Local de Crime: do macroambiente para a perícia criminal às limitações em campo

30/03/2014 às 14:45
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O presente trabalho visa trazer à baila, uma reflexão sobre as delimitações reais dos locais de crime – que muitas vezes perpassam o campo geográfico ou físico pela autoridade atendente da ocorrência, além de suas peculiaridades dado à natureza do delito.

Local de Crime: do macroambiente para a perícia criminal às limitações em campo

RESUMO: Este artigo tem como escopo primordial trazer uma reflexão sobre todo o universo de paradigmas que podem permear um Local de Crime. O trabalho do perito criminalístico, substancialmente, vai depender de uma série de fatores, como: um guarnecimento adequado pela polícia ostensiva; uma delimitação geográfica e associativa específica para a natureza do crime; Levantamento de Local apropriado; e sobretudo, o olhar clínico do profissional para catalogar todos os possíveis vestígios associados com a dinâmica do crime.

PALAVRAS CHAVE: Paradigmas; Local de Crime; Guarnecimento do Local; Delimitação Geográfica; Levantamento do Local; Olhar Clínico

SUMÁRIO: 1. Introdução 2. Delimitação do Local de Crime 3. Isolamento e Preservação de Locais 4. Registro Pericial do Local 5. Principais vestígios encontrados na cena do crime 5.1 Em Locais de Crime Contra o Patrimônio 5.2 Em Locais de Crime Contra a Vida 6. Considerações Finais

1 – Introdução

O ilustre professor Carlos Kehdy (1968) define local de crime como “toda área onde tenha ocorrido qualquer fato que reclame as providências da polícia.

É sabido que todo o exame de local de crime se configure como o cerne do ponto de partida da investigação criminal, sendo, portanto, inconcebível qualquer procedimento de análise investigativa de fatos delituosos sem ter havido um prévio contato do profissional com o local que desenvolveu, supostamente, a infração penal.

O ilustre professor RABELLO (1996) nos ensina e define local do crime como sendo:

“[...] a porção do espaço compreendida num raio que, tendo por origem o ponto no qual é constatado o fato, se entenda de modo a abranger todos os lugares em que, aparente, necessária ou presumidamente, hajam sido praticados, pelo criminoso, ou criminosos, os atos materiais, preliminares ou posteriores à consumação do delito, e com este diretamente relacionado.”

O maior desafio para o profissional perito, certamente é a questão do nível de preservação e isolamento do local de crime. Para Dorea (2012):

“Da elasticidade incontestável do conceito de local de crime, salienta-se a importância decorrente para o correto e completo isolamento e guarnecimento (custódia policial) do local onde se verificou a infração, a fim de que sejam propiciadas as condições para um levantamento eficaz e de extremo valor prático”.

            O presente trabalho visa trazer à baila, uma reflexão sobre as delimitações reais dos locais de crime – que muitas vezes perpassam o campo geográfico ou físico pela autoridade atendente da ocorrência, além dos tipos de locais de crime e suas peculiaridades dado à natureza da infração penal.

2- Delimitação do Local de Crime

O art. 169, do Código de Processo Penal, nos ensina que,

Para o efeito de exame do local onde houver sido praticado a infração, a autoridade providenciará imediatamente para que não se altere o estado das coisas até a chegada dos peritos, que poderão instruir seus laudos com fotografias, desenhos ou esquemas elucidativos. Parágrafo único. Os peritos registrarão, no laudo, as alterações do estado das coisas e discutirão, no relatório, as conseqüências dessas alterações na dinâmicas dos fatos.

            Essa delimitação física, geográfica ou associativa com o objeto da investigação, não consiste numa tarefa fácil, sobretudo para a polícia administrativa que comumente faz a comunicação à polícia judiciária. Para Jesus Antônio Velho e outros (2012), nos ensina que:

“A principal tarefa é descobrir qual será a área necessária a ser isolada para que a perícia possa procurar todos os vestígios relacionados ao fato. Uma regra prática a ser levada em consideração é a providência de isolar a maior área possível dentro do contexto e da situação existentes, pois áreas demasiadamente pequenas trazem o risco de contaminação ou perda de vestígios importantes para a apuração dos fatos”.

3 – Isolamento e Preservação de Locais    

É evidente que os exames de locais de crime devem, obrigatoriamente, por expressa ordem legal, ser realizados por peritos.

Umas das adversidades que o perito sempre enfrenta na sua rotina de campo, é o nível de preservação do estado das coisas, contextualizadas com a dinâmica do delito. Dado que esses profissionais não são os primeiros a chegar a uma cena de crime, é essencial que a autoridade atendente da suposta notitia criminis, adote uma gama de providências calcadas na finalidade de se isolar e preservar o macroambiente que tenha alguma ligação com a ação delitiva. Isso é muito importante para que a Criminalística trabalhe revestidos de uma maior segurança nessa busca constantes por vestígios importantes para a configuração da autoria e materialidade do crime.

Para os policiais presentes na ocorrência exige-se um certo bom senso e zelo em suas condutas, que poderão ser determinantes para a preservação de certos vestígios que requerem maiores cuidados, como uma pegada na areia, um escarro, sangue, esperma etc. Esse cuidado é compreensível, tranquilamente, visto que muitas situações climáticas podem provocar degradação a estes tipos de vestígios.

Quanto à preservação do local de crime,a perita criminal BARACAT (2008) leciona que:

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“[...] a preservação dos vestígios deixados pelo fato, em tese delituosa, exige a conscientização dos profissionais da segurança pública e de toda a sociedade de que a alteração no estado das coisas sem a devida autorização legal do responsável pela coordenação dos trabalhos no local pode prejudicar a investigação policial e, conseqüentemente, a realização da justiça, visto que os peritos criminais analisam e interpretam os indícios materiais na forma como foram encontrados no local da ocorrência.”

Dessa forma, percebe-se a relevância dos procedimentos de isolamento e preservação do local de crime, para a ocorrência de um trabalho pericial que proporcione uma verdadeira exatidão no que concerne a análise dos vestígios, culminando, assim, numa conclusão mais consistente e robusta do laudo pericial.

4 – Registro Pericial do Local

            Essa fase representa o chamado “levantamento de local”, consistindo, no processo de documentação que ocorre após a busca de vestígios no local. Logicamente, os tipos de recursos disponíveis para a realização de todo esse processo são inúmeros, sofrendo, sempre, influência do próprio progresso engatinhado pelas Ciências Forenses ao longo dos anos.

Segundo Jesus Antônio Velho (2012), os recursos básicos são:

  • “Descrição Narrativa: trata-se de relatório escrito de tudo o que o perito encontrar no local. A cena geralmente é descrita do geral para o específico. Em princípio, nenhum item é insignificante e nada pode ser descartado da documentação. Há um jargão no ambiente pericial que diz ‘nem lixo pode ser considerado lixo no local de crime’. De fato, há vários registros de vestígios importantes detectados em cestos de lixos.
  • Levantamento fotográfico: iniciado assim que o perito chega ao local, o mais rápido possível. Tirar fotos globais da cena logo ao chegar é recomendação baseada em fundamentos que podem esclarecer qual o estado da cena quando da chegada da perícia. A etapa fotográfica permeia todo o trabalho de análise da cena. Não é uma etapa estanque. Inicia-se com a chegada e continua até a liberação do local. É uma importante forma de registro.
  • Croqui: consiste em realizar um desenho da cena de crime e registrar a posição dos vestígios no local de crime, de modo a contextualizá-los para futuras referências [...]”.

5- Principais vestígios encontrados na cena do crime

5.1 Em Locais de Crime Contra o Patrimônio

Em locais de crime contra o patrimônio, os vestígios são comumente encontrados através de danos aos bens móveis e imóveis. O perito criminal responsável por esse tipo de exame deve-se ater em sob determinados objetos: depredações de edificações nas suas estruturas construtivas; arrombamentos; quebra de vidros em janelas e portas; acidentes de trânsito; apropriação indébita de água, luz, TV a cabo; equipamentos de adulteração/furto de combustível; arrombamento de veículos, etc.

            Os vestígios gerados nos objetos acima são importantes para a compreensão da dinâmica do crime, pois podem determinar certas qualificadoras configurados e disciplinados na legislação especial penal.

            A literatura criminalística aborda que quantidade de vestígios gerados em furtos é superior à de roubos. Nos primeiros são comuns danos por meio de ruptura ou transposição forçada de fechaduras, cadeados, portas, janelas, dutos de ventilação, etc., propiciando, assim, um acervo maior de vestígios materiais na ação criminosa.

5.2 Em Locais de Crime Contra a Vida

            Numa cena de crime em que, supostamente, tenha acontecido homicídio podem existir diversos tipos de vestígios associativos. O principal seria a presença de manchas de sangue, em estado líquido ou na forma de crosta. A caracterização da forma da mancha é de suma importância para a compreensão de toda dinâmica envolvida na ação criminosa. A classificação adotada pelo ilustre perito criminalístico, Luiz Eduardo Dorea, a partir da morfologia da mancha é muito clara e didática. Este ilustre colega leciona um subdivisão em Manchas por projeção, escorrimento, contato, impregnação, limpeza. São observações que poderão elucidar o modo de ação do criminoso, vítima ou objeto, durante um exame de local de crime.

Na caracterização desse tipo de líquido biológico existe alguns testes de confirmação, como teste da benzidina, da fenolftaleína, da leucobase e primordialmente, do luminol.

            Em relação à crimes contra a dignidade sexual, o esperma é um vestígio importantíssimo a ser observado pelo perito criminalístico. Umas das provas de verificação desse vestígio consubstancia pelos seguintes métodos: Prova de Corin-Stockis e Soro antiesperma.

            Outros vestígios também podem estar presentes na cena do crime, a depender da  natureza do delito, como saliva, leite, colostro, líquido amniótico, matéria fecal, urina, vômitos, fibras e pelos.

6- Considerações Finais

Por meio deste trabalho, tornou-se evidente que o exame de local de crime apresenta certos paradigmas a serem enfrentados tanto pela polícia ostensiva (polícia militar) na questão da preservação do local, quanto pelo perito criminal de campo responsável pela ocorrência. Para este profissional é importantíssimo seu olhar extensivo numa cena do crime, além de considerar e constar em laudo, possíveis interferências no conjunto probante presente no local de crime, de modo, a sedimentar de forma real e verdadeira todo o universo de provas, a serem apreciadas durante a persecução penal.

 Referências Bibliográficas

- DOREA, Luiz Eduardo; Vitor Paulo Stumvoll; Vitor Quintela. Criminalística. Millennium, 5ª edição, 2012

- ESPÍNDULA, Alberi. Perícia Criminal e Cível. 3º edição, Campinas, 2009      

- BARACAT, Claudine de Campos. A padronização de procedimentos em local de crime e de sinistro– sua importância e normatização. Disponível em: http://www.seguranca.mt.gov.br/politec/3c. Acesso: 01 de fevereiro de 2014.

- RABELLO, Eraldo. Curso de criminalística. Porto Alegre: Sagra Luzzatto, 1996.

- VELHO, Jesus Antônio, Gustavo Caminoto Geiser, Alberi Espíndula. Ciências Forenses. Uma Introdução às principais áreas da Criminalística Moderna. Editora Millennium, 1ª ed.,2012.

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Sobre o autor
Guilherme Batista Gomes Rocha

Graduação em Farmácia Industrial pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM, Diamatina, MG). Fundador da Empresa Júnior de Farmácia (FarBio, UFVJM, Diamantina, MG). Estagiário no Escritório de Advocacia Dr. Paulo Batista Rocha. Pós-graduado em Gestão de Saúde Pública e Meio Ambiente e Gestão de Assistência Farmacêutica. Mestrado em Química Analítica em andamento. Farmacêutico.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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