Defesa do meio ambiente e licitação pública

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A tutela do meio ambiente, como bem de uso comum do povo, é medida indispensável à continuidade da vida. O art. 225 da Constituição Federal impõe ao poder público e à coletividade o dever de preservá-lo.

Defesa do meio ambiente e licitação pública         

 

A tutela do meio ambiente, como bem de uso comum do povo, é medida indispensável à continuidade da vida. O art. 225 da Constituição Federal impõe ao poder público e à coletividade o dever de preservá-lo.

“Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.”

            As medidas que limitam o uso excessivo dos bens sem reposição se tornam, hoje, instrumento assecuratório da própria vida.

            A defesa do meio ambiente é feita pela criação de normas de tutela, bem como pela execução de atividade material que garanta a eficácia de referias normas.

            Em vista da necessidade de consumo de bens pela Administração Pública, para a execução dos serviços públicos, faz-se necessária a publicação de regras que estimule os empresários a produzirem e circularem produtos que preenchem os requisitos de sustentabilidade ambiental.

            A própria Constituição Federal, além de exigir do Poder Público assegurar a efetividade desse direito, exige o estudo prévio de impacto ambiental para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente. Devem fazer parte dos pressupostos da contratação administrativa, as regras de prevenção ao meio ambiente. Por isso, contemplado e exigido hodiernamente nos editais licitatórios que visam a aquisição de bens ou prestação de serviços que possam causar alguma degradação ao meio ambiente.

            O poder público é quem detém a competência legislativa. Todas as regras de preservação e repressão aos atos que causam ou possam causar alguma lesão ao bem jurídico meio ambiente devem ser postas pela entidade política competente. Indaga-se: são possíveis exigências editalícias que não estejam contempladas em lei? Não. Ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude de lei (inciso II do art. 5º da CF/88).

            Como ressaltado pela Lei Fundamental, somente na forma da lei poderá ser exigida o estudo prévio do impacto ambiental. Estendem-se às demais regras que contemplem determinações e exigências outras às pessoas físicas e jurídicas.

            Cabe ao poder público, por meio de lei, o controle da produção, comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente.

As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

            Umas das medidas constitucionais postas ao cidadão é a denominada “ação popular”. As pessoas jurídicas não possuem legitimidade para a impetração, tendo em vista ser restrita aos cidadãos, pessoas físicas.  Na forma do inciso LXXIII do art. 5º da Constituição Federal,  qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência.

            A ação popular é instrumento perfeitamente aplicável às licitações e contratações que direta ou indiretamente lesam o patrimônio público, a moralidade administrativa e o meio ambiente.

É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios,  proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição; proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico;   responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;

Por fim, a ordem econômica é fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, e tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observado, entre outros, o seguinte princípios: defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação.

No que se refere à aplicabilidade dessas regras às licitações e contratações públicas, o art. 3º da Lei nº 8.666/93 estabelece que “a licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos.”   

Como veremos, a proposta mais vantajosa é a que atenda ao interesse público, e o interesse público é aquele que atenda à coletividade e a Administração Pública harmonicamente. Não há como dissociar a preservação do meio ambiente com o interesse público, assim como as regras relativas à função social dos institutos.  

A Instrução Normativa nº 01/2010 do Ministério do Planejamento que esmiúça as regras licitatórias para um meio ambiente sustentável, tem por base legal hierárquica o art. 3º da Lei nº 8.666/93.

Assim, as especificações para a aquisição de bens, contratação de serviços e obras por parte dos órgãos e entidades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional deverão conter critérios de sustentabilidade ambiental, considerando processos de extração, fabricação, utilização e descarte dos produtos e matérias primas.

As regras dessa IN nº 01/2010 aplica-se à formalização, renovação, aditamento de convênios ou instrumentos congêneres, ou ainda de contratos de financiamento com recursos da União.

Os interessados devem observar nos atos convocatórios as regras referentes à entrada de materiais, processos de produção, entrega, transporte, uso e descarte. Essas matérias devem ser necessariamente tratadas quando se estiver diante de licitação que vise a contração de serviços e/ou aquisição de produtos que causam ou potencialmente possam causar degradação ambiental.

O instrumento convocatório (edital) deverá formular as exigências de natureza ambiental de forma a não frustrar a competitividade. Nem todas as empresas possuem base tecnológica que atenda as regras ambientais de forma instantânea, sendo indispensável a adequação gradual às regras. A Administração somente poderá exigir algo somente após a obrigatoriedade legal e, mesmo assim, entendemos que deva viabilizar a adequação pelas empresas. Somente após o enquadramento dos empresários às regras legais será possível a exigência editalícia.

Seriam inócuas as exigências que não são substancialmente observadas pela maioria dos concorrentes. Ter-se-ia nítida restrição da competitividade.

Nas licitações que utilizam como critério de julgamento o tipo melhor técnica ou técnica e preço, deverão ser estabelecidos no edital critérios objetivos de sustentabilidade ambiental para a avaliação e classificação das propostas (art. 3º da Instrução Normativa nº 01/2010).

Não olvidamos que nos projetos básicos e projetos executivos de obras e serviços serão consideradas a possibilidade de emprego de mão-de-obra, materiais, tecnologia e matérias-primas existentes no local para execução, conservação e operação (inciso IV do art. 12 da Lei nº 8.666/93).

As especificações e demais exigências do projeto básico ou executivo, para contratação de obras e serviços de engenharia, devem ser elaborados visando à economia da manutenção e operacionalização da edificação, a redução do consumo de energia e água, bem como a utilização de tecnologias e materiais que reduzam o impacto ambiental.

Opinativamente, quando há regras que impõe a observância de regras básicas de sustentabilidade que possam ser por todas as empresas observadas, as interessadas podem exigir da Administração Pública que constem referidas regras nos atos convocatórios. A idéia é de que, as empresas que ainda não se enquadraram possuirão maiores condições de baixar os preços, diante a ausência de custos para a implantação de políticas de sustentabilidade ambiental.

Os critérios exemplificativos de sustentabilidade que poderão constar no termo de referência, projeto básico e/ou projeto executivo são: I – uso de equipamentos de climatização mecânica, ou de novas tecnologias de resfriamento do ar, que utilizem energia elétrica, apenas nos ambientes aonde for indispensável; II – automação da iluminação do prédio, projeto de iluminação, interruptores, iluminação ambiental, iluminação tarefa, uso de sensores de presença; III – uso exclusivo de lâmpadas fluorescentes compactas ou tubulares de alto rendimento e de luminárias eficientes; IV – energia solar, ou outra energia limpa para aquecimento de água; V – sistema de medição individualizado de consumo de água e energia; VI – sistema de reuso de água e de tratamento de efluentes gerados; VII – aproveitamento da água da chuva, agregando ao sistema hidráulico elementos que possibilitem a captação, transporte, armazenamento e seu aproveitamento; VIII – utilização de materiais que sejam reciclados, reutilizados e biodegradáveis, e que reduzam a necessidade de manutenção; e IX – comprovação da origem da madeira a ser utilizada na execução da obra ou serviço.

Deve ser priorizado o emprego de mão-de-obra, materiais, tecnologias e matérias-primas de origem local para execução, conservação e operação das obras públicas.

Ainda nos termos da referida IN, os órgãos e entidades da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional, quando da aquisição de bens, poderão exigir os seguintes critérios de sustentabilidade ambiental: I – que os bens sejam constituídos, no todo ou em parte, por material reciclado, atóxico, biodegradável, conforme ABNT NBR – 15448-1 e 15448-2; II – que sejam observados os requisitos ambientais para a obtenção de certificação do Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial – INMETRO como produtos sustentáveis ou de menor impacto ambiental em relação aos seus similares; III – que os bens devam ser, preferencialmente, acondicionados em embalagem individual adequada, com o menor volume possível, que utilize materiais recicláveis, de forma a garantir a máxima proteção durante o transporte e o armazenamento; e IV – que os bens não contenham substâncias perigosas em concentração acima da recomendada na diretiva RoHS (Restriction of Certain Hazardous Substances), tais como mercúrio (Hg), chumbo (Pb), cromo hexavalente (Cr(VI)), cádmio (Cd), bifenil-polibromados (PBBs), éteres difenil-polibromados (PBDEs).

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             O edital poderá estabelecer que, selecionada a proposta, antes da assinatura do contrato, em caso de inexistência de certificação que ateste a adequação, o órgão ou entidade contratante poderá realizar diligências para verificar a adequação do produto às exigências do ato convocatório, correndo as despesas por conta da licitante selecionada (art. 5º). O edital ainda deve prever que, caso não se confirme a adequação do produto, a proposta selecionada será desclassificada.

Os editais, ainda, para a contratação de serviços deverão prever que as empresas contratadas adotarão as seguintes práticas de sustentabilidade na execução dos serviços, quando couber: I – use produtos de limpeza e conservação de superfícies e objetos inanimados que obedeçam às classificações e especificações determinadas pela ANVISA; II – adote medidas para evitar o desperdício de água tratada, conforme instituído no Decreto nº 48.138, de 8 de outubro de 2003; III – Observe a Resolução CONAMA nº 20, de 7 de dezembro de 1994, quanto aos equipamentos de limpeza que gerem ruído no seu funcionamento; IV – forneça aos empregados os equipamentos de segurança que se fizerem necessários, para a execução de serviços; V - realize um programa interno de treinamento de seus empregados, nos três primeiros meses de execução contratual, para redução de consumo de energia elétrica, de consumo de água e redução de produção de resíduos sólidos, observadas as normas ambientais vigentes; VI - realize a separação dos resíduos recicláveis descartados pelos órgãos e entidades da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional, na fonte geradora, e a sua destinação às associações e cooperativas dos catadores de materiais recicláveis, que será procedida pela coleta seletiva do papel para reciclagem, quando couber, nos termos da IN/MARE nº 6, de 3 de novembro de 1995 e do Decreto nº 5.940, de 25 de outubro de 2006; VII – respeite as Normas Brasileiras – NBR publicadas pela Associação Brasileira de Normas Técnicas sobre resíduos sólidos; e VIII – preveja a destinação ambiental adequada das pilhas e baterias usadas ou inservíveis, segundo disposto na Resolução CONAMA nº 257, de 30 de junho de 1999 (art. 6º da IN 01/2010).

O parágrafo único do art. 6º da Instrução Normativa nº 01/2010, deve ser interpretado com extrema cautela, tendo em vista o princípio da legalidade do art. 37 e do inciso II do art. 5º da Constituição Federal. Estabelecer que o disposto no art. 6º  não impede que os órgãos ou entidades contratantes estabeleçam, nos editais e contratos, a exigência de observância de outras práticas de sustentabilidade ambiental, desde que justificadamente, poderá ensejar quebra do princípios da legalidade, estabelecendo exigências não contempladas em lei. Portanto, as exigências devem estar em consonância com a lei, pois ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer, senão em virtude de lei.

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Sobre o autor
David Augusto Souza Lopes Frota

DAVID AUGUSTO SOUZA LOPES FROTA Advogado. Servidor Público Federal. Pós-graduado em Direito Tributário. Pós-graduado em Direito Processual. Especialista em Direito Administrativo. Especialista em Licitações Públicas. Especialista em Servidores Públicos. Foi analista da Diretoria de Reconhecimento Inicial de Direitos – INSS – Direito Previdenciário. Foi analista da Corregedoria Geral do INSS – assessoria jurídica e elaboração de pareceres em Processos Administrativos Disciplinares - PAD. Foi Analista da Diretoria de Recursos Humanos do INSS - Assessor Jurídico da Coordenação de Recursos Humanos do Ministério da Previdência Social – Lei nº 8.112/90. Chefe do Setor de Fraudes Previdenciárias – Inteligência previdenciária em parceria com o Departamento de Polícia Federal. Ex-membro do ENCCLA - Estratégia Nacional de Combate a Corrupção e à Lavagem de Dinheiro do Ministério da Justiça. Convidado para ser Conselheiro do Conselho de Recursos da Previdência Social - CRPS. Convidados para atuação junto ao Grupo Responsável pela Consolidação dos Decretos Federais da Presidência da República. Assessor da Coordenação Geral de Recursos Logísticos e Serviços Gerais do MPS - COGRL. Elaboração de Minutas de Contratos Administrativos. Elaboração de Termos de Referência. Pregoeiro. Equipe de Apoio. Análise das demandas de controle interno e externo do MPS. Análise das demandas de Controle Interno e Externo do Ministério da Fazenda - SPOA. Assessor da Coordenação Geral do Logística do Ministério da Fazenda - CGLOG – SPOA. Assessor da Superintendência do Ministério da Fazenda no Distrito Federal - SMF-DF. Membro Titular de Conselho na Secretaria de Direitos Humanos para julgamento de Processos. SEDH. Curso de Inteligência na Agência Brasileira de Inteligência - ABIN. Consultoria e Advocacia para prefeitos e demais agentes políticos. Colaborador das Revistas Zênite, Governet, Síntese Jurídica, Plenus. Coautor de 3 livros intitulados "O DEVIDO PROCESSO LICITATÓRIO" tecido em 3 volumes pela editora Lumen Juris.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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