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Controle judicial da ineficiência administrativa: uma análise principiológica

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O artigo aborda o tema sob uma perspectiva científica, preocupando-se em identificar se a alteração constitucional trouxe a lume postulado que, isoladamente considerado, poderia ou não constituir fundamento suficiente para o controle judicial.

INTRODUÇÃO

As alterações introduzidas no corpo da Constituição por meio da Emenda Constitucional n.o 19, de 4 de junho de 1998, constituíram nova fonte de desafios para os estudiosos do Direito Administrativo. Dentre as mudanças, observa-se a nova redação dada ao caput do art. 37 da Constituição Federal, no qual foi incluído, junto aos diversos outros princípios norteadores da Administração Pública, o princípio da eficiência.

Essa inovação no corpo constitucional fez surgir para os estudiosos do direito um relevante desafio no sentido de delimitar o alcance da aplicação do princípio em relação aos atos da Administração Pública, apaziguando, da melhor forma possível, seu possível conflito com demais postulados administrativos – também erigidos constitucionalmente como princípios ou fundamentos – notadamente com o Princípio da Legalidade.

A intenção do presente estudo é investigar se o princípio da eficiência estaria a fazer um papel de legítimo princípio jurídico, com todas as características intrínsecas a tais institutos, ou se seria ele meramente uma diretriz geral dos atos da Administração Pública.

Nesse mesmo compasso, pretende-se investigar a possibilidade de controle judicial da ineficiência administrativa escudada exclusivamente na violação desse novo princípio constitucional, não obstante encontrar-se atualmente sedimentado o paradigma de que a discricionariedade administrativa não seria objeto de controle por parte do Poder Judiciário.


CONSIDERAÇÕES SOBRE A NORMATIVIDADE DOS PRINCÍPIOS

Jean Boulanger foi o pioneiro a tomar as rédeas do estudo analítico e classificatório sobre os tipos e variedades de princípios de Direito. Prudente defensor da normatividade dos princípios, encarava-os como os materiais através dos quais poderia a doutrina erguer com confiança a edificação jurídica.

Em defesa de sua tese, o jurista utiliza-se da disparidade entre os princípios e as regras de Direito para evidenciar o caráter normativo dos primeiros, sem detrimento da inegável normatividade inerente às regras.

Em primeiro plano, analisa a diferença entre os dois institutos afirmando que há entre eles uma distinção não apenas de importância dentro da ordem jurídica, mas também de natureza. A generalidade atribuída a uma regra jurídica não se confunde com a generalidade de um princípio. Enquanto a regra, ainda que geral, seja estabelecida para disciplinar um número indeterminado de atos ou fatos, regendo tão-somente aqueles atos ou fatos, os princípios, diferentemente, são gerais porque visam regular “uma série indefinida de aplicações” (BOULANGER, 1950 apud BONAVIDES, 1997, p. 239).

Os princípios, ainda que não estejam postos de maneira explícita dentro de um sistema de normas, exprimem sua normatividade por meio do trabalho jurisprudencial. É a chamada jurisprudência dos valores ou jurisprudência dos princípios. No que diz respeito a este fator – da jurisprudência como agente materializador da juridicidade dos princípios de Direito – conveniente chamada faz Boulanger (p. 66-67):

Uma vez afirmados e aplicados na jurisprudência, os princípios são os materiais graças aos quais pode a doutrina edificar, com segurança, construções jurídicas [...]. Os princípios existem, ainda que não se exprimam ou não se reflitam em textos de lei. Mas a jurisprudência se limita a declará-los; ela não os cria. O enunciado de um princípio não escrito é a manifestação do espírito de uma legislação.

Num certo momento da elaboração doutrinária e sem jamais perderem o atributo da normatividade, separam-se os princípios em duas espécies distintas: a dos que revelam a natureza de ideias jurídicas norteadoras do bem-pensar legal, demandando concretização na lei e na jurisprudência (ratio legis ou razão da lei), e a dos que, além de serem a razão da lei, também são a própria lei, lex, sedimentando-se, nos moldes do que já é reconhecido pela doutrina, numa regra jurídica (latu sensu) de aplicação imediata.

Essa diferenciação entre os princípios positivados e os não positivados rendeu a estes últimos a alcunha de “princípios abertos” – porque relativamente desprovidos do caráter de norma – ao passo que aqueles se apresentam como “princípios normativos”. Eis aqui uma primeira ilação a respeito da relevância jurídica da positivação dos princípios de direito.

Crisafulli apoia o raciocínio acima explicando que os princípios possuem uma dupla eficácia: a eficácia imediata – oriunda dos princípios apresentados como “princípios normativos” –, aplicáveis desde o momento em que foram introduzidos nos textos legais, e a eficácia mediata (programática) – advinda daqueles “princípios abertos”, acima expostos – demandadores de um certo labor interpretativo em virtude de sua maior indeterminação e generalidade.

Anuncia, nesse mesmo mister, que “um princípio, seja ele expresso numa formulação legislativa ou, ao contrário, implícito ou latente num ordenamento, constitui norma, aplicável como regra” (CRISAFULLI, 1952 apud BONAVIDES, 1997, p. 258).

De acordo com essa linha de pensamento, se os princípios de Direito constituíssem meras diretrizes teóricas, estaríamos obrigados a aceitar o fato de que, num caso concreto, a norma haveria de ser posta pelo juiz, e não por ele apenas aplicada.

Se a unidade de um sistema jurídico é condição fundamental para a coerência do direito, em si mesmo considerado, são os princípios de Direito – e não uma casual harmonia eventualmente existente entre as regras de um ordenamento – os responsáveis por tal realidade. A formação unitária do sistema só pode sobreviver em razão da identidade da natureza entre os princípios e as normas. E essa conformidade só existe porque o princípio também é norma, notadamente quando positivado.

Assim, pode-se sintetizar as ideias acima apresentadas fazendo-se remissão às iluminadas palavras daquele notável Professor italiano, segundo o qual “os princípios são normas escritas e não escritas, das quais logicamente derivam as normas particulares, também estas escritas e não escritas, e às quais inversamente se chega partindo destas últimas” (CRISAFULLI, ibid., p. 91).


CONTORNOS JURÍDICOS DO PRINCIPIO DA EFICIÊNCIA

Não é recente a dificuldade que os estudiosos encontram, mormente no campo do Direito, em atribuir conceitos herméticos e definidos a certos institutos, principalmente àqueles que se fazem objeto de grandes impasses. O mesmo certamente haveria de ocorrer com a eficiência administrativa.

Muito embora haja no campo jurídico certa aversão ao fato de o legislador estabelecer conceitos em textos legais, em determinadas situações, (talvez com o objetivo de acabar com dúvidas acerca daquelas definições demasiadamente amplas ou vagas que enchem os Tribunais de interpretações equivocadas) o legislador vê-se obrigado a conceituar certos institutos, tal como aconteceu, por exemplo, no caso do conceito de tributo, trazido no artigo 3o do Código Tributário Nacional.

No caso da eficiência administrativa, não ousou o legislador tecer maiores considerações acerca de sua conceituação, derrogando à doutrina essa árdua tarefa.

Para Maria Silvia Zanella Di Prieto (1999, p. 219), por exemplo, o princípio apresenta-se sob dois aspectos, podendo ser considerado: 1) em relação à forma de atuação do agente público e 2) em relação ao modo de organização do ente administrativo. Enquanto sob este prisma entende-se a eficiência como sendo a exigência à boa organização, estruturação e disciplina na administração pública, sob aquele primeiro entende-se que é a exigência, em relação ao agente público, do melhor desempenho possível de suas atuações e atribuições, de forma a lograr os melhores resultados.

Para Hely Lopes Meirelles (1995, p. 50), eficiência é o que se impõe a todo agente público de realizar suas atribuições com presteza, perfeição e rendimento funcional. É o mais moderno princípio da função administrativa, que já não se contenta em ser desempenhada apenas com legalidade, exigindo resultados positivos para o serviço público e satisfatório atendimento das necessidades da comunidade e de seus membros.

Alexandre de Moraes (2001, p. 306), por seu turno, define o princípio da seguinte maneira:

[...] é aquele que impõe à Administração Pública direta e indireta e a seus agentes a persecução do bem comum, por meio do exercício de suas competências de forma imparcial, neutra, transparente, participativa, eficaz, sem burocracia e sempre em busca da qualidade, primando pela adoção dos critérios legais e morais necessários para melhor utilização possível dos recursos públicos, de maneira a evitar-se desperdícios e garantir-se uma melhor rentabilidade social.

Dentre tão boas definições, contudo, a que parece mais completa e integrativa é a de Paulo Modesto (2000, p. 70), segundo o qual:

O princípio da eficiência é a exigência jurídica, imposta à administração pública e àqueles que lhe fazem as vezes ou simplesmente recebem recursos públicos vinculados de subvenção ou fomento, de atuação idônea, econômica e satisfatória na realização das finalidades públicas que lhe forem confiadas por lei ou por ato ou contrato de direito público.

Definidos os contornos principais do postulado objeto do presente estudo, propõe-se, a partir deste ponto, a uma análise sistematizada e investigativa de seu papel no ordenamento jurídico.


EFICIÊNCIA E EFICÁCIA: UM PARALELO NECESSÁRIO

Em boa parte do cotidiano administrativo eficiência e eficácia são empregados como sinônimos. O próprio dicionário Aurélio, por exemplo, diz que o termo eficiência significa ação, força, virtude de produzir um efeito, eficácia. Esta, por sua vez, significa aquilo que produz o efeito desejado, que dá bom resultado, que age com eficiência.

Entretanto, muito embora exista tal equivalência de sentidos quanto à conotação vernacular dos termos, no campo jurídico não pode ser válida tamanha simplificação.

O próprio artigo 74 da Constituição Federal de 1988, ao dispor sobre o controle interno a ser exercido pelos Três Poderes, determina como finalidade desse controle, em seu inciso II, “comprovar a legalidade e avaliar os resultados, quanto à eficácia e eficiência, da gestão orçamentária, financeira e patrimonial [...].”

Se é entendimento pacífico que a lei, no escopo de evitar confusões, deve atribuir, a cada palavra, seu significado preciso e, além disso, evitar conceitos vagos, imprecisos e redundantes, diferentemente não seria em relação ao texto constitucional. Este, quando menciona os deveres de eficácia e eficiência, estabeleceu definitivamente uma diferenciação entre os dois institutos.

Contudo, a Doutrina não é pacífica ao considerar o conteúdo axiológico dos termos e a eles conotações imprecisas e, na maioria das vezes, contraditórias.

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Renato Lopes Becho (1999 apud GABARDO, 2002, p. 24), anuncia, em uma das interpretações possíveis, que enquanto a eficácia se relaciona mais com atos ou fatos, a eficiência diz respeito às pessoas (físicas ou jurídicas), ambas mantendo, contudo, a ideia de cumprimento de metas e obtenção dos efeitos desejados pelos administrados.

Sob outro ponto de vista, Egon Bockmann Moreira (2000, p. 330) sustenta que enquanto a eficácia diz respeito à possibilidade de atingimento dos fins preestabelecidos em lei, a eficiência administrativa impõe que esse cumprimento da lei seja concretizado com um mínimo de ônus social, buscando sempre o benefício do cidadão.

Para Cecília Vescovi de Aragão, (1997 apud GABARDO, 2002, p. 25) enquanto a eficiência diz respeito à relação entre custo “real” e custo “padrão” ou “desejado”, a eficácia é traçada pela relação entre o produto “real” e o produto “padrão”. Neste ponto, percebe-se uma clara separação entre os meios e os fins, como condicionadores da eficiência e da eficácia, respectivamente.

Percebe-se, portanto, que entre a eficiência e a eficácia existe uma tênue linha divisória. É de se lembrar, contudo, que os elementos são dependentes entre si, caminhando sempre juntos na busca do quase inalcançável bem-comum.


EFICIÊNCIA E ATO DISCRICIONÁRIO

A Doutrina costuma dividir os atos administrativos, quanto à validade de sua expedição, como atos discricionários ou vinculados. Na verdade, a discricionariedade e a vinculação não constituem características do ato em si, mas do juízo valorativo feito pelo administrador. Discricionária ou vinculada é a apreciação a ser realizada pela autoridade administrativa quanto aos aspectos jurídicos ou fáticos de determinada situação.

Vinculado é o ato em que a lei não abre espaço para que o administrador teça juízos sobre a oportunidade ou a conveniência da medida, traçando-lhe um caminho específico e, ao mesmo tempo, proibindo-lhe de se portar de maneira diferente à estabelecida no texto legal.

O ato discricionário, por sua vez, é aquele em que existe, para o administrador público, relativa margem de liberdade de escolha entre duas ou mais situações diferentes. Assim, quando a norma diz que a Administração poderá realizar determinado ato, depara-se com a discricionariedade da situação.

Estudar o princípio da eficiência, no que tange à ação administrativa, é analisar a órbita de sua discricionariedade. Quanto à vinculação, a eficiência está mais para a execução dos atos que para sua gênese. De acordo com Marcelo Harger:

Os atos vinculados normalmente não são afetados pelo princípio da eficiência. É que, nesses casos, a lei já determina qual a única solução possível para o atingimento do interesse público. A solução ótima, nesses casos, já está prevista em lei.

Nos casos em que existe discricionariedade, cabe ao administrador optar, entre duas soluções possíveis, pela que lhe apresentar ser mais conveniente. Todavia, uma vez inserida a eficiência dos atos administrativos como uma exigência constitucional, poderia tal juízo influenciar os parâmetros de ação do Administrador? Não surgirá dessa relação uma espécie de vinculação espúria?

A nosso ver não é isso o que ocorre. De fato, jamais fora permitido ao administrador agir de maneira ineficiente. Contudo, a partir das alterações trazidas pela Emenda 19, o administrador ficará ainda mais adstrito ao agir com qualidade. Deverá ele observar que a decisão administrativa agora está, mais do que nunca, compromissada com a melhor solução, produzindo efeito mais rápido e com o menor custo possível para a administração.

Portanto, no uso de sua competência discricionária o administrador público não detém a possibilidade de escolher uma solução que seja, sob o ponto de vista técnico, de eficácia duvidosa, ou notadamente menos eficiente que as demais alternativas possíveis. A discricionariedade jamais poderia consistir em um pretexto para decisões cuja ineficiência salta aos olhos, decisões estas que desrespeitam a finalidade legal e, via de consequência, o interesse público.


CONTROLE JUDICIAL DA INEFICIÊNCIA ADMINISTRATIVA

É de conhecimento notório que um dos fundamentos da organização estatal é a tripartição dos poderes, segundo a qual num Estado organizado os poderes de administrar, julgar e legislar devem ser exercidos de forma separada, mantendo entre si, contudo, uma relação de colaboração (relação horizontal), e não uma relação de hierarquia (relação vertical).

Sob esse prisma surge um dos principais problemas quando da análise do controle feito pelo Judiciário dos atos da administração: até onde poderia ir o Juiz ao apreciar as ações administrativas?

Embora se possa afirmar que o Estado Democrático de Direito possui como um de seus pilares o controle dos atos administrativos, a doutrina administrativa sempre encarou a interferência do Judiciário com bastante reserva. Talvez pelo imenso temor ao governo dos juizes, nada mais lhes atribuiu a Ciência Jurídica que a possibilidade de aferição dos critérios de legalidade e forma dos atos administrativos, sendo que seu mérito, seu conteúdo, constitui uma barreira quase intransponível ao alvitre dos magistrados no exercício do controle externo.

Para alguns, como Vladimir da Rocha França, embora tenha ocorrido a inclusão expressa da eficiência no rol do artigo 37 da Constituição, ainda assim seria vedado ao Judiciário o controle integral da eficiência da atividade administrativa.

De acordo com tal entendimento, a eficiência da ação administrativa seria objeto do controle interno de cada poder e, conjuntamente, do poder legislativo. No que diz respeito ao controle administrativo, a atividade da Administração Pública já seria constantemente analisada internamente. Assim, nos casos em que a providência administrativa passasse a ser inconveniente ou inoportuna, estaria ela passível de revisão pela própria administração, atendendo inclusive ao princípio da autotutela de seus atos.

Contudo, há que se salientar que, quando se utiliza deste tipo de avaliação, o que se controla não é a juridicidade da medida, mas sua efetividade.

Outro problema enfrentado pelos administrativistas é o que trata do método da aferição do cumprimento ao dever de eficiência. A doutrina, contudo, não dedica maiores debates a este ponto, de forma a reconhecer que, para que haja a efetiva análise da eficiência de um ato, existe a necessidade de se estabelecer critérios bem definidos, como metas a serem perseguidas. Egon Bockmann Moreira (2000, apud GABARDO, 2002, p. 142) concorda com essa ideia, declamando o seguinte:

O controle da eficiência não parte de norma genérica e abstrata de conduta, desprovida de mandamento legal. Ao contrário, exige configuração precisa e minuciosa, mediante pautas de comportamento predefinidas – que estabeleçam normativamente o alcance de específicos resultados, a utilização de recursos certos e as conseqüências jurídicas daí derivadas. Caso contrário, inexistirá a “relação” definidora da eficiência.

Obviamente tal regra não pode ser absoluta. Casos há em que são analisadas circunstâncias normais, cujos valores de ordem jurídica são suficientes para se chegar a uma conclusão. Nesses casos, o juiz traçará seu próprio norte e será seu próprio perito.

De acordo com os que combatem a possibilidade de invalidação do ato administrativo com base na eficiência, este princípio, quando interpretado em conjunto com os demais, poderia apenas orientar o juiz a tomar a melhor decisão, mas nunca poderia servir de substrato fundamentador da anulação de um determinado ato. Não se poderia justificar a anulação embasado tão- somente no fato de ter sido unicamente violados parâmetros de eficiência.

Ora, se se tomar como verdadeira tal assertiva, cabalmente surgirá um paradoxo.

Se anteriormente foi dito que para que um princípio possa ser considerado como tal, deve ter como característica a plena operabilidade – no sentido de ser possível se desfazer certa situação sob o argumento único e exclusivo de que se inobservou o mandamento – como então poderia ser verdade que o exclusivo emprego da eficiência não pode invalidar o ato administrativo? Fatalmente seríamos compelidos a concluir que a eficiência não é um princípio, porquanto absolutamente desprovido de normatividade e coercibilidade.

A nosso ver, contudo, muito benvinda foi a alteração do caput do artigo 37 da Lei Maior, já que a exigência pela eficiência administrativa padecia de amparo legal, mesmo quando, em diversos casos, não bastava ao administrador seguir a legalidade, a impessoalidade a moralidade e a publicidade para a consecução do bem-comum.

Emerson Gabardo (2002, p. 137), corroborando nosso entendimento, salienta:

O potencial jurídico do princípio da eficiência, notadamente após sua constitucionalização, é capaz de reverter o posicionamento dos Tribunais Superiores no sentido de que não é possível ao Judiciário controlar a eficiência do ato administrativo. Cada vez mais, a partir da positivação expressa do princípio, haverá a possibilidade da análise pelo Judiciário de questões antes afastadas pela jurisprudência.

Não há qualquer ofensa ao princípio da divisão dos poderes se o juiz, quando provocado, e amparando-se em argumentos técnicos fundamentados, não se limita à mera análise da legalidade, pondo-se a apreciar a eficiência dos atos administrativos (ou a possibilidade de sua ocorrência), até mesmo porque o princípio da eficiência se insere no ordenamento como um critério de aferição de legitimidade dos atos da Administração.

Em sintonia com esse entendimento, Alexandre de Moraes (2001, p. 312) apresenta o seguinte:

Vislumbra-se, portanto, dentro dessa nova óptica constitucional, um reforço à plena possibilidade do Poder Judiciário, (CF, art. 5o , XXXV), em defesa dos direitos fundamentais e serviços essenciais previstos pela Carta Magna, garantir a eficiência dos serviços prestados pela Administração Pública, inclusive responsabilizando as autoridades omissas, pois, conforme salienta Alejandro Nieto, analisando a realidade espanhola, quando o cidadão se sente maltratado pela inatividade da administração e não tem um remédio jurídico para socorrer-se, irá acudir-se inevitavelmente de pressões políticas, corrupção, tráfico de influência, violências individual e institucionalizada, acabando por gerar intranqüilidade social, questionando-se a própria utilidade do Estado.

Por derradeiro, existe ainda um último empecilho trazido por parte da doutrina em relação à operabilidade do princípio da eficiência. De acordo com esse ramo do pensamento, é impossível (não sob o aspecto jurídico, mas sob o aspecto fático) se aferir a eficiência de qualquer ato administrativo antes mesmo de sua execução, da produção de seus efeitos concretos. De acordo com esta facção, o papel do juiz, neste caso, se exaure na simples comprovação de que os caminhos tomados, bem como a obediência ao princípio da supremacia do interesse público estão em conformidade com o regime jurídico-administrativo pátrio.

É bom lembrar que, de acordo com a doutrina tayloriana, existe uma série de preceitos prévios e necessários ao alcance da eficiência no trabalho. Com base neste pensamento, é possível se concluir que a eficiência é critério que pode ser medido anteriormente ao início da execução do ato, e não somente como uma consequência dele.

Retomando o raciocínio anterior, é óbvio que a vicissitude das circunstâncias nem sempre abre espaço a um prévio controle da eficiência dos atos administrativos. Contudo, tal fato não pode inibir a possibilidade (ao menos teórica) de se proceder tal averiguação nos demais casos. A conclusão que se pode chegar é que, quando se concorda que a eficiência de determinado ato só pode ser constatada a posteriori, ou melhor, após a exteriorização de seus efeitos no mundo real, concorda-se também com a ideia de que é preferível que o ato ineficiente se concretize e cause prejuízos à coletividade (para que depois se responsabilize o Estado) a controlar previamente os possíveis resultados da ação administrativa.

Assim, podem-se considerar afastados todos os argumentos em desfavor do controle da eficiência pelo judiciário, seja em razão da legitimidade, da legalidade ou da operabilidade de tal controle.

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Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS, Emmanuel Felipe Borges Pereira. Controle judicial da ineficiência administrativa: uma análise principiológica. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3976, 21 mai. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/28502. Acesso em: 20 abr. 2024.

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