Resenha: o surgimento do Direito do Trabalho, na obra de Sayonara Grilo Leonardo Coutinho da Silva

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Resenha crítica do nascimento das relações coletivas de trabalho e do direito coletivo do trabalho no Brasil no livro Relações Coletivas de Trabalho de Sayonara Grilo Leonardo Coutinho da Silva.

Sayonara Grillo Coutinho Leonardo da Silva, em sua obra Relações Coletivas de Trabalho – Configurações Institucionais no Brasil Contemporâneo – objeto desta resenha, começa por nos apresentar um panorama geral do surgimento das relações coletivas de trabalho no mundo por meio da identificação do desenvolvimento de tais relações na História, destacando momentos chave de crise e surgimento de direitos.

            A Autora faz um breve relato da situação Europeia no século XVII e XVIII para depois ater-se ao fim do século XIX e início do século XX, momento singular do desenvolvimento dos Direitos dos trabalhadores e dos direitos coletivos do trabalho. Tal desenvolvimento acompanhou a evolução dos direitos sociais e políticos e até mesmo a evolução da própria ideia de cidadania.

            Sayonara destaca a importância de compreender o processo de desenvolvimento industrial acontecido nos séculos XIX e XX, a modernização do Estado e o processo econômico. A relação entre Estado, trabalhadores e agentes econômicos passou por várias transformações para que se pudesse finalmente alcançar a ideia de proteção coletiva dos trabalhadores em relação aos empregadores e ao próprio regime econômico.

            No século XIX a necessidade de defesa dos trabalhadores como coletividade do regime econômico era clara, visto que o regime do laissefaire estruturava-se em torno da liberdade de comércio, trabalho e indústria, e a mão-de-obra era um artigo comercial posto no mercado e adquirido por meio do contrato individual que “atomizava” o cidadão, tornando difícil que uma determinada classe de trabalhadores conseguisse equiparar seus direitos entre eles mesmos, pelo caráter pessoal da relação de trabalho.

            A situação chegou a tal ponto que as proibições de sindicalização e movimentos operários já não eram eficazes, forçando o regime a se modificar e aceitar os agrupamentos de trabalhadores e suas demandas. Isso foi reforçado com o começo da Primera Guerra Mundial, quando havia a urgente necessidade de os Estados cooperarem com os sindicatos de trabalhadores para que se pudesse gerenciar as infraestruturas nacionais voltadas para a Guerra. Aí estabeleceram-se novas políticas de aceitação das agremiações de trabalhadores.

            O marco desta nova conjuntura foi a Constituição de Weimar, na Alemanha, que data de 1919, e foi a primeira constituição a reconhecer e institucionalizar direitos sindicais e a garantia de direitos do trabalho para a generalidade dos trabalhadores.

                        No pós-guerra surge a necessidade de estruturação de um Direito Internacional do Trabalho, pois havia resistência das empresas em adotar direitos sob o argumento de que a adoção de tais direitos nacionais afetariam a competitividade com empresas de outros países que não adotassem tais direitos trabalhistas. Como desenrolar dessa necessidade temos o Tratado de Versailles, afirmando o direito de sindicalização e posteriormente a criação da Organização Internacional do Trabalho, que visava a uniformização de condições de trabalho no mundo.

            A Autora afirma que a evolução do processo para se chegar ao atual conceito do contrato de trabalhopassou por três fases: A primeira vai das corporações à Revolução Francesa, quando a relação de trabalho era extremamente pessoal e vinculava a pessoa do trabalhador a pessoa do patrão. A segunda fase vai da Revolução Francesa ao fim do século XIX, marcada pela liberdade contratual individual no mercado caracterizada pela unilateralidade de diretrizes imposta pelo empregador. A terceira fase começa do final do século XIX e caracteriza-se pela autonomização da ideia do contrato de trabalho subordinado não apenas as necessidades empresariais, mas também aos institutos derivados de negociações coletivas dos trabalhadores.

            Impossível não traçar um paralelo entre a história da evolução do direito do trabalho e a evolução dos direitos humanos. Ao acompanhar a trajetória de conquistas traçada pela Autora no âmbito do direito do trabalho, podemos perceber que tais conquistas são, além de trabalhistas, conquistas de direitos sociais e econômicos e civis. Exemplo disso é o caso de mulheres e crianças e o reflexo que a crítica às suas condições de trabalho tem na maneira como são considerados na questão da cidadania.

            Após todos os fatos históricos acima elencados, pode-se dizer que houve um período de regresso do direito coletivo do trabalho. O surgimento de regimes totalitários na Europa mexeu profundamente com a autonomia de sindicatos e agremiações, de modo que estes ficaram totalmente sujeitos aos Estados totalitários: foram abolidos ou transformados em marionetes do regime. Aqui a Autora se atém ao caso da Itália, por este ter sido o maior influenciador da formação de estruturas sindicais no Brasil.

            No período que se segue à Segunda Guerra Mundial, há então uma grande retomada da democratização dos movimentos sindicais, já que são rechaçadas as ideias totalitárias e há uma grande busca pelo bem-estar social. O Welfare Stateproporcionou um ambiente fértil para a reconstrução de ideias de liberdade sindical e associativa. A autora afirma que “são assim, ‘os coletivos de trabalho, coletivos sindicais, as regulações coletivas de direito laboral que fundam e possibilitam a aquisição de proteções sociais no Welfare State’”.

            Se segue ao Welfare State o período do neoliberalismo, que novamente rompe com a evolução das garantias coletivas e critica arduamente os fundamentos e formas práticas e jurídicas dos direitos coletivos. As diversas crises por que passava a economia mundial por volta da década de 1970 impulsionavam o pensamento da relatividade das vantagens dos modelos de sindicalização e negociação coletiva. Esse quadro econômico-social levou a diminuição das garantias de emprego e fragilização dos movimentos sindicais.

             Segue daí uma nova conjuntura que favorece a proliferação de contratos instáveis, temporários, o surgimento de novas figuras autônomas no mercado de trabalho, mecanismos de exclusão social e a substituição de uma sociedade pautada na busca pelo emprego por uma sociedade assentada no desemprego.

            Há tentativas de amenizar as perdas sofridas pelo direito do trabalho nesta época, expressas por exemplo no Tratado de Amsterdam, que reitera a capacidade de associação e os direitos coletivos. Ainda hoje há o desenvolvimento da autonomia coletiva e as demandas coletivas são reconhecidas, mesmo que de forma incipiente.

            Pela narrativa da Autora percebemos que os direitos trabalhistas, em especial os coletivos, passam por fases alternadas de fortalecimento e enfraquecimento de suas proposições e que isto se correlaciona intimamente com as reviravoltas econômicas e sociais do mundo. O inegável é que os paradigmas vêm ficando cada vez mais complexos, devido a fatores como a globalização e a complexidade de uma economia que tem sido cada vez mais virtual.

            Agora a Autora sai da análise histórica da formação do direito coletivo do trabalho e passa a discussões teóricas de institutos e conceitos do direito coletivo do trabalho, usando como base autores como Ermida Uriarte e Kahn Freund.

            Sayonara destaca que para Uriarte existem três paradigmas de regulação da liberdade sindical: o abstencionista, o intervencionista e o sistema unitário, que descrevem basicamente como o Estado interfere nas relações entre empregadores e trabalhadores. Tais conceitos e seus desdobramentos práticos serão posteriormente explorados no texto fazendo correlação com outros autores.

Em seguida a Autora se detém nas ideias de Kahn Freund sobre a regulamentação das intervenções estataisnas relações coletivas de trabalho e a regulamentação das próprias relações coletivas de trabalho. Neste ponto Freund destaca os modelos de negociação, que para ele são dois: contratual ou estático e institucional ou dinâmico. No primeiro caso, as negociações são pontuais no tempo e estendem-se até certo termo. No segundo caso não há um contrato resultante da negociação com um termo inicial e final, mas resoluções bilaterais que serão interpretadas e negociadas pelas partes no decorrer do tempo.

Os estudos de Freund tem como base paradigmática a o sistema abstencionista adotado pela Inglaterra, o laissefaire coletivo. Critica-se o modelo por este fundar-se na ideia de que a abstenção do Estado proporcionaria o ambiente ideal para o equilíbrio das relações coletivas de trabalho.

Passa a Autora a explanar sobre a teoria de Gino Giugni e os conceitos de ordenamento sindical e legislação de sustento. Tais conceitoscorroboram com o pensamento de que o abstencionismo não é o regime ideal de desenvolvimento da liberdade sindical e de negociação coletiva, indicando que deve haver interferência estatal moderada nas relações coletivas de trabalho.

 Neste contexto surge o conceito de proteção promocional, em que o estado promove o ambiente ideal para que a negociação coletiva resulte na proteção dos trabalhadores. Nesta nova fase o agente principal da proteção não é mais o Estado, mas sim os organismos autônomos dos trabalhadores. Aqui a Autora destaca o pensamento de Freitas Júnior sobre os modelos de protecionismo clássico e promocional e seu papel no Welfare State.

Em seguida Sayonara Grillo passa a analisar as perspectivas das relações coletivas de trabalho sob o prisma de um paradigma democrático-constitucional. Este contexto promove a proteção de direitos coletivos por meio de um conjunto normativo constitucional mediante, especificamente, o estabelecimento da garantia de liberdade sindical. Na prática, isso significa garantir aos trabalhadores o direito à associação, à filiação às entidades e direito de ação e organização.

            No plano internacional, isso se exprimiu por meio de tratados, pela Declaração de Direitos do Homem, aprovada em 1948 pela assembléia da ONU e ainda dois importantes pactos do mesmo organismo internacional: o Pacto sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e o Pacto sobre Direitos Civis e Políticos. Todos os documentos elaborados apontam para a liberdade sindical como diretriz internacional do Direito do Trabalho.

Passa a Autora a analisar o papel da Organização Internacional do Trabalho na internacionalização da liberdade sindical, afirmando que a atuação do organismo não se limita a legislação de normas internacionais, mas busca também estabelecer diretrizes da política trabalhista, fiscalizar a aplicação das normas internacionais, receber e apreciar queixas e reclamações em face da potencial violação de suas normas.

Especificamente sobre o direito sindical, a OIT editou duas importantíssimas convenções: a Convenção 87, sobre liberdade sindical (não ratificada), e a Convenção 98 sobre negociação coletiva. A primeira com vista a proteger o sistema de eventuais ingerências estatais e a segunda para proteger dos empregadores.

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A OIT possui órgãos dedicados exclusivamente às questões coletivas, como o Comitê de Liberdade Sindical, criado com a função de analisar especificamente as questões ligadas a infração das liberdades sindicais, seja pelos Estados, seja pelos organismos patronais.

            Sayonara discorre sobre as mais variadas funções assumidas pelo organismo internacional em questão no gerenciamento de conflitos coletivos do trabalho no âmbito internacional, passando por liberdade, greves, associativismo e direitos de filiação.

Destaca a autora a questão da liberdade sindical, adotando a teoria de Arnaldo Süssekind, que afirma que esta deve ser analisada a partir de um triplo aspecto: a) coletiva, b) individual e c) autonomia sindical.

Segue a autora em momento em que o foco é a autonomia sindical constitucionalizada, destacando que a autonomia não é fonte do direito coletivo do trabalho, mas sim a negociação sindical. A autonomia é o instrumento por meio do qual se faz possível que a negociação coletiva torne-se fonte do direito, utilizando os conceitos de autotutela, autonormatização e auto-organização.

Passando ao subitem 2.3, Sayonara Grillo muda o paradigma dos estudos e começa a análise das relações coletivas de trabalho no final do século XX e início do século XXI, que passou por profundas transformações derivadas das tremendas transformações da própria sociedade, a crise do Welfare State e o abalo do fordismo no pós-guerra. O período é marcado por uma nova disposição das tensões entre capital e trabalho decorrente, principalmente, do novo modelo de acumulação capitalista. Esse quadro gerou o que Mattoso chama de “desordem do trabalho”, que se reflete na insegurança do trabalho, que soma a insegurança no mercado de trabalho, insegurança no emprego, insegurança na renda, insegurança na contratação e insegurança na representação do trabalho.

Aqui aparecem as mudanças drásticas na organização do modelo de trabalho, quando o fordismo é substituído pelo toyotismo, pela necessidade que havia de se aplicar um sistema que permitisse a flexibilização do trabalho. O novo sistema permite que a produção se ajuste mais facilmente as demandas do mercado. Uma das consequências mais notáveis dessa necessidade de rápida adaptação às demandas e flexibilização do trabalho é a terceirização.

A Autora conclui que o quadro supracitado cria classes diferentes de trabalhadores (alguns permanentes, outros com contratação precária) e que além disso, a estruturação do trabalho, apesar de ter diminuído a taxa de mortalidade no trabalho, propicia o desenvolvimento de doenças psicológicas nos trabalhadores, decorrentes de altos níveis de estresse a que são submetidos em um sistema que sobrevive de ameaças controladas e distorções comunicativas propositais (Dejours, 1999).

Após fornecer uma visão geral do desenvolvimento do Direito Coletivo do Trabalho no mundo, Sayonara concentra-se em abordar as relações coletivas de trabalho no Brasil.

A Autora elege como primeiro interregno digno de destaque a primeira república, momento em que se formava uma identidade do trabalho decorrente do enfrentamento da herança da escravidão, que ainda marcava o modo como a sociedade brasileira encarava seus trabalhadores.

Neste contexto surgiram as associações de trabalhadores, que propiciavam um ambiente fértil não só para identificação entre os trabalhadores, mas também para o crescimento de tensões coletivas e identidade dos trabalhadores.

Datam deste período os primeiros movimentos de categorias de trabalhadores reivindicando direitos que achavam seus como coletividade. Tais movimentos, â época não logravam de aceitação e terminaram em repressão policial.

Começa, então, a entrada dos conflitos do trabalho no direito brasileiro. Seguiram-se greves e movimentos, indicando a necessidade de se formar uma legislação de regulamentação de tais situações. O que culminou no Decreto n. 1.637/1907: a primeira lei de sindicalização nacional.

As condições críticas causadas pela Primeira Guerra Mundial criaram o pano de fundo para que os movimentos sindicais se fortalecessem e fossem deflagradas um número inédito de greves por todo o país. Como resultado, houve grande repressão policial e até mesmo dos setores patronais para impedir a sindicalização.

Foi em 1926 que houve um marco na história do direito do trabalho no Brasil, quando este direito foi citado explicitamente na Constituição Federal pela primeira vez. A partir daí o congresso passou a legislar frequentemente sobre matérias trabalhistas, de modo que ao fim deste mesmo ano, vários assuntos de direito do trabalho já estavam legalmente abrangidos.

            Depois da Revolução de 1930, foi editado o Decreto n. 19.770/1931, que legislava sobre sindicalismo se opondo ao decreto n. 1.607, mas que instituía a unicidade de representação sindical por classe de trabalhadores, importante restrição à liberdade e à autonomia sindicais. Outra restrição era a exigência de que o sindicato fosse reconhecido pelo ministério do trabalho.

Daí seguiu uma fase de ativismo tanto dos movimentos dos trabalhadores, quanto do empresariado, quanto do Estado, este na figura do Ministério do Trabalho, Industria e Comércio, desarticulando os movimentos sindicais para logo após rearticulá-los em sua estrutura, em um projeto de corporativismo que foi até mesmo acieto por parcelas do operariado.

Resultado de lutas, alguns relevantes direitos trabalhistas foram normatizados na Constituição Federal de 1934. A Justiça do Trabalho foi instituída como órgão não jurisdicional, integrada ao Ministério do Trabalho. Curiosamente, foi a única Constituição que consagrou a pluralidade sindical no Brasil. Apesar disso, não garantia o direito de greve, o que enfraquecia em parte a figura das convenções coletivas.

Ainda no ano de 1934 foi editado o decreto 24.694 que castrava a pluralidade sindical, indo na contramão das disposições constitucionais. A proibição ao pluralismo não era direta, mas as regras colocadas pelo decreto para a constituição de um sindicato, na prática impediam que houvesse mais de dois sindicato por categoria, não existindo no Brasil, apesar da permissão constitucional, um verdadeiro pluralismo sindical.

É chegado o Estado novo, momento em que o corporativismo e o fascismo ditam as regras das políticas adotadas pelo governo Vargas, momento em que a legislação é quase uma cópia das legislações européias de cunho fascista, como a Carta Del Lavoro, que foi praticamente copiada no art. 138 da Constituição do período. O corporativismo controlava a repressão às entidades sindicais.

Em 1939 veio a Lei Orgânica de Sindicalização Nacional, em substituição ao decreto 24.694/1934, já que o decreto nesta época já não tinha razão de existir, pois o corporativismo havia mitigado a necessidade de o Ministério articular suas pretensões de controle da organização sindical. A LOSN é a predecessora do Título V da Consolidação das Leis do trabalho, e traz toda a terminologia que seria usada daí para a frente na construção do que viria a ser o direito sindical no Brasil.

            Um importante instituto estabelecido na LOSN foi a possibilidade de os sindicatos imporem uma contribuição aos sindicalizados, fato que afetaria as estruturas sindicais no Brasil ainda por muitos anos.

Outro fator importante foi a definição dos critérios de enquadramento sindical. Este seria feito por categorias definidas em um quadro elaborado pelo Ministério do Trabalho Industria e Comércio, impedindo a livre associação de trabalhadores por critérios diversos da identificação de categoria.

Neste ponto a legislação já definia a estruturação, a definição do enquadramento sindical e o imposto sindical obrigatório: os três fatores que regeriam o direito sindical brasileiro urbano (sindicatos rurais excluíam-se de algumas regras, como a contribuição sindical obrigatória).

Na década de 1940 foram instituídos o salário mínimo e a Justiça do Trabalho no contexto de valorização da figura de Getúlio Vargas. A instituição de tais fatores não é vista apenas como vantagens adquiridas pelos trabalhadores, mas é estudada pelos teóricos como jogadas estratégicas do governo de alcançar seus objetivos de controle, tanto do mercado industrial como dos trabalhadores por meio da imposição da ideologia vigente. A justiça do Trabalho, que era desvinculada do Poder Judiciário, era usada pelo Estado como meio de intervir nos dissídios coletivos.

Conviviam neste cenário a normatividade da Justiça do Trabalho e as convenções decorrentes de negociações coletivas. Neste contexto, consolidou-se um sistema estático de contratação com base no princípio da anualidade que marcava uma data-base para a ocorrência dos dissídios.

A justiça do Trabalho até os dias de hoje ainda é instituição controversa e tem defensores e opositores segundo Sayonara. Os que se opõe, dizem que a criação da justiça do trabalho impediu que fosse criada uma classe dos trabalhadores mais forte e independente. Os que defendem alegam que a classe dos trabalhadores foi historicamente oprimida no Brasil, e havia a necessidade de proteção deste segmento social, coisa alcançada pela criação da Justiça do Trabalho.

Pode-se dizer que para além da Justiça do Trabalho, o maior legado deixado pelo governo de Getúlio Vargas para o Direito do Trabalho e para a própria sociedade foi a Consolidação das Leis do Trabalho, sancionada em 1° de maio de 1943. Apesar  da importância da Lei, ela pouco inovou as relações do trabalho à época, já que era apenas uma grande junção da legislação já existente. O CLT foi a primeira reunião sistematizada do chamado Direito Individual e do Direito Coletivo do Trabalho.

Curiosamente a CLT dava tratamentos diferenciados aos dois ramos do Direito do Trabalho: enquanto incentivava a integração no âmbito individual, controlava e reprimia, por meio de uma legislação corporativista, o a autonomia no exercício de direitos coletivos.

Em 1945, quando Vargas rumava para a redemocratização, houve certa abertura política, o que possibilitou a anistia de alguns presos que compunham as lideranças comunistas e sindicais. Após isso, formou-se o MUT- Movimento Unificado dos Trabalhadores – que lutaria por uma reforma em prol de uma maior liberdade dos movimentos sindicais e principalmente pelo fim da vinculação ministerial, o que gerou várias greves nos anos de 1945 e 1946.

Esses fatos culminaram na edição do Decreto-lei n. 9.070, de março do 1946, chamado de Lei de Greve, que disciplinou as paralisações e obstou sua realização, além de criminalizar algumas práticas de resistência operária.

Um tema que instiga as discussões teóricas é o porque no Brasil o rompimento da ditadura e a redemocratização não foram acompanhados da reforma do regime normativo, passando do corporativismo para a ampliação das liberdades sindicais, como ocorreu em países europeus. Teóricos afirmam que este paradoxo se dá pela heterogeneidade do sindicalismo do período que atrelava decisões de comunistas e varguistas.

Depois do período constituinte de 1946, foram, novamente, consolidados na nova constituição a contribuição sindical obrigatória, a unicidade sindical, o intervencionismo ministerial e o corporativismo sindical, confirmados na jurisdição que seguiu o processo.

Por outro lado, a Constituição de 1946 enquadrou a Justiça do Trabalho no Poder Judiciário e estruturou essa Justiça no modelo tradicional de hierarquia judiciária. Após isso, seguiu-se um período caracterizado pelo processo de afirmação do caráter normativo da Justiça do Trabalho e definição dos limites deste poder.

A Autora passa a analisar o período que chama “interregno democrático”, dav promulgação da Constituição de 1946 ao governo de João Goulart. Destaca que neste período o sindicalismo buscou sua independência em relação ao Estado, agindo com autonomia, ainda que tal autonomia seja questionada doutrinariamente por estarem os movimentos sindicais ligados a interesses partidários e políticos.

O interregno democrático, segundo a articulista, não foi exatamente democrático para os movimentos sindicais, que sofreram com a repressão principalmente a partir de 1947, com grande intervenção do Ministério do Trabalho nas instituições sindicais, como a CTB e o MUT. A situação foi agravada pelo cenário internacional da Guerra Fria e a perseguição aos comunistas, que acarretou a declaração de ilegalidade do PCB, que era ligado a muitos setores sindicais.

Além desses fatores, não foi votado o projeto de lei que regulamentava o sindicalismo como previsto no artigo 159 da Constituição de 1946, abrindo espaço para o regime corporativista sustentado pela CLT.

Seguiu o governo Vargas, que manteve o sistema como estava, apesar da pressões que sofria. Com o suicídio do presidente, conservou-se a idéia de trabalhismo. Vem, então, o governo de JK, com grande incentivo industrial, que aumentou a demanda por mão de obra multiplicando grandemente o número de trabalhadores. Com seu plano de desenvolvimento de 50 anos em 5, JK adotou medidas que se mostrariam insustentáveis: a tendência de congelamento de salários que não poderia conviver com a alta da inflação. Esse quadro gerou greves, com destaque para a greve dos 400 mil, ocasião em que os trabalhadores conseguiram, em decisão do TST, o aumento de 25% dos salários.

No governo JK o movimento sindical se fortaleceu também devido a diminuição do intervencionismo do Ministério do Trabalho, ainda que mantida a estrutura corporativista. Intensificou-se a criação de sindicatos.

O período de 1960 a 1964 caracterizou-se pelo fortalecimento dos movimentos sindicais. Em 1963 isso transpareceu na greve dos 700 mil, que reuniu várias categorias de trabalhadores e evidenciou o poder negocial dos sindicatos e a amplitude das pautas em discussão.

Esses movimentos evidenciaram a incapacidade do sistema implantado pelo Estado Novo de gerir adequadamente os conflitos coletivos. Isso foi usado como um dos pretextos para o golpe militar de 1964. A ditadura instalada instaurou uma segunda fase nas relações de trabalho: da flexibilização regulatória e repressão ao movimento sindical.

A ditadura militar foi marcada pela diminuição dos direitos sociais, inclundo os trabalhistas coletivos. Por exemplo a proibição da greve nos setores considerados essências pelo governo. Há ainda a criação do FGTS em 1966, que acabou por aumentar a insegurança pessoal dos trabalhadores por extinguir a estabilidade decenal e diminuir salários. Os sindicatos e movimentos coletivos estavam submetidos ao Estado.

A Autora destaca três legados do período ditatorial: a extinção da estabilidade decenal, a redução do poder normativo da Justiça do Trabalho e o limite à aquisição de reajustes salariais, que levaram os sindicatos a incluírem em suas pautas melhores condições de trabalho, para além dos salários.

O ano de 1978 foi marcante para o Direito do Trabalho no Brasil, pois foram deflagradas várias greves que resultaram na melhora das condições de trabalho de mais de um milhão de trabalhadores, especificamente em relação aos salários. A partir daí acirrou-se a repressão governamental aos movimentos coletivos, o que teve como contrapartida o aumento do número de greves em protesto. Esses movimentos no presente contexto ganhavam ares de luta pela cidadania, de modo que alcançaram forte dimensão política. Postulava-se por liberdade sindical, direito de greve, organização nos locais de trabalho, negociação coletiva e o direito de contratação coletiva das condições de trabalho. Com o fim do período da ditadura militar, os movimentos sindicais ganharam força, foram deflagradas várias greves e aumentou exponencialmente o número de dissídios coletivos.

Veio então a Constituição de 1988, que continha em si uma caráter mais protetivo do trabalhador, como o reconhecimento da capacidade ativa dos sindicatos. A Justiça do Trabalho foi reformulada e ampliada, determinada a criação dos TRT’s em cada Estado da Federação. Agora a normatividade de Justiça do Trabalho não estava subordinada a lei ordinária, mas à própria Constituição.

A Constituição de 88 ampliou a autonomia sindical, mas esta era mitigada pela forte presença ainda de elementos corporativistas. A Constituição de 88 manteve a contribuição sindical obrigatória, a solução jurisdicional dos conflitos por meio do poder normativo, o monopólio da representação das categorias e a unicidade sindical. Alguns autores chamam de “neocorporativismo” esse sistema híbrido adotado pela Constituição de 1988, que, apesar de manter construtos corporativistas, incentiva a liberdade e autonomia sindical.

A greve foi reconhecida como direito fundamental dos trabalhadores, inclusive dos servidores públicos, o que significou grande avanço no assunto, com apenas uma pequena limitação a serviços essenciais e inadiáveis. Apenas posteriormente, em 1989, haveria um esvaziamento do amplo direito a greve com a edição da Lei 7.783/1989, que versou sobre “abuso do direito de greve” nos casos em que a greve fugisse aos padrões do que havia sido determinado na lei. A Constituição também favoreceu a autonomia e a negociação coletiva, que propiciou, também, o desenvolvimento da idéia de flexibilização.

Os narrados de Sayonara analisados nos permitem ter uma visão geral do desenvolvimento do direito e das relações coletivas do trabalho no Brasil. Principalmente a parte final, que nos proporciona uma narrativa histórica extensa e detalhada do processo de evolução dos conceitos que entremeiam as relações coletivas do trabalho e sua evolução particular no país.

Por meio da narrativa histórica aliada aos conceitos teóricos descritos na Obra de Sayonara, podemos perceber que o Direito Coletivo do Trabalho no Brasil, apesar de acompanhar algumas tendências mundiais, é algo sui generis, que evoluiu de maneira muito particular para adaptar-se às condições da realidade brasileira, comportando-se muitas vezes de maneira diversa do acontecido na experiência europeia, por exemplo.

A necessidade de adaptação de institutos do direito coletivo do trabalho por entre as várias fases da sociedade e da política nacional criaram algo singular, por vezes paradoxal, como a manutenção de preceitos tipicamente corporativistas ao mesmo tempo que se fomenta a liberdade e autonomia sindical.

Apesar de tais condições não tão ideais, é observável que os avanços das liberdades dos movimentos sindicais foram positivos, gerando um horizonte de expectativa otimista neste tema em relação a desenvolvimentos futuros. Isso soma ao fato de que a complexidade das relações trabalhistas modernas (principalmente relacionadas ao fenômeno da terceirização) exigem um maior ângulo de abertura das liberdades de autonomia, representação e negociação coletivas.

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