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Qual o futuro do sistema penitenciário federal?

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29/01/2015 às 13:20
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5. A PROPOSTA

A proposta é que seja criado no Brasil a figura do “Regime Penitenciário Federal” diferenciando o regime jurídico das Penitenciárias Federais em relação às prisões comuns.

No “Regime Penitenciário Federal” inverte-se a ordem dos focos principais. Enquanto nos estabelecimentos comuns o caráter ressocializador é meta principal, no regime federal a segurança pública prepondera, posto que, a prioridade destes estabelecimentos consiste em garantir a impossibilidade de fugas, comunicações ilícitas, motins, etc.

Entretanto o oferecimento de meios de (re)integração social continuam sendo metas irrenunciáveis, a única diferença consistiria no reconhecimento formal da inversão das prioridades, ou seja, os trabalhos e projetos de reintegração do preso ocorreriam sempre que a segurança do estabelecimento estivesse em níveis de normalidade, em outras palavras, havendo paz interna, os projetos de reintegração, como desenvolvimento de atividades laborais e educativas seguiriam seu curso normal, focados na recuperação do indivíduo preso, ainda que tenha sido líder de uma facção criminosa.

Uma forma de regulamentação do “Regime Penitenciário Federal” seria a inclusão na Lei 7210/84 de um capítulo próprio para este fim.

Embora o texto legal possa se apresentar de diversas formas e títulos, podendo ser em Lei específica, numa medida provisória, ou inserido no próprio corpo da L.E.P. apresento abaixo uma sugestão de texto a ser incluído no título IV da L.E.P. que classifica os estabelecimentos penais:

(Título IV – Dos Estabelecimentos Penais)

Capítulo VIII - DAS PENITENCIÁRIAS FEDERAIS

Art. Os estabelecimentos penais federais têm por finalidade promover a execução administrativa das medidas restritivas de liberdade dos presos provisórios ou condenados, que representem risco a ordem pública, social ou ao ambiente carcerário, cuja inclusão se justifique no interesse da segurança pública ou do próprio preso mediante, uma das seguintes características:

I - ter desempenhado função de liderança ou participado de forma relevante em organização criminosa;

II - ter praticado crime que coloque em risco a sua integridade física no ambiente prisional de origem;

III - estar submetido ao Regime Disciplinar Diferenciado - RDD;

IV - ser membro de quadrilha ou bando, envolvido na prática reiterada de crimes com violência ou grave ameaça;

V - ser réu colaborador ou delator premiado, desde que essa condição represente risco à sua integridade física no ambiente prisional de origem; ou

VI - estar envolvido em incidentes de fuga, de violência ou de grave indisciplina no sistema prisional de origem.

Art. O estabelecimento penal federal tem as seguintes características:

I - destinação a presos provisórios e condenados em regime fechado;

II - capacidade para até duzentos e oito presos;

III - segurança externa e guaritas de responsabilidade dos Agentes Penitenciários Federais;

IV - segurança interna que preserve os direitos do preso, a ordem e o rigor na disciplina;

V - acomodação do preso em cela individual;

VI - existência de locais de trabalho, de prestação de serviços de saúde, de atividades sócio-educativas e culturais, de esporte, de prática religiosa e de visitas, dentro das possibilidades do estabelecimento penal;

VII – Proibição de visitas íntimas, salvo como recompensa por bom comportamento nos termos do art. 56 da L.E.P. ; e

VII – Contatos físicos com o ambiente externo realizados exclusivamente por parlatório monitorado, salvo no caso do inciso acima .

Defende-se aqui, a criação do Regime Penitenciário Federal com monitoramento permanente das entrevistas de advogados, e a proibição de visitas íntimas, salvo em casos específicos, como por exemplo, em caso de recompensa por bom comportamento.

O que se busca não é a supressão de direitos, mas proibir o seu uso com fim ilícito.

Ante a delicada discussão sobre o fim das visitas íntimas e o monitoramento das entrevistas com advogados, restam as seguintes questões; o que interessa mais à sociedade brasileira: I) Medidas eficazes para garantir a segurança da população? ou II) A repetição de práticas ilícitas por meio de “brechas” legislativas que permitem a continuidade de crimes, como tráfico de drogas e armas, incêndios de ônibus, revoltas e outras ações violentas que colocam em risco a população? O que importa mais?

Se de um lado temos alguns direitos individuais de pessoas presas, de outro, temos a segurança da sociedade, o interesse público, a ordem social, de interesse comum de todos os cidadãos livres. Qual bem jurídico é mais importante?

Quem perde e quem ganha com o Regime Penitenciário Federal? Certamente quem ganha é a sociedade e quem perde são as facções criminosas.

Um maior rigor para com os presos federais não significa injustiça alguma, ao contrário, significa a verdadeira justiça, pois como dizia Rui Barbosa, numa de suas mais brilhantes peças produzidas, a Oração aos Moços de 1921:

...A regra da igualdade não consiste senão em quinhoar desigualmente aos desiguais, na medida em que se desigualam. Nesta desigualdade social, proporcionada à desigualdade natural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade... Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria desigualdade flagrante, e não igualdade real (grifo nosso)...

Assim, presos que preencham os requisitos do art. 3º do Decreto 6877/09, não podem ser tratados como presos comuns, já que o próprio legislador os diferenciou, logo tratá-los de forma igual ao preso comum seria um tratamento igual para presos desiguais.

Situações excepcionais demandam regras também excepcionais, na medida destas desigualdades. E regras excepcionais, devem delimitar claramente as exceções para evitar excessos no futuro.


6. CONCLUSÃO

O jovem Sistema Penitenciário Federal mesmo sendo, na prática, um regime excepcional de cumprimento de pena, vem amadurecendo e rendendo bons frutos à sociedade brasileira no combate ao crime organizado, conforme se demonstrou nos tópicos e gráficos acima. Junto com o seu amadurecimento vêm diagnosticando também a necessidade de adequações legais para continuar proporcionando para a nação unidades prisionais verdadeiramente seguras, livres de fugas, motins, corrupção ou celulares, mesmo que custodiando os mais perigosos presos do Brasil.

Contudo, corre sério risco de equiparar-se aos demais sistemas prisionais estaduais se não houver, em breve, regulamentação de um regime jurídico próprio capaz de sustentar um rigor disciplinar diferenciado do convencional e apto a impedir a audácia de falsos visitantes que colaboram com facções criminosas, ou advogados ligados ao crime organizado.

Não basta apenas mudá-los para uma Unidade Federal, é preciso mudá-los de Unidade e, mudar as regras de cumprimento nestas unidades, para que estes presos “especiais”, de fato não consigam mais repetir os aterradores ataques que comandaram no passado e que motivaram sua inclusão numa prisão federal.

A limitação no combate ao crime organizado por meio da subversão da visita íntima e da entrevista não monitorada com defensores particulares, para fins criminosos, justifica regras excepcionais para as Penitenciárias Federais.

Importante destacar que a inexistência de um regime jurídico específico para o S.P.F., não significa seu fracasso imediato, ou a repetição instantânea das lamentáveis cenas de rebeliões já conhecidas. Mas significaria abrandar o combate ao crime organizado.

A sociedade, as autoridades, a imprensa, os legisladores, o meio acadêmico, o judiciário, enfim, todos os segmentos sociais, devem refletir sobre a questão aqui apresentada. A ausência de reflexão sobre medidas de combate à criminalidade organizada nos estabelecimentos prisionais federais pode gerar a ineficiência no isolamento dos líderes de organizações criminosas, causando assim uma involução no processo de melhoria do sistema penitenciário nacional e um desperdício dos recursos financeiros e humanos.

Por outro lado, a lealdade aos direitos humanos fundamentais, como ferramenta para a proteção da integridade física e moral, da dignidade da pessoa humana e garantia do contraditório e da ampla defesa, são valores indiscutíveis, princípios inalienáveis que devem ser observados com primazia. O respeito à vida, ainda que o indivíduo esteja condenado, nunca pode ser relegado, e deve ser uma busca perene do Estado e um compromisso moral dos seus representantes.

Diante disto, e de todos os argumentos já expostos anteriormente, pode-se aferir que as lideranças criminosas mais nocivas à sociedade devem ser custodiadas nas Penitenciárias Federais, sob um regime jurídico próprio, diferentemente dos presos comuns, mas na medida e nos limites dessas diferenças.


7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BOSCHI, José Antônio Paganella. Da Pena e seus Critérios de Aplicação. Porto Alegre: Livraria do Advogado. 2003.

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CPI DO SISTEMA CARCERÁRIO. Relatório. Brasília: Câmara dos Deputados, 2008.

KUEHNE, Maurício. Lei de Execução Penal & Legislação Complementar, 6 ed. CTBA: Juruá. 2009.

KUEHNE, Maurício. Lei de Execução Penal Anotada 6 ed. Curitiba: Juruá, 2009.

MARCÃO. Renato. Curso de Execução Penal. 7 ed. São Paulo Saraiva, 2008.

MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução Penal, 10 ed. São Paulo: Atlas, 2002.

Revistas do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária. MJ. CNPCP. Brasília-DF.

BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e Das Penas.

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FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. Petrópolis: Vozes.

HULSMAN, Louk et al. Penas Perdidas. O Sistema Penal em Questão. Rio de Janeiro: LUAM, 1993.

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COYLE, Andrew. Manual para servidores penitenciários. Centro Internacional de estudos Penitenciários (ICPS-International Centre for Prison Studies) do King’s College. Londres. Reino Unido/Brasil.

VARELLA, Dráuzio. Estação Carandiru. São Paulo: Estação das Letras, 1999.


Notas

2 Ministério da Justiça Notícias (26/12/2008), “Sistema Penitenciário Federal reduz em 70% rebeliões nos estados”, página consultada em 05/08/2014, disponível em: <https://portal.mj.gov.br/main.asp?View={7CBDB5BE-654D-4BA8-8A49-8FC8AA654ECE}&BrowserType=IE&LangID=pt-br&params=itemID%3D%7BAFD72583%2DEEBC%2D4FD1%2DA210%2D4ECDF0828BD6%7D%3B&UIPartUID=%7B2218FAF9%2D5230%2D431C%2DA9E3%2DE780D3E67DFE%7D>

3 Ministério da Justiça Notícias (29/11/2013), “Quinto presídio de segurança máxima do país será construído no DF”, página visitada em 05/08/2014, disponível em: <https://www.correiodopovo.com.br/Noticias/?Noticia=503082>

4 Estadão (24/03/2009), “Presa advogada suspeita de ser informante de facções”, página consultada em 05/08/2014, disponível em : <https://www.estadao.com.br/noticias/geral,presa-advogada-suspeita-de-ser-informante-de-faccoes,344057,0.htm>

5 Estadão (27/11/2010), “Justiça decreta prisão de 02 advogados de Marcinho VP”, página consultada em 05/08/2014, disponível em: <https://www.estadao.com.br/noticias/impresso,justica-decreta-prisao-de-2-advogados-de-marcinho-vp,645910,0.htm>

6 Meia Hora Plantão de Notícias (22/10/2010), “Mulher tinha recado para atacar as UPPs”, página consultada em 05/08/2014, disponível em: <https://www.meiahora.ig.com.br/noticias/mulher-tinha-recado-para-atacar-as-upps_1089.html>

7 Globo.com (24/03/2011), “Bilhetes de Beira-Mar mostram esquema de lavagem de dinheiro”, página consultada em 05/08/2014, disponível em <https://www.globo.com/Jornalismo/FANT/0,,MUL1654533-15605,00-BILHETES+DE+BEIRAMAR+MOSTRAM+ESQUEMA+DE+LAVAGEM+DE+DINHEIRO.html>

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Sobre o autor
Cristiano Tavares Torquato

Agente Penitenciário Federal, ex Agente Penitenciário Estadual - Bacharel em Direito, Especialista em Direitos Humanos e Segurança Pública.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

TORQUATO, Cristiano Tavares. Qual o futuro do sistema penitenciário federal?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4229, 29 jan. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/30880. Acesso em: 23 dez. 2024.

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