6. Conclusões
O novo conceito de propriedade, concebido a partir das transformações sociais ocorridas no último século, principalmente caracterizada pela transição do Estado liberal e sua superada doutrina da propriedade como meio de afirmação do poder e da riqueza do indivíduo e de instrumento de consagração de sua liberdade, para o Estado social e sua visão do direito de propriedade condicionado ao atendimento do interesse social, fez com que o instituto da propriedade industrial passasse a ser interpretado em harmonia com o novo paradigma constitucional da função social da propriedade.
Ao lado do legítimo interesse que tem o Estado de conferir ao titular do bem da propriedade industrial privilégio temporário para a exploração com exclusividade do objeto havido de seu intelecto criativo, uma vez que dos avanços tecnológicos aproveita-se toda a sociedade, há de se impor ao titular desses direitos limites para que esse mecanismo de restrição ao livre direito de concorrência não se transforme em proteção estatal ao abuso do direito de exploração exclusiva da propriedade.
Neste sentido, o constituinte vinculou a proteção do direito da propriedade industrial ao atendimento de condições pré-estabelecidas na norma fundamental como caracterizadoras da função social deste tipo de propriedade, o atendimento do interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País.
Apesar de tratar a matéria como direito fundamental, o que nos parece um resquício da visão absolutista da propriedade consagrada nos ideais revolucionários franceses do final do século XVIII, o constituinte deu-lhe, também, o tratamento de princípio geral da atividade econômica, o que, no caso dos bens da propriedade industrial, representa a sua verdadeira natureza e destinação, o de bens de produção dotados de uma finalidade social.
Ao constatar-se que o texto constitucional diferencia as diversas propriedades e, consequentemente, as também diversas funções sociais que lhes são impostam, há de se observar que a nítida intenção do constituinte foi a de valer-se dos conceitos jurídicos indeterminados “interesse social” e “desenvolvimento tecnológico” para condicionar a discricionariedade da administração na aferição do atendimento a essas exigências.
A função social da propriedade industrial seria, portanto, a finalidade imposta pela norma constitucional de que estes bens imateriais sejam destinados ao atendimento dos interesses coletivos nela descritos, sendo que, ao titular destes direitos que os exerce de forma abusiva, devem ser impostas as penalidade descritas na norma infraconstitucional, a exemplo do licenciamento compulsório de patentes.
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SILVA, José Afonso da. Comentário Contextual à Constituição. 3ª edição. São Paulo: Malheiros Editores, 2007.
Notas
[1] SILVA, José Afonso da. Comentário Contextual à Constituição. 3ª edição. São Paulo: Malheiros Editores, 2007, p. 56
[2] ANDRADE, Vieira apud MENDES, Gilmar Ferreira et al. Curso de Direito Constitucional. 2ª edição ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 236
[3] CANOTILHO, J. J. Gomes apud op. cit., p. 236
[4] SANCHIS, Pietro apud MENDES, Gilmar Ferreira et al. Curso de Direito Constitucional. 2ª ed. ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 237
[5] FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 31ª ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 305
[6] op. cit.
[7] op. cit., p. 310
[8] MAMEDE, Gladston. Direito Empresarial Brasileiro: Empresa e Atuação Empresarial. 2ª ed.. São Paulo: Atlas, 2007, p.228.
[9] COMPARATO, Fábio Konder apud GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. 10ª ed. ver. e atual. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 234 e 235.
[10] MORAES, José Diniz de. A Função Social da Propriedade e a Constituição Federal de 1988. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 34.
[11] GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. 10ª ed. ver. e atual. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 225
[12] op. cit., p. 237
[13] op. cit., p. 238
[14] apud MATIAS, João Luis Nogueira. Repensando o Direito de Propriedade. CONPEDI. Disponível em: http://conpedi.org/manaus/arquivos/anais/manaus/reconst_da_dogmatica_joao_luis_matias_e_afonso_rocha.pdf. Acesso em: 24.08.2008.
[15] apud MATIAS, João Luis Nogueira. Repensando o Direito de Propriedade. CONPEDI. Disponível em: http://conpedi.org/manaus/arquivos/anais/manaus/reconst_da_dogmatica_joao_luis_matias_e_afonso_rocha.pdf. Acesso em: 24.08.2008
[16] MÉXICO. Constitución Federal de 1917. Disponível em: http://pdba.georgetown.edu/constitutions/mexico/mexico1917.html. Acesso em : 20.08.2008.
[17] apud MORAES, José Diniz de. A Função Social da Propriedade e a Constituição Federal de 1988. São Paulo: Malheiros, 1999.
[18] BRASIL. Constituição Federal de 1946. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao46.htm. Acesso em 20.08.2008.
[19] Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XXII - é garantido o direito de propriedade; XXIII - a propriedade atenderá a sua função social; (...)
[20] Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...) II - propriedade privada; III - função social da propriedade; (...)
[21] GRAU, Eros Roberto apud SANTIAGO, Alex Fernandes. A Função Social da Propriedade e a Reserva Legal. Disponível em: www.ammp.org.br/artigos/alexsantiago.doc. Acesso em: 20.08.2008.
[22] KRELL, Andreas J. Discricionariedade Administrativa e Proteção Ambiental. O Controle dos Conceitos Jurídicos Indeterminados e a Competência dos Órgãos Ambientais: um Estudo Comparativo. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004, p. 29.
[23]op. cit., p. 32.
[24] KRELL, Andreas J. Discricionariedade Administrativa e Proteção Ambiental. O Controle dos Conceitos Jurídicos Indeterminados e a Competência dos Órgãos Ambientais: um Estudo Comparativo. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004, p. 31
[25] op. cit., p. 31.
[26] ADEODATO, João Maurício. A Discricionariedade Administrativa. Boletim Jurídico. Edição n.º 211. Disponível em: http://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.asp?id=1674. Acesso em: 24.08.2008.
[27] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso em Mandado de Segurança n.º 19590. Recorrente: Gilberto Pinto Fontoura. Recorrido: Estado do Rio Grande do Sul. Relator: Ministro Félix Fischer. Brasília, 02 de fevereiro de 2006. Disponível em: http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/Justica/detalhe.asp?numreg=200500241465&pv=000000000000. Acesso em: 20.08.2008.
[28] BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil. . Brasília: Senado Federal, 1988, art. 5º, § 1º.
[29] apud MORAES, José Diniz de. A Função Social da Propriedade e a Constituição Federal de 1988. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 93
[30] apud MORAES, José Diniz de. A Função Social da Propriedade e a Constituição Federal de 1988. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 95
[31] op. cit.
[32] Por isso, é socialmente obrigado a executar esta tarefa, e que não será socialmente protegido apenas no caso de o cumprir, e na medida em que satisfaz. A propriedade não é, portanto, o direito subjetivo do proprietário, é a função social do titular da riqueza.
[33] GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. 10ª ed. ver. e atual. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 244
[34] ibidem, p. 247
[35] Art. 5º Consideram-se bens móveis, para os efeitos legais, os direitos de propriedade industrial.
[36] BINENBOJM, Gustavo e GAMA JÚNIOR, Lauro. O Direito à Proteção Patentária como Direito Fundamental: Interpretações Sistemática, Teleológica, Constitucional e Internacional. Direito Federal – Revista da Associação dos Juízes Federais do Brasil, Campinas, n.º 23, p. 158. 1º semestre, 2005.
[37] Art. 8º É patenteável a invenção que atenda aos requisitos de novidade, atividade inventiva e aplicação industrial.
[38] Art. 68. O titular ficará sujeito a ter a patente licenciada compulsoriamente se exercer os direitos dela decorrentes de forma abusiva, ou por meio dela praticar abuso de poder econômico, comprovado nos termos da lei, por decisão administrativa ou judicial.
§ 1º Ensejam, igualmente, licença compulsória:
I - a não exploração do objeto da patente no território brasileiro por falta de fabricação ou fabricação incompleta do produto, ou, ainda, a falta de uso integral do processo patenteado, ressalvados os casos de inviabilidade econômica, quando será admitida a importação; ou
II - a comercialização que não satisfizer às necessidades do mercado.