Os protestos massivos que se espalharam por todo país, durante as jornadas de junho, diferentemente do que ocorreu em 1964, 1968, 1984 e 1982, não pediam o afastamento de nenhum governante muito menos o retorno da ditadura militar. Mas foram enfáticos: “os políticos que estão aí não nos representam”. Ou seja: os brasileiros, especialmente os jovens, já não querem ser vistos como meros “eleitores” (eleitores ignorantes e incapazes, segundo a direita; ou apenas um número estatístico, consoante a esquerda).
A democracia deixou de ser democrática, no sentido de não entender os reais anseios da população (nem por isso deve ser substituída por qualquer tipo de ditadura ou autoritarismo). As redes sociais, no século XXI, como instrumento de enlaçamento de vários segmentos da sociedade civil, está mudando e vai mudar muito mais a democracia e a governança. A questão é saber administrar toda essa robustez das ruas e das redes sociais, captando suas excelências assim como refutando o excesso, o radical. Dentro de pouco tempo, da velha democracia representativa sobrará muito pouco. O estilo de governança também vai se alterar profundamente (porque por meio das redes sociais podemos captar os anseios médios da população ou encontrar os consensos diretivos da governança, que deve ser pensada não somente para as emergências - tal como hoje acontece -, mas sim, para governos estáveis de longo prazo).
É impossível pensar a democracia e a governança, neste século XXI, sem as redes sociais. Mark Zuckerberg (fundador do facebbok) disse: “Esperamos mudar a maneira como as pessoas se relacionam com seus governos e instituições sociais”. Se será o facebook (isolada ou conjuntamente com outras redes) que vai cumprir esse papel não sabemos. Mas é certo que os governos e as instituições políticas e sociais vão se aproximar fortemente das redes sociais, ou seja, vão estabelecer diálogos produtivos, participativos, deliberativos e vigilantes.
Os três pilares da governança inteligente (Berggruen e Gardels, Governança inteligente para o século XXI, p. 146) são: “delegar, fomentar a participação e dividir a tomada de decisões”. Isso sinaliza com um novo tipo de democracia e de governança, que serão participativas, deliberativas e vigilantes. Tanto mais vigilantes quanto mais transparência for conquistada. A Lei de Acesso à Informação (12.527/11) já representou um extraordinário avanço, nesse sentido. Combinando-se essa lei com a iniciativa dos pejorativamente chamados “amadores” (das redes sociais), podemos buscar soluções inteligentes para os grandes problemas das sociedades complexas.
O poder de compartilhar faz com que as pessoas comuns sejam ouvidas de forma muito mais participativa e deliberativa. Suas vozes já não podem ser ignoradas. Os velhos e seletos estamentos burocráticos, inclusive os políticos, darão lugar a novas formas de relacionamento direto com a população, extraindo-se dela o consenso médio, orientador da governança estável de médio e longo prazo. Instrumentos clássicos de participação direta do povo no governo, como plebiscito, referendo, “recall”, iniciativa legislativa popular etc. passarão por profundas transformações (Erik Camarano e J. Fishkin, Folha de S. Paulo de 16.07.13, p. A2). Já se pode dizer que são instrumentos da era analógica, que não possuem a mesma representatividade, dimensão e ressonância dos novos instrumentos da era digital em rede.
Tudo que era sólido (também nos campos da democracia e da governança) está virando líquido (Bauman). A governança profissional já não terá como ignorar a participação dos “amadores”. O mundo mudou, as velhas concepções de democracia e de governança sofrerão transformações profundas. O velho ainda não morreu, mas o novo já chegou. Só resta saber o formato que tudo vai tomar. Tão relevante como a forma do governo é o grau de governo (grau de conectividade com os anseios populares sensatos).