O contrato de adesão

27/10/2014 às 15:07
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O presente trabalho visa estudar de maneira concisa as principais características do contrato de adesão, iniciando-se pela realização de uma releitura histórica, analisando sua tipificação, natureza jurídica, início de formação contratual e interpretação.

1.1   Breve Histórico

Primeiramente, insta discorrer acerca do surgimento do contrato de adesão, no contexto jurídico pátrio, para então aprofundarmos ao tema.

Com efeito, diante da tradicional concepção de contrato, a relação contratual era basicamente formada por partes em posição igualitária, em que as condições do negócio jurídico eram discutidas e acertadas conforme a vontade das partes.

Com a evolução ocorrida na sociedade, a massificação de consumo, decorrente, principalmente, da revolução industrial, eclodiu-se a necessidade de que as contratações fossem mais rápidas para serem eficientes, surgindo-se no mundo jurídico novos métodos de contratação, dentre eles, o contrato de adesão. Com efeito, pode-se afirmar que, para a sociedade atual, as novas técnicas de contratação são indispensáveis para fomento das relações comerciais, sobretudo a de consumo.

O contrato de adesão foi, primeiramente, assim denominado por Raymond Saleilles, jurista francês, no ano de 1901, quando adveio a chamada massificação das relações contratuais, considerando-se uma das maiores repercussões no mundo jurídico[1].

No Brasil, em mais que esperada hora, o termo contrato de adesão foi trazido ao ordenamento jurídico pelo inovador Código de Defesa do Consumidor[2] sendo, posteriormente, reafirmado pelo Código Civil de 2002[3].

1.2   Conceito

O contrato de adesão trata-se de negócio jurídico bilateral ou plurilateral, no qual apenas uma das partes – proponente ou estipulante –, decide, previamente, quais as cláusulas serão efetivamente inseridas no contrato, de modo que, a outra parte – aderente –, apenas anui ou não, com aquilo já estabelecido, ficando esta impedida de modificar substancialmente as condições do contrato.

            Maria Helena Diniz define o contrato de adesão:

[...] é aquele em que a manifestação da vontade de uma das partes se reduz a mera anuência a uma proposta da outra, como nos ensina R. Limongi França. Opõe-se a ideia de contrato paritário, por inexistir a liberdade de convenção, visto que exclui qualquer possibilidade de debate e transigência entre as partes, pois um dos contratantes se limita a aceitar as cláusulas e condições previamente redigidas e impressas pelo outro [...], aderindo a uma situação contratual já definida em todos os seus termos...[4]

            Cézar Fiuza ressalva que “o contrato de adesão não é uma categoria autônoma, nem um tipo contratual, mas sim uma técnica diferente de formação de contrato, podendo ser aplicada a inúmeras categorias contratuais” [5].

Por sua vez, Carlos Roberto Gonçalves ensina que há no contrato de adesão “uma restrição mais extensa ao tradicional princípio da autonomia da vontade. [...] Em razão dessa característica, alguns autores chegaram a lhe negar natureza contratual, sob o fundamento de que lhe falta a vontade de uma das partes – o que evidencia o seu caráter institucional”.

Todavia, o mencionado autor ressalta que “prevalece o entendimento de que a aceitação das cláusulas, ainda que preestabelecidas, lhe assegura aquele caráter” [6].

            Essa restrição à autonomia de vontade suportada por uma das partes é a principal característica que difere o contrato de adesão do contrato tradicional, chamado por grande parte da doutrina de paritário, isto é, onde as partes estabelecem as condições contratuais conjuntamente, de modo igualitário. Todavia, vale dizer que Cézar Fiuza discorda que o contrato de adesão não se trataria de contrato paritário (com partes iguais):

“A doutrina vem empregando tradicionalmente o termo paritário, em vez de negociável. Não concordo, porém. Paritário é o que se forma por elementos pares para estabelecer igualdade. A expressão contrato paritário deixa a entender, erroneamente, que os contratos de adesão seriam leoninos, por conferir a uma das partes vantagem exagerada, em prejuízo da outra.” (2008, p. 469)

            Geralmente, os formuladores de contratos de adesão são grandes empresas, de direito público ou privado, ainda que titulares de um monopólio de direito ou de fato (fornecimento de água, gás, eletricidade, linha telefônica), envolvendo uma relação de consumo. Estando prontos os instrumentos contratuais, permanecem estes à disposição de um número indeterminado e desconhecido de pessoas. Assim, comumente, o contrato de adesão está ligado às relações de consumo, embora haja negócios jurídicos que não tenha essa característica (Carlos Roberto Gonçalves, p. 100).

            Observa-se que, na maioria das vezes, há disparidade de poder econômico entre as partes, onde de um lado encontra-se o proponente, que fica no polo mais forte da relação jurídica contratual e de outro lado, o aderente, parte hipossuficiente[7] em razão de sua situação econômica e de sua condição técnica inferior para defender seus direitos.

            Consoante o acima exposto, nota-se que as disposições contratuais ficam, exclusivamente, à disposição de apenas uma das partes, qual seja, a do lado mais forte da relação, visto que o aderente é impedido de discutir e modificar substancialmente o teor do contrato ou de suas cláusulas. É, dessa forma, um contrato que embora seja bilateral, é formado unilateralmente a sua essência, cujo conteúdo é produzido em massa, apenas facultando à outra parte o simples ato de aderir-lhe ou não.

1.3  Tipificação

O contrato de adesão vem tipificado nos artigos 423 e 424 da Lei n.º 10.406, de 10 de janeiro de 2002, Código Civil (CC), bem como no artigo 54 da Lei n.º 8.078, de 11 de setembro de 1990, Código de Defesa do Consumidor (CDC).

Os dispositivos encontrados no Código Civil, assim como no CDC, impõem uma proteção maior à parte hipossuficiente da relação contratual, ou seja, ao aderente. Prescrevendo-se que, em havendo cláusulas ambíguas ou contraditórias, deverá ser adotada interpretação mais favorável ao aderente. Outrossim, as cláusulas que determinam a renúncia antecipada do aderente a direito resultante da própria natureza do contrato serão tidas como nulas[8].

Já o Código de Defesa do Consumidor conceitua e estipula a forma que se dará o vínculo contratual. Por esse instrumento legislativo, torna-se difícil de imaginar a hipótese de modalidade de contrato de adesão em relações que não sejam a consumerista, tendo em vista que se dirigem à contratação em massa.

O art. 54, do CDC, define o contrato de adesão como aquele em que as cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de serviços ou produtos, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente o teor do contrato, conforme o quanto se segue:

Art. 54. Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo.

§ 1° A inserção de cláusula no formulário não desfigura a natureza de adesão do contrato.

§ 2° Nos contratos de adesão admite-se cláusula resolutória, desde que a alternativa, cabendo a escolha ao consumidor, ressalvando-se o disposto no § 2° do artigo anterior.

§ 3° Os contratos de adesão escritos serão redigidos em termos claros e com caracteres ostensivos e legíveis, de modo a facilitar sua compreensão pelo consumidor. (Redação dada pela nº 11.785, de 2008)

§ 4° As cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão.

Esse dispositivo possui quatro parágrafos nos quais preveem: a inserção de cláusula no formulário, hipótese que não se desfigura a natureza de adesão no contrato; admissão de cláusula resolutória, desde que seja alternativa e conforme a vontade do consumidor; que a redação dos contratos de adesão escritos devem ser redigida em termos claros e legíveis, cujo tamanho da fonte não poderá ser inferior ao corpo doze[9]; as cláusulas que limitarem o direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque, de modo que possibilite fácil e imediata compreensão.

Vale dizer, a possibilidade de inserção de cláusula no contrato de adesão não desfigura sua natureza, vez que, a maior parte do seu conteúdo permanece formada unilateralmente pelo proponente. Desse modo, também não seria razoável afirmar que a simples modificação ou exclusão de uma cláusula no contrato, modificaria a sua essência. Por ser o contrato de adesão uma técnica de contratação de massa, para que este se descaracterize, é necessário que o contratante obtenha condições que não são oferecidas aos demais consumidores, que sua relação para com o fornecedor seja diferenciada.

O Código de Defesa do Consumidor permitiu, no artigo acima citado, a inclusão de cláusula resolutória pelo estipulante do contrato, desde que seja alternativa e dede que a escolha entre a manutenção ou a resolução do contrato seja do aderente. Importa transcrever abaixo trecho do Código Brasileiro de Defesa do Consumidor – Comentado pelos Autores do Anteprojeto:

O Código permite a cláusula resolutória nos contratos de adesão, mas restringe sua aplicação, pois só está permitida a cláusula resolutória alternativa. O estipulante poderá fazer inserir no formulário a cláusula resolutória, deixando a escolha entre a resolução ou manutenção do contrato ao consumidor...[10]

 O §3º do supra artigo trata da forma pela qual o contrato de adesão será redigido. Todavia, a Lei não restringe o contrato de adesão às formas escritas, sendo possível também a sua formação também de forma verbal.

Em relação ao contrato escrito, a Lei assegura ao aderente o princípio da legibilidade das cláusulas contratuais, permitindo ao consumidor ter conhecimento do conteúdo do contrato sem necessitar de esclarecimento por parte do fornecedor[11].

Com a entrada em vigor da Lei n.º 11.785 de 22 de setembro de 2008, que deu nova redação ao §3º, foi reafirmado o princípio da legibilidade das cláusulas contratuais, pois, agora, além de o contrato de adesão ter de ser redigido de forma clara e com caracteres legíveis e ostensivos, deverá possuir tamanho de fonte não inferior ao corpo doze.

Todavia, embora tenha tido o legislador intenção benevolente ao estabelecer tamanho mínimo da letra redigida no contrato de adesão, não protegeu totalmente o consumidor, visto que o legislador furtou-se de indicar qual a fonte. De modo que, em algumas fontes, o corpo doze não terá uma letra razoavelmente legível. Nesse sentido, Danilo Andreato critica alteração trazida pela Lei, como se pode ver em trecho transcrito abaixo:

[...] Trocando em miúdos — e letra miúda é o que se pretende evitar nas contratações consumeristas por adesão —, estar o contrato redigido em fonte com tamanho 12 não significa necessariamente que tais cláusulas se caracterizem pela ostensividade e legibilidade, predicados requeridos por lei. Frases redigidas em “Kartika” ou “Vivaldi”, tamanho 12, possuem aparência minúscula se comparadas ao mesmo trecho sob o formato “Times New Roman”, também em dimensão 12.

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A mudança implementada no parágrafo 3º do artigo 54 do CDC foi redigida em favor do consumidor e, seguramente, com o pensamento voltado a fontes de uso corriqueiro, como “Times New Roman”, “Arial” e outras de semelhante estatura, revelando certa deficiência técnica na redação do dispositivo ao descer a minúcias, porém sem o afastamento de imprecisões.

Como se sabe, a norma é resultante da interpretação do texto, por isso é importantíssimo atentar para as distinções práticas entre texto e norma, e devidamente identificar o comando normativo, nem sempre abrangido pelas vestes gráficas do texto da lei. Com relação ao novo teor do parágrafo 3º do artigo 54 do CDC, o fundamental é que as cláusulas do contrato de adesão, a partir da sua estética, permitam pronta detecção visual e fácil leitura, o que, a depender do tipo de fonte empregada, poderá ensejar a exigência de que as disposições contratuais estejam redigidas em tamanho mínimo superior ao corpo 12.[12]

            O legislador, por fim, determina que as cláusulas desvantajosas ou que impliquem em limitação do direito do aderente, deverá ser destacadas das demais, isto é, ou de cor diferente, ou grifada, ou em negrito, enfim, deverão ser distintas das demais.

           

1.4    Formação do Contrato de Adesão

Para facilitar o estudo da matéria e aplicação pragmática da matéria, doutrina costuma dividir a formação dos contratos em três etapas, tais como: negociações preliminares, fase de policitação e aceitação.

A primeira, negociações preliminares, é uma fase prescindível e dispensável, isto é, não é uma fase obrigatória à formação de um contrato válido. Nesta primeira fase é aquela em que as partes discutem as condições do contrato. É uma fase em que as propostas feitas não vinculam as partes, tendo em vista que estão apenas delimitando a sua vontade para, eventualmente, a formação de um contrato futuro.

A fase de policitação já possui força vinculante, na qual uma das partes emite uma proposta pronta à outra, com prazo determinado ou não, a qual dela se espera um aceite ou o silêncio, desde que seja uma situação que indique o aceite, ressalvada as hipóteses previstas no art. 428 do Código Civil[13].

Por fim, a aceitação pode ser expressa ou tácita, desde que exteriorize tal vontade positiva do oblato ao proponente, que, no contrato de adesão, terá de ser na sua íntegra. Isso porque, o contrato de adesão prescinde de fase preliminar em que ambas as partes discutem os termos do negócio.

Verifica-se, no contrato de adesão, apenas a fase de policitação, ou seja, a fase proposta e a aceitação. Com efeito, recebida a proposta pelo oblato, cabe a este, aceita-la ou não integralmente.

1.4.1.   Início do vínculo contratual

O contrato de adesão, diferentemente dos contratos tradicionais, não ensejam em uma contraproposta do aderente, vez que as condições da proposta são estipuladas unilateralmente pelo proponente. Assim, o aderente tem de aceitar as condições contratuais em sua totalidade ou não aceita-las em um todo. Pois, não é característica do contrato de adesão que o aderente realize alteração o substancial do conteúdo do contrato, do contrário o descaracterizaria.

Por ser o contrato de adesão, negócio jurídico consensual, para que nasça o vínculo contratual, basta que o aderente manifeste sua aceitação, expressa ou tácita, de submeter-se às condições dadas pelo estipulante.

Nesse diapasão, ressalta Silvio Venosa[14] que “a manifestação tácita decorre de atos inequívocos, induvidosos da intenção de contratar, tornando-se desnecessária a manifestação expressa”. E continua o autor que “o silêncio só estará apto materializar um consentimento contratual quando vier acompanhado de outras circunstâncias ou condições, que envolvem a vontade contratual no caso concreto”.

1.5    Natureza Jurídica

O contrato de adesão não trouxe ao mundo jurídico uma nova espécie de contrato autônomo. Trata-se, no entanto, de uma nova modalidade de contratação em massa, na qual, apenas uma das partes – a proponente –, exclusivamente estipula as condições contratuais.

Portanto, a diferença do contrato de adesão para os contratos consensuais tradicionais, encontra-se em sua formação e modalidade de contratação. Isso porque, o contrato unilateralmente redigido pelo proponente é direcionado ao público em massa, a toda e qualquer pessoa ou a determinado grupo de pessoas, física e jurídica, para que, se concordarem, aderir integralmente com os termos do contrato.

1.6    Características Gerais do Contrato de Adesão

As cláusulas pré-formuladas do contrato de adesão são destinadas ao público em abstrato, por esse motivo, possuem algumas características além daquelas já estudadas, como uniformidade, generalidade e rigidez.

O desígnio do estipulante do contrato é obter a aderência da maior quantidade de pessoas na forma mais invariável possível. Assim, com propostas uniformes, o contratante poderá saber quais são as prestações e contra-prestações devidas à massa que eventualmente aderir ao contrato.

A generalidade presente nos contratos de adesão deve-se à pluralidade de sujeitos para a qual o contrato é elaborado. Então, semelhante à uniformidade, a generalidade ocorre para que a aplicação de cláusulas possa ser aplicável ao maior número de sujeitos que poderão aderir ao contrato.

A rigidez presente no contrato de adesão é decorrente de sua pré-formulação unilateral e, principalmente, da uniformidade. Assim, para que as cláusulas sejam uniformes, também deverão ser inflexíveis, sob pena de descaracterizar a modalidade de contrato de adesão. Restando, então, ao aderente assentir com o bloco de cláusulas ou desistir de contratar.

1.7     Cláusulas Abusivas

O CDC trata dos direitos básicos de consumidor e em seu art. 6º, inciso IV, visa a proteção contra a inserção de cláusulas abusivas no contrato. O mesmo diploma houve por enumerar um rol não exaustivo de cláusulas abusivas, que serão consideradas nulas de pleno direito.

A vedação de cláusulas abusivas abrange todo tipo de contrato, inclusive o contrato de adesão, todavia, quanto a este último, havia a necessidade de intervenção do legislador, tendo em vista que o aderente não tem oportunidade de discutir ou rejeitar cláusulas que lhe seja desfavorável. A finalidade dessa vedação legal é a de manter um equilíbrio entre as partes, o que não existiria sem maior proteção ao aderente.

O art. 51 do CDC, abaixo transcrito, é o dispositivo que enumera as possíveis cláusulas abusivas que serão consideradas nulas:

Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

 I - impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços ou impliquem renúncia ou disposição de direitos. Nas relações de consumo entre o fornecedor e o consumidor pessoa jurídica, a indenização poderá ser limitada, em situações justificáveis;

II - subtraiam ao consumidor a opção de reembolso da quantia já paga, nos casos previstos neste código;

III - transfiram responsabilidades a terceiros;

IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade;

V - (Vetado);

VI - estabeleçam inversão do ônus da prova em prejuízo do consumidor;

VII - determinem a utilização compulsória de arbitragem;

VIII - imponham representante para concluir ou realizar outro negócio jurídico pelo consumidor;

IX - deixem ao fornecedor a opção de concluir ou não o contrato, embora obrigando o consumidor;

X - permitam ao fornecedor, direta ou indiretamente, variação do preço de maneira unilateral;

XI - autorizem o fornecedor a cancelar o contrato unilateralmente, sem que igual direito seja conferido ao consumidor;

XII - obriguem o consumidor a ressarcir os custos de cobrança de sua obrigação, sem que igual direito lhe seja conferido contra o fornecedor;

XIII - autorizem o fornecedor a modificar unilateralmente o conteúdo ou a qualidade do contrato, após sua celebração;

XIV - infrinjam ou possibilitem a violação de normas ambientais;

XV - estejam em desacordo com o sistema de proteção ao consumidor;

XVI - possibilitem a renúncia do direito de indenização por benfeitorias necessárias.

§ 1º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que:

I - ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence;

II - restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual;

III - se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso.

§ 2° A nulidade de uma cláusula contratual abusiva não invalida o contrato, exceto quando de sua ausência, apesar dos esforços de integração, decorrer ônus excessivo a qualquer das partes.

§ 3° (Vetado).

§ 4° É facultado a qualquer consumidor ou entidade que o represente requerer ao Ministério Público que ajuíze a competente ação para ser declarada a nulidade de cláusula contratual que contrarie o disposto neste código ou de qualquer forma não assegure o justo equilíbrio entre direitos e obrigações das partes.

As cláusulas abusivas descritas no artigo acima são exemplificativas, vez que o dispositivo afirma: “entre outras cláusulas”. Havendo, então, alguma cláusula que onere demasiadamente o consumidor, desequilibrando a relação contratual, ou fira os princípios gerais do negócio jurídico, o juiz poderá reconhecer de ofício a abusividade na cláusula e declará-la nula, isto é, sem eficácia.

Com efeito, também a cláusula lícita poderá ser considerada abusiva e, posteriormente, declarada nula por requerimento de uma das partes ou de ofício pelo juiz. Nesse sentido, Cláudio Bonatto faz importante ressalva acerca das cláusulas abusivas e ilícitas:

[...] podemos afirmar que o conceito de cláusula abusiva é mais amplo do que o de cláusula ilícita, pois pode haver cláusula lícita que seja ao mesmo tempo abusiva, na medida em que provoque, concretamente, um desiquilíbrio contratual, com vantagem exclusiva do agente econômico, como, por exemplo, a cláusula que autoriza tanto o fornecedor, como o consumidor, ou seja, bilateralmente, a cancelar o contrato firmado. É lícita, segundo a exegese do art. 51, inciso XI, do CDC, porém pode ser abusiva, na medida em que, pela duração do contrato (o longo tempo decorrido), o consumidor tenha se tornado cativo na contratação.[15]

Nesse diapasão, ressalta Nelson Nery Júnior que “as relações de consumo são informadas pelo princípio da boa-fé (art. 4º, caput e inc. III, CDC), de sorte que toda cláusula que infringir esse princípio é considerada,  ex lege, como abusiva”[16].

O Código Civil, por sua vez, impõe como nulas as cláusulas inseridas no contrato de adesão que impliquem na resigna do aderente a direito que lhe cabe em razão do na natureza do contrato. Sendo assim, também trata-se de cláusula leonina que poderá ser reconhecida e declarada nula pelo juiz ex officio. Veja-se abaixo o quanto disposto no artigo 424 do CC:

Art. 424. Nos contratos de adesão, são nulas as cláusulas que estipulem a renúncia antecipada do aderente a direito resultante da natureza do negócio.

Acerca do termo “nulidade de pleno direito” no art. 51, do CDC, José Rogério Cruz e Tucci assevera:

“De qualquer forma, aqui, é um problema de eficácia; onde se lê nulidade é ineficaz. É ineficaz quando o consumidor recusar, então, a arbitram ou, evidentemente, quando ele não instaurar o processo arbitral.” (Informação verbal)[17]

Assim, vale ponderar, as cláusulas abusivas poderão estar em qualquer tipo de contrato, inclusive a modalidade de adesão. Devendo sê-las declaradas nulas e, desse modo, sem eficácias no mundo jurídico.

1.8     Interpretação do Contrato de Adesão

A interpretação dos termos de um contrato devem seguir alguns critérios gerais, os quais Carlos Roberto Gonçalves aduz:

Algumas regras práticas podem ser observadas no tocante à interpretação dos contratos: a) a melhor maneira de apurar a intenção dos contratantes é verificar o modo pelo qual o vinham executando, de comum acordo; b) deve-se interpretar o contrato, na dúvida, da maneira menos onerosa para o devedor [...]; c) as cláusulas contratuais não devem ser interpretadas isoladamente, mas em conjunto com as demais; d) qualquer obscuridade é imputada a que redigiu a estipulação, pois podendo ser claro, não o foi [...]; e) na cláusula suscetível de dois significados, interpretar-se-á em atenção ao que pode ser exequível...[18] (Destaque nosso)

Sendo assim, em se tratando de contrato de adesão, não se pode interpretá-lo da mesma forma em que se faz com os contratos paritários, pois naquele há discrepância na predominação de vontade de uma das partes sobre as demais, visto que unilateralmente elaborou os termos do contrato.  De modo que, a interpretação deverá ser feita contra aquele que as ditou.

O art. 423 do CC, com intuito de coibir que o contrato de adesão tenha um conteúdo pérfido perante o aderente, uma vez que o estipulante já possui a prerrogativa de fixar as cláusulas previamente sem a indução do aderente, determinou que a interpretação deva ser favorável a este último, conforme se vê abaixo:

Art. 423. Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente.

Entende-se por ambígua a cláusula que possui interpretação literal em mais de um sentido e por contraditória aquela em que for incompatível com seu próprio conteúdo. Assim, presente essa hipótese, o magistrado deverá adotar a interpretação mais favorável ao aderente.

Contudo, sendo necessária a intervenção judicial, o juiz, como intérprete do  contrato, não poderá ser furtar de verificar a boa-fé dos contratantes, bem como os demais princípios de direito inerentes ao contrato. Para, dessa forma, não ensejar em insegurança jurídica aqueles que contratarem na modalidade de adesão.

Finalmente, não custa dizer que, evidentemente, em havendo alguma cláusula inserida posteriormente no contrato de adesão, esta deverá prevalecer sobre as demais pré-formuladas unilateralmente.

CONCLUSÃO

O contrato de adesão tornou-se uma das modalidades de se pactuar acordos de vontade mais céleres existentes. Viabilizou-se a celebração de vários negócios jurídicos realizados diariamente no mundo contemporâneo, tendo em vista os negócios reallizados em massa desde a Revolução Industrial. No entanto, em razão da forma em que é elaborado, faz-se manifestamente indispensável a imposição de regras legais que garantam às partes a efetivação de princípios norteadores do direito, tais como boa-fé, função social do contrato, entre outros, acarretando, eventualmente, na flexibilização do "pacta sunt servanda", sem importar na resolução do contrato.  


[1] NOVAIS, Alinne Arquette Leite. A Teoria Contratual e o Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: RT, 2001, p.98.

[2] Lei n.º 8.078, de 11 de setembro de 1.990.

[3] Lei n.º 10.406, de 10 de janeiro de 2.002.

[4] DINIZ, Maria Helena. Código Civil anotado. 14ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009, p.367.

[5] FIUZA, Cézar. Direito Civil: curso completo. 11ª ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2008, p. 470.

[6] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil brasileiro, vol. 3: contratos e atos unilaterais. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 100.

[7] GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri. Dicionário Técnico Jurídico. 2ª ed. São Paulo: Rideel, 1999, p. 345: Pessoa de escassos recursos econômicos, de pobreza constatada, que deve ser auxiliada pelo Estado, incluindo-se a assistência jurídica (CF, art. 203).

[8] CDC: Art. 423. Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente. Art. 424. Nos contratos de adesão, são nulas as cláusulas que estipulem a renúncia antecipada do aderente a direito resultante da natureza do negócio.

[9] Redação determinada pela Lei n.º 11.785, de 22 de setembro de 2.009.

[10] GRINOVER, Ada Pellegrini; VASCONCELLOS, Antônio Herman, et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Anteprojeto. 9ª ed. Forense Universitária Biblioteca Jurídica, p. 634.

[11] Idem, p. 635.

[12] ANDREATO, Danilo. “Tamanho da Letra não vai deixar contrato mais claro” in Revista Consultor Jurídico, pub. 30 set 2008. Disponível: <http://www.conjur.com.br/2008-set-30/tamanho_letra_nao_deixar_contrato_claro >. Acesso: 29 mar  2014.

[13] CC: Art. 428. Deixa de ser obrigatória a proposta: I - se, feita sem prazo a pessoa presente, não foi imediatamente aceita. Considera-se também presente a pessoa que contrata por telefone ou por meio de comunicação semelhante; II - se, feita sem prazo a pessoa ausente, tiver decorrido tempo suficiente para chegar a resposta ao conhecimento do proponente; III - se, feita a pessoa ausente, não tiver sido expedida a resposta dentro do prazo dado; IV - se, antes dela, ou simultaneamente, chegar ao conhecimento da outra parte a retratação do proponente.

[14] VENOSA, Sílvo de Salvio. Direito Civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. Vol. II. 10ª ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 520-521.

[15] BONATTO, Cláudio. Código de Defesa do Consumidor: cláusulas abusivas nas relações contratuais de consumo. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001, p. 35.

[16] GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Op. Cit., p. 529.

[17] Informação obtida pela exposição de TUCCI, que foi um dos palestrantes do evento “Arbitragem e Mediação – O Brasil na Rota da Modernidade”, organizado pelo IASP – Instituto dos Advogados de São Paulo, no dia 9 de dezembro de 2013.

[18] GONÇALVES, Carlos Roberto. Op. Cit., p. 68/69

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Sobre a autora
Sthefane Gaggioli

Graduanda em Direito, Universidade Presbiteriana Mackenzie.<br>

Informações sobre o texto

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