Análise das taxas de polícia e serviço público

29/09/2014 às 08:24

Resumo:


  • Considerações históricas sobre o tributo desde a consolidação da ideia de Estado como gestor dos interesses da sociedade.

  • Definição de tributo como prestação pecuniária compulsória, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa vinculada.

  • Modificações na identidade dos tributos ao longo do tempo, de acordo com o sistema de governo e o Regime Jurídico vigente.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Trata-se de uma abordagem sobre a espécie de tributo denominada Taxa, diferenciando suas espécies "taxa de serviço" e "taxa de polícia". Para tanto, traçar-se-á um histórico do tributo, seguido da conceituação de taxa e as peculiaridades de suas espécies.

1 Considerações históricas sobre o tributo

Desde que se consolidou a ideia de Estado como gestor dos interesses da sociedade, entendeu-se também que era necessário haver alguma espécie de arrecadação de valores para que o Estado custeasse a si mesmo, sendo assim capaz de promover o interesse público. Esses valores são chamados tributos e é de fato o valor  que os particulares pagam ao Poder Público para que seja convertido em prestações de várias espécies, tendo como fim último o interesse dessa mesma sociedade.

Este pensamento encontra apoio na ideia de Contrato Social, preconizada por Rousseau, que delineou serem os seres humanos incapazes de habitar pacificamente de maneira horizontal sem uma força coatora que os regulasse. Assim, criou-se um Poder, o Estado, que conteria parcelas das liberdades individuais desses sujeitos habitantes da sociedade. Assim, discorre o mestre ROUSSEAU (2003, p.31):

Achar uma forma de sociedade que defenda e proteja com toda a força comum a pessoa e os bens de cada sócio, e pela qual, unindo-se cada um a todos, não obedeça todavia senão a si mesmo e fique tão livre como antes.

Com este “Poder”, seria capaz de impor limitações a estes mesmos particulares, de maneira a provocar o respeito mútuo ou coagir as pessoas a respeitarem-se mutuamente em relação aos direitos fundamentais de outrem.

Com este mesmo poder, seria obrigado a prestar uma série de atividades objetivando o bem estar desta sociedade que com tamanha boa fé confiou no Estado. Confiança essa que, na democracia representativa, é demonstrada através da eleição dos representantes, detentores da Função de Governo e com este poder, ganham o poder de criarem as diretrizes e promoverem as ações de promoção e restrição de direitos que descambem, em última instância, no interesse público.

As atividades supracitadas serão exercidas através da Administração Pública, o viés do Poder Executivo responsável por dar personificação às ações práticas de benefício público, através das atividades da Função Administrativa: Serviço Público, Poder de Polícia, Intervenção Estatal no domínio econômico e fomento. O instituto responsável por essa concretização pode ser comparado a uma Máquina, a Máquina Pública – personificação da Administração Pública e representada por todos os seus órgãos, criaturas e contratantes.

Para esta série de atividades ocorrer, no entanto, é necessário existir, como já supramencionado, um custeio. A sociedade deve pagar valores para que a Máquina Pública possa não apenas subsistir, mas também prover-se de recursos necessários para praticar as atividades de benefício público, já mencionadas. Estes valores a serem arrecadados são chamados de “tributos”. Seu conceito vem delineado pelo Código Tribuário Nacional, em seu art. 3º:

Art. 3º Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.

Os moldes nos quais se formatou a identidade desses institutos modificaram-se ao longo do tempo, do sistema de governo e do Regime Jurídico vigente, tendo passado por épocas de maior ou menor intervenção do Estado de acordo com a ideologia política dominante. Assim, na época do Absolutismo, o poder de tributar encontrava poucas fronteiras, inclusive existindo coincidência entre o patrimônio público e privado, dando formatação ao conhecido Patrimonialismo.

Quando da Revolução Francesa, promovida pela classe burguesa no intuito de libertar-se das rédeas rigorosas de um Estado arbitrário, separaram-se as instâncias pública e privada, estando o Estado submetido ao chamado Estado de Direito. A decorrência desse acontecimento foi que todo o poder estatal passou a ser condicionado à aprovação da sociedade como condição legitimadora, sendo assim de fato o Estado gestor do interesse público e não mais uma força arbitrária munida de coerção desregulada sobre os particulares.

A formatação dos tributos, como é consequente, sofreu mutações de acordo com estas diferentes modificações de sistema. Na época do Absolutismo a figura do tributo era oscilante, uma vez que o Poder Público podia exigi-lo de maneira desregrada, inclusive para interesses próprios. Nessa época não havia uma regulação científica, legal e apta a sancionar da ciência dos tributos. Por isso o tributo dissociava-se do fim último de promover o interesse social, tratando-se de uma verdadeira coação pecuniária que o Estado exercia sobre a sociedade sem, em compensação, prestar contrapartida  adequada.

Quando o Liberalismo estabeleceu-se, trazendo a figura do Estado Mínimo, que preconizava pela intervenção mínima do Estado na Iniciativa Privada, com fulcro de extinguir as arbitrariedades supramencionadas, a figura do tributo, como é cediço, formatou-se. Desta feita remodelou-se a antiga ideia de tributação em uma noção a ser afastada do sistema econômico, uma vez que representa a intervenção do Estado na vida dos particulares através da obrigação da pecúnia.

No entanto, entendeu-se que mesmo que à iniciativa privada fosse relegada grande parte dos serviços, o Estado continuaria existindo e portanto deveria haver sim um custeio para as atividades – agora com um caráter mais subsidiário – que continuariam a existir. A este passo, consolidava-se a ideia do Neoliberalismo, um liberalismo com contornos sociais através do qual o Estado poderia intervir em alguns aspectos na iniciativa privada, porém de forma regrada e com objetivos específicos de promover o bem social e explorar a atividade econômica nos moldes estritamente constitucionais. Sendo este o caso de segurança nacional, relevante e interesse público ou nos casos previstos em lei, como é explicitado no art. 173 da Carta Magna.

Com o Estado Neoliberalista entendeu-se que a existência de tributos era a única garantia de não-intervenção total do Estado, uma vez que esta arrecadação viesse nos moldes legais, ou seja, uma verdadeira expressão do Estado de Direito uma vez que o Estado estaria – e está – limitado pela Constituição Federal e pelas Legislações complementares no seu exercício de arrecadação de tributos.

Dado esse contexto, aproxima-se mais do momento atual no qual vive-se ainda em um Estado Neoliberalista com contornos sociais, que valoriza a iniciativa privada, mas no qual o Estado toma para si certas atividades que entende serem essenciais ao bem estar coletivo – sendo este o chamado serviço público.

Ao mesmo tempo, entende que devem haver certas restrições à vida dos particulares com fulcro na necessidade de promover e harmonizar os interesses também privados e assim conseguir-se atingir um interesse público.

 A essas restrições – que atingem de maneira específica a liberdade e a propriedade dos particulares – é dado o nome de Poder de Polícia Este, ao lado do Serviço Público, o Fomento e a Intervenção Estatal no Domínio Econômico compõem o conceito de Função Administrativa, que trata-se precisamente do sentido objetivo da Administração Pública, sendo assim as atividades que esta exerce: Seu objeto.

Dentre estas atividades que compõem o conceito de Função Administrativa, o presente artigo visa focar o Serviço Público e o Poder de Polícia justamente por serem aquelas cuja prestação incidirá na existência do tributo aqui a ser tratado: A Taxa.

2 Taxas: Configuração e caracteres diferenciadores.

A taxa é uma das cinco espécies de tributos. É um tributo que possui como característica diferenciadora o fato de seu fato gerador depender de uma ação estatal específica, podendo configurar-se essa em prestação de serviço público específico efetivo ou potencial e atuação do efetivo de poder de polícia.

Ao expor que seu fato gerador está vinculado a uma ação estatal específica, demonstra-se que este se trata verdadeiramente de um tributo vinculado diretamente, uma vez que não é a ação por si do particular que cria o fato gerador a justificar sua existência e cobrança e sim uma atuação estatal específica, neste caso tratando-se da manifestação de serviço público específico ou da atuação do poder de polícia.

A lei que dispõe de maneira específica sobre a Taxa é o Código Nacional Tributário, em seus artigos:


Art. 77 - As taxas cobradas pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição.

 Parágrafo único. A taxa não pode ter base de cálculo ou fato gerador idênticos aos que correspondam a imposto, nem ser calculada em função do capital das empresas.

Para uma devida compreensão das hipóteses de incidência da taxa, é necessário desmembrar as duas espécies de atuação estatal que causam sua incidência: Exercício regular do Poder de Polícia e Utilização, efetiva ou potencial, de serviço público, para assim compreender-se

Quanto à razão de ser da Taxa, pertinente se faz a lição de LUCIANO AMARO (2013, p. 53) sobre o tema:

As diversas teorias sobre taxas ora sublinham a existência de um benefício ou vantagem para o contribuinte, dando a elas um caráter contraprestacional, ora as veem como reembolso do custo da atuação estatal, ora as caracterizam meramente como tributo ligado à atuação específica do Estado, abstraídas eventuais vantagens que possam ser fruídas pelo contribuinte.

Estas visões estão ligadas a dois viés específicos das taxas, que são verdadeiramente as espécies de atuação estatal apta a configurar seu fato gerados, sendo estas, como supramencionado, a prestação efetiva ou potencial do serviço público e o exercício regular do poder de polícia.

Assim, é perceptível que o fato gerador dessa espécie tributária é a uma atuação estatal e não a uma ação do contribuinte, o que a configura inequivocamente como um tributo vinculado.

Importante destacar os outros caracteres através dos quais as taxas diferem dos tributos restantes, sendo um deles a não-devolutividade, característica que a diferencia do empréstimo compulsório, uma vez que enquanto neste tributo o valor pago ao Fisco é posteriormente restituído, naquela isso seria impossível.

Apresenta-se ainda a categorização relativa à destinação específica. É cediço que a taxa para serviços públicos tem sua destinação específica atrelada aos serviços cuja prestação enseja seu fato gerador. Já a taxa de polícia, no que pese a divergência doutrinária sobre o tema, é majoritariamente considerada como tributo sem destinação específica, uma vez que irá verdadeiramente custear a existência do poder de polícia e não trata-se de contrapartida de uma prestação positiva. Essa diferença será explanada com maior especificidade adiante, quando da diferenciação entre taxas de serviço e de polícia.

No tocante à caracterização da taxa em relação às outras espécies tributárias é ainda importante colocar que os serviços aos quais está destinada a custear são serviços divisíveis. Afastando-se uma ideia de serviços com destinatário geral e inominado (coletividade) a serem custeados, por exemplo, pelos impostos, um tributo não vinculado. A divisibilidade dos serviços cuja prestação enseja a taxa é de fato um critério de distinção pois denota a aptidão de individualizar-se o contribuinte, fator de extrema importância para o delineamento do tributo.

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Nesse sentido, explica ainda AMARO (2013, p. 54):

O que está assente é que, se as atividades gerais do estado devem ser financiadas com impostos, arrecadados de toda coletividade, há outras atividades estatais, que dada sua divisibilidade e referibilidade a um indivíduo ou a um grupo de indivíduos determinável, podem (e, numa perspectiva de justiça fiscal, devem) ser financiadas por tributo, pagos pelos indivíduos a quem estas taxas se dirigem.

 

Por fim e almejando-se avançar para análise das espécies de taxa, uma última lição da mesma autora demonstra a peculiaridade do contribuinte da taxa, cuja configuração será o verdadeiro fato determinante do delineamento desse tributo, de modo a apartá-lo dos demais:

“Contribuinte da taxa será (...) a pessoa que provoca a atuação estatal caracterizada pelo exercício do poder de polícia ou a pessoa a quem seja prestada (ou à disposição de quem seja colocada) a atuação do Estado ,traduzida num serviço público divisível. Temos, assim, taxas de polícia e taxas de serviço”.

No mesmo sentido, ICHIHARA (2009, p.84):

A taxa tem como característica, na materialidade de ser fato gerador a “atuação estatal diretamente referida de seu contribuinte”, em forma de contraprestação de serviço.

3 Taxas de Serviço e de Polícia

Como supracitado as taxas podem ser de serviço ou de polícia.

Nesse sentido, a Carta Magna:

Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:

(...)

II - taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição;

 

Assim, analisar-se à inicialmente a taxa de serviço.

 

3.1. Taxas de serviço

Visando uma adequada explicação sobre os caracteres que compõem a “taxa de serviço”, inicialmente é imperioso apresentar o conceito de serviço público que alicerça esta explanação, sendo este abaixo descrito, nas palavras do grande mestre MELLO (2004, p.620):

Serviço público é toda atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material destinada à satisfação da coletividade em geral, mas fruível singularmente pelos administrados, que o Estado assume como pertinente a seus deveres e presta por si mesmo ou por quem lhe faça as vezes, sob um regime de Direito Público – portanto consagrador de prerrogativas de supremacia e de restrições especiais – instituídos em favor dos interesses definidos como públicos no sistema normativo.

 

Dado atemporal conceito de serviço público, cabe salientar que no tocante às taxas, os serviços que caracterizam seu fato gerador são somente aqueles divisíveis, ou seja, aqueles serviços nos quais o destinatário é identificável, pode ser individualizado.

Esta é a principal distinção entre esta espécie tributária e as contribuições; Uma vez que enquanto estas se referem a serviços indivisíveis, de caráter geral, nas taxas trata-se de serviços divisíveis, aqueles nos quais o destinatário pode ser identificado.

Superado este momento é chegada a hora de caracterizar os serviços a serem cobrados com taxa. Para tanto, faz-se uso da letra do CTN, que preceitua em seu art. 79 que estes deverão ser:

Art. 79. Os serviços públicos a que se refere o artigo 77 consideram-se:

I - utilizados pelo contribuinte:

a) efetivamente, quando por ele usufruídos a qualquer título;

b) potencialmente, quando, sendo de utilização compulsória, sejam postos à sua disposição mediante atividade administrativa em efetivo funcionamento;

II - específicos, quando possam ser destacados em unidades autônomas de intervenção, de utilidade, ou de necessidades públicas;

III - divisíveis, quando suscetíveis de utilização, separadamente, por parte de cada um dos seus usuários.

Já no primeiro inciso do referido dispositivo, encontra-se uma bifurcação fatal para o entendimento das taxas. Ora os serviços a ensejar este tributo devem ser 1) utilizados pelo contribuinte efetivamente, ora 2) potencialmente colocados a sua disposição. Esta separação de hipóteses é explicitada de maneira confusa pelo legislador por mera imperícia vernácula, mas que é de rápida cognição pelo leitor atento.

A primeira e mais autoexplicativa hipótese refere-se a situações nas quais o contribuinte estará fatual e diretamente usufruindo de um serviço público divisível. Referindo-se a esta hipótese, ICHIHARA (2009, p.85) explica e exemplifica:

O serviço público deverá ser utilizado ou usufruído pelo contribuinte, por exemplo, a taxa de expedição de certidão (O Estado preste um serviço fornecendo a certidão e o contribuinte, recebendo diretamente ou usufruindo o serviço prestado pelo Estado, paga o tributo em espécie de taxa).

 

Esta hipótese é de mais simples cognição pois apresenta uma situação e interação e contrapartida direta e portanto, mais aparente. Tal como um caráter de reciprocidade em relação a uma prestação positiva por parte do Estado, ou seja, uma ampliação de direitos na vida do contribuinte.

No entanto, como demonstrado, existe outra hipótese, menos óbvia, da cobrança de taxas por serviço público. Trata-se de serviço público de prestação obrigatória colocado à disposição pelo Estado. Este é o caso ao qual refere-se a segunda parte do art. 79, I, ao mencionar os serviços “potencialmente (...) colocados à disposição.”

Esta diferenciação ocorre pois trata-se de uma hipótese que admite a possibilidade de não fruição pelo destinatário do serviço público em questão. Ora, tratando-se de serviço cuja prestação seja obrigatória pelo Estado e este tenha, por isso mesmo, o colocado à disposição do potencial usuário, poderá ser sobrada a ataxa do mesmo, ainda que não o tenha efetivamente utilizado. Exemplo clássico é o da taxa de recolhimento de lixo, sobrada ainda que o contribuinte esteja viajando e portanto não produza lixo.

Importante ainda ressaltar que quando o serviço público em análise for prestado por concessão ou permissão, este será cobrado por tarifa e não por taxa, não obstante seja divisível. Isso porque a  capacidade tributária ativa das taxas é das pessoas jurídicas de direito público, sendo limitada aos entes da federação e a suas autarquias.

Fato este que, considerando que no outro pólo do contrato de concessão ou permissão está o particular – que executará a tarefa a ele delegada – torna impossível que o mesmo cobre taxas, devido precisamente a seu regime jurídico.

Visando ainda a caracterização dos serviços por este tributo contemplados, vem à pauta o restante da definição de serviços público divisíveis e específicos, analisando-se agora o caráter “específico”.

Por serviço público específico trata-se daquele que possui estrutura delimitada, ou seja, estrutura própria apta a realizar de maneira própria suas execuções. Trata-se precisamente do conceito de uma unidade autônoma.

Dadas essas considerações, segue-se ao conceito de taxas de polícia.

3.2. Taxas de polícia

Para fins do presente estudo, utilizar-se-á do conceito trazido pelo próprio CTN e que irradia-se para os vários remos do direito público quando vem à tona a questão da conceituação do Poder de Polícia, sendo este:   

Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interêsse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de intêresse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.

 

                  Dado o referido conceito, percebe-se imediatamente uma diferença substancial entre as taxas de serviço e as de polícia, pois enquanto aquelas se prestam, em regra, a integrar o valor que custeia um serviço específico prestado (ou potencialmente posto à disposição), nas taxas do poder de polícia o mesmo não ocorre, uma vez que não há uma prestação positiva. Há, de fato, uma prestação negativa. Ou seja, a restrição de liberdade e propriedade visando, em âmbito mais amplo, a consecução do interesse público.

Dado este caráter, é destoante pensar que custeia-se o uma prestação, levando-se a crer, portanto, que o fundamento da taxa de polícia é de fato o custeio da própria existência do poder de polícia, de maneira geral e sem o fim de amplitude de direitos de maneira direta.

Ora, é cediço que embora haja restrições individuais, o poder de polícia objetiva o bem-estar da coletividade. No entanto este fundamento não é o suficiente para se visualizar a taxa como uma prestação que objetiva a consecução direta dos atos que compõem o poder de polícia, precisamente porque, na observação da vida prática, verifica-se que estes atos se dão por meio de atuações que não são do interesse pessoal do destinatário do poder de polícia, naqueles momentos específicos em que este se manifesta.

Assim, logicamente e considerando a necessidade da polícia administrativa para o controle social, leva-se a crer que o fundamento da taxa de polícia é o custeio da própria existência do poder de polícia e não de atos específicos que emanam do mesmo. Esta fundamentação foi traçada unicamente com o objetivo de sustentar a posição de que a taxa de polícia é uma taxa sem destinação específica, de maneira diversa à taxa de serviço.

Ora, pode-se dizer que a destinação do valor pago pelo contribuinte na taxa de polícia é de destinação específica a um órgão – Aquele responsável pela consecução desse poder – mas não a uma atividade específica.

Esclarecido este ponto, parte-se para o desmembramento da espécie de atuação do poder de polícia ao qual refere-se a incidência da taxa. Foi dito que trata-se de “regular exercício do poder de polícia” e este é um conceito que foi explicado no art.78, parágrafo único do CTN:

Art. 78 (...)

Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de polícia quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder.

 

Neste arrimo, identifica-se dois caracteres no termo “regular” presente em “regular exercício do poder de polícia”.

a) O primeiro refere-se à vinculação do exercício de polícia ao devido processo legal, observando-se os trâmites que garantem a tutela dos direitos e garantias fundamentais daqueles sujeitos à atuação legal desse poder;

b) O segundo aspecto refere-se à efetividade do exercício do poder de polícia. Isso quer dizer que ele deve estar ativo, atuante. Não basta, portanto, mera expectativa de atuação. Não existe nessa espécie e tributo a possibilidade de taxa para “potencial prestação do poder de polícia”, como poderia-se desavisadamente pensar, através de uma analogia superficial com a taxa de serviço.

Ao trata-se da taxa de polícia, para que esta possa ser cobrada, o poder de polícia deve estar em pleno exercício, ativo. Este é o segundo viés da expressão “exercício regular do poder de polícia”.

Por fim, imperioso tecer algumas considerações sobre a cobrança de taxa no tocante à capacidade ativa tributária da mesma.

Ora, ao tratar-se de poder de polícia, trata-se de um poder inerente à administração pública, que deve ser exercido em um regime de direito público. Com fundamento no direito administrativo é cediço que as únicas figuras aptas a exercerem poder de polícia são os entes federados e suas autarquias. Assim são estes aptos a cobrarem taxas.

Quando falar-se de outra figura administrativa cobrando determinado valor com caracteres semelhantes, há de se distinguir imediatamente e encontrar quais os caracteres dissonantes de acordo com a classificação supra, para que se identifique se se trata de outra espécie tributária ou até mesmo preço público. No entanto, de certo, não tratar-se-á de taxa.

Referências Bibliográficas

AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 19ª ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

BRASIL. Código Tributário Nacional. In: Vade Mecum. São Paulo: Saraiva, 2013.

______. Constituição da República Federativa do Brasil (1988). In: Vade Mecum. São Paulo: Saraiva, 2009.

ICHIHARA, Yoshiaki. Direito Tributário. 15ª ed. São Paulo: Atlas, 2009.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 17. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2004.

ROUSSEAU, Jean Jacques. Do Contrato Social. São Paulo: Martin Claret, 2007.


 

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Sobre a autora
Kristal Moreira

Advogada. Professora Orientadora do Núcleo de Prática Jurídica da Faculdade Paraíso do Ceará. Pós-graduanda em Direito Público. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Urbanístico. Autora de diversos artigos.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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