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Eficácia horizontal dos direitos fundamentais: o particular como “vilão” e o Estado como guardião?

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04/06/2014 às 10:36
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CONCLUSÃO

Os dados históricos nos revelam uma realidade que alarma quando se passa a considerar a possibilidade da suplantação de uma das mais relevantes conquista dos movimentas liberais, qual seja, a autonomia da vontade.

Considerar a possibilidade de o Estado novamente tolher, eliminar um dos direitos mais característicos e relevantes do homem chega a ser assustador.

Contudo, também o são os exemplos cada vez mais reiterados nos quais os direitos mais básicos do indivíduo são destroçados, suplantados na maioria das vezes pela atuação voraz do poder econômico.

Talvez o fato de admitir a incidência dos direitos fundamentais nas relações privadas cause certa estranheza em virtude das consequências práticas disso. Afinal, para assegurar essa incidência, imprescindível a intervenção do Estado-juiz. Isso reduziria consideravelmente a liberdade dos particulares em benefício da ingerência cada vez mais acentuada do Estado nas relações entre os homens livres.

Todavia, apesar dos posicionamentos contrários, trata-se a eficácia direta dos direitos fundamentais de conclusão inevitável e resultado naturalístico da evolução dos mesmos.

Vive-se hoje sob a égide de uma Constituição que representou a transição do sistema ditatorial à democracia representativa, por isso mesmo, trata-se daquela cujo corpo contém expressivas garantias voltadas à proteção e promoção da dignidade do indivíduo. Restringir, contudo, essa proteção ao âmbito das relações públicas, desconsiderando por completo a realidade sociocultural do país, onde atrocidades inimagináveis são perpetradas por particulares contra outros particulares, é nó mínimo temerário. Constitui, na verdade, entendimento contrário à própria natureza dos direitos fundamentais aos quais se deve ofertar a interpretação que melhor garanta a sua efetividade.

Assim, o entendimento que esposa a aplicação direta, imediata, independente da intervenção do legislador infraconstitucional, parece ser o mais oportuno e compatível com a atual conjuntura da sociedade brasileira, bem como, com o estágio evolutivo dos direitos fundamentais o qual se vivencia hodiernamente.


REFERÊNCIAS

COSTA JÚNIOR, Ademir de Oliveira. A eficácia horizontal e vertical dos Direitos Fundamentais. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, X, n. 41, maio 2007. Disponível em: <http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=1838>. Acesso em maio 2012.

CAVALCANTE FILHO, João Trindade. Teoria geral dos direitos fundamentais. Disponível em http://www.tvjustica.jus.br/. Acesso em 28 maio 2012.

DA SILVA, Virgílio Afonso. Direitos fundamentais e relações entre particulares. Revista Direito GV 1. v. 1 n. 1 p. 173-180, mai. 2005.

GAGLIANO, Pablo Stolze. FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo curso de Direito Civil, contratos: teoria geral. 7ª. ed. v. IV – São Paulo: Saraiva, 2011.

GEMIGNANI, Tereza Aparecida. GEMIGNANI, Daniel. A eficácia dos direitos fundamentais nas relações de trabalho. Disponível em http://www.trt3.jus.br/escola/download/revista/rev_80/tereza_aparecida_gemignani_e_daniel_gemignani.pdf. Acesso em 28 de maio de 2012.

MENDES, Gilmar. Os direitos fundamentais e seus múltiplos significados na ordem constitucional. Revista Diálogo Jurídico, Salvador, CAJ - Centro de AtualizaçãoJurídica, nº. 10, janeiro, 2002. Disponível na Internet: <http://www.direitopublico.com.br>. Acesso em: 28 de maio de 2012.

NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 5º. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Método, 2011.

ROSPA, Aline Martins. Aplicação dos direitos fundamentais às relações privadas. Disponível em http://www.lfg.com.br/artigos/Blog/APLICACAO_DOS_%20DIREITOS_FUNDAMENTAIS_%20AS_RELACOES_PRIVADAS.pdf. Acesso em 28 de maio de 2012.

SANTOS, Carla Maia dos. Qual a distinção entre eficácia vertical e eficácia horizontal dos direitos fundamentais? Disponível em http://www.lfg.com.br. Acesso em 28 de maio de 2012.

WEIS, Carlos. Direitos Humanos Contemporâneos. 2ª. ed. São Paulo: Editora Malheiros, 2010.


Notas

[1] WEIS, Carlos. Direitos Humanos Contemporâneos. 2ª. ed. São Paulo: Editora Malheiros, 2010.

[2] COSTA JúNIOR, Ademir de Oliveria. A eficácia horizontal e vertical dos Direitos Fundamentais. In:Âmbito Jurídico, Rio Grande, X, n. 41, maio 2007. Disponível em: <http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=1838>. Acesso em maio 2012.

[3] Obra cit., p. 24.                                                               

[4] Obra cit., p. 79.

[5] “A expressão direitos fundamentais (droits fondamenataux) surgiu na França, em 1770, no movimento político e cultural que deu origem à Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, em 1789. (NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 5ª. ed., rev., atual. e ampl. São Paulo: Método, 2011.

[6]CAVALCANTE FILHO, João Trindade. Teoria geral dos direitos fundamentais. Disponível em http://www.tvjustica.jus.br/. Acesso em 28 maio 2012.

[7] No que respeita as funções ou finalidades dos direitos fundamentais, o professor FACHIN preleciona dizendo que para o professor CONOTILHO são “a função de defesa ou de liberdade - impõe ao Estado um dever de abstenção, significa dever de não-interferência ou de não-intromissão; nessa direção, impõe-se ao Estado a abstenção de prejudicar, ou seja, o dever de respeitar os atributos que compõem a dignidade da pessoa humana -; função de prestação social - atribui à pessoa o direito social de obter um benefício do Estado, impondo-se a este o dever de agir, para satisfazê-lo diretamente, ou criar as condições de satisfação de tais direitos. Em regra, está relacionada aos direitos fundamentais à saúde, à educação, à moradia, ao transporte coletivo etc. -; função de proteção perante terceiros - Os direitos fundamentais das pessoas precisam ser protegidos contra toda sorte de agressões. Na conflituosidade da vida cotidiana, tais direitos podem ser violados a qualquer instante; Verifica-se, então, a eficácia horizontal dos direitos fundamentais. O Estado, atendendo à função, desempenhada pelos direitos fundamentais, de prestação perante terceiros, atua para proteger tais direitos -;  função de não discriminação - Nenhuma pessoa poderá ser privada de um direito fundamental em razão de discriminação. Está-se, portanto, diante do princípio da igualdade.” (FACHIN, Zulmar. Funções dos direitos fundamentais. Disponível em http://www.lfg.com.br. Acesso em 27 de maior de 2008.)

[8] DANTAS, Paulo Roberto de Figueiredo. Direito Constitucional. 6ª. ed. São Paulo: Atlas, 2010.

[9] MENDES, Gilmar. Os direitos fundamentais e seus múltiplos significados na ordem constitucional. Revista Diálogo Jurídico, Salvador, CAJ - Centro de AtualizaçãoJurídica, nº. 10, janeiro, 2002. Disponível na Internet: <http://www.direitopublico.com.br>. Acesso em: 28 de maio de 2012.

[10] SANTOS, Carla Maia dos. Qual a distinção entre eficácia vertical e eficácia horizontal dos direitos fundamentais? Disponível em http://www.lfg.com.br. Acesso em 28 de maio de 2012.

[11] EMENTA: SOCIEDADE CIVIL SEM FINS LUCRATIVOS. UNIÃO BRASILEIRA DE COMPOSITORES. EXCLUSÃO DE SÓCIO SEM GARANTIA DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO. EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS. RECURSO DESPROVIDO. I. EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS. As violações a direitos fundamentais não ocorrem somente no âmbito das relações entre o cidadão e o Estado, mas igualmente nas relações travadas entre pessoas físicas e jurídicas de direito privado. (Omissis). RE 201819, rel. Min. Gilmar Mendes, j. 11/10/2005. Disponível em http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia. Acesso em 28 de maio de 2012. Grifo nosso.

[12] “De maneira didática, pode-se definir a eficácia vertical dos direitos fundamentais como aquela que vincula o legislador, o juiz, e os entes estatais em geral. A eficácia horizontal diz respeito à incidência das normas jusfundamentais às relações privadas, havendo discussão se tal eficácia seria mediata ou imediata, isto é, se as normas de direito fundamental atingiriam os particulares, seja nos casos em que uma das partes ostenta poder econômico ou social, seja nas relações jurídicas entre iguais.”(PIMENTA, José Roberto Freire. DE BARROS, Juliana Augusta Medeiros. A eficácia imediata dos direitos fundamentais individuais nas relações privadas e a ponderação de interesses. Disponível em http://www.conpedi.org.br/manaus/arquivos/anais/bh/jose_roberto_freire_pimenta.pdf. Acesso em 28 de maio de 2012.)

[13] SANTOS, Carla Maia dos. Qual a distinção entre eficácia vertical e eficácia horizontal dos direitos fundamentais? Disponível em http://www.lfg.com.br. Acesso em 28 de maio de 2012.

[14] “Erich Lüth era crítico de cinema e conclamou os alemães a boicotarem um filme, dirigido por Veit Harlam, conhecido diretor da época do nazismo (dirigira, por exemplo, Jud Suβ, filme-ícone da discriminação contra os judeus). Harlam e a distribuidora do filme ingressaram com ação cominatória contra Lüth, alegando que o boicote atentava contra a ordem pública, o que era vedado pelo Código Civil alemão. Lüth foi condenado nas instâncias ordinárias, mas recorreu à Corte Constitucional. Ao fim, a queixa constitucional foi julgada procedente, pois o Tribunal entendeu que o direito fundamental à liberdade de expressão deveria prevalecer sobre a regra geral do Código Civil que protegia a ordem pública.” (CAVALCANTE FILHO, João Trindade. Teoria geral dos direitos fundamentais. Disponível em http://www.tvjustica.jus.br/. Acesso em 28 maio 2012.)

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[15] CAVALCANTE FILHO, João Trindade. Teoria geral dos direitos fundamentais. Disponível em http://www.tvjustica.jus.br/. Acesso em 28 maio 2012.

[16] DA SILVA, Virgílio Afonso. Direitos fundamentais e relações entre particulares. Revista Direito GV 1. v. 1 n. 1 p. 173-180, mai. 2005.

[17] ROSPA, Aline Martins. Aplicação dos direitos fundamentais às relações privadas. Disponível em http://www.lfg.com.br/artigos/Blog/APLICACAO_DOS_%20DIREITOS_FUNDAMENTAIS_%20AS_RELACOES_PRIVADAS.pdf. Acesso em 28 de maio de 2012.

[18] GAGLIANO, Pablo Stolze. FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo curso de Direito Civil, contratos: teoria geral. 7ª. ed. v. IV – São Paulo: Saraiva, 2011.

[19] Obra cit., p. 71.

[20]ROSPA, Aline Martins. Aplicação dos direitos fundamentais às relações privadas. Disponível em http://www.lfg.com.br/artigos/Blog/APLICACAO_DOS_%20DIREITOS_FUNDAMENTAIS_%20AS_RELACOES_PRIVADAS.pdf. Acesso em 28 de maio de 2012.

[21] GEMIGNANI, Tereza Aparecida. GEMIGNANI, Daniel. A eficácia dos direitos fundamentais nas relações de trabalho. Disponível em http://www.trt3.jus.br/escola/download/revista/rev_80/tereza_aparecida_gemignani_e_daniel_gemignani.pdf. Acesso em 28 de maio de 2012.

[22] Obra cit., p. 5.

[23] CAVALCANTE FILHO, João Trindade. Teoria geral dos direitos fundamentais. Disponível em http://www.tvjustica.jus.br/. Acesso em 28 maio 2012.

[24] NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 5º. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Método, 2011.

[25] ROSPA, Aline Martins. Aplicação dos direitos fundamentais às relações privadas. Disponível em http://www.lfg.com.br/artigos/Blog/APLICACAO_DOS_%20DIREITOS_FUNDAMENTAIS_%20AS_RELACOES_PRIVADAS.pdf. Acesso em 28 de maio de 2012.

[26] DA SILVA, Virgílio Afonso. Direitos fundamentais e relações entre particulares. Revista Direito GV 1. v. 1 n. 1 p. 173-180, mai. 2005.

[27] GEMIGNANI, Tereza Aparecida. GEMIGNANI, Daniel. A eficácia dos direitos fundamentais nas relações de trabalho. Disponível em http://www.trt3.jus.br/escola/download/revista/rev_80/tereza_aparecida_gemignani_e_daniel_gemignani.pdf. Acesso em 28 de maio de 2012

[28] “... os direitos e garantias fundamentais não são considerados absolutos, não sendo possível a alguém invocar um direito ou garantia constitucional para acobertar um comportamento ilícito, tentando afastar, com tal argumento, a indispensável aplicação da lei penal.” (DANTAS, Paulo Roberto de Figueiredo. Direito Constitucional. 6ª. ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 102).

[29] NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 5º. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Método, 2011.

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Sobre o autor
Sérgio Nunnes

Especialista em Direito Constitucional com formação para o Magistério Superior, Professor do Curso de Direito da UNEST (Paraíso-TO), FAPAL (Palmas-TO), Ex-Professor da Faculdade Serra do Carmo (Palmas-TO), Ex-professor do Curso de Direito do Centro Universitário Unirg - TO, Professor em preparatórios para Concursos Públicos, Autor de Artigos, Livros, Palestrante e Subtenente da Polícia Militar do Estado do Tocantins.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS, Sérgio Nunnes. Eficácia horizontal dos direitos fundamentais: o particular como “vilão” e o Estado como guardião?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3990, 4 jun. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/29071. Acesso em: 20 abr. 2024.

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