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Natureza jurídica e aplicabilidade da súmula impeditiva de recurso de apelação

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4. Conclusão

A súmula impeditiva é o instituto que permite a rejeição, na origem, de recursos de apelação contra sentença que esteja em conformidade com súmulas do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça. Trata-se, em essência, de outorga anômala de competência ao magistrado de primeiro grau para o julgamento do mérito da apelação, quando este for pela improcedência do pleito recursal e na hipótese específica de ser a rediscussão da tese jurídica o fundamento exclusivo do apelo. Formalmente, porém, qualifica-se como pressuposto de admissibilidade recursal específico da apelação, sendo a decisão que não recebe o recurso por esse fundamento impugnável por agravo de instrumento ou agravo nos próprios autos, em aplicação analógica do art. 544, do CPC. É instituto incabível quando pretenda o recorrente a desconstituição da sentença por nulidade ou vício formal do ato ou do procedimento, quando tenha por fundamento distinguishing ou overruling em relação ao precedente invocado ou, ainda, quando haja divergência jurisprudencial no nível dos tribunais superiores. É exemplo significativo do “prestígio alcançado pelo direito jurisprudencial no sistema jurídico brasileiro, que cada vez mais empresta força e autoridade ao direito judicado.” (LIMA, 2013, p. 369) É demonstração inequívoca da importância do precedente judicial em ordenamento jurídico de base romano-germânica, a evidenciar, com inquestionável força retórica, a aproximação entre os sistemas de direito e a relevância que, por um imperativo de natureza prática, tem conferido um Estado de civil law ao precedente judicial.


NOTAS

[1] BRASIL, 1973, p. 1: “Art. 518. Interposta a apelação, o juiz, declarando os efeitos em que a recebe, mandará dar vista ao apelado para responder. (Redação dada pela Lei nº 8.950, de 13.12.1994) § 1o O juiz não receberá o recurso de apelação quando a sentença estiver em conformidade com súmula do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal. (Renumerado pela Lei nº 11.276, de 2006) § 2o Apresentada a resposta, é facultado ao juiz, em cinco dias, o reexame dos pressupostos de admissibilidade do recurso. (Incluído pela Lei nº 11.276, de 2006)”

[2] Ademais, tendo em vista as novas faculdades outorgadas ao relator no julgamento da apelação e do reexame necessário nos tribunais, em estando a sentença de acordo com súmula do STF ou STJ, é provável que seja negado seguimento à apelação por decisão monocrática de um membro da corte, o que reforça ainda mais a ideia de inutilidade do recurso nessas circunstâncias. É o que esclarecem Fredie Didier e Leonardo Carneiro da Cunha: “Quando há súmula de tribunal superior, é muito provável que o relator negue seguimento ao reexame necessário ou à apelação. Nesse caso, há apenas um exercício de inutilidade: o juiz autoriza o encaminhamento da apelação ou submete a sentença ao reexame necessário. O relator, valendo-se do que lhe autoriza o art. 557, do CPC, nega seguimento à apelação ou ao reexame necessário. Para evitar esse gasto inútil de tempo, o § 3º do art. 475 do CPC prevê que o juiz já pode dispensar o reexame necessário quando a sentença estiver fundada em súmula do tribunal superior. Ora, mantendo unidade e coerência sistemática, se o juiz pode dispensar o reexame necessário no caso de a sentença fundar-se em súmula de tribunal superior, cabe-lhe também não admitir o recurso de apelação, caso já haja súmula de tribunal superior a respeito do tema.” (DIDIER JÚNIOR; CUNHA, 2009, p. 130)

[3] Verifica-se, outrossim, pequena semelhança com o instituto contemporâneo do julgamento liminar de mérito sem citação, previsto no art. 285-A, do CPC, introduzido pela Lei n.º 11.276/2006. Nesse dispositivo, com fundamento em precedentes do juízo, autoriza-se o magistrado a não efetuar a citação do réu e proferir de imediato a sentença quando, em se tratando de questão exclusivamente de direito, o julgamento for pela improcedência do pedido. No caso da súmula impeditiva, autoriza-se o juiz de primeiro grau a decidir o mérito da apelação quando, sendo o objeto do recurso, exclusivamente, a rediscussão de tese jurídica já fixada em súmula do STF ou STJ, o julgamento for pela improcedência da demanda recursal (BRASIL, 1973, p. 1). Como se vê, em ambos os institutos permite o legislador que se proceda a um julgamento sumário de improcedência da demanda originária ou recursal quando presentes elementos que autorizem crer ser inócuo o prosseguimento do feito, ante a incompatibilidade dos argumentos da parte com o entendimento jurisprudencial consolidado.

[4] BRASIL, 1973, p. 1: “Art. 544. Não admitido o recurso extraordinário ou o recurso especial, caberá agravo nos próprios autos, no prazo de 10 (dez) dias. (Redação dada pela Lei nº 12.322, de 2010)§ 1o  O agravante deverá interpor um agravo para cada recurso não admitido. (Redação dada pela Lei nº 12.322, de 2010) § 2o A petição de agravo será dirigida à presidência do tribunal de origem, não dependendo do pagamento de custas e despesas postais. O agravado será intimado, de imediato, para no prazo de 10 (dez) dias oferecer resposta, podendo instruí-la com cópias das peças que entender conveniente. Em seguida, subirá o agravo ao tribunal superior, onde será processado na forma regimental. (Redação dada pela Lei nº 10.352, de 26.12.2001) § 3o  O agravado será intimado, de imediato, para no prazo de 10 (dez) dias oferecer resposta. Em seguida, os autos serão remetidos à superior instância, observando-se o disposto no art. 543 deste Código e, no que couber, na Lei no 11.672, de 8 de maio de 2008. (Redação dada pela Lei nº 12.322, de 2010) § 4o  No Supremo Tribunal Federal e no Superior Tribunal de Justiça, o julgamento do agravo obedecerá ao disposto no respectivo regimento interno, podendo o relator:  (Redação dada pela Lei nº 12.322, de 2010) I - não conhecer do agravo manifestamente inadmissível ou que não tenha atacado especificamente os fundamentos da decisão agravada; (incluído pela Lei nº 12.322, de 2010) II - conhecer do agravo para: (incluído pela Lei nº 12.322, de 2010) a) negar-lhe provimento, se correta a decisão que não admitiu o recurso; (incluído pela Lei nº 12.322, de 2010) b) negar seguimento ao recurso manifestamente inadmissível, prejudicado ou em confronto com súmula ou jurisprudência dominante no tribunal; (incluído pela Lei nº 12.322, de 2010)  c) dar provimento ao recurso, se o acórdão recorrido estiver em confronto com súmula ou jurisprudência dominante no tribunal. (incluído pela Lei nº 12.322, de 2010)” Como se vê, no julgamento do agravo nos próprios autos,pode o relator, conhecendo do agravo, dar provimento ao recurso que se pretendeu destrancar com o agravo. A sugestão da Ministra Nancy Andrighi, pois, é a de que, em aplicação analógica desse dispositivo, possa o tribunal admitir agravo nos próprios autos da decisão de primeiro grau que aplica a súmula impeditiva de recursos e, chegando o feito à segunda instância, o relator, identificando equívoco do magistrado a quo, venha a conhecer do agravo para dar provimento à própria apelação.

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REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei n.º 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5869compilada.htm>. Acesso em: 17 abr. 2013.

DIDIER JÚNIOR, Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Curso de direito processual civil: meios de impugnação às decisões judiciais e processo nos tribunais. 7. ed. Salvador: JusPodium, 2009.

LIMA, Tiago Asfor Rocha. Precedentes judiciais civis no Brasil. São Paulo: Saraiva, 2013.

MARINONI, Luiz Guilherme. Precedentes obrigatórios. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013.

NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil. 5. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2013. 

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Sobre o autor
Cláudio Ricardo Silva Lima Júnior

Especialista em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC/MG). Bacharel em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco e pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) - dupla diplomação. Ex-Assessor da Justiça Federal de Primeira Instância na 5ª Região. Ex-Assessor do Ministério Público Federal na 1ª Região. Atualmente, é Oficial de Justiça do Tribunal Regional Federal da 5ª Região.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA JÚNIOR, Cláudio Ricardo Silva. Natureza jurídica e aplicabilidade da súmula impeditiva de recurso de apelação. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4106, 28 set. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/30177. Acesso em: 2 mai. 2024.

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