Sumário: 1. Introdução. 2. Do conceito de atos administrativos. 3. Dos atributos dos atos administrativos. 3.1. Presunção de legitimidade. 3.2. Autoexecutoriedade. . 3.3. Tipicidade. 3.4. Imperatividade.. 4. . o poder extroverso do Estado. 5. Conclusão. 6. Referências bibliográficas
1. Introdução
Um dos pontos mais importantes de estudo do direito administrativo diz respeito a teoria do ato administrativo. Por não existir um conceito insculpido em qualquer dispositivo legal, a tarefa de conceituar ato administrativo cabe à doutrina, havendo divergências quanto ao conceito.
Na busca por uma definição, imprescindível o estudo das características do ato administrativo, ou seja, do que a doutrina costuma chamar de atributos, pois o conceito se faz de elementos observados a partir da análise de tais características.
Nesse contexto surge o poder extroverso do Estado, uma vez que está intrinsecamente ligado ao atributo imperatividade do ato administrativo, na medida que é o poder que o Estado possui de constituir, unilateralmente, obrigações para terceiros, extravasando seus próprios limites, tendo como principal característica a possibilidade de impor seus atos independentemente da concordância do particular.
O presente estudo busca fazer uma análise sobre o conceito de ato administrativo e seus atributos para que se possa definir e delimitar o poder extroverso do Estado.
2. Do conceito de atos administrativos
Diz-se que ato administrativo é espécie do gênero ato jurídico.
Por sua vez, ato jurídico é uma espécie de fato jurídico em sentido amplo que é conceituado no âmbito do direito privado como sendo tudo o que interessa ao direito, existindo uma subdivisão em fatos jurídicos em sentido estrito e atos jurídicos.
A distinção entre fato jurídico em sentido estrito e ato jurídico consiste no fato de que os fatos jurídicos em sentido estrito são eventos da natureza com repercussão jurídica ao passo que os atos jurídicos são qualquer manifestação unilateral de vontade humana, produzindo algum efeito jurídico.
Assim, tudo o que interessa ao direito é fato jurídico, que subdivide-se em fatos jurídicos em sentido estrito (eventos da natureza) e atos jurídicos (manifestação unilateral humana).
Com relação aos atos administrativos, como dito, é espécie do gênero ato jurídico, diferenciando-se pelo fato de ser manifestação ou declaração da Administração Pública, ou seja, manifestações humanas e não fenômenos da natureza, e unilaterais, o que os diferencia dos contratos administrativos.
No ordenamento jurídico brasileiro não existe uma definição legal para ato administrativo, tendo a tarefa de conceituá-lo sido incumbida à doutrina, sendo normal a existência de divergências quanto ao conceito.
Na busca de um conceito para ato administrativo cada estudioso procura agrupar características que confiram uma certa similaridade a ponto de agrupá-las na construção teórica do conceito. Dessa forma, cada estudioso possui suas preocupações e sua própria visão de mundo, podendo achar que seja suficiente um certo número de características para fechar um conceito ao passo que outros podem reputar que seja insuficiente, demandando uma quantidade maior de similitudes ou mesmo com relação aos critérios para seleção de tais características, surgindo daí as divergências doutrinarias quanto ao conceito de ato administrativo.
Como dito, ato administrativo é uma espécie de ato jurídico, encaixando-se como uma espécie de ato estatal, diferenciando-se dos atos típicos dos poderes Legislativo e Judiciário. Uma característica marcante é o regime jurídico de direito público.
Não basta dizer que é um ato praticado pelo poder público, uma vez que a Administração pratica inúmeros atos que não interessam diretamente ao Direito Administrativo. A Administração pratica atos regidos pelo Direito Privado, como a locação de um veículo para utilização pelos servidores, ou mesmo pratica atos políticos ou de governo que são aqueles extraídos diretamente do texto constitucional, não se caracterizando tais atos como administrativos.
Celso Antônio Bandeira de Mello[1] nos fornece, em seu Curso de Direito Administrativo, a seguinte definição para ato administrativo:
Declaração do Estado (ou de quem lhe faça as vezes – como, por exemplo, um concessionário de serviço público), no exercício de prerrogativas públicas, manifestada mediante providências jurídicas complementares da lei a título de lhe dar cumprimento, e sujeitas a controle de legitimidade por órgão jurisdicional.
Segundo José dos Santos Carvalho Filho, ato administrativo é “a exteriorização da vontade de agentes da Administração Pública ou de seus delegatários, nessa condição, que, sob regime de direito público, vise à produção de efeitos jurídicos, com o fim de atender ao interesse público”.[2]
Maria Sylvia Zanella Di Pietro define ato administrativo como sendo “a declaração do Estado ou de quem o represente que produz efeitos jurídicos imediatos, com observância da lei, sob regime jurídico de direito público e sujeita a controle pelo Poder Judiciário.”[3]
Assim, o ato administrativo decorre de uma manifestação do Estado ou de quem lhe faça as vezes, sujeita a regime jurídico administrativo, produzindo efeitos jurídicos na intenção de atender ao interesse público, estando tal ato sujeito ao controle pelo Poder Judiciário.
Vale ressaltar que, embora próprios do Poder Executivo, os atos administrativos podem ser praticados tanto pelo Poder Judiciário quanto pelo Poder Legislativo em suas funções atípicas, principalmente quando editam atos relacionados à gestão interna.
De suma importância para a diferenciação dos atos administrativos dos demais atos jurídicos de direito privado é o estudo dos seus atributos, que são, nas palavras de Maria Sylvia Zanella Di Pietro, “as características que permitem afirmar que ele se submete a um regime jurídico administrativo ou a um regime jurídico de direito público”.[4]
O conceito de Poder Extroverso do Estado decorre do estudo dos atributos do ato administrativo, mais precisamente do atributo da imperatividade.
3. Dos atributo dos atos administrativos
Os atos administrativos se submetem a um regime de direito público, o que significa dizer que se confere um tratamento diferenciado a tais atos quando comparados aos atos de direito privado.
Tal tratamento se dá pelo fato da Administração Pública desenvolver atividade voltada à realização do interesse público, daí decorrendo a necessidade de se conferir certos ônus, restrições e prerrogativas próprias de tais atos, não ocorrendo nos atos de direito privado.
Conferir prerrogativas ao ato administrativo significa dizer que se confere uma posição de supremacia a tais atos consubstanciando a própria supremacia do interesse público, uma vez que devem ser utilizadas para satisfazer o interesse público.
Vale transcrever a lição dada por Celso Antônio Bandeira de Mello[5] quando discorre sobre os atributos do ato administrativo:
A justificação dos poderes, juridicamente regulados, que assistem à Administração Pública reside na qualidade dos interesses que lhe incumbe prover. Bem por isso, a utilização de suas prerrogativas só é legítima quando manobrada para a realização de interesses públicos e na medida em que estes sejam necessários para satisfazê-los.
Insta ressaltar que as prerrogativas conferidas ao ato administrativo não são incondicionadas nem tampouco ilimitadas, na medida que se prestam para a satisfação do interesse público, estando sujeitas ao ditames legais e passíveis de controle pelo Poder Judiciário em casos de ilegalidades que possam desvirtuar do interesse público.
Como já foi dito, atributos são qualidades ou características dos atos administrativos. Os atributos não se confundem com os requisitos ou elementos do ato administrativo, uma vez que estes são condições a serem observadas para a válida edição do ato ao passo que os atributos são características dos atos administrativos.
Embora não haja uniformidade entre os doutrinadores quanto a listagem dos atributos dos atos administrativos, considera-se que os principais são a presunção de legitimidade, a imperatividade, a autoexecutoriedade e a tipicidade.
3.1. Da presunção de legitimidade
Como o próprio nome indica, a presunção de legitimidade é o atributo do ato administrativo que os reveste da presunção de que foram editados em conformidade com o Direito até que se prove o contrário. “Essa característica não depende de lei expressa, mas deflui da própria natureza do ato administrativo, como ato emanado de agente integrante da estrutura do Estado”.[6]
É uma característica presente em todos os atos administrativos, independente do conteúdo, seja os que estabeleçam obrigações ou mesmo os que reconheçam direitos.
José dos Santos Carvalho Filho[7] discorre sobre os fundamentos da presunção de legitimidade nos seguintes termos:
O fundamento precípuo, no entanto, reside na circunstância de que se cuida de atos emanados de agentes detentores de parcela do Poder Público, imbuídos, como é natural, do objetivo de alcançar o interesse público que lhes compete proteger. Desse modo, inconcebível seria admitir que não tivessem a aura de legitimidade, permitindo-se que a todo momento sofressem algum entrave oposto por pessoas de interesses contrários. Por esse motivo é que se há de supor que presumivelmente estão em conformidade com a lei.
Para a prevalência do interesse público faz-se necessário uma certa agilidade na prática do ato administrativo que é obtida pela presunção de legitimidade, não sendo necessário que a Administração dependa de manifestação prévia do Poder Judiciário quanto à validade dos seus atos.
Assim, desde quando editados, os atos administrativos já produz os efeitos que lhe são próprios, autorizando a imediata execução pela Administração, mesmo que o ato esteja eivado de algum vício, o que deverá ser anulado posteriormente pela própria Administração ou pelo Poder Judiciário.
Como já dito, em decorrência da presunção de legitimidade, o ato administrativo será tido como válido até que se prove o contrário. Dessa forma, o ônus da prova da existência de vício no ato administrativo é de quem alega, consistindo numa presunção relativa (iuris tantum), sendo possível o administrado socorrer-se do Poder Judiciário a qualquer tempo para impedir o cometimento de qualquer ilegalidade em decorrência de ato administrativo defeituoso.
3.2. Autoexecutoriedade
Autoexecutoriedade consiste no atributo ou característica do ato administrativo em que o mesmo, quando praticado, já pode ser logo executado sem que haja a necessidade de se buscar o Poder Judiciário para tal execução.
Maria Sylvia Zanella Di Pietro diz que “consiste a autoexecutoriedade em atributo pelo qual o ato administrativo pode ser posto em execução pela própria Administração Pública, sem necessidade de intervenção do Poder Judiciário.”[8]
“No direito privado são raras as hipóteses em que se permite ao particular executar suas próprias decisões”[9]. Maria Sylvia Zanella Di Pietro cita como exemplos de execução direta a “legitima defesa, a retenção da bagagem do hóspede que não pague as despesas de hospedagem, a defesa da posse em caso de esbulho, o corte de ramos da árvore do vizinho que invadem a propriedade alheia”. [10]
O fundamento da autoexecutoriedade consiste na necessidade de salvaguardar com rapidez e eficiência o interesse público, sendo um efeito da presunção de legitimidade dos atos administrativos.
Ao contrário da presunção de legitimidade, a autoexecutoriedade não existe em todos os atos administrativos, sendo possível apenas quando expressamente previsto em lei ou quando se tratar de medida urgente que, caso não praticada com urgência possa causar prejuízo maior ao interesse público.
Exemplos de atos praticados com uso da autoexecutoriedade diz respeito ao exercício do poder de polícia pela Administração quando destrói alimentos impróprios para o consumo ou, em caso de urgência, a destruição de prédio que ameaça desabar, podendo causar grandes danos à coletividade.
Como bem lembrado por José dos Santos Carvalho Filho[11], “em algumas hipóteses, o ato administrativo fica despido desse atributo, o que obriga a Administração recorrer ao Judiciário”, citando-se como exemplo “a cobrança de multa ou a desapropriação”, já que ambas as atividades necessitam que a Administração ajuíze a ação competente.
Por fim, registre-se que esse atributo não impede o controle judicial posterior do ato praticado, que pode ser provocado pela pessoa que se sentir lesada ou mesmo que se busque a suspensão do ato ainda não executado tanto pela via administrativa quanto pela via judicial.
3.3. Tipicidade
Segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro, “tipicidade é o atributo pelo qual o ato administrativo deve corresponder a figuras definidas previamente pela lei como aptas a produzir determinados resultados”[12].
Dessa forma, em decorrência do atributo da tipicidade, corolário do princípio da legalidade, não é possível que a Administração pratique atos inominados sem previsão legal, uma vez que para cada finalidade que a Administração pretenda alcançar deve ter um ato definido em lei.
Ainda conforme os ensinamentos de Maria Sylvia Zanella Di Pietro[13], lista-se duas consequências advindas do atributo da tipicidade:
Esse atributo representa uma garantia para o administrado, pois impede que a Administração pratique atos dotados de imperatividade e executoriedade, vinculando unilateralmente o particular, sem que haja previsão legal; também fica afastada a possibilidade de ser praticado ato totalmente discricionário, pois a lei, ao prever o ato, já define os limites em que a discricionariedade poderá ser exercida.
Em suma, o atributo da tipicidade confere ao administrado uma garantia na medida que impede a Administração de praticar um ato unilateral e coercitivo sem qualquer previsão legal bem como afasta a possibilidade de ser praticado um ato totalmente discricionário, já que a lei ao prever o ato fixa os limites para o exercício da discricionariedade.
3.4. Imperatividade
A imperatividade tem como sinônimo a coercibilidade, sendo o atributo do ato administrativo que impõe a obrigatória submissão ao ato praticado de todos que se encontrem em seu círculo de incidência.
Celso Antônio Bandeira de Mello[14] diz que imperatividade “é a qualidade pela qual os atos administrativos se impõem a terceiros, independentemente de sua concordância.”
Segundo José dos Santos Carvalho Filho[15], imperatividade é sinônimo de coercibilidade nos seguintes termos:
Imperatividade, ou coercibilidade, significa que os atos administrativos são cogentes, obrigando a todos quantos se encontrem em seu círculo de incidência (ainda que o objetivo a ser por ele alcançado contrarie interesses privados), na verdade, o único alvo da Administração Pública é o interesse público.
O fundamento da imperatividade é extraído do princípio da supremacia do interesse público, que embora implícito no texto constitucional, está expressamente previsto no artigo 2º, caput, da Lei nº. 9.784/99, e especificado no parágrafo único, com a exigência de “atendimento a fins de interesse geral, vedada a renúncia total ou parcial de poderes ou competência, salvo autorização em lei” (inciso II).
Ademais, em decorrência do regime democrático e do sistema representativo, toda atuação do Estado deve ser pautada pelo interesse público, sendo lógico que a atuação estatal se sobreponha aos interesses privados na medida que deve prevalecer o interesse público.
Assim como a autoexecutoriedade, a imperatividade não existe em todos os atos administrativos, mas somente nos atos que impõem obrigações, estando ausente nos “atos de consentimento (permissões, autorizações), em que ao lado do interesse público de todo ato há também o interesse privado”[16].
A imperatividade, como decorrência do princípio da supremacia do interesse público, tem incidência direta nos atos em que a Administração manifesta seu poder de império, por meio do que se denomina poder extroverso, que será analisado em seguida.
4. Do poder extroverso do Estado
A imperatividade consiste no atributo segundo o qual “os atos administrativos se impõem a terceiros, independentemente de sua concordância”[17], sendo um atributo que decorre do poder extroverso do Estado.
Seguindo os ensinamentos de Celso Antônio Bandeira de Mello[18], que por sua vez busca na doutrina italiana o fundamento para o atributo da imperatividade, argumenta que tal atributo:
decorre do que Renato Alessi chama de ‘poder extroverso’, que permite ao Poder Público editar provimentos que vão além da esfera jurídica do sujeito emitente, ou seja, que interferem na esfera jurídica de outras pessoas, constituindo-as unilateralmente em obrigações.
Assim, o poder extroverso é o poder que o Estado possui de constituir, unilateralmente, obrigações para terceiros, extravasando seus próprios limites, tendo como principal característica a possibilidade de impor seus atos independentemente da concordância do particular.
Cita-se como exemplos em que se exerce o poder extroverso o poder de regulamentar, fiscalizar e fomentar, dentre outros. Na prática, percebe-se na cobrança e fiscalização dos impostos, controle do meio ambiente, na fiscalização do cumprimento das normas sanitárias ou no serviço de trânsito.
Os Tribunais pátrios, a exemplo do Tribunal Regional Federal da 5ª. região[19] e da 4ª. região[20] já consideraram que a exigência de apresentação dos documentos fiscais não consubstancia ato ilegal na medida que se mostra como uma faceta do poder extroverso da Administração, como se verifica nas decisões abaixo transcritas:
PROCESSO CIVIL. TRIBUTÁRIO. CAPUT DO ART. 35 DA LEI Nº 8.212/1991, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI Nº 9.528/1997. MATÉRIA RESERVADA A LC. INCONSTITUCIONALIDADE IN CONCRETO. SENTENÇA DE NATUREZA EXTRA PETITA. INEXISTÊNCIA. ILEGITIMIDADE PASSIVA DOS SÓCIOS. ART. 6º DO CPC. INSS. ARRECADAÇÃO E FISCALIZAÇÃO. LEGITIMIDADE. ATOS ADMINISTRATIVOS. PRESUNÇÃO DE LEGITIMIDADE. PROCESSO ADMINISTRATIVO. OBSERVÂNCIA DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. ART. 32, PARÁGRAFO 1º, ALÍNEA "D", DA LEI N.º 8.212/91. DOCUMENTOS COMPROBATÓRIOS. ARQUIVAMENTO. PRAZO DE 10 (DEZ) ANOS. PRAZO DO ART. 421, PARÁGRAFO 1º, DO CPC. PRECLUSÃO CONSUMATIVA. TAXA DE JUROS SELIC. MATÉRIA TRIBUTÁRIA. LEGITIMIDADE. JUDICIÁRIO. EXCLUSÃO OU GRADUAÇÃO DE MULTAS. RAZOABILIDADE.
(...)
5. É cediço que a presunção de legitimidade de que gozam os atos administrativos somente poderá ser ilidida por prova inequívoca, a cargo da parte executada (art. 3º da Lei de Execução Fiscal). Alegações de ordem genérica não podem desconstituir a força probante de regularidade e de validade do lançamento contido no título executivo;
6. Não há que se falar que o processo administrativo desenvolveu-se com ofensa aos princípios do contraditório e da ampla defesa. A exigência de apresentação de documentos fiscais não consubstancia ato ilegal a ser afastado. Pelo contrário, decorre da própria natureza da relação de direito público entre Fisco e contribuinte, mostrando ser uma faceta do poder extroverso da Administração. Nesse sentido: TRF - 4ª Região, Primeira Turma, Agravo de Instrumento n.º 2005.04.01.017092-1/PR, DJU: 13/07/2005;
(...)
(AC - Apelação Civel – 430617, Relator Desembargador Federal Frederico Pinto de Azevedo, TRF5, 1a. Turma, DJE 31/08/2010, página 76.) grifo nosso
TRIBUTÁRIO. EXIGÊNCIA DE APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTOS FISCAIS DE PERÍODO ANTERIOR AOS ÚLTIMOS DEZ ANOS. DESCABIMENTO. ART. 32, §11, DA LEI 8.212/91. 1. A exigência de apresentação dos documentos fiscais não consubstancia ato ilegal a ser afastado. Pelo contrário, decorre da própria natureza da relação de direito público entre Fisco e contribuinte, mostrando ser uma faceta do poder extroverso da Administração, onde encontra fundamento. 2. O art. 32, §11, da Lei 8.212/91, determina que os documentos comprobatórios do cumprimento das obrigações fiscais devem ficar arquivados na empresa durante dez anos, à disposição da fiscalização. 3. Assim, o ato administrativo que cobra documentos em período anterior aos últimos dez anos, ameaçando a imposição de multa no caso do descumprimento, é contrário ao espírito e ao texto da lei, revelando-se incompatível com a sistemática instituída pelo legislador. 4. Agravo de instrumento parcialmente provido, a fim de afastar a obrigação da agravante em apresentar documentação relativa a período anterior aos últimos dez anos.
(AG 200504010170921, Relator Wellington Mendes de Almeida, TRF4, 1a. Turma, DJ 13/07/2005, página 319.) grifo nosso
Portanto, o poder extroverso do Estado está intrinsecamente ligado ao atributo imperatividade do ato administrativo, na medida que é o poder que o Estado possui de constituir, unilateralmente, obrigações para terceiros, extravasando seus próprios limites, tendo como principal característica a possibilidade de impor seus atos independentemente da concordância do particular.