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Cautelares satisfativas?

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01/11/2002 às 00:00
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14- Conclusões.

Hoje mais do que nunca é de se reconhecer a vocação instrumental do processo sem que isto implique, contudo, negar a sua autonomia dogmático-estrutural. Como instrumento que é, o processo deve se amoldar à realidade a que se aplica, caso contrário esta fadado, como qualquer ramo do direito, a perder legitimidade, propiciando a formação de segmentos não cobertos pela tutela jurisdicional. Nesta busca incessante de acompanhar a realidade, ante a impossibilidade de se prever todas as situações pelo dinamismo crescente da sociedade moderna, algumas vezes ocorre uma disparidade entre a norma e o fato e nestes casos temos que nos valer de interpretação e adaptação para preencher estas lacunas. Entre dois males, ode subverter a estrutura e finalidade de um instituto jurídico e deixar o fato sem apreciação, prefere-se o primeiro porque menos danoso.

Há que observar, contudo, que a anomalia só persiste porquanto não se crie o instrumento adequado. No caso específico das cautelas satisfativas, o artigo 273, na redação que lhe deu a reforma processual de 1994, indubitavelmente criou um mecanismo apto a cobrir a necessidade de antecipação dos efeitos da tutela. Submeteu o legislador, atento a uma tradição arraigada em nosso sistema de prestígio dos juízos de certeza, a antecipação a uma sistemática mais rígida do que a requerida para acautela. Se certo ou errado este proceder não está em questão aqui pois legem habemus.

Afastada a necessidade de uso do instrumento anômalo pela existência de previsão específica de outro que lhe faça as vezes, não se pode tolerar a permanência das cautelares satisfativas, pena de tornarmos letra morta a dicção do artigo 273 do CPC. Frente a casos em que se veicule demanda deste teor, nada restará ao magistrado senão aplicar o artigo 267, inc. VI do CPC extinguindo o feito sem julgamento de mérito porque não há mais espaço para cautelares satisfativas no direito brasileiro. Há que valer-se o jurisdicionado do artigo 273 para a obtenção de antecipação dos efeitos da tutela e se submeter a todos os seus requisitos, ficando banida a utilização das cautelas satisfativas.


15-Blibliografia

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Curso de processo Civil, Sérgio Antônio Fabris editor, 3 ed., 1996, v. I

Comentários ao Código de Processo Civil, Lejur, 2º ed., 1986, v. XI

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- Theodoro Júnior, Humberto; Curso de Direito Processual Civil, Forense, 16 ed., 1996, v II e 18º ed., 1999

Tutela Antecipatória e Tutela Cautelar in RT nº 742. Ago, 1997

Curso de Direito Processual Civil, Forense, 18 ed. 1996.. I

-Tornaghi

, Hélio ; A Relação Processual Penal, Saraiva, 2º ed. 1987 -Tourinho Filho, Fernando da Costa; Processo Penal, Saraiva, 12º ed., 1990 - Zawascki, Teori Albino; Antecipação da Tutela e Colisão de Direitos Fundamentais", in AJURIS, nº 64

Antecipação da Tutela, Saraiva, 2º ed., 1999


16.Notas

1. Ver os seus Comentários ao Código de Processo Civil, Forense,2º ed, 1979, v. I, p. 276 et seq, bem como o Tratado das Ações, v. I, II e V.

2. Araken de Assis;

Manual do Processo de Execução, RT. 5º ed. 2º tiragem, 1998, p. 505.

3. Carnelutti

constrói sua doutrina com base no litígio. Para ele, a jurisdição só existe frente ao conflito. Sua construção doutrinária encontra forte acolhida entre os processualistas brasileiros, tanto assim que exemplificativamente afirma Galeno Lacerda: " A verdade é que a jurisdição, como atividade específica do Poder Judiciário, existe por causa do conflito e para solucioná-lo. Esta a finalidade indiscutível do Judiciário"(Comentários ao Código de Processo Civil, Forense, 8º ed., 1999, v. VIII, t. II, p. 15). Afirma Carnelutti, Sistema de Direito Processual Civil, Classic Book, 1º ed., 1999, v. I, p. 60: " Se o interesse significa uma situação favorável à satisfação de uma necessidade; se as necessidades do homem são ilimitadas, e se, pelo contrário, são limitados os bens, ou seja, a porção do mundo exterior apta a satisfazê-las, como correlativa à noção de interesse e a de bem aparece a do conflito de interesses. Surge o conflito entre dois interesses quando a situação favorável a satisfação de uma necessidade exclui a situação favorável de uma necessidade distinta." Em outro trecho se lê: "Pode acontecer que, diante da pretensão o titular do interesse oposto decida à sua subordinação. Em tal caso, a pretensão é bastante para determinar o desenvolvimento pacífico do conflito. Mas com frequência não acontece assim. Então, à pretensão do titular de um dos interesses em conflito se opõe a resistência do titular do outro. Quando isto acontecer, o conflito de interesses se converte em litígio. Chamo de litígio o conflito de interesses qualificado pela pretensão de um dos interesses e pela resistência do outro"(Op. cit. p. 93). E segue::" Interesse não significa um juízo, mas uma posição do homem, ou mais exatamente : a posição favorável à satisfação de uma necessidade"

4. É o denominado efeito reflexo da coisa julgada. Ver Moacyr Amaral Santos, Primeiras Linhas de Direito Processual Civil, v. III.

5. Ver Araken de Assis, Da Execução de Alimentos e da Prisão do Devedor, RT, 4º ed., 1998, p. 52. Cumulação de Ações, RT, 3º ed, 1998, p. 94. Moacyr Amaral Santos, Primeiras Linhas de Direito Processual Civil, Saraiva, 21 ed., 1999, p. 179.

6. Araken de Assis

, da Execução de alimentos e da Prisão do Devedor, RT, 4º ed, 1998, p. 50. Cumulação de Ações, RT, 3º ed. 1998, p. 93. Moacyr Amaral Santos, Primeiras Linhas de Direito Processual Civil, Saraiva, 21º ed, 1999, p. 179

7. A doutrina reluta em acolher esta classificação, sendo que a maioria ainda considera as eficácia mandamentais e executivas meros desdobramentos da condenação. A respeito adverte Ovídio Baptista da Silva: " Dizer, porem, como faz Pontes de Miranda, que ´ está assente na ciência do direito´ a classificação das ações e sentenças em cinco espécies é, no mínimo, um exagero, se não for uma inocultável falsidade científica. Ao contrário, o que esta firmemente ´assente´ na doutrina processual é o entendimento de que somente existem as três ações, identificadas como declaratórias, constitutivas e condenatórias"( Jurisdição e Execução na tradição romano- canônica, RT, 2º ed., 1998, p. 13)

8. Na verdade em 1966. Consultar os seus " Dez anos de pareceres"

9. Teori Albino Zawascki

. Antecipação da Tutela, Saraiva, 2º ed. 1999, p. 8. Mas há respeitáveis críticas a esta acepção afirmando-se que a cautela terá feição de cognição ou executiva. Tal posicionamento ganha impulso na doutrina italiana.

10. Assim lembra Carlos Alberto Álvaro de Oliveira:"No processo cautelar, prevenção do dano dá-se sem interferência do plano do direito material, nele não se verificando efeito antecipado da futura sentença de mérito. A ordem cautelar atua no plano sensível com caráter puramente satisfativo, destinado apenas a garantir o resultado útil do processo de conhecimento ou de execução.Já na hipótese do art. 273 não basta penas conservar para garantir a insatisfação decorrendo estado antijurídico, mostrando-se necessária a antecipação, total ou parcial, dos próprios efeitos materiais da sentença a ser proferida no processo de conhecimento."(Comentários ao Código de Processo Civil, Forense, 4º ed., 1999. V. VIII, t II, p. 10). Contra Ovídio Baptista da Silva, em seu Curso de Processo Civil, Forense, v.III, para quem a cautela se presta à proteção do direito material falando-se em um direito material de cautela. Os argumentos do professor gaúcho podem ser acolhidos desde que a cautela não tome uma feição satisfativa. Assim, é possível alvitramos a cautela ao direito material e não necessariamente ao resultado útil do processo, contudo, a cautela não poderá tomar as vezes da tutela satisfativa, embora se permite reconhecer-lhe um caráter autônomo.

11. Ver a respeito Cândido Rangel Dinamarco, A Intrumentalidade do Processo, Malheiros, 6º ed., 1998, p. 20 a 23

12. Como doutrina Celso Antônio Bandeira de Mello, a doutrina administrativista costuma utilizar a referência a procedimento, mas citando a opinião de Carnelutti, demonstra que o processo não é exclusivismo do exercício da jurisdição. Curso de Direito Administrativo, 12º ed., 1999. p. 418-420. Também Hely Lopes Meirelles, Direito Administrativo Brasileiro, Malheiros 22º ed, 1997, p. 591, nota 25, afirma que o processo não é exclusividade do exercício da atividade do judiciário pois afirma que a jurisdição não é exclusividade daquele.

13. Ovídio Baptista da Silva

, A Cautelar Inominada no direito Brasileiro, Forense, 1979, p. 128

14. Conforme nos dá conta Theodoro Júnior, Curso de Direito Processual Civil, Forense, 26 ed. 1999, v.II, p. 371: "Não se pode, bem se vê, tutelar qualquer interesse, mas tão somente aqueles que, pela aparência se mostram plausíveis de tutela no processo principal". Sobre o fumus boni iuris ver José Frederico Marques. Manual de Direito Processual civil, Saraiva, 4º ed. 1981, v. IV, p. 336.

15. Significa dizer que assim como as condições da ação no processo de conhecimento, o fumus boni iuris e o periculum in mora são verificados levando em conta uma probabiliade de existênica levando em conta a narrativa da inicial. Descabe ao magistrado na cautela aprofundar-se em questionamentos acerca deste direito acautelado. Ver Nelton Agnaldo dos Santos Moraes, A Ténica de Elaboração da Sentença Cível, Saraiva 1998, p. 130

16. Calmon de Passos

, J.J; Comentários ao Código de Processo Civil, Forense, 8º ed., 1998, v. III, p. 20: "Toda a liminar é antecipação de tutela, porquanto se dá, desde logo, aquilo que seria deferível após determinados procedimentos, mês nem toda a antecipação de tutela é liminar." "A antecipação de tutela ora disciplinada, com a nova redação dada ao artigo 273 do CPC, não é medida cautelar,nem liminar. Tem função e dogmática próprias"

17. Pontes de Miranda

, Comentários ao CPC de 1973, Forense, 1976, t. XII, p. 70

18. Galeno Lacerda

. Comentários ao Código de Processo Civil, Forense, 8º ed., 1998, v.VIII, t., II, p. 242 e 243

19. Ernane Fidélis dos Santos,

Manual de Direito Processual Civil, Saraiva, 4º ed., 1996, v. II, p. 296

20. Barbosa Moreira,

O Novo Processo Civil Brasileiro, Forense, 9º ed., 1998, p. 416

21. Humberto Theodoro Júnior;

Curso de Direito Processual Civil, Forense, 16 ed., 1996, v II, n. 1021, p. 409

22. Ovídio Baptista da Silva;

Comentários ao Código de Processo Civil, Processo Cautelar, Lejur, 2 ed., 1986, v. XI, p. 211

23. Ovídio Baptista da Silva

, Jurisdição e Execução na tradição romano- canônica, RT, 2 ed., 1998, p. 190

24. A teor do artigo 798 do CPC. Mas é de notar-se que a locução medidas cautelares não calha bem à situação em questão, pois seria melhor referirmo-nos a provimentos cautelares para separá-las estas providências das medidas típicas. Na doutrina, Pontes de Miranda leciona que :" A regra é de que as mediadas cautelares estão subordinadas aso princípio ne iudex procedat ex officio, salvo quando a lei ou a natureza da ação principal autorize o juiz a decretá-la sem provocação". ( Comentários ao Código de Processo, Forense, 1976. v. XII, p. 46)

25. É a opinião também de Theodoro Júnior, verbis: "É inequívoca, em outros termos, a prova capaz, no momento processual, de autorizar uma sentença de mérito favorável à parte que invoca a tutela antecipada, caso pudesse a causa ser julgada desde logo. Dir-se-á que, então, melhor seria decidir de vez a lide, encerrando-se a disputa por sentença definitiva. Mas não é bem assim. O julgamento definitivo de mérito não pode ser proferido senão a final, depois de exaurido todo o debate, toda a atividade instrutória. No momento, pode haver prova suficiente para acolhida antecipada da pretensão do autor. Depois, porém da resposta e contraprova do réu, o quadro de convencimento pode resultar alterado e o juiz terá de julgar a lide contra o autor"(Tutela Antecipatória e Tutela Cautelar in RT nº 742, p. 49)

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26. Acerca da verossimilhança manifestou Calamandrei da seguinte forma:" O juízo de verossimilitude, nos casos em que o direito processual o considera relevante, tem esta característica: que é um juízo emitido, não sobre o fato, senão a afirmação do fato, é dizer, a respeito da alegação (positio) do fato, proveniente da parte que pede ser admitida a aprová-lo e o que afirma como historicamente já ocorrido( Direito Processual Civil, Bookseller, 1999, v. II, p. 277)

27. Teori Albino Zawascki

pensa de maneira um tanto diferente, embora chegue às mesmas conclusões práticas. Afirma ele :"Dir-se-á que é um paradoxo a exigência de fato certo e juízo de verossimilhança do direito: se o fato é certo, o direito existe ou não existe, em razão de que jura novit curia, ou seja narra mihi factum, dabo tibi ius. Na verdade, a referência a ´ prova inquívoca´ deve ser interpretada no contexto do relativismo próprio do sistema de provas. Como dizia Calamandrei: ´todas las pruebas, se bien se mira, nom son más que pruebas de verosimilitud (...) Aun para el juez más escrupuloso y atento, vale el límite fatal de la natureza humana: lo que vemos, sólo es lo que nos parece que vemos. No verdad, sino versosimilitud: es dicir, aparencia( que puede ser también ilusion) de verdad´. Assim, o que a lei exige não é certamente, prova de verdade absoluta- que sempre será relativa, mesmo quando concluída a instrução- mas uma prova robusta, que embora no âmbito de cognição sumária, aproxime, em segura medida, o juízo de probabilidade do juízo de verdade"( Antecipação daTutela cit. p. 76). Ora se mesmo após a instrução há uma certeza relativa não porque estabelecer uma diferença entre o que resulta na cognição sumária e na exauriente quando o fato é claro e não há dúvida desde já da certeza do direito. A diferença que se estabelece, conforme dissemos é que se requer uma cognição exauriente para que a conclusão de certeza seja apta a produzir seus efeitos.

28. Como nos dá conta Cândido Rangel Dinamarco; " A exigência de prova inequívoca significa que a mera aparência não basta e que a verossimilhança exigida é mais do que o fumus boni iuris exigido para a tutela cautelar". (A Reforma do CPC, Malheiros, 4 ed. 2º tiragem, 1998, p. 145)

29. Como aliás já lecionou corretamente Teori Albino Zavascki - "Antecipação da Tutela e Colisão de Direitos Fundamentais", in AJURIS, nº 64, p.395:"O risco de dano irreparável ou de difícil reparação e que enseja antecipação assecuratória, é o risco concreto (e não hipotético ou eventual), atual (ou seja, o que se apresenta iminente no curso do processo), e grave (vale dizer, o potencialmente apto a fazer ou a prejudicar o direito afirmado pela parte). Se o risco, mesmo grave, não é iminente, não se justifica a antecipação da tutela. É conseqüência lógica do princípio da necessidade, antes mencionado"

30. J.J. Calmon de Passos; Inovações no Código de Processo Civil Forense, p. 9.

31. iden ibidem p. 9

32. Cândido Rangel Dinamarco;

A Reforma do Código de Processo Civil, Malheiros, 4º ed., 2º tiragem, 1998, p. 146

33. Assim também Teori Albino Zawascki, op. cit, p. 88 e Carlos Alberto Álvaro de Oliveira, Comentários cit. p. 24: "A restrição generalizada e indistinta estatuída no § 2º do artigo 273 trata o problema de forma míope, por privilegiar demasiadamente e de forma exagerada o ponto de vista da parte atingida em detrimento do autor da providência. Este também pode estar em risco de sofrer prejuízo irreparável em virtude da irreversiblidade fática de alguma situação da vida. Só o orgão judicial está habilitado para apreciar o conflito de valores no caso concreto, sempre presente por sinal em qualquer problema humano, e dar-lhe a solução adequada"

34. Conforme Theodoro Júnior nos lembra;" Muitas foram as controvérsias e quase sempre se considerava abusiva a prática de generalizar as cautelares para obter, de plano, satisfação do direito subjetivo da parte, mormente porque não havia, nem na lei,nem na doutrina, uma disciplina que desse apoio e segurança ao desvio do poder geral de cautela para cumprir a missão nova que se lhe atribuía"( Tutela Antecipatória e Tutela Cautelar, in Revista dos Tribunais, nº 742, Ago. 19997, p. 44)

35. Ver João Roberto Parizatto; Do agravo, Brasília jurídica, 1996, p. 55. Nelson Luiz Pinto, Manual dos Recursos Cíveis, Malheiros, 1999, p. 130. José Carlos Moraes Salles, Do Recurso de Agravo, RT, 2º ed., 1999, p. 145.

36. No magistério de Teori Albino Zawascki, op cit. p 11:" "Dessa forma, embora cautela e antecipação trabalhem com a urgência, buscando preservação do dano decorrente da demora do curso do processo de conhecimento ou de execução, não há como afastar a manifesta diversidade da natureza do receio de lesão, elemento importante para diferenciá-las".(Op. cit., n.º 5, p. 11)

37. José Frederico Marques, Manual de Direito Processual Civil, Saraiva, 4º ed., 1981, v. IV, p. 364, fala em provisoriedade mas, como realça Teori Albino Zawscki, provisóriedade e temporariedade não são a mesma coisa. Provisória é a liminar cautela, enquanto que a tutela cautelar proferida em sentença de mérito é temporária.

38. Theodoro Júnior

afirma categoricamente: " Com a nova sistemática do art. 273, criou-se um divisor de águas a separar, com técnica e adequação, as funções distintas que tocam aos institutos da tutela cautelar e da tutela antecipatória"

39. O processualista gaúcho considera a medida prevista noa artigo 273 ou a medida cautelar apresentam em substância uma mesma pretensão à segurança, por isso afirma que a nomeclatura é irrelevante e que deve o juiz conhecer os pedidos um pelo outro, aplicando uma fungibildade. ( Comentários ao Código de Processo Civil, Forense, 4º ed., 1999, v. VIII. t. II, p. 23.

40. Só é admissível a fungibilidade quando houver transformação da antecipação em cautela porque não haveria burla à lei e se é possível o mais é possível o menos. Como lembra Theodoro Júnior: " O que não se pode tolerar é a manobra inversa, ou seja, transmudar medida antecipatória em medida cautelar, porquanto ensejaria à parte obter a tutela excpcional do artigo 273 do CPC sem se submeter às suas exigências e condicionamentos"( Tutela Antecipatória e Tutela Cautelar cit., p. 53)

41. Nem sempre foi assim. Até o terceiro quartel do século XIX não se tinha a noção de um direito de ação desvinculado do direito material. A concepção da ação era então a concepção Civilista de Savigny. A pandectologia alemã, apegada ao conceito da actio romana concebia a ação como a fase dinâmica do direito material, ou seja, como o próprio direito material em reação. "Nihil aliud est actio quan ius, quod sibi debeatur, in juditio persequendi". E Joseph Unger, assim como Demolombe no seu célebre comentário ao Código Napoleônico, falavam da ação como o direito material "vestido para a guerra". Esta visão só começou a mudar à partir da conhecida polêmica entre Ernest Windescheid e Theodor Muther. Em 1856, Windescheid publica "Die actio des romischen Civilrecht, von Standpunk des heutigen Rechts" (A actio do direito civil romano a partir do ponto de vista do direito moderno). Nesta obra sustenta o processualista alemão que o conceito de actio romano é substancialmente diferente do conceito moderno. A actio era o poder de agir em face de outrem, ao passo que na concepção moderna entende que a actio é, antes de tudo, um direito derivado de um direito, estabelecendo-se uma primeira ruptura com o conceito civilista para o qual tudo trava-se do mesmo direito. Estabelece Wisdschied o conceito da "anspruch"(pretensão) que não corresponderia ipsis litteris ao conceito de actio. À obra de Windscheid dirigiu Theodor Muther mordaz crítica com mal disfarçado cunho pessoal ("Zur Leher von romischen Actio, der heutigen Klagrecht, des Litiscontestation und der singularssuccesion in Obligationen- Eine Kritich des windeschieid´schen Buches. Sobre a doutrina da actio romana, do moderno direito de ação, da litiscontestação e da sucessão singular nas obrigações-Crítica à obra de Windescheid).Afirma Muther que a pretensão era no direito romano preexistente à actio e que uma vez levada ao pretor, a este cabia conceder obrigatoriamente a fórmula. Via portanto Muther a actio como voltada ao pretor que não podia refugir ao dever de dar a fórmula, sendo que primitivamente era a actio ato bilateral dos contenedores que teriam que vir ambos a juízo pedir a concessão da fórmula, pois era imprescindível vir a juízo cum aliquo (actio sacraria). Em sua réplica (Die actio gegen Dr Muther. A Actio, reposta ao Dr Muther).Windescheid acabou, após alguma exitação, concordando com a posição de Muther segundo a qual o direito de ação é autônomo e não se confunde com o direito material. Estava lançada a base da independência dogmática do processo. No doutrina nacional mantiveram-se fiéis á doutrina civilista João Monteiro, Jorge Americano e Manuel Aurelino de Gusmão, desconhecendo o progresso da ciência processual. Procedida a separação dos planos material e processual, restava delinear os contornos e limites do direito de ação. O punctun dollens residia em ter ou não ação aquele que veicula uma pretensão infundada, ou seja saber se teria havido ação quando fosse ao final julgado improcedente o pedido.

42. Ao direito concreto sobrepôs-se a Teoria do Direito Abstrato de Ação, da lavra de Dagenkolb e Plóz. O segundo, húngaro, publica "Beitrage zur Theorie des Klagesrecht". Dagenkolb, alemão, produz "Einlassungaspruch und Urteilsnorm" (Ingresso forçado e norma judicial). Segundo as colocações dos dois processualistas, o direito de ação é absolutamente autônomo pois caso contrário não se poderia explicar toda a atividade processual realizada antes da sentença de improcedência. Tem-se então uma completa e absoluta separação entre os planos do direito material e processual. O direito material é exercido frente a outrem e visa o bem da vida objeto do direito. O direito de ação tem por sujeito passivo o Estado-Juiz e tem por objeto a prestação jurisdicional. A inexistência do direito material não afeta a existência do direito de ação. O grande mal desta teoria reside no fato de chancelar a pretensão infundada. Confunde-se, senso largo, o direito de ação com o direito de petição, genérico e amplo

43. Em 1885, Adolf Wach publica "Handbuch des Deustchen Civilprozessrecht", seguindo a obra que já havia publicado antes, em 1879 (Vortage uber die Reich Civilprozessrecht). Defende Wach em sua doutrina que somente se for julgada procedente a ação, ou seja, se for reconhecido o direito ao litigante, haveria ação, pois embora independente do direito material, está a ação vinculada a um direito material, de modo que chega a conclusão de que a ação sem direito é uma mera pretensão mas não chega a ser ação. Segundo ele para que haja verdadeiramente ação é necessário: 1)Direito violado. 2)Legitimidade. 3)Possibilidade jurídica do pedido. A influência de Wach sobre Chiovenda e consequentemente sobre Liebman chegará a nossos dias através da Teoria Eclética da Ação.

44. Ver Hélio Tornaghi, A Relação Processual Penal, Saraiva, 2º ed. 1987, p. 105. Fernando da Costa Tourinho Filho, Processo Penal, Saraiva, 12º ed., 1990, p. 262. Humberto Theodoro Júnior, Curso de direito Processual Civil, Forense, 18º ed., 1996, p. 49 et seq. Sobre a doutrina de Wach, Cândido Rangel Dinamarco et alii, op. cit, p. 249.J.E Carreira Alvim, op. cit,p. 111.

45. O maior prosélito da Teoria Eclética da Ação, na verdade seu idealizador foi Enrico Tullio Liebman. Mas é preciso notar que a visão italiana das condições da ação difere um pouco da nossa pois não se considera a possibilidade jurídica do pedido condição da ação, mas sim elemento do mérito. Diz Liebman:" La condizioni dell`azione, poco fa menzionate, sono l`interesse ad agire e la legitimazone. Esse sono, come già accennato, i requisiti di esistenza dell azione, e vanno perciò accertate in giudizio, (anche se di solito, per implicito) preliminarmente all`esame del merito". (Enrico Tullio Liebman. Manuale di Diritto Processuale Civile, Giuffrè Editore, Milano, 4º ed, 1980, v. I, p. 135). Ver ainda, Galeno Lacerda, Despacho Saneador, Sérgio Antônio Fabris editor, 3º ed, 1999, p. 78

46. O que separa a condição da ação do mérito é a prova como lembra Nelton Agnaldo dos Santos Moraes; A Técnica cit, p. 133.

47. Chiovenda

, após afirmar que o conceito de parte se relaciona com a lide, demonstra que há terceiros que ingressam no processo e pessoas que fazem parte da relação deduzida em juízo mas que não ingressam no processo. Conclui: "Por essas razões, reputamos parte aquele em face do qual, e não contra o qual, se demanda um atuação da vontade da lei."( Instituições de Direito Processual Civil, Bookseller, 1999, v. II, p. 277)

48. Chiovenda

, afirma que o conceito de parte se relaciona com a lide. Mas após relaciona uma série de situações em que estão no processo pessoas alheias à lide e do reverso, ou seja, pessoas que estão no litígio mas não em juízo afirma: " Por estas razões, reputamos parte aquele em face do qual, e não contra o qual se demanda uma atuação da vontade da lei" ( Instituições de Direito Processual, Bookseller, 1999)

49. Sobre a legitimidade ver Humberto Theodoro Júnior,Curso de Direito Processual Civil, Forense, 18º ed. 1996, v. I, p. 56. Júlio Fabbrini Mirabette; Processo Penal, Atlas, 9º ed., 1999, p. 103. J. E Carreira Alvim. Elementos de Teoria Geral do Processo, Forense. 7º ed, 1997, p. 122.Cândido Rangel Dinamarco et alii, Teoria Geral do Processo, Malheiros, 1993, p. 259. Ovídio Baptista da Silva e Fábio Luiz Gomes, Teoria Geral do Processo Civil, RT, 1997 p. 114. Enrico Tullio Liebman, Manuale di Diritto Processuale Civile, Giuffrè Editore, Milano,4º ed, 1980, v. I., p. 139. Vicente Greco Filho. Direito Processual Civil Brasileiro, Saraiva, 2º ed, 1984, p. 69

50. Moacyr Amaral Santos

, Primeiras Linhas de Direito Processual Civil, Saraiva, 21 ed. 1999, v. I, p. 170: "Possibilidade jurídica é a condição da ação que diz respeito `a pretensão. Há possibilidade jurídica quando a pretensão em abstrato se inclui entre aquelas reguladas pelo direito objetivo". Ver ainda Wilson de Souza Campos Batalha, Tratado de Direito Judiciário do Trabalho, Ltr, 3º ed., 1997, p. 565.

51. Muito pelo contrário, como leciona Egas Dirceu Moniz de Aragão, Comentários ao Código de Processo Civil, Forense, 9ª ed, 1998, v. II, nº 525, p. 403, a impossibilidade jurídica do pedido deve ser buscada na existência de impedimento expresso e não na previsão de norma que abrigue o direito pleiteado. A regra é a possibilidade, a impossibilidade a exceção.

52. Sobre a impossibilidade jurídica do pedido ver Humberto Theodoro Júnior,Curso de Direito Processual Civil, Forense, 18º ed. 1996, v. I, p. 53. J.E Carreira Alvim, op. cit.,p 122-124. Cândido Rangel Dinamarco, op. cit., p. 256. Vicente Greco Filho. Direito Processual Civil Brasileiro, Saraiva, 2º ed, 1984, p.75

53. Ver Cândido Rangel Dinamarco, Execução Civil, Malheiros, 5º ed., 1997, p. 400.

54. Ver sobre o interesse processual Enrico Tullio Liebman, op. cit., p. 136. Theodoro Júnior, op. cit. p. 55. Cândido Rangel Dinamarco, op. cit. p. 257. J.E. Carreira Alvim. Op. cit. p. 121. Vicente Greco Filho. Direito Processual Civil Brasileiro, Saraiva, 2º ed, 1984, p.72

55. Cânddo Rangel Dinamarco

, Execução cit. p. 406

56. Cândido Rangel Dinamarco

et alli falam em adequação.

57. Neste diapasão, a lição de Nelson Néry Júnior e Rosa Maria Andrade Néry: " Interesse Processual: Trata-se do interesse processual, condição da ação, e não do interesse material, que respeita ao mérito(Arruda Alvin, Tratado,I, 323). O interesse processual se consubstancia na necessidade de o autor vir a juízo e na utilidade que o provimento jurisdicional lhe poderá trazer"(Código de Processo Civil Comentado, RT, 3º ed., 1997, p. 249)

58. Na doutrina, a manifestação de Theutônio Negrão:"A falta de interesse jurídico, como diz o artigo 50( ou legítimo interesse, como está nos artigos 869 e 1.194, bem como no CC 76)determina o indeferimento da inicial(Art. 295, caput-III) ou a extinção do processo(art. 267-VI, 268 e 329). Deve ser alegada na contestação( art. 301, X) e pode ser decidida fora de audiência(art. 327 a 329)" (Código de Processo Civil e legislação processual em vigor,Saraiva, 27º ed., 1996, p. 70. Moacyr Amaral Santos. Op. cit. p. 171

59. Conforme Teori Albino Zawaski, op. cit, p. 120; " encontrando-se o processo na fase recursal, o pedido de antecipação de tutela será formulado perante o orgão competente para o julgamento do recurso. È o que ocorre com as medidas cautelares em geral (´ interposto o recurso, a medida cautelar será apreciada diretamente pelo tribunal´ diz o parágrafo único do artigo 800), não havendo razão para dar-se, aqui, disciplina distinta. E, como nas causas e competência originária, caberá ao relator receber, processar e decidir o incidente, facultadno-se à parte que se sentir agravada por suas decisões, apresentar recurso ao colegiado"

60. Como lembram Nelson Néry Júior e Rosa Maria Andrade Néry: "Inocorrência de preclusão: A aferição pelo juiz da existência das condições da ação, notadamente a legitimidade das partes e o interesse processual, se faz de modo liminar, pois somente deverá indeferir a inicial se a parte for manifestamente ilegítima(CPC 395, II)A decisão liminar positiva do juiz, determinando a citação, não gera preclusão, de sorte que poderá a qualquer tempo e grau de jurisdição(CPC, art. 267, par. 3º) enquanto não proferida a sentença, reexaminar a questão sobre as condições da ação, (RTJ. 112/1404; VI ENTA 9), já que se trata de matéria de ordem pública."(Op. cit, p. 248)

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Sobre o autor
Marcelo Colombelli Mezzomo

Ex-Juiz de Direito no Rio Grande do Sul. Professor.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MEZZOMO, Marcelo Colombelli. Cautelares satisfativas?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. -243, 1 nov. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3412. Acesso em: 23 nov. 2024.

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