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A religião entre a pessoa humana e o Estado de Direito

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19/10/2014 às 13:18
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Proposições conclusivas

1) A liberdade religiosa é necessariamente balanceada pelos referenciais de pluralismo, igualdade e tolerância, o que assegura a coexistência das distintas formas de manifestação da espiritualidade, a ausência de posições de preeminência perante a ordem jurídica e a garantia de que todas essas manifestações podem se expandir livremente, sem qualquer censura.

2) A liberdade religiosa alcança tanto o direito de ter uma crença, como o de não ter crença alguma, bem como o direito de emitir opinião crítica sobre qualquer religião.

3) A liberdade religiosa não pode chegar ao extremo de comprometer a vida e a saúde daqueles que não tenham capacidade para externar livremente a sua vontade.

4) O caráter laico do Estado não chega ao extremo de desconsiderar a identidade cultural e as tradições da sociedade, o que autoriza a utilização de símbolos, como o crucifixo, ou a utilização do nome de Deus em documentos oficiais, como o papel moeda, situação que deve perdurar enquanto não difundido um sentimento de discriminação no âmbito das demais religiões.

5) Devem ser aceitas manifestações religiosas, individuais e silenciosas, de agentes públicos (v.g.: utilização da crucifixos, turbantes etc.), mesmo no exercício da função pública, tão-somente enquanto tais manifestações não forem vistas como a postura oficial do Poder Público.

6) O ensino religioso, nas escolas públicas, deve prestigiar a abordagem histórica, sem proselitismo.

7) A assistência religiosa, nos estabelecimentos de internação coletiva, deve preservar a igualdade das distintas religiões existentes, não se mostrando compatível, com a ordem constitucional, a contratação, pelo Poder Público, de religiosos a serem incumbidos dessa atividade.


Referências Bibliográficas:

BARBOSA, Rui. Commentarios á Constituição Federal Brasileira, colligidos e ordenados por Homero Pires, vol. III, Do Poder Executivo, São Paulo: Saraiva & Cia., 1933.

BIDART CAMPOS, German J.. Manual de la Constitucion Reformada, Tomo I, 5ª reimp., Buenos Aires: Ediar, 2006.

CIÁURRIZ, Maria José. La Libertad Religiosa en el Derecho Español, Madrid: Editorial Tecnos, 1984.

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DOUGLAS, William O.. The Right of the People, 4ª imp., New York: Pyramid Books, 1966.

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GARCIA, Emerson. A Moralidade Administrativa e sua Densificação, in Revista de Informação Legislativa do Senado Federal nº 155/153, 2002.

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VENDITI, Rodolfo. L’Obiezione di Coscienza al Servizio Militare, Milano: Dott. A. Giuffrè Editore, 1981.

VERA URBANO, Francisco P.. La Libertad Religiosa como Derecho da la Persona, Madrid: Instituto de Estudios Politicos, 1971.

STARCK,Christian e SCHMIDT, Thorsten Ingo. Staatsrecht, 2ª ed., München: Verlag C.H. Beck München, 2008.


Notas

[1] É a moral crítica a que se referia Hart (2001: 201).

[2] Constituições de 1891 (art. 72, § 3º); 1934 (art. 113, nº 5); 1937 (art. 122, nº 4); 1946 (art. 141, § 7º); 1967 (art. 150, § 5º); e Emenda Constitucional nº 1/1969 (art. 153, § 5º). No Império, face à adoção de uma religião oficial, a católica apostólica romana, eram impostas restrições à manifestação pública de outras crenças: Constituição de 1824, arts. 5º e 179, nº 5. 

[3] Convenção Americana de Direitos Humanos – Pacto de São José da Costa Rica, adotada em 22/11/1969 e promulgada pelo Decreto nº 678/1992 (arts. 5º, 1; e 12, 1); Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada e proclamada pela Resolução 217 A (III) da Assembléia Geral das Nações Unidas, de 10 de dezembro de 1948 (art. 18); e Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, adotado em 16/12/1966 e promulgada pelo Decreto nº 592/1992 (arts. 18, 1; e 27).

[4] Vide Primeira Emenda à Constituição norte-americana de 1787, adotada em 1791; e Constituições alemã de 1949 (art. 4º); andorrana de 1993 (art. 11, 1 e parágrafo único); argentina de 1853 (art. 14); belga de 1994 (arts. 19; e 20); cubana de 1976 (art. 54); espanhola de 1978 (arts. 16 e 20 (1, d)); francesa de 1958 (preâmbulo, art. 2º); holandesa de 1983 (art. 6º, 2); italiana de 1947 (arts. 8º, 19 e 20); japonesa de 1946 (art. 20); portuguesa de 1976 (art. 41); russa de 1993 (arts. 14, 2; 28; e 29, 2); suíça de 1874 (art. 49) e de 1999 (arts. 8º, 2; 15; e 72); e turca de 1982 (art. 15, 2); Declaração de Direitos da Virgínia (EUA) de 1776 (Seção 16); Declaração Dignitatis Humanae sobre Liberdade Religiosa, do Concílio Vaticano II, de 1965; Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (França) de 1789 (art. 10).

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[5] 1 BvR 2084/2005, j. em 13/12/2006, in Neue Zeitschrifit für Verwaltungsrecht 2007, p. 808. 

[6] A Declaração “Dignitatis Humanae”, do Concílio Vaticano II, dispôs que a liberdade religiosa é um direito civil de todos os seres humanos, o que lhes assegura “estarem imunes de coerção tanto por parte de pessoas particulares, como de grupos sociais e de qualquer autoridade humana” (nº 1); acrescendo-se que, “em matéria religiosa, nem se obriga alguém a obrar contra sua consciência, nem se impede que atue em conformidade com ela, em ambiente privado ou público, só ou associado com outros, dentro dos limites devidos” (nº 2).

[7] Constituição brasileira de 1988, art. 5º, II.

[8] Vide as Constituições alemã de 1949 (art. 4º); andorrana de 1993 (art. 11, 2); argentina de 1853 (art. 14); belga de 1994 (arts. 11; 19; e 131) cubana de 1976 (art. 54); espanhola de 1978 (arts. 16 e 20 (I, d)); holandesa de 1983 (art. 6º, 1); italiana de 1947 (arts. 8º, 19 e 20); japonesa de 1946 (art. 20); portuguesa de 1976 (art. 41) e suíça de 1999 (art. 15); Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (França) de 1789 (art. 10). No âmbito do Direito Internacional, vide a Convenção Americana de Direitos Humanos – Pacto de São José da Costa Rica, de 1969 (art. 12, 2 e 3); a Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948 (art. 18); e o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, de 1966 (arts. 18, 2 e 3; e 27).

[9] Um interessante resumo da linha evolutiva da objeção de consciência, em que se percebe uma intensa influência de fatores teológicos, pode ser obtida em Rodolfo Venditti (1981: 6-36).

[10] Sobre a temática, vide as Constituições alemã de 1949 (arts. 4º, 3; e 12a, 1); chilena de 1980 (art. 22); cubana de 1976 (art. 64); espanhola de 1978 (art. 30(2)); holandesa de 1983 (arts. 98, 3; e 99); italiana de 1947 (art. 42); mexicana de 1917 (art. 31, II e III); paraguaia (art. 113); peruana de 1993 (art. 78); portuguesa de 1976 (art. 276); russa de 1993 (art. 59, 3); e suíça de 1999 (art. 59, 3).

[11] Vide as Constituições de 1891 (art. 11, inc. 2); 1934 (art. 17, II). 1937 (art. 32, b); 1946 (art. 31, II); 1967 (art. 9º, II); e Emenda Constitucional nº 1/1969 (art. 9º, II).

[12] Vide as Constituições alemã de 1949 (art. 140 c.c. Constituição de Weimar de 1919, art. 137, I: “Es besteht keine Staatskirche”), andorrana de 1993 (art. 11, 3); belga de 1994 (art. 21, § 1º); russa de 1993 (art. 14, 1 e 2); e suíça de 1999 (art. 72, 2).

[13] BVerfGE 108, 282. Cf. JARASS e PIEROTH, 2009: 153-154.

[14] BVerwGE 90, 112, 116.

[15] O Supremo Tribunal Federal já teve oportunidade de decidir que (1) imóveis de instituição religiosa alugados a terceiros não são tributados pelo IPTU (STF, Pleno, RE nº 325.822/SP, rel. Min. Ilmar Galvão, j. em 18/12/2002, DJ de 14/05/2004); (2) os templos de qualquer culto não estão imunes à contribuição sindical (STF, 2ª Turma, RE nº 129.930/SP, rel. Min. Carlos Velloso, j. em 07/05/1991, DJ de 16/08/1991).

[16] Constituições alemã de 1949 (art. 7º (2, 3)); andorrana de 1993 (art. 20, 3); belga de 1994 (art. 24, § 1º, 3 e § 3º, 1); espanhola de 1978 (art. 27); holandesa de 1983 (art. 23, 3); mexicana de 1917 (art. 3º); peruana de 1993 (art. 22); e suíça de 1999 (arts. 63, 1 e 2; e 66, caput, 1 e 2).

[17] Vide as Constituições de 1934 (art. 113, nº 6); 1946 (art. 141, § 9º); 1967 (art. 150, § 7º); e Emenda Constitucional nº 1/1969 (art. 153, § 7º). No direito comparado, podem ser mencionadas as Constituições alemã de 1949 (art. 4º); argentina de 1853 (art. 14); cubana de 1976 (art. 54); e italiana de 1947 (arts. 8º, 19 e 20).

[18] Vide: Lei nº 6.923/1981 (Dispõe sobre o serviço de assistência religiosa nas forças armadas); Lei nº 7.210/1984 (Institui a Lei de Execução Penal - art. 24); Lei nº 8.069/1990 (Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente - art. 124, XIV); e Lei nº 9.982/2000 (Dispõe sobre a prestação de assistência religiosa nas entidades hospitalares públicas e privadas, bem como nos estabelecimentos prisionais civis e militares).

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Sobre o autor
Emerson Garcia

Membro do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GARCIA, Emerson. A religião entre a pessoa humana e o Estado de Direito. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4127, 19 out. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/32816. Acesso em: 19 abr. 2024.

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