A Execução Trabalhista na Recuperação Judicial

17/10/2014 às 11:34
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Neste artigo procura-se pontuar o conflito de competência, na satisfação do crédito obreiro, entre os institutos da Execução Trabalhista e da Recuperação Judicial.

Em 09 de fevereiro de 2005, a antiga lei de Falências deu lugar a nova Lei nº 11.101, atualmente chamada de Lei de Falências e Recuperação Judicial.

Com o advento desta nova lei o instituto da concordata deixou de existir dando lugar à atual Recuperação Judicial, a qual objetiva viabilizar a superação de crise econômica do devedor, tal qual descreve seu artigo 47, in verbis:

“A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação de crise econômico-financeira do devedor, à fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estimulo à atividade econômica.”(g.n.)

A criação desse novo instituto trouxe algumas implicações à justiça juslaboral, como por exemplo o impedimento da continuação do processo de execução na justiça do trabalho, devendo o prosseguimento do feito, a partir da sentença líquida, se dar no juízo da cível da própria recuperação judicial.

Diferentemente da concordata, que é o antepassado da recuperação. O falido instituto da concordata, conforme entendimento pacífico do STF, jamais freou a continuação do processo de execução, conforme Súmula 227/STF:

“A concordata do empregador não impede a execução do credito nem a reclamação de empregado na Justiça do Trabalho”.(g.n.)

Ou seja, o empregador que estava tentando ganhar fôlego e superar dificuldades dificilmente conseguiria visto que a justiça do trabalho constantemente desviaria o crédito não restando qualquer liquidez aos demais credores.

A partir de então pode se perceber o real motivo de o instituto da concordata ter rumado o fracasso e consequentemente ter dado lugar a recuperação judicial.

Naquele momento o legislador tomou a precaução de viabilizar, mesmo que por um curto prazo, a possível recuperação do devedor, tratando o artigo 6º, § 4º da LRJE, de prever a suspensão temporária, por 180 dias, de todas as execuções, in verbis:

“Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário.

(...)

§ 4º Na Recuperação Judicial, a suspensão de que trata o caput deste artigo em hipótese nenhuma excederá o prazo improrrogável de 180 (cento e oitenta) dias contado do deferimento do processamento da recuperação, restabelecendo-se, após o decurso do prazo, o direito dos credores de iniciar ou continuar suas ações e execuções, independentemente de pronunciamento judicial.” (g.n.)

Findo o prazo de suspensão as execuções trabalhistas poderão prosseguir seu curso normalmente, independente de ter seu crédito inscrito no plano de reabilitação, segundo o art. 6º, § 5º da norma citada. Mesmo com a clareza da norma legal da Lei de Recuperação e Falência, vinha decidindo o STJ pelo deslocamento incondicional das execuções trabalhistas, senão vejamos:

CONFLITO POSITIVO DE COMPETÊNCIA. VASP. EMPRESA EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL. PLANO DE RECUPERAÇÃO APROVADO E HOMOLOGADO. EXECUÇÃO TRABALHISTA. SUSPENSÃO POR 180 DIAS. ART. 6º, PARÁGRAFOS DA LEI 11.101/05. MANUTENÇÃO DA ATIVIDADE ECONÔMICA. FUNÇÃO SOCIAL DA EMPRESA. INCOMPATIBILIDADE ENTRE O CUMPRIMENTO DO PLANO DE RECUPERAÇÃO E A MANUTENÇÃO DE EXECUÇÕES INDIVIDUAIS. PRECEDENTE DO CASO VARIG - CC 61.272/RJ. CONFLITO PARCIALMENTE CONHECIDO. 1. A execução individual trabalhista e a recuperação judicial apresentam nítida incompatibilidade concreta, porque uma não pode ser executada sem prejuízo da outra. 2. A novel legislação busca a preservação da sociedade empresária e a manutenção da atividade econômica, em benefício da função social da empresa. 3. A aparente clareza do art. 6º, §§ 4º e 5º, da Lei 11.101/05 esconde uma questão de ordem prática: a incompatibilidade entre as várias execuções individuais e o cumprimento do plano de recuperação.

4. "A Lei nº 11.101, de 2005, não terá operacionalidade alguma se sua aplicação puder ser partilhada por juízes de direito e por juízes do trabalho." 5. Conflito parcialmente conhecido para declarar a competência do Juízo da 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais da Comarca de São Paulo. (STJ CC 73380 SP 2006/0249940-3 – Relator: Hélio Quaglia Barbosa – Julgamento: 28/11/2007 – Órgão Julgador: Segunda Seção – Publicação: DJE 21/11/2008).

CONFLITO POSITIVO DE COMPETÊNCIA. VIAÇÃO AÉREA SÃO PAULO S.A - VASP. EMPRESA EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL. SUSPENSÃO DAS EXECUÇÕES INDIVIDUAIS. NECESSIDADE. 1. O conflito de competência não pode ser estendido de modo a alcançar juízos perante os quais este não foi instaurado. 2. Aprovado o plano de recuperação judicial, os créditos serão satisfeitos de acordo com as condições ali estipuladas. Nesse contexto, mostra-se incabível o prosseguimento das execuções individuais. Precedente. 3. Conflito parcialmente conhecido para declarar a competência do Juízo da 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais do Foro Central de São Paulo – SP. (TST – CC 88661 SP 2007/0188584-8 – Relator: Fernando Gonçalves – Julgamento: 25/08/2005 – Segunda Seção – DJ 03/06/2008).

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Posterior a esta fase, o STJ passou a permitir a possibilidade do prosseguimento da execução nos casos que não prejudicassem o patrimônio da recuperanda, como por exemplo em casos de responsabilidade subsidiária, solidária, visto que pessoa jurídica do mesmo grupo econômico que não possua bem integrante do juízo recuperando ou falimentar possa ser executado.

Sendo assim, com este posicionamento, o instituto da Recuperação Judicial vinha trilhando o mesmo rumo da fracassada Concordata.

Neste sentido, porém recentemente, o STJ vem inovando, modificando seu entendimento anterior, afim de dar uma chance ao novo, e ainda obscuro, da recuperação judicial, permitindo que fique a crivo do juízo universal todo e qualquer crédito da recuperanda, sendo inviável o prosseguimento da execução trabalhista, no caso, em juízo singular mesmo após os 180 dias expressos na legislação específica.  

PEDIDO DE RECONSIDERAÇÃO RECEBIDO COMO Agravo regimental. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. JUÍZO TRABALHISTA E JUÍZO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL. PROSSEGUIMENTO DAS EXECUÇÕES TRABALHISTAS APÓS A FASE DE ACERTAMENTO E LIQUIDAÇÃO. COMPETÊNCIA DO JUÍZO UNIVERSAL DA RECUPERAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. RETOMADA AUTOMÁTICA DAS EXECUÇÕES APÓS O FIM DO PRAZO DE 180 DIAS. NÃO CABIMENTO. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que, ultrapassada a fase de acertamento e liquidação dos créditos trabalhistas, cuja competência é da Justiça do Trabalho, os valores apurados deverão ser habilitados nos autos da falência ou da recuperação judicial para posterior pagamento (Decreto-Lei 7.661/45; Lei 11.101/2005). 2. O entendimento desta Corte preconiza que, via de regra, deferido o processamento ou, posteriormente, aprovado o plano de recuperação judicial, é incabível a retomada automática das execuções individuais, mesmo após decorrido o prazo de 180 dias previsto no art. 6º, § 4º, da Lei 11.101/2005. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ - RCD no CC 131894 SP 2013/0414833-7 – Relator: Min. Raul Araújo – Julgamento: 26/02/2014 – Órgão Julgador: S2 – Segunda Seção – Publicação: DJE 31/03/2014).

EMENTA DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA DECIDIDO PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. FALÊNCIA. FUNÇÃO SOCIAL DA EMPRESA. LEI11.101/2005. DEBATE DE ÂMBITO INFRACONSTITUCIONAL. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO DO ART. 97 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. RESERVA DE PLENÁRIO. INOCORRÊNCIA. ACÓRDÃO RECORRIDO PUBLICADO EM 17.11.2011.Não há falar em ofensa ao art. 97 da Carta Maior ou em contrariedade à Sumula Vinculante 10, porquanto não declarada, na hipótese, a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público. Acresço que o Tribunal Pleno desta Casa no julgamento do RE 583.955-RG/RJ, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe 28.8.2009, negou provimento ao recurso extraordinário ao entendimento de que compete a Justiça Estadual Comum processar e julgar a execução de débitos trabalhistas no caso de empresa em face de recuperação judicial. Isso porque foi opção do legislador infraconstitucional (Lei 11.101/2005) manter o regime anterior de execução dos créditos trabalhistas pelo juízo universal da falência (Decreto-Lei 7.661/1945), sem prejuízo da competência da Justiça Laboral quanto ao julgamento do processo de conhecimento. Agravo regimental conhecido e não provido. (STF - RE 679155 GO – Relator: Min. Rosa Weber – Julgamento: 12/08/2014 – Órgão Julgador: Primeira Turma – Publicação: DJe-167 DIVULG 28-08-2014 PUBLIC 29-08-2014).

RECUPERAÇÃO JUDICIAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO PARA OS ATOS DE EXECUÇÃO. Tratando-se de empresa que figure em processo de recuperação judicial, a competência para a execução dos valores decorrentes de condenação trabalhista é do Juízo Falimentar, mesmo quando decorrido o prazo de suspensão de que trata o artigo 6º, § 4º, da Lei nº 11.101/05. Hipótese em que o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar Conflito de Competência, profere decisão declarando a competência do Juízo de Direito da 1ª Vara Cível de Sapucaia do Sul/RS para o julgamento das questões referentes ao plano de recuperação judicial da empresa Recrusul S.A., inclusive sobre ações de execuções de dívidas trabalhistas relativas a valores não habilitados no plano de recuperação judicial. (TRT4 - AP 00000949220125040291 RS 0000094-92.2012.5.04.0291 – Relator: GEORGE ACHUTTI – Julgamento: 04/12/2012).

Com o posicionamento do STF, em consonância com as jurisprudências do STJ e até mesmo dos Tribunais do Trabalho, firmou-se entendimento que todo e qualquer crédito deve ser executado no juízo universal, perdendo a justiça do trabalho a essência da qual se reveste, conforme prevê o art. 114, I da Constituição Federal.

Nesse passo, o que se pode observar é que o judiciário vem tentando dar uma espécie de segunda chance a empresas que ainda vislumbram a possibilidade êxito, mesmo com as adversidades, se sobrepondo inclusive ao legislador que tratou de estabelecer planos e prazos.

Nada mais justo, visto que após deferido o plano de recuperação judicial o “caixa” ou capital de giro da empresa dever ser forte o suficiente para o período de “quitação das dívidas”, estabelecidos em lei.

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Sobre a autora
Gabriella Peixoto

Advogada. Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito de Itu. Pós-Graduanda em Direito e Processo do Trabalho.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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