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A guarda compartilhada e a pensão alimentícia

29/11/2014 às 13:16
Leia nesta página:

Na guarda compartilhada, há uma divisão proporcional dos gastos na criação dos filhos, na medida das condições financeiras de cada um dos pais, levando em consideração o que foi previamente acordado.

INTRODUÇÃO

A sociedade brasileira está passando por profundas transformações. A família já não é mais uma instituição patriarcal. O próprio conceito de família já não é mais o mesmo; há inúmeras outras formas de interação que podem ser consideradas família, como até mesmo a família monoparental, ou seja, aquela que possui um só genitor e a respectiva prole.

E essas transformações atingiram o modo como as pessoas se relacionam. Casamentos que antes resistiam apenas de fachada passaram a ser desfeitos de forma bastante simplificada. Hoje, quando há consenso e inexistem filhos menores, os casais podem extinguir o casamento até mesmo em Cartório.

O fim de um casamento não significa (e não deve significar) o fim de uma família. Muito embora a relação entre os ex-cônjuges fique, em muitos casos, estremecida, deve-se haver um mínimo de tolerância para que se possa construir um ambiente saudável para as crianças e para os adolescentes frutos da antiga união.

É muito comum que pai e mãe se digladiem pela guarda de seus filhos. Nesses casos, em regra, o juiz concede a guarda a um deles, e ao outro, sobra apenas o direito a visitas em dias, hora e local marcados. Geralmente cabe ao pai/mãe que não ficou com a guarda do filho o dever de pagar a pensão alimentícia.

Poucos são os casos em que o juiz entende que a guarda compartilhada é a forma que melhor atende às necessidades dos filhos, concedendo-a geralmente nas hipóteses de separação amigável. Entretanto, tramita no Congresso Nacional projeto de lei que determina que a guarda seja sempre compartilhada.

Mas o que é guarda compartilhada? Como ela funciona? Em quais casos não se deve adotá-la. E ainda, persiste o dever de pagar pensão alimentícia nos casos de guarda compartilhada? A quem cabe tal responsabilidade? As respostas para esses questionamentos serão buscadas ao longo deste trabalho.

O PRINCÍPIO DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

Qualquer que seja o tipo de família, os interesses da criança e do adolescente devem ser resguardados. Assim dispõe o caput do artigo 227 da Constituição Federal:

 “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de coloca-los a salvos de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.

Portanto, verifica-se que são três os responsáveis por garantir que as melhores condições sejam proporcionadas às nossas crianças, adolescentes e jovens: a família, a sociedade e o Estado. Para que haja uma proteção efetiva, foram criados o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº. 8.069/1990) e o Estatuto da Juventude (Lei nº. 12.852/13).  

Para que não ocorra a alienação parental ou o distanciamento físico e afetivo de um dos pais em relação aos seus filhos, o instituto da guarda compartilhada ganhou maior relevância em comparação à tradicional guarda unilateral. Isso tudo em benefício da criança e do adolescente.

A GUARDA COMPARTILHADA

Primeiramente, é necessário distinguir a guarda compartilhada da guarda alternada. Nesta, a criança e o adolescente ora ficam um determinado prazo com o pai, ora ficam um determinado prazo com a mãe. Isso não é tão saudável, pois são criados dois ambientes familiares distintos, o que pode prejudicar a formação dos filhos. É o que defende Flávio Tartuce (2012, p. 1131):

“Guarda alternada: o filho permanece um tempo com o pai e um tempo com a mãe, pernoitando certos dias da semana com o pai e outros com a mãe. A título de exemplo, o filho permanece de segunda a quarta-feira com o pai e de quinta-feira a domingo com a mãe. Essa forma de guarda não é recomendável, eis que pode trazer confusões psicológicas à criança. Com tom didático, pode-se dizer que essa é a guarda pingue-pongue, pois a criança permanece com cada um dos genitores por períodos interruptos.”

Já na guarda compartilhada, os filhos efetivamente ficam com apenas um dos pais, - ou o pai ou a mãe, mas todas as decisões a respeito daqueles são tomadas de forma conjunta, como a escola em que irão estudar, o planejamento das férias etc. Para Flávio Tartuce (2012, p. 1132):

“Guarda compartilhada ou guarda conjunta: hipótese em que pai e mãe dividem as atribuições relacionadas ao filho, que irá conviver com ambos, sendo essa sua grande vantagem”.

Evidentemente, para que a guarda compartilhada possa produzir seus efeitos benéficos sobre as crianças e os adolescentes se faz necessário que os pais tenham, no mínimo, uma relação amistosa entre si. Caso contrário, a guarda unilateral, que é aquela em que a guarda do filho fica com apenas um dos pais, e o outro apenas contribui de forma emocional e financeira, se torna a mais recomendável. Segundo Flávio Tartuce (2012, p. 1131):

“Guarda unilateral: uma pessoa tem a guarda enquanto a outra tem, a seu favor, a regulamentação de visitas. Essa era a forma mais comum de guarda, trazendo o inconveniente de privar o menor da convivência contínua de um dos genitores, o que motivou a alteração legislativa”.

A guarda compartilhada, prevista nos arts. 1.583 e 1.584 do CC/02, tem como objetivo básico por um fim na alienação parental. Isso porque o sentimento de “ser proprietário exclusivo da criança” e a postura autoritária frente ao outro pai perdem força quando há um planejamento e uma tomada de decisões conjuntas em razão do real melhor interesse da criança e do adolescente.

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Em suma, o que se pretende com a guarda compartilhada é ter os dois pais presentes e atuantes, em condição harmoniosa. Portanto, situação em que a lei deve sempre estimular. Nesse sentido, acredita-se que será um enorme avanço para a defesa do melhor interesse da criança e do adolescente caso o PL 113/2013 seja aprovado, pois, ainda que um dos pais se recuse a dividir a guarda com o outro, a guarda compartilhada será estipulada. Dessa forma, será concretizado o disposto no art. 3º do ECA:

“A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.

A PENSÃO ALIMENTÍCIA

É errônea a ideia de que durante a guarda compartilhada não mais subsiste a obrigação de pagamento da pensão alimentícia. Como afirmado anteriormente, muito embora as decisões a respeito dos filhos sejam tomadas por ambos os pais, a guarda, evidentemente, fica com apenas um deles. Assim, àquele que não ficou com a guarda cabe a obrigação de ajudar financeiramente.

Porém, há uma divisão proporcional dos gastos na criação dos filhos, na medida das condições financeiras de cada um dos pais, levando em consideração o que foi previamente acordado. Assim, além de dividirem os cuidados e as principais decisões sobre os filhos, os pais também devem dividir as despesas.

E as consequências para aquele que descumprir o acordado, deixando de pagar a pensão, são as mesmas da guarda unilateral, “podendo sofrer execução até com a possibilidade de ver sua prisão decretada, além de outras medidas como a inscrição de seu nome no cadastro de devedores de pensão alimentícia, em empresas de proteção ao crédito como SPC e SERASA”, segundo a Assessoria de Comunicação do IBDFAM.

Portanto, ainda que um dos genitores, que não possuía a guarda da criança, faça um pedido de guarda compartilhada ao juiz, e este revisando a decisão anterior a conceda, o pagamento da pensão alimentícia subsistirá. Pois a mudança da guarda unilateral para a guarda compartilhada trará consequências/benefícios para a criança e para o adolescente, o que não se confundem com a desobrigação financeira.

CONCLUSÃO

Percebe-se que a previsão da guarda compartilhada em nosso ordenamento jurídico foi um grande avanço para a sociedade. Tal guarda traz uma série de benefícios para os filhos dos ex-cônjuges, pois a separação dos pais não se torna empecilho para que a criança e o adolescente possam ter um convívio saudável tanto com a mãe quanto com o pai.

E com a guarda compartilhada o que se pretende é, justamente, a aplicação do princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, concretizando diversos dispositivos do ECA, do CC/02 e, até mesmo, da CF/88. Muito embora a guarda compartilhada se mostre a melhor opção para os pais e para os filhos, ela ainda é pouco utilizada pelos juízes, como aponta estudo promovido pelo IBDFAM.

Portanto, é importante que o Congresso Nacional aprove o PL 113/2013, “que determina que, em caso de desacordo entre mãe e pai quanto à guarda do filho, se os dois estiverem aptos para exercer o poder familiar, o juiz deverá aplicar a guarda compartilhada. A única exceção será quando um dos genitores declarar ao juiz que não deseja a guarda do filho”.

Dessa forma, a guarda compartilhada passará a ser a regra, somente não sendo empregada nos casos em que os ex-cônjuges demonstrem que a má relação entre eles é tamanha, que impossibilite um mínimo de convivência hígida. Nesses casos, profissionais, como por exemplo, assistentes sociais, psicólogos, mediadores, dentre outros, auxiliarão o juiz a identificar a possibilidade ou não da adoção da guarda conjunta.


REFÊNCIAS

FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil - Família. 4ª ed. Salvador: Editora JusPodium, 2012.

TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. 2ª Ed, São Paulo, Editora Método, 2012.

CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Principais Julgados do STF e STJ comentados – 2013. 1ª ed. Manaus: Editora Dizer o Direito, 2014.

Entrevista: Guarda compartilhada e obrigação alimentar. Disponível em: >https://www.ibdfam.org.br/noticias/5103/Entrevista%3A+guarda+compartilhada+e+obriga%C3%A7%C3%A3o+alimentar< Acessado em: 07 de out. de 2014. Publicado em: 07 de ago. de 2013. Autoria: Assessoria de Comunicação do IBDFAM.

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Sobre o autor
Fabrício Cardoso de Meneses

Procurador Federal.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MENESES, Fabrício Cardoso. A guarda compartilhada e a pensão alimentícia. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4168, 29 nov. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/32678. Acesso em: 18 nov. 2024.

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