Aécio Neves quer ser mais temido do que amado, pobre candidato...

09/09/2014 às 23:19
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Que as lições dos grandes romanos possam inspirar os brasileiros medíocres que disputam a presidência.

Hoje fiquei sabendo que Aécio Neves está processando o Twitter para obter as informações de dezenas de twitteiros que supostamente o ofenderam. Em razão disto, me senti obrigado a abordar o assunto. Meditando sobre o tema, percebi que a melhor maneira de fazer isto seria recorrendo aos grandes exemplos do passado.

Após a morte de Julio César, Cícero resolveu sair de Roma por causa do terror desencadeado por Marco Antonio e Dolabela. Em Leucópetra, perto de Régio, ele foi informado da Oração de seu adversário no Senado inspirada nos princípios da justiça e resolveu voltar a Roma. Ao chegar na cidade não foi à reunião do Senado em que Marco Antonio deveria falar novamente. Irritado com a ausência de Cícero, Marco Antonio disse aos senadores que talvez fosse com oficiais demolir a casa do adversário. Em outra reunião do Senado e na ausência de Marco Antonio, Cícero proferiu sua famosa Oração Filípica I, da qual destaco o seguinte fragmento:

"Não posso persuadir-me a suspeitar que te cativou o dinheiro. Diga cada qual o que quiser, não tenho necessidade de o crer; nunca em ti conheci coisa indecorosa nem abatida, posto que os domésticos às vezes costumam censurá-las; mas estou inteirado da tua constância, e prouvera a Deus que pudesses evitar a suspeita, assim como evitas a culpa.

Mas muito mas receio que, ignorando o verdadeiro caminho da honra, tenhas por mais glorioso poderes tu só mais do que todos, e quereres antes ser temido de teus patrícios do que amado. Se assim o entendes, muito te desvias do caminho da glória. A glória consiste em ser cidadão amado, ser benemérito da República, e louvado, respeitado e querido; mas ser temido e malquisto é coisa aborrecível, detestável, fraca e caduca. Até na fábula vemos que aquele que dizia: 'Aborreçam, contanto que temam', lhe serviu isto de ruína." (ORAÇÕES, Marco Túlio Cícero, Biblioteca Clássica, volume XLIII, 2a. edição, Atena Editora, São Paulo, 1957, p. 121-122)

A ação ajuizada por Aécio Neves contra o Twitter para conseguir informações de dezenas de twitteiros me fez recorrer à autoridade deste fragmento. É evidente que o candidato tucano quer intimidar seus adversários, quer eles sejam internautas que compartilham conteúdos que ele julga ofensivo, quer sejam empresas virtuais que possibilitem o compartilhamento de informações "on line".

Não entrarei aqui no mérito do processo ajuizado por Aécio Neves, nem tampouco questionarei a técnica do seu defensor. Ao Poder Judiciário cabe decidir o destino da ação. O que me interessa é o efeito catastrófico que uma atitude como esta pode ter sobre o próprio candidato e, caso ele seja eleito, sobre o meu país. Numa República ninguém deve querer se impor pela força, pois somente a Lei deve imperar sobre todos. E a nossa Lei Maior, como todos sabemos, garante mais a liberdade de expressão do que o desejo de censura manifestado por aqueles que se dizem ofendidos, mas que desejam calar opiniões dissonantes da sua.

Quem é eleito para um cargo público num Estado de Direito não pode imaginar que permanecerá nele se for odiado pelo povo que o elegeu. Não é pela força que se governa um país democrático e sim pela criação de consensos, coisa que somente é possível se fazer quando os governados não tem razões para odiar ou para temer o governante. 

É claro que um tirano pode chegar ao poder pela astúcia e o conservar através da intimação cercando-se de soldados. Um ditador pode até rasgar uma Constituição e se perpetuar na presidência sendo odiado e temido por décadas. Isto, porém, não dará a ele nem um bom lugar na História (a qual certamente também será escrita pelas vítimas e por seus descendentes), nem segurança a ele e aos seus familiares (pois há o risco do tirano ou de seu ente querido ficar vulnerável entre aqueles que maltratou e que tem coragem para se vingar). 

Aécio Neves agiu como um bom discípulo de Maquiavel. Em seu livro "O Príncipe", o diplomata florentino diz que aos governantes convém mais serem temidos do que amados. Melhor seria que ele se inspirasse em Marco Túlio Cícero, que sabia ser melhor ser amado e respeitado do que temido e odiado. O exemplo de Fernando Collor sendo impedido de ficar na presidência em razão de intenso ódio popular ainda é bem vivo na memória dos brasileiros. Deveria ser também na consciência de Aécio Neves e de qualquer candidato a presidente do Brasil. Por isto, tomo a liberdade de pedir a Aécio Neves um gesto de civilidade, de grandeza e de generosidade tipicamente romana: desista da ação contra o Twitter candidato, nada será mais útil ao país e à sua candidatura do que evitar o erro cometido por Marco Antonio.

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Sobre o autor
Fábio de Oliveira Ribeiro

advogado em Osasco (SP)

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