I – INTRODUÇÃO
A interação entre a teoria econômica e o direito, embora essencial, ainda é pouco explorada no Brasil. Tal deficiência decorre, em grande parte, da formação dos economistas e dos advogados em suas graduações. O desconhecimento mútuo e a falta de linguagem comum entre economistas e advogados podem ser extremamente nocivos ao desenvolvimento dos negócios.
O precário diálogo entre as duas profissões já causaria problemas mesmo em economias simples, com restritos mercados financeiros e de capitais, com serviços públicos controlados pelo governo e fechadas ao comércio internacional e aos investimentos estrangeiros. Porém, em uma realidade de mercados financeiros de capitais cada vez mais complexos em número e densidade de instrumentos e operações, questões multidisciplinares emergem a todo momento.
Nesse passo, os profissionais envolvidos nestas transações precisam caminhar com segurança em áreas não devidamente exploradas durante suas vidas acadêmicas.
Considerando que o mercado seja uma estrutura de formação de valores, em que seus indivíduos buscam atender seus interesses específicos, o Direito é a única forma de capitanear estas relações. Com a globalização, a concentração econômica das empresas torna-se uma exigência inevitável na restruturação dos mercados, com vigorosos impactos na otimização do capital e na estrutura das empresas modernas.
Desta forma, falar da importância das aquisições na estratégia das empresas é lugar comum. O que se tem presenciado é a ocorrência crescente de transações, muitas com valores astronômicos e também inúmeras outras pequenas, que não chamam a atenção nos noticiários, mas que, silenciosamente, ajudam a transformar o cenário do mundo dos negócios.
Não obstante, o presente estudo tem por objetivo abordar questões multidisciplinares relacionadas ao papel das aquisições na dinâmica de mercado, bem como uma análise dos fatores preponderantes para as avaliações e decisões de investimento.
II – DAS AQUISIÇÕES ENQUANTO PARTE DA ESTRATÉGIA
A vida das empresas é permeada por inúmeros questionamentos. Por maior que seja, capitalizada e tecnologicamente avançada, a empresa precisa fazer algo de uma maneira que outros não conseguem fazer. Essa diferenciação pode ocorrer tanto pela entrega de um benefício único, quanto pela entrega de um mesmo benefício que suas concorrentes, mas custando menos.
Nesse sentido, as empresas precisam vencer a chamada Fronteira de Eficiência¹, termo este esculpido e consagrado pelo eminente professor da Harvard Business School, Michael Porter. Isso significa que, assim como seus melhores competidores, a empresa é capaz de extrair o máximo de seu investimento, dentro do que a tecnologia atual permita, voltada para sempre produzir o máximo pelo que custa. Sendo assim, se não estiver na fronteira, seu problema não será de estratégia, mas, sim, de eficiência.
Isto posto, é possível mensurar o desafio dobrado gerado pela competição entre as empresas: (a) a corrida incessante para estar na fronteira; e (b) a busca por algo que os outros não fazem, que o cliente valoriza e que é difícil de se imitar.
Nesse passo, a aquisição, ou venda, pode ser a melhor alternativa para que uma empresa esteja na Fronteira de Eficiência e possa tornar única sua posição.
III – DA MOTIVAÇÃO ESTRATÉGICA
É trabalho recorrente de estudiosos e pesquisadores do tema enumerar e estruturar, à procura de coincidências, um padrão de comportamento ao se analisar um conjunto de operações realizadas em um determinado período de tempo. Entretanto, tais estudos são recheados de subjetividade, em virtude da infinidade de elementos que impactam a tomada de decisão pela aquisição ou pela venda, o que demanda estudo das especificidades de cada negócio.
De qualquer forma, importante se torna abordar algumas das motivações mais frequentemente encontradas nestas transações, seja de forma isolada ou combinada, a saber: i) economias de escala e escopo; ii) concentração de poder de mercado; iii) vencer, ou erigir, barreiras à entrada; iv) reduzir a competição (redução de capacidade); v) substituição de pesquisa e desenvolvimento; e vi) diversificação.
Economias de escala e escopo: ocorre por meio da diluição de custos fixos. Se uma parcela significativa dos custos de uma empresa é fixa, então o aumento da produção fará com que o custo unitário caia. Por sua vez, a economia de escopo diz respeito à redução de custo causada pelo aumento na variedade de produtos e serviços que uma empresa produz, através do uso comum de algum recurso.
Concentração de poder de mercado: capacidade de impor aos clientes um preço mais alto ou aos fornecedores um preço mais baixo do que seria possível em um mercado altamente competitivo, seja através de uma posição dominante em tamanho ou relacionado ao monopólio sobre um recurso.
Vencer, ou erigir, barreiras à entrada: costumam estar associadas a uma atratividade mais alta da indústria, pelo simples fato de restringirem o número de competidores. Assim, aqueles que conseguem vencê-las habilitam-se a participar de um mercado mais lucrativo. Da mesma forma, aquelas que consegueem erigir barreiras à entrada, garantem para si maior lucro.
Reduzir a competição (redução de capacidade): a presença de capacidade ociosa incentiva os competidores a sacrificar preço tentando aumentar sua capacidade, com perdas para todas as empresas. Na chamada “Teoria dos Jogos”, essa é uma situação denominada “dilema do prisioneiro”. Trata-se de uma situação em que o jogador já pode antever que uma determinada ação o colocará, ao final do processo, em uma situação pior que a inicial. Contudo, mesmo que não a adote, os outros jogadores o farão e neste caso sua situação ficará ainda pior.
Substituição de pesquisa e desenvolvimento: vista como estratégia, a aquisição como substituição à pesquisa e desenvolvimento traz a redução de custo e um ganho na velocidade de desenvolvimento, mas com uma contrapartida. Ao optar por esse caminho a empresa corre sempre o risco de desqualificar-se para o desenvolvimento futuro, tornando-se dependente da procura de novos alvos de aquisição.
Diversificação: sem dúvida alguma, o mais controverso motivo para as aquisições. A teoria das finanças não nega o benefício da diversificação, contudo esta mesma teoria diz que a empresa que diversifica seus negócios não cria valor para o acionista, pois ele poderia fazer esta diversificação por si só. Surge, portanto, a questão se a diversificação cria ou não valor, uma vez que a possiblidade de uma mesma empresa oferecer unidades de negócio distintos não seria atrativa para o investidor que pode, por si próprio, diversificar seus investimentos com muito mais facilidade. Porém, dois professores indianos radicados nos Estados Unidos, Tarun Khanna e Krishna Palepu, discordam desta regra, no sentido de que em mercados emergentes, como o Brasil, há situações que justificam a diversificação não relacionada, ou seja, adquirir empresas com atividades independentes².
IV – AVALIAÇÃO E DECISÕES DE INVESTIMENTO
Um ativo é definido como sendo um gerador de benefícios futuros para o seu detentor. Sendo tais benefícios futuros medidos monetariamente, pode-se ter um critério de decisão para optar pela aquisição de um ativo, que é estabelecer um valor para a negociação tal que o quanto se espera agregar de benefícios com a sua posse supere o valor da negociação. Os benefícios futuros são traduzidos em capitais a serem recebidos durante todo o período de posse sobre o ativo.
Mais do que determinar o valor, deve-se ressaltar que o processo que levou os avaliadores a determinarem as expectativas adotadas sobre o futuro do negócio avaliado é o mais importante. Pode-se dizer que avaliar um ativo é projetar uma decisão no campo virtual para permitir que os administradores a tornem realidade.
Consideradas as inúmeras possibilidades de objetivos e alternativas, a determinação de valor é carregada de subjetividade, sendo dependente do processo de escolha das alternativas, bem como da formação de opinião sobre as expectativas criadas.
Nesse passo, destaca-se a importância da adoção de margem de erro possível para os resultados encontrados. Sendo que os valores prováveis se situam em um intervalo em que qualquer um deles é viável para a negociação. Não obstante, deve-se apresentar justificativa pormenorizada das considerações adotadas na avaliação, de forma que permita o questionamento do valor apurado de forma consistente.
V – DA AVALIAÇÃO DE RESULTADO E DESEMPENHO DAS EMPRESAS
A avaliação de resultados está ligada a mensuração da margem de contribuição gerada pelos produtos. Por sua vez, a avaliação de desempenho tem como objeto a segmentação de uma empresa em unidades administrativas. Esta diferenciação é importantíssima uma vez que um resultado positivo pode mascarar problemas de eficiência e desempenho das empresas.
Os sistemas de avaliação de desempenho devem induzir nos processos empresariais seus objetivos e estratégias, constituindo um elo entre os objetivos e a execução prática das atividades nas empresas, refletindo sua viabilidade econômico-financeira.
VI – INDICADORES DE RENTABILIDADE
Existem diversas medições de rentabilidade. Essas medições permitem ao analista avaliar os lucros da empresa em relação a certo nível de vendas, a certo nível de ativos ou ao volume de capital investido pelos proprietários. Nesse passo, alguns destes indicadores devem ser apresentados, a saber:
Margem de lucro bruto: o quanto de cada unidade monetária de vendas resta após o pagamento do custo da mercadoria vendida;
Margem de lucro líquido: representa a proporção de cada unidade monetária de receita de vendas restante após a dedução de todos os custos e despesas, incluindo juros, impostos e dividendos de ações preferenciais;
Lucro por ação: representa o número de unidades monetárias de lucro gerado para cada ação ordinária emitida.
Os índices de rentabilidade envolvem, também, as relações entre o retorno auferido pela empresa quando comparado ao ativo (Return on Assets – ROA), ao patrimônio líquido (Return on Equity – ROE) ou, ainda, sobre o investimento (Return on Investiment – ROI). O retorno sobre ativo (ROA) apresenta o retorno produzido pelo total das aplicações realizadas por uma empresa por seus ativos, o retorno sobre o patrimônio líquido (ROE) apresenta a porcentagem de retorno do lucro sobre os recursos aplicados e, por fim, o retorno sobre investimento (ROI) apresenta o retorno produzido pelo total de recursos aplicados em determinado período.
VII – INDICADOR FINANCEIRO GLOBALIZADO
Com a globalização da economia, as empresas perceberam que sua continuidade está vinculada a atender, da forma mais eficiente possível, aos desejos estabelecidos pelo mercado. Em verdade, a atual abertura dos mercados, ao mesmo tempo que promove os consumidores ao papel de poder patronal, coloca a competitividade como o principal desafio contemporâneo a ser vencido pelas empresas na busca de sua viabilização.
Nesse contexto, surge a necessidade de medidas gerenciais que ressaltem melhor as estratégias financeiras e vantagens competitivas empreendidas. Este é o caso da consagrada medida financeira conhecida por EBITDA. Esta sigla vem do inglês, Earning Before Interest, Taxes, Depreciation and Amortization, se traduzindo em nosso idioma algo como lucro antes dos juros, impostos, depreciações e amortizações.
O EBITDA equivale ao conceito de fluxo de caixa operacional da empresa, apurado antes do cálculo do imposto de renda. Parte das receitas consideradas no EBITDA pode não ter sido recebida, assim como parte das despesas incorridas pode ainda estar pendente de pagamento. Nesse passo, essa medida financeira não representa o volume efetivo de caixa, mas sim como um indicador de potencial de geração de caixa.
O EBITDA revela, em essência, a genuína capacidade operacional de geração de caixa de uma empresa, ou seja, sua eficiência financeira determinada pelas estratégias adotadas. Quanto maior o índice, mais eficiente a formação de caixa e melhor a capacidade de pagamento aos proprietários de capital e investimentos da empresa.
A grande novidade do EBITDA na análise de desempenho global de uma empresa por meio do fluxo de caixa, independente dos reconhecidos méritos associados ao índice, talvez esteja em sua proposta de se tornar uma medida financeira globalizada. Porém, ao se confrontar o EBITDA de empresas, a comparabilidade dos resultados é prejudicada principalmente pelas variações da legislação tributária nas diversas jurisdições.
Uma empresa pode apresentar alta formação de caixa, medida pelo EBITDA, porém enfrentar dificuldade em pagar juros aos seus credores. As disponibilidades de caixa poderiam ser totalmente absorvidas pelas necessidades de reinvestimentos.
A formação do EBITDA inclui uma parcela de depreciação que costuma ser relevante em muitos setores. A maioria das empresas tem, no atual ambiente competitivo de mercado, necessidades de reinvestimento periódico alto, muitas vezes superior à própria depreciação.
Não obstante, com o objetivo de se medir a efetiva capacidade de geração de caixa da empresa, muitas vezes são desconsideras despesas não recorrentes verificadas em determinado período. Despesas ou receitas não recorrentes são aquelas que existem em determinado exercício, motivadas por algum evento que se espera que não se repita no futuro próximo. São eventos que não ocorrem com frequência, não estando diretamente vinculados aos negócios da empresa.
São exemplos de receitas não recorrentes: créditos fiscais e receitas na alienação de uma participação acionária. Por sua vez, são exemplos de despesas não recorrentes: multas, acidentes na fábrica e gastos com implantação de novos sistemas de controle operacional.
VIII – CONCLUSÃO
O presente estudo teve como objetivo apresentar uma revisão dos conceitos sobre análise Estratégica e Econômico-Financeira, bem como a descrição e utilização das ferramentas de análise dos indicadores contábeis e financeiros da empresa, cuja finalidade é realizar uma avaliação de desempenho e projetar cenários futuros.
Não obstante, o estudo se debruçou sobre os contextos em que as operações de fusões e aquisições estão inseridas e como a realização destes negócios está intimamente relacionada com as estratégias adotadas pelas empresas.
Feitas estas considerações, observa-se que em face da complexidade de modelagem e instrumentalização das operações de fusões e aquisições, diversos são os profissionais envolvidos na consecução dos objetivos e planos de negócio traçados. Portanto, é imprescindível que estas pessoas estejam familiarizadas não só com a linguagem adotada, mas também com conceitos e matérias que por vezes fogem do escopo primário, porém com enorme relevância para a qualidade do trabalho a ser realizado.
IX – NOTAS E BIBLIOGRAFIA
[1] PORTER, Michael E. Competitive advantage: creating and sustaining superior performance. New York: Free Press, 1998. 557 p.
[2] KHANNA, Tarun; PALEPU, Krishna G. Winning in emerging markets: a road map for strategy and execution. Harvard Business Press, 2010. 247p.
ASSAF NETO, ALEXANDRE – Estrutura e Análise de Balanços: Um Enfoque Econômico-Financeiro. 10ª Edição – São Paulo: Editora Atlas, 2012;
PADOVESE, CLOVES LUIS - Contabilidade Gerencial. 7ª. Edição – São Paulo: Editora Atlas, 2010;
MARTELANC, ROY; PASIN, RODRIGO; CAVALCANTE, FRANCISCO - Avaliação de empresas: um guia para fusões e aquisições e gestão de valor. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2010;
FABRETTI, LÁUDIO CAMARGO - Fusões, aquisições, participações e outros instrumentos de gestão de negócios: tratamento jurídico, tributário e contábil. 2005;
BARROS, BETÂNIA TANURE DE - Fusões e aquisições no Brasil: entendendo as razões dos sucessos e fracassos. São Paulo: Atlas, 2003.