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O papel do Poder Judiciário no meio ambiente

15/08/2014 às 15:47
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A utilização abusiva da natureza tem ocasionado diversas tragédias ambientais. Cabe ao Poder Judiciário resguardar ou ao menos tentar assegurar um parâmetro mínimo digno à proteção do meio ambiente.

Resumo: O meio ambiente tem passado por várias transformações em razão dos inúmeros problemas climáticos que o mundo moderno enfrenta. Desperdício dos recursos naturais tem sido uma atitude típica dos homens no Brasil e no mundo. A utilização abusiva da natureza tem ocasionado diversas tragédias ambientais. E, diante de tudo isso, cabe ao Poder Judiciário resguardar ou ao menos tentar assegurar um parâmetro mínimo digno à proteção do meio ambiente.

Palavras-chave: Meio ambiente. Poder Judiciário. Proteção. Interdisciplinariedade.

Sumário: Introdução. 1 - Meio ambiente sob um novo olhar. 2 - Poder Judiciário e Meio Ambiente.


Introdução

O aquecimento global, suas causas e as consequências nefastas para a existência de vida no planeta têm dominado as discussões no mundo. O consumo e o desperdício são uma realidade e certamente trazem insegurança para as futuras gerações. As mudanças climáticas, o uso abusivo de recursos naturais, a extinção das espécies e a redução da biodiversidade são problemas mais que atuais que precisam de atenção de todos os segmentos da sociedade.

A própria Constituição de 1988 já demonstrou preocupação com as futuras gerações do país. E, por isso, fixou mecanismos de controle e de proteção ao meio ambiente. Apesar da previsão constitucional, sem dúvida relevante neste sentido, é preciso definir papeis dentro da sociedade. Não basta mais que somente a legislação seja o suficiente.

O papel do Judiciário, neste contexto, é fundamental. O juiz não pode continuar a ser apenas um mero aplicador de leis. É preciso que passe a adotar e incentivar dentro da sua comarca atitudes que demonstrem preocupação com o meio ambiente. Desta forma, os próprios servidores poderão ficar empenhados em replicar essas práticas em casa e na comunidade onde vivem. E, assim, poderão passar a contribuir ainda mais para ter uma sociedade com os olhos voltados ao meio ambiente.


1 - Meio ambiente sob um novo olhar

As próximas gerações precisam urgentemente de uma mudança de hábito da sociedade atual. O Poder Judiciário tem o dever de valorizar e incentivar a responsabilidade socioambiental como verdadeiro cooperador. O tema meio ambiente sempre trouxe preocupações e, no Brasil, a Constituição de 1988 consagrou a preservação do meio ambiente dedicando um capítulo inteiro, dentre outros artigos, para o tema. A Constituição estabelece mecanismos de proteção e controle, como se observa no artigo 225.

Recentemente, a Lei de Licitações e Contratos (Lei nº 8.666/1993) teve seu art. 3º alterado no sentido de promover o desenvolvimento nacional sustentável nos procedimentos licitatórios. Observa-se que a proposta mais vantajosa para a administração pública deve considerar as questões sustentáveis em suas aquisições, conforme regulamentou o Decreto nº 7.746/2012, arts. 2º e 4º. Os dispositivos prevêem:

“Art. 2º A administração pública federal direta, autárquica e fundacional e as empresas estatais dependentes poderão adquirir bens e contratar serviços e obras considerando critérios e práticas de sustentabilidade objetivamente definidos no instrumento convocatório, conforme o disposto neste Decreto.

Art. 4º São diretrizes de sustentabilidade, entre outras:

I – menor impacto sobre recursos naturais como flora, fauna, ar, solo e água;

II – preferência para materiais, tecnologias e matérias-primas de origem local;

III – maior eficiência na utilização de recursos naturais como água e energia;

IV – maior geração de empregos, preferencialmente com mão de obra local;

V – maior vida útil e menor custo de manutenção do bem e da obra;

VI – uso de inovações que reduzam a pressão sobre recursos naturais; e

VII – origem ambientalmente regular dos recursos naturais utilizados nos bens, serviços e obras.

Estes são alguns parâmetros para que seja fomentada a adoção de medidas sustentáveis na Administração Pública. O Poder Judiciário deve estar atento às medidas de proteção. A Administração Pública tem um poder de compra muito expressivo. Para se ter uma ideia, as compras da administração pública de bens ou serviços consomem 15% do Produto Interno Bruto (PIB) anual, algo em torno de R$ 600 bilhões, segundo dados do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG). Desse modo, o Ministério do Meio Ambiente criou o programa Agenda Ambiental na Administração Pública (A3P), que tem como objetivo a reformulação da cultura institucional nos órgãos e entidades públicas.


2 - Meio ambiente e Poder Judiciário

Em relação ao Poder Judiciário, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) como órgão difusor de técnicas administrativas e com o objetivo de padronizar as formas de atuação, recomendou aos Tribunais (Recomendação nº 11/2007) a adoção de políticas públicas que visem a formação e recuperação de um ambiente ecologicamente equilibrado, além da conscientização dos servidores e jurisdicionados sobre a necessidade de efetiva proteção ao meio ambiente. São exemplos dessas políticas públicas: a) utilização de papel reciclado e não clorado nos impressos do Poder Judiciário, sejam de natureza administrativa ou processual; b) instituição da coleta seletiva de resíduos, destinando recipientes individuais para plástico, papel, metal e vidro, e a ulterior doação do material coletado a entidades assistenciais que se responsabilizem pela correta utilização do material para a devida reciclagem; c) aquisição de impressoras que imprimam, automaticamente, em frente e verso; d) aquisição de bens e materiais de consumo que levem em consideração o tripé básico da sustentabilidade: ambientalmente correto, socialmente justo e economicamente viável; e) utilização sustentável da energia e dos combustíveis; e f) utilização de edifícios com observância da proteção ao meio ambiente.

Ainda no âmbito do CNJ, a Resolução nº 70/2009 classifica a Responsabilidade Social e Ambiental como atributo de valor para a sociedade. No ano de 2010, foi fixada, entre as metas do CNJ, a meta 6 —que estabelecia que os tribunais reduzissem em pelo menos 2% o consumo per capita de energia elétrica, telefone, papel, água e combustível.

A utilização de boas práticas que visam a sustentabilidade devem ser adaptadas no cotidiano. Pequenas mudanças de atitudes no trabalho, em casa e na rua fazem a diferença.  Nesse contexto, o papel do magistrado é de extrema relevância. Na administração de sua unidade, o magistrado atua como verdadeiro formador de opinião. Como gestor público, tem a capacidade de inserir na rotina de sua unidade práticas e políticas voltadas para a responsabilidade socioambiental. São exemplos destas práticas: o consumo consciente de papel, com impressão exclusivamente de documentos; impressão de documentos em frente e verso ou, se possível, duas folhas em uma; utilização, em documentos internos, no verso de folhas já usadas (rascunhos); utilização em documentos externos de papel reciclado como alternativa preferencial e reciclagem de um volume de papel equivalente ao consumido, utilizando os coletores individuais de papel descartado.

O consumo consciente de energia igualmente é muito importante. Orientar os servidores vinculados à sua unidade que somente acendam lâmpadas quando a iluminação natural não for suficiente e que ao saírem desliguem os computadores (sem deixar somente bloqueado) é fundamental. Além disso, é importante sugerir que apaguem as luzes ao sair e desliguem impressoras e demais equipamentos eletrônicos. Se o ambiente for climatizado, é preciso manter as janelas fechadas.

Claro que há muito mais modelos de economia, mas é preciso começar pelos mais básicos ao menos. É necessário repensar a necessidade de consumo e os padrões de produção e descarte adotados e recusar possibilidades de consumo desnecessário e produtos que gerem impactos ambientais significativos. Reduzir e evitar desperdícios, reutilizar o que pode ser reaproveitado e reciclar são atos necessários.

O CNJ recomenda aos Tribunais relacionados que adotem políticas públicas visando a formação e recuperação de um ambiente ecologicamente equilibrado, além da conscientização dos próprios servidores e jurisdicionados sobre a necessidade de efetiva proteção ao meio ambiente, bem como instituam comissões ambientais para o planejamento, elaboração e acompanhamento de medidas, com fixação de metas anuais, para a correta preservação e recuperação do meio ambiente. É neste sentido que o Judiciário deve caminhar para um futuro melhor do meio ambiente.

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Conclusão

O Poder Judiciário, com a força expressiva que mantém perante seus servidores e toda a sociedade, tem o papel de direcionar as atitudes para a sustentabilidade. O CNJ fez relevantes recomendações neste sentido. Essas recomendações e orientações possibilitam ao Judiciário a busca pela sua contribuição ambiental. Além disso, vale lembrar a economia gerada com pequenas atitudes que podem fazer a diferença no final das contas.

A função do juiz é ampliada neste novo cenário. O juiz deve ter atitudes que demonstrem a preocupação com o meio ambiente. Essa questão deve ser analisada no próprio planejamento estratégico do Tribunal de Justiça, dentro das metas e missão do Judiciário. Além do mais, quando do planejamento estratégico da sua unidade jurisdicional, o juiz deve pontuar essas questões estabelecendo igualmente metas que preservem o meio ambiente no local de trabalho.

A preocupação deve ser permanente e não de forma isolada somente no horário de expediente para cumprir recomendações do CNJ. Afinal, hoje o juiz não é mais visto somente como autoridade cuja função é de mero aplicador das leis. No passado, talvez bastasse esse papel ao magistrado. Mas não nesse contexto contemporâneo.  O juiz deve voltar seus olhos para os anseios e necessidades ambientais de toda a sociedade. E, enfim, dar exemplo de boas práticas sustentáveis. Como bem disse Gandhi: “Nós devemos ser a mudança que queremos ver no mundo”.


Bibliografia

Constituição Federal de 1988 - acesso em 23.10.2013. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm

Lei 8.666 de 21 de junho de 1993 - Institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências. Acesso em 23.10.2013. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8666cons.htm

Recomendação nº 11/2007 - Conselho Nacional de Justiça - acesso em 2310.2013. http://www.cnj.jus.br/atos-administrativos/atos-da-presidencia/322-recomendacoes-do-conselho/12093-recomenda-no-11

Resolução nº 70/2009 - - Conselho Nacional de Justiça - acesso em 2310.2013. http://www.cnj.jus.br/gestao-e-planejamento/gestao-e-planejamento-do-judiciario/resolucao-n-70


Abstract: The Environment has undergone many changes because of the numerous weather problems that the modern world has accepted. Waste of natural resources has been a typical attitude of men in Brazil and worldwide. The misuse of nature has caused many tragedies ambientas. And amid all this, it is up to the judiciary to safeguard or at least try to ensure a decent minimum standard for the protection of the environment.

Keywords: Environment. Judiciary. protection

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Sobre a autora
Larissa Pinho de Alencar Lima

Juíza em Rondônia, Doutoranda em Ciências Políticas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Mestranda em educação pela Universidade Federal de Rondônia e Especialista em Direito Civil e Direito do Consumidor.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA, Larissa Pinho Alencar. O papel do Poder Judiciário no meio ambiente. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4062, 15 ago. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/31029. Acesso em: 29 mar. 2024.

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