De acordo com uma matéria publicada na Revista Consultor Jurídico[i], em um evento realizado no Tribunal de Justiça de São Paulo, no dia 06 de fevereiro último, o Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Ricardo Lewandowiski, criticou duramente o que ele chamou de “política do encarceramento”. Suas críticas foram ratificadas pelo Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Desembargador José Renato Nalini, pelo Desembargador Henrique Nelson Calandra, pelo presidente do Tribunal Regional Federal da 3a Região, Fábio Prieto e pelo presidente da Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo, Marcos da Costa. A única voz dissonante foi a do Governador do Estado, Geraldo Alckmin, que afirmou que investigar e prender “é essencial para diminuir a atividade delituosa e acabar com a impunidade”.
Parte das críticas se refere aos presos provisórios, em sua maioria resultantes de prisões em flagrante que, de acordo com dados do Ministério da Justiça, representam cerca de 40% do total de encarcerados no Brasil. Hoje este preso passa de três a quatro meses preso até a primeira audiência, onde, na maioria dos casos, é colocado em liberdade. A cerimônia lançou um projeto, inicialmente implantado em duas delegacias da capital paulista, onde os presos em flagrante serão levados, em até vinte e quatro horas, a uma audiência de custódia, onde o magistrado avaliará e decidirá sobre a necessidade da prisão.
Achamos uma atitude louvável e não vemos objetivo para a manutenção de prisões desnecessárias, porém, as críticas apresentadas não se restringiram a esta situação.
Tem se tornado voz corrente no Brasil o excesso de encarceramentos e, por vezes, são apresentadas estatísticas que em nada justificam esta afirmativa. Normalmente as críticas ao encarceramento se apoiam no fato do crescimento exponencial da população carcerária brasileira. Estudos indicam que nos últimos vinte anos a população carcerária aumentou mais de 400%[ii], e que hoje a população carcerária brasileira é a terceira maior do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos e da China[iii].
Estes dados, por si sós, não significam muita coisa, em especial não significam que no Brasil se prende muito. Indicam que a população carcerária aumentou, que estamos prendendo mais. A questão é: por que?
Simples, prendemos mais porque os crimes estão crescendo. Toda a população sabe disso. Esta é a grita popular, estamos cada vez mais inseguros, o crime está aumentando. Mês a mês são divulgadas estatísticas criminais e, salvo algumas variações sazonais, os crimes estão em patamares elevados. Embora alguns indicadores apresentem varrições a melhor, ou seja, comparados com o mesmo mês no ano anterior apresentem decréscimo no número de crimes praticados, os números absolutos são sempre elevados. No Brasil se comete muito crime e se pune muito pouco, esta é a realidade.
Sempre achei que esta era a visão geral da sociedade, mas ao ver algumas afirmações de iminentes juristas e cientistas sociais fiquei em dúvida, será que a Suécia é aqui?
De acordo com a Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo[iv], no ano de 2014 foram registrados 1.411.984 Boletins de Ocorrência de crimes. Se considerados apenas os crimes de “Homicídio Doloso”, “Furto”, “Roubo” e “Furto e Roubo de Veículo” os números são 1.051.455.
Em contrapartida, no mesmo ano de 2014, foram registrados 106.495 prisões em flagrante delito, ou seja, cerca de 7,55% dos crimes cometidos culminam com a prisão em flagrante. Daí pergunto, prende-se muito no nosso país?
Por vezes amigos me perguntam em conversas informais por que temos tantos crimes no Brasil. Simples, se você decidir se dedicar a prática delituosa, a chance de ser pego é de oito em cada cem. Disse de ser pego, não de ser condenado e muito menos de que esta condenação se dê em uma prisão, o pouco habitual regime fechado.
Não queremos aqui reduzir toda a problemática criminal ao encarceramento. Sabe-se que a melhora dos indicadores criminais, a construção de uma sociedade mais segura exige vontade governamental, tempo, trabalho e dedicação. Há a necessidade de se desenvolver políticas públicas de largo espectro e, mesmo com muito trabalho e esforço, nunca haverá o “crime zero”.
Mas não podemos negar que a prisão e sua subsequente condenação são fortes indicadores da força do Estado em relação ao crime. Quaisquer pessoas, criminosos inclusive, fazem uma análise de risco em suas atividades. Ainda que de forma muito rústica, um infrator calcula os ganhos de uma ação delituosa e as possíveis perdas. Em relação às perdas, excetuando-se a perda da vida, a consequente preocupação é em relação a perda da liberdade. E neste quesito, pouco o desestimulamos.
Por tudo isso, acredito que a polícia prende bem e, infelizmente, consegue prender pouco.
[i] Revista Consultor Jurídico, Presidente do STF ataca "política do encarceramento" no Brasil, em http://www.conjur.com.br/2015-fev-07/presidente-stf-ataca-politica-encarceramento-brasil - consultado em 10/02/2015.
[ii] Agência Brasil, População carcerária do Brasil aumentou mais de 400% em vinte anos, em http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2014-03/populacao-carceraria-aumentou-mais-de-400-nos-ultimos-20-anos-no-brasil - consultado em 06/03/2015.
[iii] Conselho Nacional de Justiça, CNJ divulga dados sobre nova população carcerária brasileira, em http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/28746-cnj-divulga-dados-sobre-nova-populacao-carceraria-brasileira -consultado em 06/03/2015.
[iv] Secretaria de Segurança Pública, CAP, Estatísticas de Criminalidade do Estado de São Paulo, http://www.ssp.sp.gov.br/novaestatistica/Pesquisa.aspx - consultado em 06/03/2015.