Downsizing, straining e burnout

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Um termo de administração que esteve muito em voga nos últimos anos foi “downsizing”. Essa palavra, que em tradução livre significa algo como “achatamento” ou “encolhimento”, na prática consiste numa série de medidas destinadas a enxugar as despesas e otimizar os recursos existentes, a fim de aumentar a produtividade da empresa.

Algo inevitável nesse processo de reestruturação (ou reengenharia), é a redução do quadro de funcionários, para que os custos do negócio sejam minimizados. Na teoria a ideia tem bastante fundamento, mas erros na execução do downsizing ou sua implementação sem a necessária preocupação com a qualidade de vida no trabalho irá resultar em graves problemas.

Quando a redução do quadro de trabalhadores é exagerada, os remanescentes são sobrecarregados com os afazeres daqueles que foram desligados, e têm que aumentar sua produtividade. Se a cobrança por resultados é abusiva, ou se as metas e os prazos são inatingíveis ou arrojados demais, cria-se um clima de estresse e tensão constante entre os empregados que, antes considerados colegas, passam a se ver como concorrentes, e valores como trabalho em equipe e colaboração vão desaparecendo.

Nesse cenário são comuns gestores que administram por meio de ameaças diárias, utilizadas com o intuito de “motivar” os trabalhadores e “incentivar” o aumento de sua eficiência. Os subordinados são “lembrados”, à exaustão, que a empresa confiou neles e os manteve no emprego, e que eles devem fazer por merecê-lo, o que significa produzir cada vez mais. Afinal, quem não estiver satisfeito e não quiser trabalhar naquele sistema, que peça demissão e dê lugar aos muitos outros trabalhadores que cobiçam aquela vaga.

“Forçar à exaustão” e “esticar além do limite, até distender” são algumas das traduções da expressão “straining”, que também significa exigir dos funcionários, durante um tempo prolongado, um esforço além do normal e aceitável. O straining é uma consequência direta da implementação de um downsizing mal estruturado, e é considerada uma das formas de assédio moral organizacional, também chamada de gestão por estresse, que surge em ambientes nos quais as empresas estimulam, direta ou indiretamente, a prática dos atos de violência moral.

Por mais incrível que possa parecer, o straining ainda é considerado por alguns como algo normal, uma forma de gestão focada em resultados. Os empresários que pensam dessa forma, muitas vezes apoiados por gestores de RH mal informados, veem como uma qualidade do empregado o que, equivocadamente, denominam “resiliência”, ou seja, a capacidade do trabalhador, ofendido e vilipendiado, de suportar e superar às constantes humilhações, para que continue se submetendo à prática do assédio moral.

A verdade, entretanto, é que a pessoa assediada, além de ser ofendida em seus direitos da personalidade, garantidos pela Constituição Federal, também é vítima de uma infinidade de problemas de saúde, dentre os quais a “Síndrome de Burnout”. Chamada ainda de “Síndrome do esgotamento profissional” ou “estafa profissional”, essa doença, cuja principal causa é o excessivo estresse no ambiente de trabalho, é caracterizada pela sensação de esgotamento físico e emocional, mudanças bruscas de humor, irritabilidade, lapsos de memória, dificuldade de concentração, ansiedade, depressão, dores de cabeça, hipertensão e uma série de outros sintomas.

Os transtornos mentais, a propósito, são a terceira maior causa de afastamento pelo INSS e o terceiro motivo de aposentadoria por invalidez nas cidades, o que dá a dimensão do impacto desse tema em nosso mercado de trabalho. É necessário que os empresários compreendam que o custo dessas práticas é muito alto, o que não compensa o momentâneo aumento de produtividade. Os trabalhadores não são máquinas e, cedo ou tarde, cairão exaustos na vala dos inválidos e improdutivos, prejudicando assim toda a sociedade.

Contra as empresas, além de eventuais indenizações trabalhistas, pesarão despesas com afastamentos, absenteísmo e turnover (recrutamento, seleção e treinamento). As empresas que adotam a prática do assédio moral organizacional têm sua imagem manchada perante o mercado consumidor e potenciais empregados, já que bons profissionais evitam trabalhar em ambientes reconhecidamente tóxicos. Antes de toda a questão financeira, todavia, vem o respeito ao ser humano, o que é uma questão de humanidade.

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Sobre o autor
Frederico Eugênio Fernandes Filho

Sou empreendedor e conheço as dificuldades do dia a dia dos micro e pequenos. Depois de 15 anos advogando, resolvi mudar de vida e fui empreender. Comecei um negócio do zero, apanhei, aprendi, cresci. Como não entendia nada do assunto, fui estudar. De lá pra cá fiz Empretec, vários cursos livres, MBA em Administração pela USP e Mestrado em Administração, também pela USP, e não paro de estudar. Hoje trabalho compartilhando o que aprendi, como professor de temas relacionados à Administração em cursos livres e em MBAs na Fundace-USP, e desenvolvo cursos, palestras, treinamentos e workshops para micro e pequenos empreendedores. Eu procuro transmitir conhecimentos fundamentais de Administração de forma simples e prática, para que possam ser imediatamente aplicados aos negócios. Também trabalho como voluntário em programas gratuitos de capacitação de empreendedores de baixa renda. Meu propósito é ajudar os micro e pequenos a melhor administrarem suas empresas, com o objetivo de proporcionar sustentabilidade aos seus negócios e tranquilidade às suas famílias. Daí nasceu o projeto engata e vai, por meio do qual compartilho conteúdo pra quem quer empreender.

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