidade, face à relevância do seu caráter pedagógico. Também por ocupar posição estratégica na produção, difusão e utilização do conhecimento através das práticas educativas eleitas para desenvolver com autonomia, a competência profissional exigida pela sociedade.

O cumprimento dessa dupla finalidade envolve, sem dúvida, uma tomada de consciência sobre as mudanças possíveis no contexto da organização do trabalho pedagógico no ensino superior. Tanto no que se refere ao exercício da docência, quanto à postura do aluno e as condições oferecidas pela instituição formadora visando à melhoria do ensino com garantia de uma aprendizagem realmente efetiva, especialmente na perspectiva da formação inicial.


1 Fatores que interferem na construção da autonomia

Os avanços alcançados pelas teorias pedagógicas no âmbito de uma abordagem crítica, ancorados numa perspectiva sócio-histórica, contribuem para esclarecer aspectos fundamentais da docência que não pode mais ser compreendida apenas sob a esfera da competência didática que se realiza na sala de aula formalizada. A postura linear, vertical e autoritária do professor como mestre do repasse de informações pré-fabricadas deve ser superada com base nos novos paradigmas que orientam a epistemologia contida numa didática transformadora, cada vez menos instrumental.

Assim, conclui-se que já não é mais admissível continuar a desenvolver uma experiência pedagógica fundamentada no paradigma da racionalidade técnica, privilegiando a visão bipartida que separa o professor do pesquisador, o ensino da aprendizagem, a teoria da prática, distanciando os que pensam a realidade, interrogam, duvidam, questionam, reconstroem o conhecimento, dos que apenas repassam/assimilam retalhos desconexos desses conhecimentos exogenamente produzidos como um saber hegemônico que se sobrepõe através das regulações acadêmicas ocultas sob o currículo vigente. É preciso aproximar os ganhos teóricos alcançados pelos avanços da teoria pedagógica, das práticas em desenvolvimento, concorrendo para que se efetivem o mais rapidamente possível as mudanças necessárias para assegurar a qualidade de ensino com autonomia de aprendizagem.

Esses são aspectos importantes que demandam uma preocupação legítima com a problemática que expõe o desafio central desta reflexão: compreender a pesquisa acadêmica, especialmente em seu sentido educativo, como mediação didático-pedagógica capaz de ajudar o professor a superar a postura positivista de uma didática voltada para formar o aluno com a “cabeça bem-cheia” de informações técnicas, muitas vezes vazias de significado ético e social. Faz-se então, urgente aprender a fazer[2] a “cabeça bem-feita”[3] promovendo a autonomia intelectual do aluno. Isso significa que será necessário rever, não só a estrutura acadêmica dos cursos de formação superior e sua forma de organização didático-pedagógica, mas também hábitos e padrões de comportamento que já estão arraigados na conduta dos educadores e educandos. A força do hábito, contida na tradição pedagógica, limita o ensino ao interior da sala de aula, num espaço impermeável às visões do futuro e aos cenários mutantes dos problemas e questões que nos implica, queiramos ou não, no mundo do aqui e agora.

Para Morin[4], o problema central da cabeça bem-feita está nas interações que se pode produzir a partir da aquisição dos conhecimentos (de dentro da academia com os de fora, que se estendem à margem da comunidade acadêmica). Por isso ele afirma que

Como nosso modo de conhecimento desune os objetos entre si, precisamos conceber o que os une. Como ele isola os objetos de seu contexto natural e do conjunto do qual fazem parte, é uma necessidade cognitiva inserir um conhecimento particular em seu contexto e situá-lo em seu conjunto. (...) O desenvolvimento da aptidão para contextualizar tende a produzir a emergência de um pensamento “ecologizante”, no sentido em que situa todo acontecimento, informação ou conhecimento em relação de inseparabilidade com seu meio ambiente – cultural, social, econômico, político e, é claro, natural.[5]

Nesse sentido, acredita-se que é fundamental desenvolver uma nova consciência do ensino, compreendendo-o sob o eixo de um conhecimento pedagógico integrador, capaz de realçar a natureza investigativa do processo didático. Sob esse enfoque o ensino será competente para problematizar a realidade, desenvolvendo-se através da elaboração e execução orientada de projetos de pesquisa que representam a possibilidade de reconhecimento e enfrentamento das situações-problema. Situações, para as quais ainda não se tem respostas certas e suficientes, cujas receitas não constam nos manuais das academias. São os problemas reais, vividos no cotidiano que nos aflige e que precisam de respostas e de esclarecimentos que não se resolvem satisfatoriamente ao nível do senso comum, ou nos limites dos saberes teóricos especializados. É preciso que sejam compreendidos de forma articulada ao contexto mais amplo, em sintonia com a necessidade de fortalecer o pensamento ecologizante.

Aprender a ler e a perceber melhor a realidade plural e complexa que nos cerca, concretiza o fundamento ético-político presente na finalidade da educação superior. É essencial na formação da autonomia dos sujeitos, que assim, serão politicamente competentes para pensar e compreender o mundo, global e localmente, adquirindo capacidade de intervenção na comunidade em que habita. Esse é o compromisso inequívoco da educação, especialmente no âmbito do ensino superior.

A conquista da autonomia acadêmica permite que o aluno comprometido com o esclarecimento das questões da sua época, interaja através da articulação ensino-pesquisa-extensão, com os diversos campos do conhecimento, conjugando os saberes necessários à superação da visão de mundo ingênua. Visão que detém, antes de ingressar na academia e aprender a explicação científica dos fatos, e que às vezes, subsiste. Pode-se então concordar com Morin, que

Uma educação para uma cabeça bem-feita, que acabe com a disjunção entre as duas culturas, daria capacidade para se responder aos formidáveis desafios da globalidade e da complexidade na vida cotidiana, social, política, nacional e mundial. [6]

A pesquisa acadêmica, como mediação educativa poderá se constituir como um importante elo que se estende entre as experiências da vida acadêmica e as necessidades visíveis na vida social e cotidiana, apontando, pela forma metodológica rigorosa de conhecer os caminhos que nos permitirão confirmar os benefícios de uma cabeça bem-feita.

Muda então, a perspectiva do papel a ser exercido pelo professor - de mero informante/repassador de um conhecimento já feito, previamente selecionado pelo currículo acadêmico, a gestor/construtor/mediador do ensino-aprendizagem. O professor passa a ser reconhecido como um facilitador da aprendizagem, que precisa erguer-se à condição de sujeito, conquistando autonomia, tornando-se co-responsável pela definição das estratégias pedagógicas mais favoráveis à construção das “cabeças bem-feitas”. Isso implica assumir-se como mediador das condições necessárias para uma aprendizagem ativa do aluno; significa erigir-se à condição de criador de oportunidades e aríete capaz de combater a mediocridade do ensino reprodutivo e a postura copista, passiva e subalterna que marca ainda a conduta do estudante universitário; este, desprovido de vontade própria, é, muitas vezes, visto como um objeto, um artefato presente na sala de aula, à mercê das práticas institucionais retrógradas e conservadoras que terminam por encher-lhes a cabeça de informações desconexas e fragmentadas, que cumprem apenas um antigo ritual acadêmico. Demo,[7] defende com razão e pertinência, a superação do que ele chama de “velha aula que vive ainda da quimera do “fazer a cabeça do aluno”, via relação discursiva, decaída na exortação e na influência autoritária, sem perceber que isto, no fundo, sequer se diferencia do fenômeno de fofoca”

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 Em decorrência dos posicionamentos mais recentes de estudiosos e pesquisadores, especialmente com base nas referências recorrentes feitas por Demo[8], pode-se afirmar que a compreensão da pesquisa e do papel do professor ressalta, sobretudo, o eixo didático-pedagógico das mudanças que envolvem as práticas cotidianas que concretizam o ato educativo.

Nota-se que há uma tendência de reconfiguração dos processos didático-pedagógicos que vão exigir a formação de um professor, cujo perfil deve se constituir a partir da reflexão e da pesquisa. Nessa perspectiva, o docente passa a ser reconhecido como sujeito capaz de construir sua autonomia profissional. Ao assumir, no cotidiano de suas práticas, o exercício da competência investigativa como um saber-fazer que aguça a percepção da realidade, o docente amplia a capacidade de problematizar, questionar e encaminhar procedimentos que concorrem para responder às necessidades do seu tempo. Este é, sem dúvida, um dos pressupostos a ser perseguidos na reflexão deste tema – a consciência de que é indiscutível refazer o perfil do professor-instrutor, qualificando-o para ser professor-pesquisador. Com isso, também se questiona seu processo de formação inicial e continuada, suas possibilidades de atualização e profissionalização através dos espaços institucionalizados para tal tarefa.

Nesse contexto proativo às mudanças no âmbito do ensino superior, a reflexão sobre o valor pedagógico da pesquisa como mediação didática para o fortalecimento da autonomia docente/discente, sinaliza novas formas de ensinar e aprender. A pesquisa, como mediação didático-pedagógica se coaduna com os avanços postos pelos novos paradigmas da ciência e da tecnologia, cabendo interrogar:

  • Será que temos um professor formado no âmbito da autonomia e preparado para formar para a autonomia?
  • Quais serão, na prática, os caminhos possíveis para configurar uma nova organização do trabalho pedagógico no ensino superior, transformando a didática repetidora numa metodologia mais inovadora?
  • Como é possível entender a pesquisa como elemento indissociável do ensino?
  • E quanto ao aluno, como contribuir para que supere a posição subalterna de copista tornando-se sujeito do processo de formação, capaz de reconstruir o conhecimento ativamente aprendido?

Estas questões implicam num compromisso ético com o estudante universitário e demandam um novo olhar sobre o espaço acadêmico como espaço de produção de um projeto pedagógico coletivo e diferenciado, gestado no cotidiano das práticas em execução. Tal perspectiva deve envolver os alunos desde o início dos cursos, através de metodologias que os exorte a produzir, criar, mais do que copiar e repetir. Isso significa que será preciso privilegiar a aprendizagem ativa do aluno, além de incentivar e valorizar a produção docente. Não só como uma exigência burocrática dos órgãos reguladores que pontuam mais ou menos determinadas experiências com o intuito de chancelar a qualidade das instituições formadoras, mas para que se cumpra efetivamente a função precípua das instituições de ensino superior.

Para vencer esse desafio, será preciso investir num esforço contínuo de mudanças estruturais que acolham e facilitem, no ambiente acadêmico, o desenvolvimento de novas posturas em relação ao processo de ensino-aprendizagem, onde a pesquisa se estabeleça como parte importante do cotidiano acadêmico. Assim, os alunos se familiarizarão com os processos que integram a metodologia científica como uma forma privilegiada para conhecer a realidade – aprendendo a desenvolver competências fundamentais à sua emancipação como ser pensante: capacidade de argumentação, habilidade para observar/olhar o ambiente à sua volta, capturando sensivelmente aspectos que os ajude a perceber e interpretar a realidade com maior independência de crítica.

O desenvolvimento dessas competências na certa irá contribuir para a conquista da autonomia acadêmica, formando o aluno para assumir, cada vez com mais veemência, a atitude emancipatória resultante de uma didática que investe na experiência do aprender a aprender e abusa da pesquisa como princípio científico e educativo.


2 A democratização do acesso ao ensino superior e o desafio da aprendizagem significativa

A formação de uma atitude flexível, aberta e crítica, do estudante de nível superior, tendo em vista a aquisição do conhecimento científico, pressupõem a organização de uma rotina pedagógica favorável para mobilizar a conquista de uma postura acadêmica madura e responsável, necessária à autonomia do aprendiz.

A necessidade de se estabelecer uma rotina acadêmica voltada para a construção da autonomia intelectual implica na percepção da responsabilidade, da disciplina e do rigor metodológico, que não prescindem do diálogo e da participação efetiva de alunos e professores. Participação e diálogo são então reconhecidos como valores que deverão constituir a ação educativa para um saber-fazer mais ativo e compreensivo capaz de superar a atitude passiva e subalterna, que caracterizam a aprendizagem mecânica, tradicional.

A busca da autonomia de pensamento implica não somente no domínio de fundamentos que referendem uma nova forma de perceber a realidade, mas, sobretudo, num processo de formação pautado na possibilidade de questionar, duvidar e problematizar o conhecimento já feito, com o rigor que caracteriza a metodologia científica. Implica na possibilidade do estudante compreender racionalmente e situar historicamente o conhecimento, elegendo-o como instrumento de inserção social.

Um segundo pressuposto necessário para o esclarecimento do tema se insere contraditoriamente na constatação dos avanços democráticos já conquistados pela crescente universalização do ensino e, portanto, pela maior cobertura para entrada de outras camadas sociais no ensino superior em faculdades públicas ou privadas.

Quando se reflete sobre a democratização de educação observa-se que a propensão para generalização do acesso ao nível superior de ensino, revela a quebra de barreiras sociais e político-culturais que começam a ser legalmente transpostas.

A política educacional inaugura programas especiais promotores de uma maior cobertura para o ensino superior, a exemplo do PROUNI e do FIES. A proliferação das faculdades privadas e a ampliação de vagas nas universidades federais, com seus projetos de interiorização, abrem as portas do ensino superior para dar acesso a um novo público, que traz para as salas de aula, alunos que não tiveram chances educativas equânimes no processo de educação básica.

Por isso, será preciso considerar as peculiaridades desse novo público, entendendo que suas necessidades se encontram além da diversidade de formação adquirida na educação básica. É preciso entender o caráter flexível das propostas que ampliam as possibilidades de oferta da educação e se concretizam de forma desigual. Constata-se uma forma de universalização que não garante, por si só, o princípio da autonomia – seja no contexto da inclusão social, do desempenho profissional ou do exercício da cidadania -, uma vez que não há correspondência entre os níveis de autonomia social, acadêmica e profissional.

Nesse sentido, constata-se que as perspectivas de mobilidade social desse novo contingente acadêmico continuam ainda muito limitadas e desiguais. A própria trajetória universitária traz exigências de estudos curriculares que reflete a opção institucional, mais ou menos elitista, como produto histórico de uma cultura acadêmica gestada sob a égide da seletividade competitiva.

A institucionalização das políticas educacionais que visam à inclusão e a equidade pecam, por não considerar, numa visão de conjunto, outras vinculações democráticas supra-escolares igualmente necessárias para fortalecer a autonomia social. Assim, ao invés de ampliar, a educação que se oferece com base na filosofia da “cabeça bem cheia” reduz as chances de ascensão que se anunciam na sociedade globalizada, cujo mercado de trabalho é cada vez mais seletivo e carente de “cabeças bem feitas”.

No entanto, é inegável reconhecer que a flexibilidade seletiva para o ingresso no mundo acadêmico, junto aos programas da universidade aberta a todos, trazem, por certo, benefícios inestimáveis para muitos que até então estiveram completamente excluídos dessa oportunidade de avanços no itinerário de estudos. No entanto, pelas considerações já tecidas, não é possível deixar de observar que o alargamento dessa porta de entrada não se coaduna ainda com a abertura de outros espaços sociais posteriores necessários à consolidação da cidadania.

Assim, o que temos como situação dada no ensino superior é uma comunidade acadêmica diferenciada, herdeira de uma série de dificuldades e limitações sociais, culturais e educativas, que irão se refletir, mais, ou menos intensamente, no desempenho acadêmico e conseqüentemente no desempenho profissional.

Ter clareza dessa questão é fundamental para que se empreenda um exame mais adequado das condições de ensino hoje existentes nas instituições de nível superior. É preciso identificar alternativas que dêem conta das necessidades criadas por essa nova categoria de alunos, oriundos de diferentes perspectivas de escolarização ao nível da educação básica, que não garantem, por si só, a sustentabilidade de um projeto educativo mais afinado com as referências sociais, econômicas e pedagógicas da atualidade.

É preciso e é urgente, que se pense em novas formas de equalização pedagógica para aquisição do saber acadêmico, fomentando espaços paralelos de aprendizagem complementar que fortaleçam a competência construtiva do aluno, promovam sua auto-estima e contribuam efetivamente para que tenham uma aprendizagem realmente significativa.

Se não há igualdade nos pontos de partida, é preciso reconhecer que as instituições de ensino superior, públicas e particulares (que hoje são muitas), deverão se preocupar ainda mais com a qualidade do trabalho pedagógico, equalizando os pontos de chegada. Para tanto, devem considerar a identidade dos seus alunos, suas necessidades e experiências, a fim de criar e patrocinar formas mais adequadas e justas de aprendizagem, que evitem, por assim, dizer, o dispêndio de tempo e energia, numa empreitada que se guia, metaforicamente, pela trilha de um “vôo cego”. Reconhecer os obstáculos desse percurso inicial é fundamental, para que se mire com lucidez e segurança, o horizonte a ser conquistado, elucidando criticamente cada etapa do trabalho acadêmico e, tendo à mão, os instrumentos e as estratégias que, acertadamente, irão orientar o novo trajeto.

Entre os instrumentos não poderão faltar competência e compromisso do educador com a mudança possível de se fazer imediatamente, a fim de qualificar o ensino e a aprendizagem nas instituições que almejam fazer a diferença. Nestas, a conquista da autonomia é pedra de toque que não pode e não deve ser esquecida pelos mestres construtores da experiência humana mais fundamental: a educação como elemento inalienável para gestação da autonomia cidadã para uma vida digna e plena.

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Sobre o autor
Guilherme da Costa Nascimento

Pós- Graduado em Direito Público - UNIASELV-SC Mestrando em Direito Constitucional - UFS-SE

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

NASCIMENTO, Guilherme Costa. A pesquisa como mediação do ensino e instrumento promotor da autonomia acadêmica . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3759, 16 out. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/25525. Acesso em: 19 abr. 2024.

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