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Definição do sujeito ativo do ICMS Importação. Afinal, para qual Estado deve ser recolhido o imposto?

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05/08/2014 às 12:39
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CONCLUSÕES

Em vista do exposto, conclui-se que:

De acordo com o art. 155, § 2º, IX, “a”, da Constituição Federal, o ICMS Importação deve caber ao Estado onde estiver localizado o destinatário jurídico da mercadoria, ou seja, a pessoa física ou jurídica que efetivamente realizou a “operação” de “circulação” de “bem” ou “mercadoria”.

O papel da lei complementar tributária, nos termos do art. 146 da Constituição Federal é de, precipuamente, dispor sobre conflitos de competência, regular as limitações constitucionais ao poder de tributar e estabelecer normas gerais em matéria tributária. Porém, não cabe à lei complementar inovar o sistema jurídico, alterando as regras matrizes de incidência possíveis impostas constitucionalmente.

A norma infraconstitucional de natureza complementar que norteia a instituição e exigência do ICMS Importação pelos Estados e pelo Distrito Federal é a Lei Complementar 87/96.

A Lei Complementar 87/96, ao definir o sujeito ativo do ICMS Importação (art. 11, I, “d”), previu que o local da operação ou da prestação, para os efeitos da cobrança do imposto e definição do estabelecimento responsável, é, tratando-se de mercadoria ou bem importado do exterior, o do estabelecimento onde ocorrer a entrada física.

Na medida em que o sujeito ativo do ICMS Importação definido constitucionalmente é o Estado no qual esteja estabelecido aquele que realiza a operação relativa à circulação de bens importados do exterior, a prescrição contida no art. 11, I, “d”, da Lei Complementar 87/96, se interpretada literalmente, é inconstitucional por vincular o pagamento do imposto para Estado onde não esteja estabelecido o contribuinte do imposto.

Para a interpretação do art. 11, I, “d” da Lei Complementar 87/96 de acordo com o norte constitucional, é essencial que, sob os desígnios do art. 110 do CTN, analise-se a definição dos conceitos de “pessoa jurídica” ou “sociedade comercial”, “empresa” e “estabelecimento”, concluindo-se, pois que, quem celebra os negócios jurídicos é a pessoa jurídica ou sociedade comercial, sendo o estabelecimento apenas o complexo de bens organizados, para o exercício da empresa (atividade empresarial).

A prescrição contida no art. 11, I, “d”, da Lei Complementar 87/96 é constitucional desde que a norma dela extraída seja a de que o ICMS Importação é devido ao Estado no qual se der a entrada física da mercadoria, nos casos em que a pessoa jurídica que realizou a operação de circulação de mercadoria, possuir estabelecimentos localizados em Estados distintos da Federação, e fizer o bem importado circular fisicamente por um estabelecimento específico, tratando-se de regra de exceção. Neste caso, e somente neste caso, o ICMS Importação caberá ao Estado no qual se der entrada física no estabelecimento da pessoa jurídica, não cabendo a análise, pois conceitualmente equivocada, de qual estabelecimento realizou o negócio, já que, repita-se, quem realiza a operação é a “pessoa jurídica” e não o “estabelecimento”.

Mantém-se intacta, pois, a regra geral segundo a qual o ICMS Importação é devido ao Estado no qual estiver estabelecida a pessoa jurídica que realizar a operação relativa à circulação de bem importado do exterior.


Notas

[1] ATALIBA, Geraldo; GIARDINO, Cleber. Núcleo da definição constitucional do ICM (Operações, circulação e saída). Revista de Direito Tributário, São Paulo, v.  25-26, p. 104, 1983.

[2] ATALIBA, Geraldo; GIARDINO, Cleber. Núcleo da definição constitucional do ICM (Operações, circulação e saída). Revista de Direito Tributário, São Paulo, v. 25-26, p. 104, 1983.

[3] MELO, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática. 7. ed. São Paulo: Dialética, 2004, p. 11.

[4] Ibidem, p. 105

[5] ATALIBA, Geraldo; GIARDINO, Cleber. Núcleo da definição constitucional do ICM (operações, circulação e saída). Revista de Direito Tributário, São Paulo, v. 25-26, p. 111, 1983.

[6] SALOMÃO, Marcelo Viana. ICMS na importação. 2. ed. São Paulo: Editora Atlas, 2001, p. 33.

[7] MELO, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática. 7. ed. São Paulo: Dialética, 2004, p. 16.

[8] Ao analisar o preceito veiculado no art. 155, § 2º, IX, “a”, da Constituição Federal, o Ministro Relator Eros Grau faz a seguinte digressão:

“8. No mínimo duas leituras poderiam ser feitas desse texto, a primeira delas conduzindo à equivocada suposição de que:

qualquer entrada de bem ou mercadoria importadas do exterior por pessoa física ou jurídica, ainda que não seja contribuinte habitual do imposto, qualquer que seja a sua finalidade sofrerá a incidência do ICMS.

9. Da segunda leitura, adequada à compreensão do todo normativo que o artigo 155 e seus parágrafos integram – vale dizer, mais do que mera leitura, interpretação do seu texto – extrair-se-á a seguinte norma:

qualquer entrada de bem ou mercadoria importadas do exterior – desde que atinente a operação relativa à circulação desse mesmo bem ou mercadoria – por pessoa física ou jurídica, ainda que não seja contribuinte habitual do imposto, qualquer que seja a sua finalidade sofrerá a incidência do ICMS.

10. O imposto não é sobre a entrada de bem ou mercadoria importada, senão sobre entradas desde que elas sejam atinentes a operações relativas à circulação desses mesmos bens e mercadorias.

11. Digo-o em outros termos: o inciso IX, alínea a, do § 2º do art. 155 da Constituição do Brasil não instituiu um imposto sobre a entrada de bem ou mercadoria importadas do exterior por pessoa física ou jurídica.

12. O que faz é simplesmente estabelecer que, desde que atinente a operação relativa a sua circulação, a entrada de bem ou mercadoria importadas do exterior por pessoa física ou jurídica sofrerá a incidência do ICMS.”

[9] ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. 6. ed. 2. tir. São Paulo: Malheiros Editores, 2001, p. 26.

[10] CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 13. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 234.

[11] Ibidem, p. 236/237.

[12] CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 13. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 251/252.

[13] SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 24 ed. rev. e atual. Nagib Slaibi Filho e Gláucia Carvalho. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p 708.

[14] DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico. Volume 2. D-I. São Paulo: Editora Saraiva, 1998, p. 776.

[15] CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 13. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 237.

[16] Ibidem, p. 258/259.

[17] ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. 6. ed. 2. tir. São Paulo: Malheiros Editores, 2001, p. 108.

[18] CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. 11. ed. rev. e ampl. São Paulo: Malheiros Editora, 2003, p. 33/34.

[19] Essa é também a conclusão de MISABEL ABREU MACHADO DERZI (In: Baleeiro, Aliomar. Direito tributário brasileiro. Atualizada por Misabel Abreu Machado Derzi. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 372): “A Lei Complementar nº 87, de 13.09.1996, foi editada exatamente em cumprimento desses ditames constitucionais, aqueles genéricos do art. 146 e aqueles específicos, constantes do art. 155”.

[20] A importação por encomenda, apesar de há muito realizada na prática, passou a ser expressamente prevista no art. 32, parágrafo único, alínea “d”, do Decreto-Lei 37/66 por intermédio da redação que lhe foi dada pelo art. 12 da Lei 11.281/2006, tal como segue:

“Art . 32. É responsável pelo imposto: (...)

Parágrafo único. É responsável solidário: (...)

c) o adquirente de mercadoria de procedência estrangeira, no caso de importação realizada por sua conta e ordem, por intermédio de pessoa jurídica importadora;

d) o encomendante predeterminado que adquire mercadoria de procedência estrangeira de pessoa jurídica importadora.”

[21] Esta modalidade de importação é prevista no arts. 32 do Decreto-Lei 37/66, já transcrito na nota 106.

[22] O elenco das circunstâncias que atraem a dúvida a respeito do local do recolhimento do imposto foi efetivado por vários estudiosos da matéria: CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. 11. ed. rev. e ampl. São Paulo: Malheiros Editora, 2006, p. 64/65; MELO, José Eduardo Soares de. A importação no direito tributário: impostos, taxas e contribuições. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 120/122; LIMA, João Frazão de Medeiros. Os sujeitos passivo e ativo do ICMS nas operações de Importação (quem paga a quem?). Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo, v. 77, p. 57-67, 2002.

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[23] Referido artigo anterior (art. 19) versa sobre a não cumulatividade do ICMS. Veja-se:

“Art. 19. O imposto é não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou por outro Estado”.

[24] ATALIBA, Geraldo; GIARDINO, Cleber. ICMS – Autonomia dos estabelecimentos. Operação mercantil – Impossibilidade de negócio consigo mesmo – não há circulação dentro de uma pessoa jurídica. Revista de Direito Tributário, São Paulo, v. 43, p. 231, 1988.

[25] CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 11. edição. São Paulo: Malheiros Editores, 2006, p. 337.

[26] No caso de a mercadoria entrar no país por intermédio de repartição aduaneira não localizada no Estado onde esteja estabelecido o contribuinte do imposto, o ICMS Importação deverá ser recolhido por intermédio de Guia Nacional de Recolhimento de Tributos Estaduais, nos termos do art. 88 do Convênio ICM Confaz 6, de 21/2/1989.

[27] Vide Resolução 13/2012, do Senado Federal

[28] ATALIBA, Geraldo; GIARDINO, Cleber. Núcleo da definição constitucional do ICM. Revista de Direito Tributário, São Paulo, v. 25-26, p. 101, 1983.

[29] COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. v 1. 11. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 63/64.

[30] REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial. 1º v. 18. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 1988, p. 58.

[31] COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. v. 1. 11. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 96.

[32] SOUSA, Rubens Gomes de. Compêndio de legislação tributária. São Paulo, 1981, p. 62.

[33] Essa mesma conclusão foi a adotada pelo Ministro Marco Aurélio, em voto vista proferido no julgamento do RE 299.079-5/RJ, julgado em 30/6/2004 e publicado em 16/6/2006.

[34] A descrição dos fatos foi realizada pelo Ministro Relator Carlos Britto:

 “(...) Empresa sediada no Estado de Pernambuco realizou a importação de álcool anidrido – produto isento do referido imposto naquela localidade – para vendê-lo à Petrobrás, com sede no Estado do Rio de Janeiro. Porém, visando à economia e praticidade, preferiu que a mercadoria fosse entregue, diretamente, à Petrobrás de Duque de Caxias (RJ), local onde ocorreu o desembaraço aduaneiro”.

[35] Referido texto extraído do Relatório do Ministro Supúlveda Pertence, nos autos do Ag. Reg. no Recurso Extraordinário 396.859-9/RJ, e é transcrição do acórdão proferido no REsp 282262, em 6/11/2001 e publicado em 4/2/2002, cujo relator foi Ministro Francisco Falcão.

[36] Dita referido dispositivo constitucional:

“Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:

I - processar e julgar, originariamente:

f) as causas e os conflitos entre a União e os Estados, a União e o Distrito Federal, ou entre uns e outros, inclusive as respectivas entidades da administração indireta;”

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Sobre a autora
Valéria Zotelli

Advogada. Sócia do Escritório Miguel Neto Advogados. Bacharel em Direito pela Universidade de São Paulo - USP. Mestre em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC-SP. Doutorando em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC-SP. especialização em Direito Processual Civil pelo Centro de Extensão Universitária, em Direito Empresarial pela Universidade Mackenzie, em Direito Tributário pela Coordenadoria Geral de Especialização, Aperfeiçoamento e Extensão - COGEAE da PUC-SP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ZOTELLI, Valéria. Definição do sujeito ativo do ICMS Importação. Afinal, para qual Estado deve ser recolhido o imposto?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4052, 5 ago. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/30555. Acesso em: 23 abr. 2024.

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