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Limites do monitoramento de empregados

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O monitoramento do trabalhador por meio de e-mails, gravação de ligações telefônicas, audiovisual, em regra, se não houver justificativa plausível, implicará em violação de direitos da personalidade do trabalhador.

As novas tecnologias desafiam constantemente o Direito e, não menos, os conceitos de gestão. O monitoramento de trabalhadores não é novidade, mas o uso de ferramentas tecnológicas para essa finalidade tem avançado alguns sinais. Recentemente, a revista The Economist noticiou a criação de uma pulseira, por uma empresa do Vale do Silício, que controla o progresso de metas de forma compartilhada com colegas, com o objetivo o aumentar a produtividade.

Está previsto na Constituição Federal que cabe a empresa zelar por um ambiente de trabalho sadio e ecologicamente equilibrado (arts. 200 e 225), o que inclui as boas práticas empresariais quanto ao trato dos direitos de personalidade e direitos fundamentais do ser humano. A Justiça do Trabalho tem aceito de forma restritiva o monitoramento do empregado. O controle da prestação de trabalho realizado de forma invasiva, sem fundamento claro, sem regras prévias e potencialmente discriminatório, pode acarretar responsabilidade às empresas (art. 932, III, do Código Civil, mas também, pela sua negligência em não ter fiscalizado a conduta de seu empregado), bem como o comprometimento da credibilidade institucional de uma marca no mercado, perante seu público e investidores.

O empregador exerce com legitimidade os poderes organizacional, disciplinar e de fiscalização, entretanto, trata-se de um tripé de direitos relativizado por princípios constitucionais que protegem intimidade, integridade física e psíquica, vida privada, honra, imagem, liberdade e igualdade. As faculdades empresariais inerentes à liberdade de iniciativa, como o poder organizacional, disciplinar e de fiscalização do empregador, podem colidir com a salvaguarda de direitos de personalidade do trabalhador, se não houver uma moderação no seu exercício. O monitoramento do trabalhador por meio de e-mails, gravação de ligações telefônicas, audiovisual, em regra, se não houver justificativa plausível, implicará em violação de direitos da personalidade do trabalhador, tais como imagem, voz, intimidade e privacidade, liberdade de expressão e crítica.

Analogamente, admite-se, por uma jurisprudência dominante, gravações sonoras no modelo de negócios de telemarketing. Trata-se de um permissivo excepcional sedimentado na necessidade da atividade empresarial, interpretando-se, nesta hipótese, ser a gravação medida essencial para se registrar as informações decorrentes do relacionamento da empresa e clientes. 

Ressalta-se, entretanto, que o banco de dados formado por essas gravações não deve ser acessado aleatoriamente pela empresa. O acesso às gravações deve ser realizado mediante a solicitação do respectivo cliente, em caso de questionamento da prestação de serviços, e/ou mediante ordem judicial.

Outras espécies de monitoramento que podem ser citadas de forma paradigmática para fins de análise daquele proposto pela nova tecnologia inserta na pulseira de medição de produtividade (uma espécie dewearable gadget imposto pelo empregador) são a audiovisual para a segurança do trabalhador e patrimônio da empresa. No monitoramento audiovisual, por exemplo, entende-se desnecessária a habilitação de voz nas câmaras de vídeo e abusivo o controle das conversas dos trabalhadores por câmaras, muito embora a captura de imagens justifique-se em grande parte dos casos como razoável. A necessidade, razoabilidade e proporcionalidade são elementos que devem estar presentes no monitoramento dito lícito.

Em todas as espécies de monitoramento, há que se levar em consideração que na relação contratual entre empregado e empregador, importa observar um elemento essencial: a confiança mútua. A presunção da fidúcia pelo empregador é intrínseca à relação contratual na forma dos princípios da boa-fé e da autonomia da vontade.

O monitoramento provoca tensão, é uma cobrança continua que prejudica e pode abalar o bem estar psíquico, físico e moral do trabalhador, e, por conseguinte, seu desempenho profissional e humano.

Os direitos da personalidade, assim como os direitos fundamentais podem ser interpretados como diretrizes para a melhor racionalização do poder empregatício. Essas limitações não inviabilizam ou restringem o bom funcionamento da livre iniciativa, mas sim, atendem a função social da propriedade, compatibilizando seu exercício com o valor social do trabalho.

Desta forma, a criação de uma pulseira para medição de produtividade e outros índices através de alta inovação tecnológica deve ser avaliada com cautela pelas empresas interessadas, em especial à luz da real necessidade e razoabilidade do seu uso, bem como da confidencialidade dos dados que tal aparato capte e transforme em relatório e inadvertidamente crie classificação de trabalhadores de forma discriminatória.

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Sobre os autores
Rafael de Mello e Silva de Oliveira

Advogado Trabalhista do escritório Crivelli Advogados Associados. Graduado em Direito pela Universidade Mackenzie e Especialista em Direito e Processo do Trabalho pela mesma Instituição de Ensino. Especialista em Direito do Trabalho e Sindical Empresarial pela Fundação Getulio Vargas.

Ivana Có Galdino Crivelli

Advogada do escritório Có Crivelli Advogados.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA, Rafael Mello Silva ; CRIVELLI, Ivana Có Galdino. Limites do monitoramento de empregados. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4276, 17 mar. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/37272. Acesso em: 19 abr. 2024.

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