Ementa: CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IPI. EXTRAFISCALIDADE . Importação de automóvel por pessoa física para uso próprio.
I – Inexistência de distinção quanto ao tipo de importador.
II – Distinção entre o IPI-Importador e o Imposto de Importação. Inexistência de dupla incidência.
III – O princípio da não-cumulatividade não justifica a exclusão do tributo sobre o consumidor final, que, no caso do IPI, atua como substituto tributário do alienante do bem, que não é alcançado pela tributação pátria.
IV – Aplicação dos princípios da capacidade contributiva e da isonomia ao importador do bem para uso próprio.
V – Superação da jurisprudência anterior em face da superveniência da EC nº 33/2001.
I – BREVE RELATO DO TEMA
1. A questão analisada neste artigo é velha conhecida no meio jurídico e responsável pela criação de uma verdadeira “indústria” de importação de automóveis de luxo no Brasil, sem o pagamento de qualquer imposto.
O tema está prestes a ser decidido no Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 723.651/PR, interposto perante o Supremo Tribunal Federal, sob relatoria do Sr. Ministro Marco Aurélio e que já possui repercussão geral reconhecida. Cuida-se de recurso interposto contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que deu provimento a apelação da União ao entendimento de que incide o Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI na importação de veículo automotor promovida por pessoa física que não é comerciante nem empresária, para uso próprio. Eis a ementa do julgado:
TRIBUTÁRIO. IPI. IMPORTAÇÃO DE VEÍCULO. PESSOA FÍSICA. USO PRÓPRIO. INCIDÊNCIA.
1. É legítima a incidência do IPI na importação de veículo para uso próprio, por pessoa física, uma vez que a destinação final do bem não é relevante para a definição da incidência do tributo em questão. De qualquer sorte, a destinação do bem, no campo do direito tributário, deve ser aferida a partir da ótica do alienante e não do adquirente, sob pena de reconhecer-se forçosamente a inexigibilidade de todo e qualquer tributo incidente sobre produto adquirido por consumidor final, o que não guarda razoabilidade.
2. O fato de pessoa física possuir domicílio ou residência, e não estabelecimento, também não guarda nenhuma relevância para desqualificar a pessoa física importadora como contribuinte do IPI, nem mesmo como contribuinte do ICMS, na redação anterior à EC 33/2001, já que tal critério foi utilizado pela Constituição Federal em sua redação anterior à referida EC tão somente para definir o ente federado destinatário da arrecadação, num contexto de guerra fiscal, e não para excluir a incidência dos impostos incidentes na importação.
3. Não há falar em ofensa ao princípio da não cumulatividade. O fato de não haver uma operação sucessiva que permita o abatimento do valor pago na importação não conduz à conclusão de que o tributo, nesta hipótese, será indevido, pois tal conclusão equivaleria a conceder uma isenção de tributo, ao arrepio da lei. Nas importações para uso próprio, o importador age como substituto tributário do exportador que não pode ser alcançado pelas leis brasileiras, descaracterizando o IPI como tributo indireto, em tais hipóteses.
4. O 'IPI tem caráter fortemente extrafiscal, constituindo instrumento de política econômica; logo, a tributação no caso em tela surge como mecanismo de proteção ao fisco contra fraudes e instrumento de preservação da isonomia e equidade no comércio internacional' (STJ, REsp nº 794.352/RJ, Rel. Ministro Castro Meira, 2ª Turma, j. 17-12-2009, Dje 10-02-2010). A pura e simples exoneração do tributo, sob equivocada invocação do princípio da não cumulatividade, além de operar contrariamente à finalidade extrafiscal do tributo, acarreta ofensa ao princípio da isonomia, uma vez que o veículo produzido no mercado interno passa a concorrer em condições desfavoráveis com os veículos importados, pois, neste caso, apenas o produto nacional seria tributado pelo IPI.
5. Entendimento que se harmoniza com a redação dada pela EC nº 33/2001 ao art. 155, § 2º, IX, 'a' da Constituição Federal, o qual, relativamente ao ICMS, tributo da mesma espécie do IPI, dispôs que 'incidirá também sobre a entrada de bem ou mercadoria importados do exterior por pessoa física ou jurídica, ainda que não seja contribuinte habitual do imposto, qualquer que seja a sua finalidade'. Superveniência de Emenda Constitucional que tornou superado o entendimento antes consolidado na Súmula nº 660 do STF e com base no qual aquela Suprema Corte em alguns julgados não submetidos à sistemática da repercussão geral excluiu a incidência do IPI na importação de veículo por pessoa física para uso próprio.
6. Sentença reformada.