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A responsabilidade penal por danos ao meio ambiente

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01/01/2003 às 00:00
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3.O meio ambiente como um interesse de caráter difuso

3.1 Os interesses transindividuais

Da reunião de vários fatores inerentes à realidade da sociedade pós-industrial, caracterizada pela produção, comercialização, crédito, comunicação, tecnologia e conflituosidade massificados, emergem situações que, além de serem desconhecidos pela tradição individualística, colocam-se como indispensáveis à vida das pessoas.

Em descompasso com códigos tradicionais, os direitos e os deveres deixam de se apresentar exclusivamente como individuais, de cunho egoístico, passando a assumir um caráter essencialmente coletivo e difuso, onde a socialização e a coletivização têm papel fundamental.

Surgem, portanto, interesses atinentes à toda a coletividade, melhor nomeados de transindividuais, eis que não se encontram acima ou além dos indivíduos. São interesses que não se enquadram na dicotomia tradicional entre o público e o privado, constituindo-se, pois, num terceiro gênero que tem características e conteúdo próprio.

Esses interesses, contrariamente ao direito individualístico, excludente, repressivo e negativo de outros direitos, têm um caráter essencialmente promocional, pois ao Estado não cabe demandar soluções a certas pretensões ou benefícios à pessoas determinadas, mas, sobretudo, compete a ele criar uma consciência de compromisso com atos futuros referentes à proteção da qualidade e continuidade da vida.

A sua violação afeta a todos inexoravelmente, o que, por sua vez, enseja aos seus atores uma co-responsabilidade e a compreensão de uma espécie de destino comum inevitável que os prende aos demais. É por isso que além de serem considerados direitos sociais ao modo de um Estado Democrático de Direito, são direitos de cunho e vínculos políticos, na medida em que requerem uma intervenção ativa de seus atores, uma atividade, e não somente uma negação, um impedimento de violação.

A defesa dos interesses transindividuais, principalmente quando se trata de meio ambiente, de interesses culturais ou de defesa do consumidor e similares, insere-se na luta pela garantia de direitos humanos fundamentais típicos daqueles de terceira geração [37], haja vista que têm, como ponto de apoio, o mesmo compartilhar de destinos, situações e interesses.

A partir da década de 60 começou-se a delinear uma nova categoria de direitos fundamentais direitos de terceira geração. Nesta perspectiva os direitos fundamentais seriam três categorias: os direitos de liberdade, os direitos de prestação (igualdade) e os direitos de solidariedade. Estes últimos direitos pressupõem o dever de colaboração de todos os estados e não apenas o atuar ativo de cada um e transportam uma dimensão coletiva justificadora de outro nome dos direitos em causa: os direitos dos povos.

Eles não se encontram atrelados a uma ordem subordinativa e hierarquizada, de regras e valores, mas sim, validam-se e buscam legitimidade e importância no conflito travado no espaço social entre interesses diversos que se chocam.

Pela conotação política inerente ao conteúdo e objeto desses interesses, sua operacionalização encontra-se estritamente vinculada à questão do acesso à justiça e ao problema da participação democrática no processo jurídico.

Quanto à forma de classificação para albergar as distintas espécies destes direitos, na doutrina encontramos, basicamente duas formas. A primeira entende que tanto os interesses coletivos como os difusos encontram-se alojados na rubrica interesses transindividuais, uma vez que ultrapassam o indivíduo isoladamente considerado. Estes constituiriam gênero, e aqueles as espécies. A segunda corrente sustenta que o gênero são os interesses coletivos que se subdividiria-se em interesses coletivos strictu sensu e interesses difusos propriamente ditos. Em razão de sua maior clareza didática, parece mais apropriada a primeira classificação, que utiliza nomenclatura distinta para cada um dos seus elementos, o que, instrumentalmente, a torna mais precisa.

Solidificou-se o entendimento doutrinário de que o interesse a um meio ambiente ecologicamente equilibrado é um interesse transindividual de caráter difuso. Por isso, passar-se-á a analisar dessa categoria de interesses – os difusos – tentando, dessa forma, evidenciar os traços principais que caracterizam o interesse ao meio ambiente.

3.2 Os interesses difusos

Com o crescimento de importância das questões relacionadas aos interesses difusos faz-se nítida a incompatibilidade destes com a teoria jurídica tradicional acostumada a reconhecer e atrelar a todo direito um titular exclusivo e visualizável, pois eles significam, sobretudo, uma indeterminação subjetiva de sua titularidade.

A síntese ordenadora do interesse difuso, diferentemente do coletivo, não se fará no interior de um grupo determinado, mas como "fruto do debate democrático no interior diluído da sociedade civil como um todo" [38]. Assim, eles distinguem-se sobremaneira dos coletivos por não estarem alicerçados em qualquer vínculo jurídico de base. A reunião de pessoas em torno de um interesse difuso assenta-se em fatos genéricos, acidentais e mutáveis, como habitar a mesma região, consumir os mesmos produtos etc. Contudo, os entes coletivos se fazem necessários para a tutela desses interesses na medida em que representam "mecanismos fundamentais para a praticabilidade, a implementação e a busca de efetivação, de tais interesses" [39].

Péricles Prade diz serem difusos os interesses:

"...titularizados por uma cadeia abstrata de pessoas, ligadas por vínculos fáticos exsurgidos de alguma circunstancial identidade de situação, passíveis de lesões determinadas entre todos os titulares, de forma pouco circunscrita e num quadro de abrangente conflituosidade" [40].

Diz o Código de Defesa do Consumidor (Lei 8078/90) em seu artigo 81,I:

Interesses difusos, assim entendidos, para efeito deste Código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato.

Assim, em razão da inocorrência de um laço de união entre os possíveis ou potenciais titulares, a determinação dos sujeitos resta por demais fluida e dispersa. Na lição de Celso Bastos, há a "descoincidência" do interesse difuso com o interesse de uma determinada pessoa abrangendo, na realidade, "toda uma categoria de indivíduos unificados por possuírem um denomidaor fático qualquer em comum". [41] Ademais, eles apresentam caráter de efemeridade, o que exige uma prestação jurisdicional imediata e eficaz, sob pena de irreparabilidade da lesão.

Não existe qualquer tipo de vínculo jurídico que reuna os sujeitos eventuais ligados aos interesses difusos, havendo apenas uma vinculação fática circunstancial entre os sujeitos afetados;

Esses interesses referem-se a bens indivisíveis, significando que a satisfação do interesse implica sempre a satisfação de toda a coletividade, da mesma forma que sua lesão se concretiza para todos. É por isso que não há que se pensar em fruição exclusiva por algum titular. A fruição é comum, de todos e de ninguém indistintamente

Tem-se assentado, após alguma depuração teórico-conceitual de que têm sido objeto, mormente no seu confronto com os interesses coletivos, que os interesses difusos se manifestam e evidenciam em torno de domínios como:

- o direito à saúde;

- a defesa do ambiente e da qualidade de vida, do direito à preservação da natureza e da paisagem natural (aí se incluindo a proteção contra os ambientes insalubres de trabalho, o ruído excessivo, a emissão de substâncias nocivas, etc);

- O direito a um crescimento e ordenamento harmônico e humanizado do território urbano (onde se pode incluir o direito à proteção da estética urbana) local, regional e nacional;

- O direito à proteção do consumo de bens e da utilização de serviços (aí se incluindo a proteção da produção, conservação, manuseamento, armazenamento, embalagem e venda de produtos, alimentares ou outros, em condições de higiene, à proteção na adesão de cláusulas contratuais de adesão, à proteção contra abusos publicitários, etc);

- o direito à proteção, salvaguarda e valorização do patrimônio cultural, que corresponde a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;

- a preservação da ordem econômica segundo regras estabelecidas de concorrência, e proibição de práticas de monopólio;

- o direito a uma preservação e circulação rodoviária segura,

- o direito à informação mediática isenta, objetiva e plural, etc.

- o uso da propriedade privada urbana ou rural segundo sua função social;

- a salvaguarda dos direitos humanos fundamentais, principalmente das minorias étnico-sociais.

Em razão dessa indeterminação dos sujeitos e da efemeridade e contingência dos interesses, os interesses difusos se apresentam fundamentalmente diferente dos demais, sejam individuais ou coletivos, o que, por sua vez, implica no que apropriadamente Mauro Cappelletti denominou de conflitualitá massima, eis que, exsurgindo de circunstâncias de fato, conjunturais (consumir produtos, habitar certa região), ensejam o confronto entre interesses de massa, sustentados por sujeitos com interesses antagônicos e são capazes, assim, de promover a discussão e a politização dos entes envolvidos.

Os representantes dos interesses e direitos difusos não são os indivíduos presentes na definição dos interesses individuais egoísticos, uma vez que a satisfação ou lesão de tais interesses implicam na satisfação da coletividade como um todo. Tampouco são os grupos apresentados como titulares exclusivos desses interesses, pois os interesses difusos pertencem não só a eles mas à comunidade como um todo. A discussão acerca da representatividade gira em torno de opções prático-políticas, que acabam por conceder tal atributo àqueles sujeitos mais capacitados para garantir a praticabilidade de tais interesses.


4. Lei dos Crimes ambientais

4.1. Considerações preliminares.

Embora a moderna evolução das idéias ecológicas tenha impulsionado o aparecimento de um complexo de princípios, técnicas e normas destinados a essa finalidade, congregando todos os ramos d ciência do direito para, com seus instrumentos próprios, auxiliar a corrigir ou impedir as distorções ambientais, novos e relevantes contornos dessa intervenção estatal foram delineados nos últimos tempos, trazendo para a órbita da tutela jurídica o direito ao meio ambiente equilibrado e à sadia qualidade de vida como um dos direitos fundamentais da pessoa humana, mas também de toda a coletividade.

Tal se deu no Brasil pela adoção desse princípio, objeto de recomendação da comunidade internacional, que foi impresso na Constituição Federal de 1988, passando assim a nortear toda a legislação ambiental subjacente, e a dar uma nova conotação a todas as leis em vigor, no sentido de favorecer uma interpretação coerente com a orientação político-institucional que então se inaugurava.

Por outro lado, o campo de abrangência da proteção jurídica ambiental alargou-se enormemente pela ampla conceituação dada ao seu objeto, que passou a incluir, ao lado dos recursos naturais, todos os bens que, de natureza material ou imaterial, se referiram à identidade, à ação, à memória da sociedade brasileira, às suas criações científicas e tecnológicas, às suas obras e edificações, enfim, tudo aquilo que se considera essencial para a plena realização da pessoa humana e para a vida na comunidade, e que pode ser chamado de patrimônio cultural da nação.

Há muito que a proteção jurídica do meio ambiente se realizava direcionada para a regulamentação da correta utilização dos recursos naturais, embora fossem parcos os instrumentos disponíveis para a sua defesa. A noção dos interesses difusos, trazida modernamente para a ordem jurídica, e a institucionalização de sua defesa através de instrumentos adequados, bem como as atribuições concedidas ao Ministério Púbico para a proteção do meio ambiente, vieram a intensificar e alargar a tutela até então dispensada aos bens ambientais.

Por outro lado, a discussão dos problemas ecológicos, a todos concernente, a atuação dos organismos internacionais, as atividades das associações civis de defesa do meio ambiente, as pesquisas e estudos científicos, puseram em cheque o substrato filosófico da proteção jurídica ambiental precedente, no sentido de fundamentá-la não apenas em termos econômicos, ou de satisfação às necessidades individuais, mas também em outros valores básicos da condição humana, de tipo cultural e de conotações éticas, que passarão a compor o novo conceito de qualidade de vida, o qual ingressou definitivamente na ordem jurídica através das referências que lhe fez a Constituição brasileira de 1988.

A nova relação que se estabeleceu entre o homem e a natureza, baseada no mútuo respeito e na mútua dependência, com a predominância do interesse coletivo sobre o individual, induziu a uma nova postura da sociedade para com o meio ambiente, que requer um novo enfoque dos problemas existentes e uma adequação da ordem jurídica para as suas soluções, levando em consideração os novos valores emergentes e a responsabilidade comum de sua defesa.

Para isso também se espera que o direito penal contribua, como parte integrante da ordem jurídica, e como recurso extremo na proteção dos valores fundamentais da sociedade, através das sanções que lhe são próprias, sendo a violação dos mesmos intolerável, e inevitável de outra forma. Funcionará então o direito penal como recurso necessário de defesa social, garantidor da coexistência pacífica entre os membros da coletividade, e instrumento de uma política que atende aos anseios sociais sem descurar os do desenvolvimento econômico e as necessidades básicas da população.

A execução dessa tarefa encontra algumas dificuldades no âmbito do direito penal. Por isso se faz necessário a realização da compatibilização da política criminal com as diretrizes de política ambiental, dotando-se a legislação penal de instrumentos e normas adequadas à proteção dos valores ambientais, refazendo a tipologia, redimensionando as penas e forjando um sistema que, além de apropriado às finalidades visadas, possa atender melhor aos anseios e às exigências da nova ordem social, que pretende a harmonização dos interesses da comunidade com a necessidade de preservar a natureza, no interesse das gerações vindouras.

4.2. A Lei dos crimes contra o meio ambiente (Lei 9.605/98). Generalidades sobre os tipos penais ambientais.

4.2.1. Bem jurídico tutelado

A idéia fundamental é do meio ambiente ecologicamente equilibrado, entendido como a manutenção das propriedades do solo, do ar e da água, assim como a fauna a flora e as condições ambientais de desenvolvimento dessas espécies de tal forma que o sistema ecológico se mantenha com seus sistemas subordinados e não sofra alterações prejudiciais.

4.2.2. Conduta

Em geral, os artigos da lei 9605/98 que trazem tipos penais, apresentam múltiplas condutas (condutas mistas ou de conteúdo variado), configurando, assim, a modalidade de tipo alternativo, ou seja, o agente pode praticar qualquer das condutas ou mais de uma que a pena será única, crime único.

Em relação ao bem jurídico mediato, os crimes previstos pela lei ambiental são formais, bastando a efetivação da conduta, não se exigindo a ocorrência do resultado naturalístico, que é a lesão ou exposição a perigo do bem jurídico "meio ambiente ecologicamente equilibrado". Contudo, em relação ao bem jurídico imediato, os crimes poderão ser formais ou materiais, de dano ou de perigo.

A maior parte dos crimes se configura por meio de ação, mas também aparecem formas omissivas.

4.2.3 Sujeito Ativo

Qualquer pessoa, física ou jurídica, poderá ser sujeito ativo do delito ambiental, inclusive as pessoas coletivas. Há, portanto, na lei penal ambiental a imputação de condutas delituosas a pessoas jurídicas.

4.2.4 Sujeito Passivo

A coletividade, de maneira difusa. A agressão ao bem jurídico meio ambiente afeta a todos de maneira indeterminada. Em algumas figuras delituosas da lei, aparece, como sujeito passivo imediato, o particular, proprietário do objeto material.

4.2.5 Objetos materiais

Fauna (Espécies da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória);

Flora (Florestas consideradas de preservação permanente, mesmo que em formação, unidades de conservação, e demais formas de vegetação);

Qualidade do ar, água e solo em relação à saúde humana;

Patrimônio histórico e cultural e o Ordenamento urbano.

4.2.6 Elemento normativo

Em inúmeros dispositivos, o aplicador deverá recorrer a outros diplomas legais para complementar o tipo penal, já que inúmeros são os tipos penais em branco. Assim, muitos serão os tipos penais que trarão elementos normativos relacionados ora à ilicitude, ora, de índole jurídica.

4.2.7 Elemento Pessoal

A maior parte dos delitos ambientais admitem crimes somente na forma dolosa, sendo poucas as figuras culposas.

4.2.8 Ação Penal

Por motivos de política criminal, que norteia a maioria das leis penais extravagantes, a ação penal dos tipos delituosos ambientais será pública incondicionada. Ou seja, caberá somente ao Ministério Público a sua proposição.

4.3. Análise dogmática e jurisprudencial dos tipos penais em espécie.

4.3.1 Crimes Contra a Fauna

Na Seção I do Capítulo V, o legislador reservou nove artigos para os crimes contra a fauna, tipificando condutas delituosas praticadas contra espécies da fauna silvestre. Somente os arts. 29, 30, 31, 32, 33, 34 e 35 tipificam as condutas delituosas. O art. 29 se refere à caça, e os arts. 34 e 35 à pesca. As penas dos arts. 29, 31 e 32 não ultrapassam um ano de detenção. Aplicável, in casu, o instituto da transação penal, previsto no art. 76 da Lei n. 9099/95. Os arts. 30, 33, 34 e 35 têm penas mínimas de um ano. Aplica-se, nesses caso, o instituto da suspensão do processo, previsto no art. 89 da Lei 9099/95. O art. 36 é norma explicativa, e o art. 37 trata de causa de isenção de pena.

Fauna é o conjunto de animais próprios de um país ou região que vivem em determinada época. Protegem-se as espécies da fauna silvestre ou aquática, doméstica ou domesticadas, nativas, exóticas ou em rota migratória. É a própria lei, no § 3o do art. 29 que determina quais são as espécies da fauna silvestre protegidas, quais sejam, "todos aqueles pertencentes às espécies nativas, migratórias e quaisquer outras, aquáticas ou terrestres, que tenham todo ou parte de seu ciclo de vida ocorrendo dentro dos limites do território brasileiro, ou águas jurisdicionais brasileiras".

Assim, passar-se-á à análise particular de alguns dos delitos contra a fauna, sempre tentando elucidar as abordagens e comentários com casos jurisprudenciais.

4.3.1.1 Art. 29, caput.

Dispositivo: "Art. 29. Matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em descordo com a obtida:

Pena – detenção de seis meses a um ano, e multa."

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4.3.1.1.1 Casos jurisprudenciais.

a) FAUNA – apanha – pequena quantidade de pássaros apreendidos – princípio da insignificância.

Pequena quantidade de pássaros apreendidos. Insignificância. Em virtude de pequena quantidade de pássaros apreendidos (um casal de bonitos, um tico-tico-rei, cinco azulões e um papagaio), não havendo comprometimento ao meio ambiente, aplica-se o princípio da insignificância para absolver os acusados (TRF – 4ª Reg., 2ª T., Acrim 93.04.29517-3-SC, rel. Juiz Jardim de Camargo, DJU, 5.06.1996).

b) FAUNA – Caça – Crime de dano – Inocorrência de tentativa.

O crime, previsto na Lei n. 5.197/67, é de dano, dado que o tipo do injusto está configurado na ação de caçar ou perseguir. Inocorrência, no caso, de tentativa, pois se configura em havendo início dos atos executórios e, quando iniciada a execução (de caçar ou de perseguir), e não vontade de fazê-lo (TRF – 2ª Reg., 2ª T., Acrim 94.02.08526-2-RJ, rel. Juiz convocado Rogério V. de Carvalho, DJU, 8.06.1995.

c) PENAL – Crime contra a fauna silvestre nacional – materialidade e autoria delitiva comprovadas – Sentença de condenação mantida.

1. Comprovada a materialidade do delito pelo auto de exibição e apreensão e laudo do Instituto de Criminalística do Estado de São Paulo, que atestam o abate do animal, cuja carne foi apreendida. 2. As circunstâncias em que os réus foram surpreendidos, bem como o fato de, em poder deles, serem encontrados os instrumentos utilizados para o abate, e à ausência de qualquer prova no sentido de que fora o animal vítima de atropelamento, conclui-se que a capivara abatida foi produto de caça, proibida nos termos da Lei 5.197/67. 3. Condenação mantida. Recurso improvido.

(TRF – 3ª Reg. ApCrim 94.03.081966-9 – TRF 3ª R – 5ª T. – j. 15.06.1998 – rela Juíza Ramza Tartuce).

d) FAUNA – Caça de animal silvestre – Erro de proibição configurado.

O art. 10, d e j, da Lei n. 5.197/67, com as alterações feitas pelos arts. 27, § 1º, da Lei n. 7.653/88. Não basta a prática de um fato típico para infligir pena. É imprescindível, sempre, que fique demonstrada a culpabilidade. Além da imputabilidade do sujeito e a exigibilidade de conduta diversa, há que se exigir a potencial consciência da ilicitude do fato cuja ausência exclui a culpabilidade, isentando de pena quando inevitável, ao teor do art. 21, § único do CP. Na hipótese, os elementos indiciadores da vontade do réu de violar a norma penal mostram-se precários e o legislador não previu o delito em sua forma culposa, razão pela qual deve ser confirmada a sentença absolvitória (TRF – 2ª Reg., 1ª T., Acrim 93.02.14174-8-RJ, rel. Des. Fed. Frederico Gueiros, DJU, 10.05.1994)

4.3.1.1.2 Comentários

a) Elementos descritivos objetivos: Os elementos descritivos objetivos são aqueles encontrados no tipo, que se pode apreender seu conteúdo sem necessidade de qualquer valoração por parte do juízo. São, portanto, o bem jurídico penalmente protegido; a ação que lesiona ou o verbo que expressa a conduta que venha a lesionar o bem jurídico; o resultado naturalístico; o nexo causal; os sujeitos do delito e o objeto material do delito. Passar-se-á, então, à análise desses elementos no tipo penal ora em estudo.

Bem jurídico tutelado. É a preservação do patrimônio natural, especialmente da fauna silvestre e aquática ameaçada ou não de extinção. Trata-se de um crime de dano, já que para a sua configuração exige a lesão ao bem jurídico penalmente tutelado.

Núcleo do tipo: São cinco os verbos núcleos do tipo em análise, quais sejam, matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar. Cuida-se de crime de múltipla ação (várias condutas); não importa se o agente praticou uma única ou várias condutas ao mesmo tempo descritas no tipo penal: responderá por um só delito. É um crime comissivo, já que exige uma ação por parte do agente.

Resultado: Aqui, trata-se de um crime material, pois o efeito lesivo concretiza-se somente com a exteriorização das ações destacadas no tipo -–matar, perseguir, caçar, apanhar ou utilizar. Consuma-se o delito com a prática de qualquer das ações incriminadas.

Sujeito ativo. Qualquer pessoa (física ou jurídica) que não possua a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente para o exercício da caça, da pesca ou da comercialização dos animais silvestres e das respectivas peles e couros, ou se a possuir, utilizá-las em descordo com a lei.

Sujeito passivo. A comunidade, de maneira difusa.

Objeto material. São todos os animais da fauna silvestre pertencentes às espécimes nativas, migratórias e quaisquer outras aquáticas ou terrestres, que tenham todo ou parte de seu ciclo de vida ocorrendo dentro dos limites do território brasileiro, ou águas jurisdicionais brasileiras.

b) Elemento normativo. Os elementos normativos são aqueles que exigem, para a sua compreensão, um determinado juízo de valoração. Podem ser por referência à ilicitude, de natureza cultural, de índole jurídica ou de índole estimativa.

No caso do dispositivo em análise, exige-se a permissão, licença ou autorização da autoridade competente para que a pessoa possa praticar as condutas descritas no caput e nos incisos I e III deste artigo. O órgão competente deverá regulamentar as normas administrativas concernentes à expedição da permissão, licença ou autorização para o exercício da caça, pesca ou comercialização dos animais silvestres e das respectivas peles e couros. Por isso, elemento normativo aqui está relacionado à ilicitude.

c) Elemento pessoal. O elemento pessoal é responsável pela ligação do fato a um determinado agente. Essa ligação poderá se dar a título de dolo ou culpa strito senso. No caso, a ligação se dará a título de dolo genérico.

O § 4º e 5º do artigo em análise, dispõe sobre as causas de diminuição e aumento da pena, sendo que será aumentada de metade, se o crime for praticado contra espécie rara ou considerada ameaçada de extinção, ainda que somente no local da infração; em período proibido à caça; durante a noite; com abuso de licença; em unidade de conservação; com emprego de métodos ou instrumentos capazes de provocar destruição em massa. Será aumentada até o triplo, se o crime decorre do exercício de caça profissional.

O art. 29, caput, por exigir uma atividade do aplicador para a complementação do tipo penal, consiste num tipo de conteúdo aberto.

Em seu § 6º fica determinado que as disposições deste artigo não se aplicarão aos atos de pesca.

Pela descrição típica do art. 29 são inúmeras as condutas que poderiam configurar o delito em questão. Todavia, a análise da tipicidade não pode estar atrelada somente à tipicidade legal. Dentro de um Estado Social Democrático de Direito, a tipicidade deve também relacionar-se à elementos materiais. Melhor dizendo, inúmeras condutas, apesar de se enquadrarem na descrição típica, de fato não ocasionam lesividade ao bem jurídico penalmente tutelado nos delitos ambientais. Por isso, deve o aplicador, para excluir tais condutas da incriminação legal, levar em conta a tipicidade material do delito.

Para que a tipicidade material seja configurada, a proteção do bem jurídico lesionado deve ser essencial (carência da tutela penal), a lesão deve ser significativa ao ponto de provocar uma danosidade social e o bem jurídico lesionado deve ser essencial (dignidade penal dos delitos). Quando não se configura a tipicidade material, diz-se que a conduta será atípica.

Assim foi o entendimento do caso jurisprudencial a) acima transcrito, no qual, pela insignificância da conduta em lesionar o bem jurídico penalmente tutelado, julgou-se improcedente a condenação. Já no caso c), parece que o órgão julgador penal desconsiderou o verificação da tipicidade material. Não parece ser de grande relevância para a proteção do bem jurídico ambiental a conduta de abater um animal, sobretudo, sendo este um animal não ameaçado de extinção. Não parece, no caso, caber os rigores do Direito Penal; apenas seria possível, dentro da concepção funcional-teleológica dos fins do direito penal adotada no presente trabalho, sanções de natureza administrativa.

O caso b) foi mister em elucidar que o delito do art. 29, caput, é um delito de dano e que, por isso, requer, para a sua consumação a lesão efetiva ao bem jurídico penalmente tutelado. Sem essa lesão – o resultado naturalístico – não há que se incriminar a conduta do agente.

4.3.1.2 § 2º do art. 29.

"§ 2º No caso de guarda doméstica de espécie silvestre não considerada ameaçada de extinção, pode o juiz, considerando as circunstâncias, deixar de aplicar a pena".

4.3.1.2.1 Casos jurisprudenciais

a) FAUNA – MANTER AVES SILVESTRES EM CATIVEIRO – ATIPICIDADE.

Leis ns. 5.197/67 e 7.653/88. É atípico o fato de manter aves silvestres em cativeiro, se não há prova de que tenham sido caçadas ou utilizadas ilicitamente. Sentença absolutória mantida. Não é fito típico o mantenimento de aves silvestres em cativeiro, para lazer, bem cuidadas, sem que se prove tenham sido caçadas ou que venham a ser utilizadas ilicitamente (TRF – 3ª Reg., 1ª T., Acrim 91.03.43765-5, rela. Juíza Ramza Tartuce, DJU, 22.03.1994.)

b) CRIME CONTRA A FAUNA – Descaracterização – Agente que mantém em cativeiro aves não ameaçadas de extinção – Ausência de potencialidade lesiva – Hipótese, ademais, em que não demonstrada a destinação comercial – Inteligência da Lei 5.197/67.

O bem protegido pela lei de crimes contra a fauna é o animal silvestre, fora do cativeiro, tendo em vista a preservação das espécies nativas. Assim, não pratica crime previsto na Lei 5.197/67, por não apresentar potencialidade lesiva, o agente que mantém em cativeiro aves não ameaçadas de extinção, mormente quando não demonstrada a destinação comercial. (TRF – 4ª Reg. Ap. 96.04.15529-6/PR – 2ª T. j. 11.12.1997 – rela. Juíza Tania Escobar – DJU 11.02.1998.

c) PROCESSO PENAL. Recurso em sentido estrito. Rejeição da denúncia. Crime contra a fauna. Manutenção em cativeiro de espécime pertencente à fauna silvestre nacional para simples deleite. Ausência de finalidade de comércio: indiferente penal. Infração administrativa. Art. 9º da Lei 5.197/67. Recurso improvido. (TRF – 3ª Reg. Rcrim. 96.03.038304-4/SP - 1ª T. j. 21.07.1998 – rel. Juiz Theotônio Costa).

4.3.1.2.2 Comentários:

No caso, aplica-se o disposto no § 2º do art. 29, que trata da guarda doméstica de espécie silvestre não considerada ameaçada de extinção. O juiz poderá deixar de aplicar a pena, pela insignificância da conduta em lesar o bem jurídico fauna.

Assim, o § 2º do art. 2º trata de uma excludente da ilicitude penal.

Os casos jurisprudenciais acima transcritos bem elucidam a ocorrência dessa excludente.

4.3.1.3 Art. 32.

"Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos:

Pena – detenção, de três meses a um ano, e multa".

4.3.1.3.1 Casos jurisprudenciais

a) MEIO AMBIENTE. Crueldade a animais. "Farra do boi". Alegação de que se trata de manifestação cultural. Inadmissibilidade. Aplicação do art. 225, § 1º, VII, da CF.

A obrigação de o Estado garantir a todos o pleno exercício de direitos culturais, incentivando a valorização e a difusão das manifestações, não prescinde da observância da norma do art. 225, § 1º, VII, da CF, que veda prática que acabe por submeter os animais à crueldade, como é o caso da conhecida "farra do boi". (RE 153.531-8/SC – 2ª T. – STF – j. 03.06.1997 – redator p/ acórdão Min. Marco Aurélio – DJU 13.03.1998).

4.3.1.3.2 Comentários.

a) Elementos descritivos objetivos :

Bem jurídico tutelado. É a preservação do patrimônio natural, especialmente os da fauna silvestre, ameaçada ou não de extinção contra abusos e maus tratos. É um crime de dano.

Núcleo do tipo: praticar, ferir e mutilar. A conduta punível é a de praticar ato de abuso, maus tratos, ferir ou mutilar. Cuida-se de crime de múltipla ação. É um tipo comissivo.

Resultado: Trata-se de um crime material.

Sujeito ativo. Qualquer pessoa

Sujeito passivo. A comunidade, de maneira difusa.

Objeto material. São as espécies da fauna silvestre, domésticas e domesticadas, nativas ou exóticas.

d) Elemento pessoal. Admite-se apenas a modalidade dolosa, sendo o dolo de forma genérica.

4.3.1.4. Art. 34, II

"Pescar em período no qual a pesca seja proibida ou em lugares interditados por órgão competente:

Pena – detenção de um ano a três anos ou multa, ou ambas as penas cumulativamente."

Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem:

(...)

II – pesca quantidades superiores às permitidas, ou mediante a utilização de aparelhos, petrechos, técnicas e métodos não permitidos;"

4.3.1.4.1 Casos jurisprudenciais.

a) FAUNA – Pesca predatória – Inocorrência de dano ao meio ambiente – Infração administrativa.

A prática de pesca com a utilização de rede de malhas não permitida administrativamente não configura crime previsto no art. 15 da Lei n. 6938/81, e sim, em caso de reincidência, contravenção. Ademais, a pesca penalizada não trouxe dano ao meio ambiente, não havendo provas de que se poderia criar uma situação de perigo ao ecossistema (TJ- MS - 1ª T., Acrim 46.262-6, rel. Des. Rui Garcia Dias, j. 11.06.1996).

b) CRIME CONTRA O MEIO AMBIENTE. Pesca predatória – Descaracterização – Pesca mediante o uso de redes – Inutilização de substância explosiva ou tóxica – Hipótese de mera infração administrativa – Interpretação dos arts. 15, caput, da Lei 6.938/81, e 34 e 35 da Lei 9.605/98.

Somente se considera pesca predatória aquela feita com a utilização de substância explosiva ou tóxica, assim, por não representar dano ao meio ambiente ou situação de perigo ao ecossistema, a pesca mediante o uso de redes não constitui crime, seja o tipificado no art. 15, caput, da Lei 6.938/81, sejam os tipificados nos arts. 34 e 35 da Lei 9.605/98, tratando-se, assim, de mera infração administrativa. (TJMS – SER 62.218-8 – 2ª T. – j. 02.12.1998 – rel. Des. Carlos Stephanini.).

4.3.1.4.2 Comentários.

a) Elementos descritivos objetivos :

Bem jurídico tutelado. É a preservação do patrimônio natural, especialmente os da fauna aquática (cetáceos, peixes, crustáceos), nos períodos considerados proibidos em lugares interditados. Trata-se de um crime de perigo concreto, pois conduzem a uma potencialidade de lesão ao bem jurídico fauna, realizável ou não, em concreto, sendo que esse perigo deve ser constatado processualmente.

Núcleo do tipo: pescar. A conduta punível é a de pescar nos períodos considerados proibidos ou em lugares interditados. Cuida-se de crime de uma única ação. É um tipo comissivo.

Resultado: Trata-se de um crime formal.

Sujeito ativo. Qualquer pessoa

Sujeito passivo. A comunidade, de maneira difusa.

Objeto material. São as espécies da fauna aquática em época de reprodução.

b) Elementos descritivos circunstanciais de meio: São os instrumentos propriamente dito para a realização do delito, quais sejam, aparelhos, petrechos, técnicas e métodos não permitidos.

c) Elemento normativo. Exige-se que a pesca não seja realizada em quantidade superior à permitida. Trata-se, portanto, de um elemento normativo com referência à ilicitude. O aplicador também deverá verificar se o instrumento utilizado é método de pesca não permitido. Também, aqui trata-se de um elemento normativo com referência à ilicitude.

d) Elemento pessoal. Admite-se apenas a modalidade dolosa, sendo o dolo de forma genérica.

No caso a) o julgador referiu-se à não ocorrência do dano para a considerar atípica a conduta. Quando ele se refere a ocorrência do dano, não quer dizer que seja um crime de dano. É um crime de perigo. Mas, como é de perigo concreto, a realização do tipo exige constatação, caso a caso, de perigo real, paupável, mensurável de lesão ou exposição a perigo do bem jurídico penalmente tutelado. Pela ementa do julgado, percebe-se que fica descaracterizado o delito pela não ocorrência de potencial perigo para o bem jurídico protegido. Acertou, assim o julgador.

Já no caso b) também acertou o julgador, pois, para a ocorrência do delito, o aplicador da norma penal deve analisar o elemento normativo com referência à ilicitude do material ou instrumento utilizado. Trata-se de uma norma penal em branco que deverá ser complementada pelo dispositivo legal ou ato administrativo que dispõe sobre quais os métodos e instrumentos são proibidos.

4.3.2. Crimes contra a flora.

Aos crimes contra a flora (Seção II do Capítulo V) o legislador reservou quinze artigos, tipificando condutas delituosas praticadas contra as unidades de conservação, abrangendo aí as reservas biológicas, reservas ecológicas, estações ecológicas, parques nacionais, estaduais e municipais, florestas nacionais, estaduais e municipais, áreas de proteção ambiental, áreas de relevante interesse ecológico e reservas extrativistas ou outras a serem criadas pelo Poder Público (art. 40, § 1º, da Lei ). Somente os arts. 38, 39, 40, 41, 42, 44, 45, 46, 48, 49, 50, 51 e 52 tipificam as condutas delituosas.

As penas dos arts. 44, 46, 48, 49, 50, 51 e 52 não ultrapassam um ano de detenção. Aplicável, nessas hipóteses, o instituto da transaçãopenal, previsto no art. 76 da Lei 9.099/95. Os arts. 38, 39, 40, 42 e 45 têm penas mínimas de um ano. Aplica-se, nesses casos, o instituto da suspensão penal, previsto no art. 89 da Lei 9.099/95.

Por flora entende-se o conjunto das plantas de uma região, de um país ou de um continente. Denomina-se diversidade biológica ou biodiversidade "a variabilidade de organismos vivos de todas as origens e os complexos ecológicos de que fazem parte: compreendendo ainda a diversidade dentro de espécies, entre espécies e ecossistema" [42].

Há que se ressaltar, ainda, que todas as infrações penais previstas na Lei n. 4.771, de 15 de setembro de 1965, alteradas pelas Leis n. 7.803/89 e 7.875/89, foram revogadas, exceto as alíneas e, j, l e m do art. 26 da mencionada lei.

4.3.2.1 Art. 38

"Destruir ou danificar floresta considerada de preservação permanente, mesmo que em formação, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção:

Pena – detenção, de um a três anos, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.

Parágrafo único. Se o crime for culposo, a pena será reduzida à metade."

4.3.2.1.1 Casos jurisprudenciais.

a) FLORA – Derrubada de árvores e outras formas de vegetação da mata atlântica – Caracterização.

A derrubada de árvores e outras formas de vegetação em área de preservação permanente, como, por exemplo, as da mata atlântica, localizadas em topo de morro, por presunção legal absoluta, configura o ilícito contravencional previsto no art. 26, a, da Lei n. 4.771/65 (TaCrim - 4ª Câm., Acrim 774.793/7 – SP, j. 22-2-1994 – RJDTACrimSP, 21:105).

b) FLORA – Desmatamento em área de preservação ambiental – Erro de proibição – Absolvição.

Inexistência de querer realizar a conduta punível, tratando-se de pessoas extremamente modestas, de pouca escolaridade. Habitualidade em realizar pequena derrubada para plantio, vez que sobreviviam deste. Inteligência do art. 20, § 1º, 1ª parte do CP (TRF - 8ª Câm., Acrim 949.431/5, rel. Juiz Bento Mascarenhas, j. 6.06.1995).

4.3.2.1.2 Comentários

a) Elementos descritivos objetivos :

Bem jurídico tutelado. É a preservação do patrimônio natural, especialmente da flora. É crime material.

Núcleo do tipo: São três os verbos núcleos do tipo em análise, quais sejam, destruir, danificar ou utilizar. Cuida-se de crime de múltipla ação (várias condutas); não importa se o agente praticou uma única ou várias condutas ao mesmo tempo descritas no tipo penal: responderá por um só delito. É um crime comissivo, exigindo uma ação por parte do agente.

Resultado: Aqui, trata-se de um crime de dano, pois o efeito lesivo concretiza-se com a exteriorização das ações destacadas no tipo. Consuma-se o delito com a prática de qualquer das ações incriminadas.

Sujeito ativo. Qualquer pessoa (física ou jurídica).

Sujeito passivo. A comunidade, de maneira difusa.

Objeto material. É a floresta considerada de preservação permanente, mesmo se em formação.

b) Elemento normativo.

Exige-se a autorização para eventual destruição da floresta para fins de utilidade pública. É, portanto, um elemento normativo com referência à ilicitude.

Há também o elemento normativo de índole jurídica, quando trata "considerada de preservação permanente.

c) Elemento pessoal. Dolo genérico. Aqui admite-se o crime na modalidade culposa.

4.3.2.2 Art. 42

"Fabricar, vender, transportar ou soltar balões que possam provocar incêndios nas florestas e demais formas de vegetação, em áreas urbanas ou qualquer tipo de assentamento humano:

Pena – detenção de um a três anos ou multa, ou ambas as penas cumulativamente."

4.3.2.2.1Casos jurisprudenciais.

a) FLORA – Agentes que transportam balão que tem o potencial de provocar incêndios em florestas – Caracterização.

O simples transporte de balão de grande porte, apto a causar incêndio em florestas e outras formas de vegetação, caracteriza a contravenção florestal do art. 26, f, da Lei n. 4.771/65 (TaCrim – 15ª Câm., Acrim 856.619/7 – SP, RJDTACrimSP, 23:106).

4.3.2.2.2 Comentários.

a) Elementos descritivos objetivos :

Bem jurídico tutelado. É a preservação do patrimônio natural, especialmente da flora. É crime de perigo abstrato, ou melhor, os balões devem ter real potencialidade de expor a perigo ou lesionar o bem jurídico tutelado.

Núcleo do tipo: São quatro os verbos núcleos do tipo em análise, quais sejam, fabricar, vender, transportar ou soltar balões. Cuida-se de crime de múltipla ação (várias condutas); não importa se o agente praticou uma única ou várias condutas ao mesmo tempo descritas no tipo penal: responderá por um só delito.

Resultado: Aqui, trata-se de um crime formal.

Sujeito ativo. Qualquer pessoa (física ou jurídica)

Sujeito passivo. A comunidade, de maneira difusa.

Objeto material. São as florestas e as demais formas de vegetação..

b) Elemento circunstancial de meio: balões, que consubstancia-se no instrumento propriamente dito para a realização do delito.

c) Elemento normativo. Encontra-se nesse dispositivo um elemento normativo de índole estimativa, qual seja, "possa provocar incêndio", já que o juízo deverá realizar um juízo de valoração para verificar a potencialidade da conduta do agente em expor a perigo ou lesionar o bem jurídico flora.

d) Elemento pessoal. Dolo genérico.

Há uma discussão doutrinária a respeito de se o tipo é formal ou de mera conduta. O crime formal, já foi delineado suas características. Já o crime de mera conduta são aqueles em que a ação ou a omissão bastam para constituir o elemento material da figura típica penal. A razão de punir tais condutas é de ordem preventiva: "a inidoneidade dessa conduta basta para torná-la objeto de reprovação, por parte do legislador, em face da presunção de dano ou de perigo, sendo indiferente que chegue, ou não, a produzir qualquer resultado" [43].

A conduta de soltar balões, por si, é uma conduta reprovável, pela presunção de dano ou perigo ao bem jurídico. Todavia, faz-se necessário que o balão seja potencialmente capaz de criar essa presunção. Assim, melhor é entendimento de que o crime em tela é formal, de perigo concreto, devendo-se averiguar, caso a caso, a potencial danosidade da conduta.

4.3.2.3 Art. 48

"Impedir ou dificultar a regeneração natural de florestas e demais formas de vegetação:

Pena – detenção, de seis meses a um ano, e multa."

4.3.2.3.1 Casos jurisprudenciais.

a) FLORA – Impedir ou dificultar a regeneração natural de florestas e demais formas de vegetação – Norma penal em branco – Erro de tipo caracterizado – Absolvição decretada.

O agente que acredita que a restrição às práticas agrícolas se limita a uma distância de 30 metros das margens da represa, quando a lei considera como imune de corte a vegetação situada a menos de 100 metros dos reservatórios, incide em erro relativo ao aspecto da norma complementar da lei penal em branco, a qual faz parte do tipo, assim caracterizado fica o erro de tipo e consequentemente excluído o dolo (TaCrim – SP – 7ª Câm., Acrim 1.043.053-2-SP, j. 27-2-1997, RJ, 243:115).

4.3.2.3.2 Comentários.

a) Elementos descritivos objetivos :

Bem jurídico tutelado. É a preservação do patrimônio natural, especialmente da flora. Trata-se de um crime de dano.

Núcleo do tipo: Impedir ou dificultar.. Cuida-se de crime de múltipla ação.

Resultado: Aqui, trata-se de um crime material, pois o efeito lesivo concretiza-se com a exteriorização das ações destacadas no tipo. Consuma-se o delito com a prática de qualquer das ações incriminadas.

Sujeito ativo. Qualquer pessoa (física ou jurídica).

Sujeito passivo. A comunidade, de maneira difusa.

Objeto material. É regeneração natural de florestas e demais formas de vegetação.

b) Elemento subjetivo. Impedir ou dificultar, pressupõe determinadas finalidade do agente.

c) Elemento pessoal. Dolo genérico.

4.3.3 Poluição e outros crimes ambientais

Aos crimes da Seção III do Capítulo V, o legislador reservou oito artigos, em que são descritas as condutas delituosas praticadas contra aqueles que causem poluição, entre outros crimes ambientais. Os arts. 54, 55, 56, 60 e 61 tipificam as condutas delituosas. As penas dos arts. 54, § 1º, 55, 56, § 3º, e 60 não ultrapassam um ano de detenção. Aplicável, pois, o instituto da transação penal, previsto no art. 76 da Lei n. 9.099/95. Os arts. 54, caput e § 2º, 56 caput e 61 têm penas mínimas de um ano. Aplica-se, assim, o instituto da suspensão do processo, previsto no art. 89 da Lei 9.099/95. O art. 58 arrola as causas de aumento de pena aplicáveis aos crimes em questão.

Essa lei revogou o art. 15 da Lei n. 6.938/81, alterada pela Lei 7.804/89, que dispunha sobre a política nacional do meio ambiente. Contudo, as contravenções penais previstas nos arts. 38 e 42 não foram revogados pela nova lei.

4.3.3.1 Art. 54, III

III - Causar poluição hídrica que torne necessária a interrupção do abastecimento público de água de uma comunidade;

4.3.3.1.1Casos jurisprudenciais.

a) POLUIÇÃO – Poluição de água potável – Configuração – Ausência de prova da potabilidade e utilização da água pela população local.

Falta elemento objetivo integrante do tipo. Para a configuração do crime do art. 271 do CP, necessária se faz a prova da potabilidade da água e sua utilização, antes de poluída ou corrompida. Sem provas da existência dos elementos objetivos integrantes do tipo, impõe-se decisão absolutória. (TRF – 3ª Reg., 2ª T., Acrim 94.03.73128-1-SP, rela. Juíza Sylvia Steiner, DJU, 13.12.1995).

b) CRIME CONTRA O MEIO AMBIENTE – Poluição do Rio Parnaíba – Violação ao art. 15 da Lei 6.938/81, com a redação dada pela Lei 7.804/89.

Comete o crime previsto no art. 15 da Lei 6938, de 31.08.1981, alterado pela Lei 7804, de 18.07.1989, o proprietário de curtume que lança no rio matérias orgânicas putrefactas, matérias não biodegradáveis, substâncias tóxicas, poluindo-o, criando, assim, uma situação de perigo para a vida humana, animal e vegetal (TRF – 1ª Reg., 3ª T., Ap. 95.01.11586-0-PI, j. 25-3-1996, rel. Juiz Tourinho Neto, DJU, 18 abr. 1996, RT, 729:651).

4.3.3.1.2 Comentários.

a) Elementos descritivos objetivos :

Bem jurídico tutelado. É a preservação do patrimônio natural e a qualidade de vida do ser humano, da fauna, da flora, do solo, do ar e das águas. Aqui, trata-se de um crime de dano, pois o efeito lesivo concretiza-se com a exteriorização da ação destacada no tipo.

Núcleo do tipo: causar poluição hídrica.

Resultado: Consuma-se o delito com a prática da ação incriminada. É crime material, portanto.

Sujeito ativo. Qualquer pessoa (física ou jurídica).

Sujeito passivo. A comunidade, de maneira difusa.

Objeto material. É a saúde humana e as águas.

c) Elemento normativo. De índole estimativa, pois deve tornar necessária a interrupção do abastecimento público de água de uma comunidade.

d) Elemento pessoal. Dolo genérico.

4.3.3.2 Art. 56, § 2º

"Produzir, processar, embalar, importar, exportar, comercializar, fornecer, transportar, armazenar, guardar, ter em depósito ou usar produto ou substância tóxica, perigosa ou nociva à saúde humana ou ao meio ambiente, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou nos seus regulamentos:

(...)

§ 2º Se o produto ou a substância for nuclear ou radioativa, a pena é aumentada de um sexto a um terço."

4.3.3.2.1 Casos jurisprudenciais

a) POLUIÇÃO – Abandono de substância radioativa – Césio – 137 – Negligência da clínica – Crime caracterizado.

É responsabilizado penalmente, a título de crime culposo, o profissional (médico e físico hospitalar) que, atuando no ramo da medicina nuclear, e ciente dos riscos dos equipamentos operados nessa atividade (clínica de radioterapia) resolve deixar equipamento radiológico em prédio abandonado, sem comunicação aos órgãos competentes, com isso ensejando a sua manipulação por pessoas do povo (comerciantes de ferro-velho) e sua contaminação por material radioativo (Césio-137), causando-lhes graves danos – mortes e lesões coporais (TRF – 1ª Reg., 3 T., Acrim 93.01.03115-9-GO, rel. Juiz Olindo Menezes).

4.3.3.2.2 Comentários.

a) Elementos descritivos objetivos :

Bem jurídico tutelado. É a preservação do patrimônio natural. É um crime de dano.

Núcleo do tipo: São doze os verbos núcleos do tipo em análise, quais sejam, produzir, processar, embalar, importar, exportar, comercializar, fornecer, transportar, armazenar, guardar, ter em depósito e usar. Cuida-se de crime de múltipla ação (várias condutas); não importa se o agente praticou uma única ou várias condutas ao mesmo tempo descritas no tipo penal: responderá por um só delito. É crime comissivo.

Resultado: Aqui, trata-se de um crime material.

Sujeito ativo. Qualquer pessoa (física ou jurídica).

Sujeito passivo. A comunidade, de maneira difusa.

Objeto material. É a saúde humana e o meio ambiente. Inclui-se também aqui o meio ambiente do trabalho, de modo a proteger todos os funcionários que trabalham em contato com substâncias tóxicas.

b). Elemento normativo. Com referência à ilicitude: "em desacordo com as exigências estabelecidas em leis e nos seus regulamentos".

Também traz elemento normativo de índole jurídica, ao dizer: "perigosa ou nociva à saúde humana ou ao meio ambiente".

c) Elemento pessoal. Dolo genérico. Também admite-se aqui a modalidade culposa.

4.3.4. Crimes contra o ordenamento urbano e o patrimônio cultural.

Na seção IV do Capítulo V, o legislador reservou quatro artigos para os crimes contra o ordenamento urbano (arts. 64 e 65) e o patrimônio cultural (arts. 62 e 63), tipificando condutas delituosas praticadas contra bem público. Todos os artigos tipificam condutas delituosas (arts. 62, 63, 64 e 65). As penas dos arts. 64 e 65 não ultrapassam um ano de detenção, aplicando-se o instituto da transaçãopenal, previsto no art. 76 da Lei 9.099/95. Já os arts. 62 e 63 têm penas mínimas de um ano de reclusão, aplicando-se o instituto da suspensão do processo, previsto no art. 89 da Lei 9.099/95.

4.3.4.1 Art. 62

"Destruir, inutilizar ou deteriorar:

I – bem especialmente protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial;

II – arquivo, registro, museu, biblioteca, pinacoteca, instalação científica ou similar protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial:

Pena – reclusão, de um a três anos, e multa.

Parágrafo único. Se o crime for culposo, a pena é de seis meses a um ano de detenção, sem prejuízo da multa."

4.3.4.1.1 Casos jurisprudenciais

a) Patrimônio Cultura – Crime de dano – Perícia indispensável – Não caracterizado o crime de dano.

Patrimônio da União. Sítio arqueológico. Art. 20, X, e Lei n. 3.924/61. Inexistência de prova das pinturas rupestres e de seu valor histórico ou arqueológico. Provimento da apelação. Conquanto os sítios arqueológicos constituam patrimônio da União Federal, conforme art. 20, X, da CF, e sua destruição configure o delito do art. 163 do CP, indispensável a comprovação de seu valor histórico e arqueológico. Não comprovada por perícia técnica, extremamente falha, a existência de pinturas rupestres, e ainda o seu valor arqueológico, pelo que sua destruição não caracteriza o crime de dano contra o patrimônio da União Federal (TRF – 1ª Reg., 3ª T., Acrim 94.01.03974-7-MG, rel. Juiz Osmar Tognolo, DJU, 10.08.1995).

b) Patrimônio cultural – Crime de dano – Ausência de dolo – Impunível a conduta culposa – Absolvição decretada.

Lei n. 3.924/61. Crime contra o patrimônio nacional. Art. 163, do CP, ausência de dolo. Impunível a conduta culposa. Absolvição pelo inc. VI, do art. 386, do CPP. Incabível o reconhecimento de dolo eventual quando o agente desconhecia o bem jurídico protegido, condição que afasta a realização do tipo penal denunciado. O delito de dano exige a consciência e a vontade de destruir, restando impunível a conduta culposa. A prova judicializada não contém elementos para demonstrar que o acusado conhecia a existência de sítio arqueológico no local das obras sob sua responsabilidade. A inexistência de marcos visuais conforta as alegações do réu. Solução absolutória que se impõe ( TRF – 4ª Reg., 1ª S., Acrim 95.04.17622-4-RS, rela. Juíza Tania Escobar, DJU, 5.06.1996).

c) Crime contra o patrimônio histórico – Tombamento provisório e definitivo – Efeitos penais.

Tendo sido previamente notificados, o proprietário, o Prefeito e a autoridade policial, pelo CONDEPHAAT, do seu interesse em preservar o imóvel, e, estando estes cientes da existência de um processo para o seu tombamento, a derrubada do prédio, a alteração de local já tombado, representa crime, pelo menos em tese.

A inexistência de dolo, a responsabilidade do infrator (ou de terceiros), o exame de eventuais justificativas da culpa ou da presença de dirimentes, tudo isso demanda um aprofundado exame do mérito, impossível de ser apreciado nos estreitos âmbitos do habeas corpus.

Se para todos os efeitos, o tombamento provisório é equiparado ao definitivo, parece que também o será para efeitos penais. O contrário, aliás, seria incentivar, muitas vezes, o proprietário de coisa durante o processo de tombamento a danificá-la parcialmente, tirando, por exemplo, seu valor histórico, sem grave dado para o valor material a fim de furtá-lo ao tombamento. (JTACrimSP, 91:162).

4.3.4.1.2 Comentários.

a). Elementos descritivos objetivos :

Bem jurídico tutelado. É a preservação do patrimônio cultural. Trata-se de um crime de dano, pois o efeito lesivo concretiza-se com a exteriorização das ações destacadas no tipo – destruir, inutilizar ou deteriorar.

Núcleo do tipo: Destruir, inutilizar ou deteriorar. Cuida-se de crime de múltipla ação (várias condutas); não importa se o agente praticou uma única ou várias condutas ao mesmo tempo descritas no tipo penal: responderá por um só delito.

Resultado: É delito instantâneo, que se consuma com a prática de qualquer das ações incriminadas. É crime material.

Sujeito ativo. Qualquer pessoa (física ou jurídica).

Sujeito passivo. A comunidade, de maneira difusa.

Objeto material. Pelo inciso I, é qualquer bem que tenha proteção por seu valor cultural através de lei específica, ato administrativo, onde estão incluídos o tombamento provisório e definitivo, além de outras formas de acautelamento, ou decisão judicial. Pelo inciso II, é arquivos, o registro, o museu, a biblioteca, a pinacoteca, a instalação científica ou similares, desde que seja protegido por lei, por ato administrativo, ou decisão judicial.

b) Elemento normativo. De índole jurídica: bem especialmente protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial.

c) Elemento pessoal. O crime do art. 62 e incisos é punido a título de dolo. Admite-se também a forma culposa, pelo parágrafo único do art. 62, quando a destruição, inutilização ou deterioração do bem resultar de negligência, imprudência ou imperícia do agente.

4.3.5 Crimes contra a administração ambiental

Na seção V do Capítulo V, o legislador reservou quatro artigos para os crimes contra a administração ambiental, tipificando condutas delituosas praticadas por funcionário público e por particular. Todos os quatro artigos tipificam crimes e estipulam sanções penais. As penas dos arts 66, 67, 68 e 69 têm penas mínimas de um ano de reclusão e detenção. Portanto, nesta Seção, aplica-se somente o instituto da suspensão do processo, previsto no art. 89 da Lei n. 9.099/95, com exceção do parágrafo único do art. 67 e do parágrafo único do art. 68 da Lei ambiental, cujas penas são de três meses a um ano, sem prejuízo da multa, se o crime for de natureza culposa. Nesses casos, aplica-se o instituto da transação penal, previsto no art. 76 da Lei n. 9.099/95.

Os dois primeiros artigos cuidam de crimes praticados por funcionário público, e os dois últimos, por particulares contra a administração pública ambiental. O legislador resolveu punir mais severamente o funcionário público do que o particular, agravando a pena daquele.

Antes do advento desta lei, o funcionário público e o particular respondiam pelas infrações penais previstas no Código Penal, cujos delitos encontram correspondência nos arts. 328 e s. do Código Penal (tratam dos crimes praticados por particular contra a administração em geral) e nos arts. 312 e s. do mosmo Codex (cuidam dos crimes praticados por funcionário público contra a dministração em geral). Com a criação da nova Lei ambiental, aplica-se o Código Penal subsidiariamente.

4.3.5.1 Art. 68.

"Deixar, aquele que tiver o dever legal ou contratual de fazê-lo, de cumprir obrigação de relevante interesse ambiental.

Pena – detenção, de um a três anos, e multa."

4.3.5.1.1Casos jurisprudenciais

a) CRIME ECOLÓGICO.

Resulta caracterizado o crime ecológico definido no art. 15 da Lei 6938/81, com a redação emprestada pela Lei 7804/89, o fato de depositar lixo doméstico na cidade a céu aberto, em local declarado por lei local área especial de preservação manancial. O crime ecológico é crime de perigo, funcionando o dano efetivo, representado pela lesão corporal grave ou pelo dano irresistível à flora ou ao meio ambiente, como causa de especial aumento de pena.

O recolhimento diário do lixo da cidade em local proibido, alimentando o mesmo agente poluidor, caracteriza um crime permanente e não concurso material de delitos ou a continuidade delitiva.

Extinto o valor referencial da multa, prevista no art. 15 da Lei 6.938/81, a pena pecuniária deve ser estabelecida com apoio na regra geral prevista no art. 49 do CP.

(TJRS – PC 694.122.680 – 4ª Cam. Crim. – j. 26.11.1996 – rel Des. Vladmir Giacomuzzi).

b) CRIME ECOLÓGICO.

Merece censura penal, de acordo com o prescrito no art. 15 da Lei n. 6.938/81, o administrador municipal que, recalcitrante às determinações dos órgãos competentes deorientação e fiscalização do meio ambiente se recusa a fazer cessar a atividade poluidora executada pelo setor da limpeza e consistente em depositar o lixo sólido da cidade em local não-licenciado e de preservação permanente.(TJRS – 4ª Câm. ProcCrim. 693153827. Revista de Jurisprudência do TJRGS 193/456)

c) PREFEITO. Poluição causada por depósito de lixo.

Não resultando demonstrado que o chorume contaminou significativamente o lençol freático ou outro manancial d’ água superficial, não se configura o delito tipificado no art. 15 da Lei 6938/81, o que só ocorre quando a poluição é em níveis tais, a ponto de poder causar danos à saúde humana, provocar a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora, conforme os termos da nova lei ambiental, que buscou esclarecer aspectos controvertidos do diploma antigo. Ação improcedente, com a absolvição dos acusados. (Revista de jurisprudência do TJRGS 193/878).

4.3.5.1.2 Comentários.

a). Elementos descritivos objetivos :

Bem jurídico tutelado. É a administração ambiental.

Núcleo do tipo: Deixar de cumprir. Conduta, portanto, comissiva por omissão.

Resultado: Aqui, trata-se de mera conduta.

Sujeito ativo. Qualquer pessoa que tiver o dever legal ou contratual de cumprir a obrigação. Pode ser funcionário público ou particular.

Sujeito passivo. A comunidade, de maneira difusa.

Objeto material. Não há.

Consumação: Consuma-se o delito com a omissão, quando o agente tinha a obrigação de agir por dever legal ou contratual.

b) Elemento normativo. Com referência à ilicitude: de cumprir obrigação de relevante interesse ambiental.

c) Elemento pessoal. Dolo genérico. Também se admite a forma culposa.

Nos casos jurisprudenciais supra citados, o dever legal dos prefeitos municipais de cumprir obrigação de relevante interesse ambiental está relacionado à necessidade de impedir que o lixo das cidades sejam depositados em lugares impróprios.

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Sobre o autor
Rodrigo Alves da Silva

mestre e doutor em Direito. É pesquisador e parecerista da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo. Advogado,regularmente inscrito na OAB/SP (204.358), docente da Escola Superior de Advocacia (ESA) e Professor Universitário.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Rodrigo Alves. A responsabilidade penal por danos ao meio ambiente. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 61, 1 jan. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3630. Acesso em: 26 abr. 2024.

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