Resumo: O presente artigo pretende discutir a responsabilidade civil das concessionárias de serviço público nos moldes da sistemática do direito civil brasileiro contemporâneo. Buscar-se-á, em um primeiro momento demonstrar que só é possível pensar em responsabilidade civil a partir da construção do Estado de Direito, sendo que este foi construído pela própria ação ultra vires dos agentes estatais. Após uma síntese das modalidades de responsabilidade civil no ordenamento brasileiro, tentar-se-á analisar a responsabilidade das concessionarias de serviço público sob a ótica daquilo plasmado no art. 37, § 6º da Constituição Federal de 1988, levando em conta os entendimentos do Tribunal Excelso sobre o tema.
Palavras-chave: reponsabilidade civil, reponsabilidade estatal, concessionárias de serviço público.
1) INTRODUÇÃO
Pensar a responsabilidade civil é conceber um conjunto de regras cogentes que orientam as ações dos sujeitos, de modo que, a violação desse regramento ético gera a possiblidade de responsabilização deste nos limites daquilo disposto pelo texto legal. Percebe-se claramente que a é própria idéia de Estado de Direito que se encontra como condição lógica para se pensar a responsabilidade civil nos moldes hodiernos. Contudo, nem sempre foi assim. O que se buscará mostrar nesse primeiro momento é como a idéia de Estado de Direito surgiu a partir da própria ação dos agentes estatais e como essa ação é pré-condição para a noção de validade das normas que impera nos dias de hoje.
Por vários séculos, no seio das ciências jurídicas e políticas, tentou-se justificar que o ambiente normal necessário para a validade de um ordenamento jurídico era fruto da própria natureza humana. Temos como exemplo maior Immanuel Kant. Como afirma VANCOURT (1989, p. 33),
"Pode acontecer, de fato, que as nossas ações estejam materialmente conformes com o dever, mas que nós a façamos por interesse ou inclinação: é o que se passa com o comerciante que vende ao preço justo para manter a sua clientela, ou com o homem que ajuda o seu próximo unicamente por simpatia. Comportando-se desse modo eles permanecem no plano da legalidade. Esta exige apenas que se atue de acordo com a lei, pouco importando as intenções. A moralidade exige mais: que eu me conforme com e espírito e a letra da lei, que eu me conforme a isso por respeito por ela".
Kant atrelou o fundamento do direito na própria liberdade do homem: cumprimos as regras por que nos libertamos do estado de animalidade. Interessante também é a passagem de SALGADO (1986, p. 253), que afirma:
"Justa é somente a ação, sob cuja a máxima a liberdade de arbítrio de cada um pode coexistir com a liberdade de todos. A liberdade é a condição de toda vida moral e, portanto, também do direito. Nenhum direito e nenhum dever tem sua origem noutra coisa senão na liberdade: von der alle morallische Gesetze, mithin alle Recht, sowohl als Pflichten ausgehen".
Contudo, tal construção se revelou fruto da crença iluminista no que tange às promessas da modernidade. A normalidade não é fruto da natureza do homem; ao contrário, ela foi historicamente construída por meio da ditadura, como nos demonstra o célebre jurista alemão Carl Schmitt.
É a distinção entre ditadura comissarial e ditadura soberana que constitui o vetor da exposição de Carl Schmitt acerca do tema. Cabe ressaltar, entretanto, que logo no prólogo, o autor apresenta um conceito de ditadura, definindo-a como “meio para alcançar um fim determinado; (...) [cujo] conteúdo só está determinado pelo interesse no resultado esperado, e por tanto, depende sempre da situação das coisas” (1968, p. 10). Essa definição que considera a ditadura como um meio técnico-objetivo para a realização de um fim determinado é comum para os dois tipos de ditadura – ou seja, aquele tipo representado pela primitiva ditadura da Reforma e o outro expresso pela ditadura da Revolução Francesa, a partir do desenvolvimento do conceito de pouvoir constituant. O que diferencia os dois tipos de ditadura apresentadas na obra é a natureza da relação entre comitente e comissário, como se verá a seguir.
Primeiramente, consideremos as distinções necessárias para a apreensão do conceito de ditadura elaborado por Carl Schmitt. No capítulo “A ditadura comissarial e a teoria do estado”, este afirma que o ditador é um comissário de ação, o que nos leva a duas distinções: a) uma referente às diferenças – com base na teoria de Bodin – entre funcionário (officier) e comissário (comissaire); e b) e outra relacionada às dessemelhanças entre os comissários de serviço, de negócio e de ação (1968, p. 49). No que diz respeito ao primeiro ponto, Bodin que o poder estatal pode ser exercido de duas formas: por funcionários ordinários ou por comissários. A distinção entre ambos repousa no fato de que o funcionário ordinário possui funções delimitadas por lei e seu cargo possui um caráter permanente, ao contrário do comissário, que, como afirma Carl Schmitt ao comentar a distinção feita por Bodin, “não tem direito ao cargo; o comissário tem sua função tão somente como um precarium e depende permanentemente de seu comitente” (1968, p. 72). Cabe aqui destacar, antes de expormos a segunda distinção, que a idéia de ditadura soberana era inconcebível para Bodin, o que o leva a afirmar a dependência do comissário ao seu comitente.
Visto o conceito de comissário, iremos expor agora a distinção entre as três espécies de comissão apontadas por Carl Schmitt. O primeiro tipo mencionado por este é a comissão de serviço. Esta tem como principal característica a pouca margem de discricionariedade deixada ao comissário quando este deve resolver os problemas ligados a sua comissão, de modo que, no decorrer do transcurso histórico do Estado moderno, estes acabam se tornando funcionários ordinários – Carl Schmitt utiliza o inspetor de carnes como exemplo para este tipo. O segundo tipo é a comissão de negócios, caracterizada por uma maior margem de discricionariedade atribuída ao comissário, que tem por objetivo resolver assuntos importantes para o Reino – como, por exemplo, os embaixadores. Por fim, o autor apresenta a categoria da comissão de ação, que possui como característica principal a concessão de todos os meios possíveis ao comissário a fim de solucionar os encargos ligados a sua comissão. O ditador é, portanto, um comissário que possui todos os meios possíveis para resolver os problemas ligados a sua comissão. Sua comissão cessa quando os problemas são resolvidos e também, até o surgimento do conceito de poder constituinte, quando seu comitente revoga seu status de comissário, o que revela que o ditador não é soberano, mas sim o é aquele que instituiu a sua comissão.
Após uma elucidação do conceito de ditadura comissarial - meio técnico-objetivo utilizado para um fim específico, de modo que ao comissário é atribuído um poder pleno por parte de uma autoridade constituída -, passemos agora para o conceito da ditadura soberana. O que diferencia esta em relação à ditadura comissarial é o fato de que o comitente no tipo soberano é um poder não constituído, mas constituinte, como por exemplo, o povo. Devido ao seu caráter não-estruturado, para Schmitt o povo é a instância aclamadora dos atos realizados pelos governantes. Daí resulta que é impossível captar uma vontade do povo, de modo que, aqueles que se dizem representantes deste em uma Assembleia Constituinte, ao mesmo tempo em que cumprem sua função representativa, devem tecer aquilo que acreditam ser a vontade da instancia popular. Cabe destacar também, que essa mudança estrutural do conceito foi resultado, principalmente, das teorias de Mably e Rousseau (SCHMITT, 1968, p.245).
Principal exemplo de uma ditadura soberana segundo Carl Schmitt, a Convenção Nacional que se reuniu em 20 de setembro de 1792 tinha como principal tarefa a elaboração de uma Constituição e representava o órgão extraordinário de um pouvoir constituant. O momento de criação desta foi marcado por diversas turbulências internas e invasões estrangeiras ao território francês, o que levou a Convenção a proclamar em 10 de outubro de 1793 que o governo provisório da França funcionaria de forma extraordinária até alcançar a paz, de modo que, para esse fim, foi suspendida a Constituição de 1793. Desse modo, foram empregadas todas as forças para eliminar os resquícios e rastros das relações feudais que ainda existiam no território francês e qualquer outro tipo de pouvoir intermédiaire, construindo, assim, gradativamente o meio homogêneo necessário para toda a ordem jurídico-política pós-revolucionária.
Daí resulta uma interessante observação: foi a ditadura, e não a própria natureza humana, que criou esse ambiente marcado pela previsibilidade e calculabilidade nas relações entre os indivíduos e entre estes e o Estado. Muitos defensores do Estado de Direito e da normalidade de princípio chegam a afirmar que a exceção pode ser totalmente eliminada das relações jurídico-políticas e que os homens se caracterizariam por possuir uma bondade intrínseca a sua natureza, desconsiderando assim o conflito nas relações que estes estabelecem. Deve-se destacar, entretanto, que a exceção – como foi possível perceber ao longo da exposição histórica apresentada por Carl Schmitt – constitui uma categoria essencial à estruturação do Estado de Direito, visto que sem a utilização de poderes extraordinários seria impossível eliminar, por exemplo, os resquícios feudais das sociedades européias que atrapalhavam a materialização dos princípios estruturadores desse tipo de organização estatal. Em geral, seria impossível criar todo o meio homogêneo que a aplicação de uma ordem normativa necessita. E é essa a principal conclusão que se pode extrair de A ditadura: sem a exceção, seria impossível construir um Estado de Direito, ressaltando que, em casos extremos, o problema da exceção volta a assolar aquele Estado fundado no formalismo e na legalidade, como ocorre nos casos de ameaça a segurança pública e a ordem.
Foi a ação dos agentes estatais que criou o Estado de Direito – contudo, não há do que se falar em responsabilização nesse período, pois foi justamente essa ação estatal ultra vires que criou aquilo necessário para o império das regras de direito e, consequentemente, da responsabilidade civil: o meio homogêneo para a validade das normas. Sob a égide da normalidade, entretanto, não há do que se falar em ausência de responsabilidade dos agentes estatais. O Estado de Direito foi criado por estes, mas, depois de substanciado em uma realidade jurídico-política, os mesmos se submetem aos preceitos jurídicos plasmados no ordenamento[1].
2) RESPONSABILIDADE CIVIL E SUAS MODALIDADES NO DIREITO BRASILEIRO CONTEMPORÂNEO
Vimos que a responsabilidade civil é atrelada a um contexto de normalidade, criada pela própria ação ultra vires [2] dos agentes estatais. Nesse contexto, há de se falar de calculabilidade das relações intersubjetivas e, consequentemente de responsabilidade civil.
Sobre a idéia de ilicitude no direito, afirma TOLOMEI (2007, p.361-362):
“O comportamento do homem, sua conduta, pode (e deve) realizar-se em conformidade com a ordem jurídica, campo este do lícito, ou pode ela apresentar-se contraveniente, momento em que são acionados mecanismos legais de repressão (grifo nosso). Nesta ordem inicial de idéias, cabe imaginar a ordem jurídica num duplo sentido justificador: indicar e proteger aquilo que é considerado lícito e, ao mesmo tempo, reprimir tudo o mais que a isto se contraponha, ou seja, afastar o ilícito, amplamente considerado”.
Deve-se ressaltar aqui, que no Código Civil de 1916, a idéia de ilicitude era intimamente relacionada àquela de responsabilidade civil (vide art. 156, CC/1916). Devia-se responsabilizar civilmente pelo cometimento de um ato ilícito, que tem como elementos estruturantes: a) conduta culposa ou dolosa do agente; b) dano e c) nexo causal entre a conduta e o dano. Fala-se em ato ilícito aquiliano quando a conduta humana transgressora do dever jurídico é imposta pela lei; já o ato ilício contratual é aquele cuja fonte obrigacional é a própria vontade dos indivíduos, substanciada pelo negócio jurídico.
Ao longo do desenvolvimento doutrinário e jurisprudencial em torno da questão da responsabilidade civil, percebeu-se que muitas vezes o subjetivismo atrelado ao conceito de ato ilícito, e consequentemente ao de responsabilidade civil, atrapalhava o aferimento do nexo causal entre conduta culpa do agente e dano causado, de modo um giro epistemológico efetuou-se nos fundamentos da responsabilidade civil. Já no século XIX, vozes levantaram-se contra o rigor subjetivista da idéia de ato ilícito e responsabilidade civil:
“Raymond de Saleilles (em sua obra intitulada Les Acidents du Travail et la Reponsabilitè Civile) fez serias objeções ao subjetivismo, e assim, como outros, contribuiu decisivamente para a mudança de perspectiva. Destacava ele que em determinados casos, como nos acidentes de trabalho, exigir da vítima prova da culpa equivalia a manter impune o provocador do dano, sobretudo diante da crescente complexidade das práticas industriais e do progressivo aumento dos riscos de acidentes, de toda espécie.” (TOLOMEI, 2007, p. 366)
Em terra brasilis, foi o célebre jurista mineiro Caio Mário Pereira da Silva que assinalou de forma pioneira a insuficiência da teoria da culpa, afirmando que cada um deveria sofrer o risco dos seus atos, sem a cogitação da idéia de culpa, e, portanto, o substrato da responsabilidade civil deveria se deslocar da noção de culpa para a noção de risco – que para ele, particularmente, era a noção de risco criado[3].
Em consonância com as construções doutrinárias, o legislador pátrio passou admitir a responsabilidade objetiva, paralelamente ao Código Civil, como no caso das estradas de ferro (Decreto 2.681/12), de acidentes de trabalho (Lei 8.213/91), de mineração (Decreto Lei 227/67), de atividades lesivas a meio ambiente (Lei 6938/81), de transporte aéreo (Lei 7.565/86) e de relações de consumo (CDC art. 12 e 14).
Semelhante ocorreu no âmbito da Constituição de 1988, onde foi atribuída responsabilidade objetiva às pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos (art. 37, § 6º, CF/88) e igualmente, àqueles que explorem energia nuclear (art. 21, XXIII, d, CF/88).
No que tange ao Código Civil de 2002, dispôs o legislador pátrio:
“Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.”
Pela exegese do artigo em tela, percebe-se que a atual sistemática de responsabilização civil consagrou tanto àquela pautada no subjetivismo quanto a responsabilidade objetiva.
O § único do artigo 927 traz uma cláusula de abertura do texto legal. A isto se deu o nome de responsabilidade objetiva judicial, que é a possibilidade que tem o juiz de transformar uma responsabilidade subjetiva em objetiva, ou seja, este pode objetivar a responsabilidade desde que presentes dois requisitos: (I) – seja atividade habitual e (II) – atividade seja ainda de risco. Essa norma é de ordem pública, de modo que o juiz pode objetivar a responsabilidade civil subjetiva de ofício. (ex.: racha no trânsito e esportes radicais). Deve-se ressaltar, contudo, que o caso fortuito e força maior excluem a responsabilidade objetiva judicial.
Visto essa pequena introdução a sistemática da responsabilização civil no direito brasileiro, passemos às concessões de serviço público e sua responsabilidade em relação aos serviços prestados.
3) AS CONCESSÕES DE SERVIÇO PÚBLICO
Desde a década de 1980 até os dias de hoje o Estado possuí grandes limitações financeiras para a realização de investimentos em infraestrutura e expansão na prestação de serviços públicos, notadamente pela expansão da sua dívida pública, pelas altas taxas de juros pagas e pelas restrições à redistribuição dos gastos governamentais. Dessa forma, sob esse cenário de restrição, responsabilização e racionalização fiscal, buscaram-se alternativas que possibilitassem maior inserção do capital privado transferindo para o particular a responsabilidade de investir em determinados setores e a prestar certos serviços públicos a fim de aumentar a eficiência.
No Brasil, o processo de privatização toma fôlego a partir do Programa Nacional de Desestatização (PND) em 1990. A introdução de novos arranjos com a participação do setor privado foi em conformidade com o princípio da subsidiariedade, no qual se entende que o Estado deve permitir que o particular execute certas atividades que ele tenha condições de exercer com a iniciativa e recursos próprios, possibilitando uma redução da intervenção estatal, estimulando e criando condições, quando preciso, para que o privado execute e conduza seus empreendimentos (DI PIETRO, 1996, apud BARRENCE, 2005, p. 42).
Proveniente desse princípio, outros mecanismos foram introduzidos na legislação brasileira, tais como concessões, permissões, autorização, contratos de gestão celebrados com as organizações sociais, convênios, parceria público-privada e outras parcerias do setor público com o setor privado, nas quais há participação privada em empreendimentos de natureza pública. As principais modalidades de articulação do Estado e a iniciativa privada para ampliar a prestação de serviços públicos serão abordadas especificamente a seguir.
3.1) Concessão comum
De acordo com Di Pietro (2009, p. 36-37) as concessões consistem no “(...) contrato administrativo pelo qual a Administração Pública transfere a outrem a execução de um serviço público, para que o execute por sua conta e risco, mediante tarifa paga pelo usuário ou outra forma de remuneração decorrente da exploração do serviço”.
Trata-se de uma modalidade de parceria com o setor privado prevista na Constituição Federal (CF) de 1988, em seu artigo 175 que “incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos”. Tal dispositivo constitucional foi disciplinado pela Lei Federal n. 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, que dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos”, no qual se reestabeleceu a possibilidade do privado investir nos setores de infraestrutura e de prestarem serviço de utilidade pública, desde que habilitados através do processo licitatório, conforme disposto abaixo (SOARES, 2010, p. 402).
Observa-se que diferentemente da privatização strictu senso o poder concedente só transfere ao concessionário a execução do serviço, sendo que a titularidade do mesmo continua do Estado, que poderá dela dispor atendendo ao interesse público, ao ter a prerrogativa de alterar cláusulas regulamentares ou de reiscindir o contrato caso não esteja em consonância com o interesse público (DI PIETRO, 2005, p. 299). Dessa forma, não houve a supressão do controle do Estado sobre a atividade em questão. O governo continua atuando na medida em que determina as diretrizes e fixa as regras gerais da execução do serviço público, que ficará a cargo da iniciativa privada (MATOS; FILHO; OLIVEIRA, 1996, p.19).
Ressalta-se que o concessionário não presta um serviço para a Administração, mas recebe, por meio de delegação contratual, o dever de prestar um serviço público à população. Como a concessão caracteriza-se como um contrato administrativo, existe a obrigatoriedade de fixar um prazo determinado, dentro do qual o serviço será prestado. Esse prazo será importante para o cálculo do valor da tarifa que será cobrada dos usuários e para a fixação do tempo necessário para amortizar o capital investido. Percebe-se que se trata de um negócio de caráter econômico, e, portanto, os particulares somente terão interesse se existirem garantias contratuais que proporcionem a segurança jurídica necessária ao negócio, principalmente, no que diz respeito às condições econômicas previamente acordadas entre Poder Público e concessionário (NATAL, 2010, p.4)
Salienta-se que a forma básica de remuneração na modalidade de concessão comum será a tarifa paga pelo usuário, podendo abrir margem de abuso por parte do parceiro privado. Torna-se necessário dessa forma, a atuação estatal, por meio das agências reguladoras, para monitorar e controlar as empresas concessionárias, a fim de preservar o interesse público (BARRENCE, 2005, p. 46).
Em 1995, a União iniciou o Programa de Concessão de Rodovias Federais para a iniciativa privada, conforme o art. 175 da Constituição Federal e a Lei Federal n. 8 987/1995 com a concessão da rodovia Rio – Petrópolis - Juiz de Fora, sendo transferidos cinco trechos de estradas totalizando 858,6 Km. No período de 1995-2009 foram celebrados 51 contratos de concessão, no qual 14 da esfera federal e 37 dos estados (SOARES, 2010, p. 424).
Para garantir maior êxito na concessão de rodovias, foi instituída a Lei Federal n° 9.277, de 10 de maio de 1996, denominada Lei das Delegações, regulamentada pela Portaria n° 368/1996 do Ministério dos Transportes, que estabeleceu as diretrizes para a delegação de rodovias federais aos estados, Distrito Federal e municípios, em que é prevista a delegação de trechos dessas rodovias para inserí-los nos seus programas de concessão de rodovias (SOARES, 2010, p.406).
Em suma, as concessões possibilitaram a maior participação do setor privado no processo de investimento em infraestrutura, no entanto a revitalização desse arranjo é primordial para atração de investimentos.
3.2) Parcerias Público- Privadas (PPP)
As parcerias público-privadas, instituídas pela Lei Federal n. 11 079, de 30 de dezembro de 2004, permite a constituição de dois tipos de PPP’s por contratos de concessão. Nos termos do artigo 2º, “parceria público-privada é o contrato administrativo de concessão, na modalidade patrocinada ou administrativa”. A concessão patrocinada, segundo § 1o do art. 2 º desta lei, é assim conceituada:
a concessão de serviços públicos ou de obras públicas de que trata a Lei n 8 987, de 13 de fevereiro de 1995, quando envolver, adicionalmente à tarifa cobrada dos usuários contraprestação pecuniária do parceiro público ao parceiro privado.
Já a concessão administrativa, disposta no § 2o, pode ser caracterizada como “o contrato de prestação de serviços de que a Administração Pública seja a usuária direta ou indireta, ainda que envolva execução de obra ou fornecimento e instalação de bens”.
Segundo Di Pietro (2005, p 308 e 312), é possível definir a concessão patrocinada como o contrato administrativo no qual o Poder Público (ou o parceiro público) delega ao concessionário (ou parceiro privado) a execução de um serviço público, antecedido ou não por obra pública, para que o realize, em seu próprio nome, com recursos advindos de tarifa paga pelo usuário, acrescido de contraprestação pecuniária paga pelo poder concedente ao concessionário. A concessão administrativa, por outro lado, é um contrato administrativo no qual o parceiro público é o usuário direto ou indireto do serviço objeto do contrato de PPP, podendo ou não abranger execução de obra ou fornecimento e instalação de bens, sendo o parceiro público responsável pelo pagamento integral das contraprestações devidas ao parceiro privado, sob uma das formas elencadas no art 6° da Lei n° 11.079.
Diferentemente da concessão de serviço público comum, a forma de remuneração nas parcerias público-privadas contam com uma contrapartida obrigatória do setor público a fim de garantir a rentabilidade financeira do empreendimento, visto que o serviço público ou obra pública apresenta pouco retorno ou retorno demorado ao setor privado. Outras diferenças que podem ser destacadas são a repartição de riscos nas parcerias público-privadas, as garantias disponibilizadas pela Administração Pública ao parceiro privado e ao financiador do projeto e o compartilhamento de ganhos econômicos entre os parceiros devido à redução do risco de crédito dos financiamentos usados pelo parceiro privado (DI PIETRO, 2005).
Sobre a contraprestação da Administração Pública, poderá ser pactuado no contrato uma remuneração variável ao parceiro privado vinculada ao seu desempenho, medida de acordo com o cumprimento de metas e padrões de qualidade estipulados e da disponibilidade conforme definição em contrato (PEREIRA, 2006, p. 8).