Da perda de mandato parlamentar por condenação criminal

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09/04/2015 às 06:01
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CONCLUSÃO

Este trabalho procurou analisar, a rigor, o efeito da perda de mandato parlamentar em razão de condenação criminal transitada em julgado. Diante do exposto, verifica-se que a polêmica sobre a perda do mandato parlamentar se instaurou não por lacuna constitucional, mas devido ao excesso de regramentos. Todavia, este aparente conflito torna-se solucionável pelo que a doutrina denomina “critério hermenêutico da regra-exceção”. Desta forma, conclui-se que ao Supremo Tribunal Federal, na hipótese de perda de mandato por condenação criminal irrecorrível, compete tão somente comunicar, à Casa Legislativa a que pertença o parlamentar condenado, que ocorreu o trânsito em julgado da decisão, para que esta proceda conforme as normas constitucionais. 

Uma controvérsia não deve se sujeitar ao exame do Poder Judiciário quando for possível evidenciar, com embasamento Constitucional, que o assunto fora conferido a um dos outros Poderes da União, haja vista o princípio da Separação dos Poderes consubstanciado no art. 2° da Carta Magna.Noutro norte, como citado no subitem “3.1 Foro por prerrogativa de função”, no Brasil visivelmente se percebe que há uma problemática no que tange à nomeação da alta cúpula do Poder Judiciário, bastando ver que potenciais acusados são os responsáveis pela nomeação dos seus julgadores. Desta maneira, creio que a condenação criminal de parlamentar condenado por sentença transitada em julgado configura condição necessária, mas não suficiente para a perda do seu mandato, a qual depende da instauração do competente processo pela Casa, nos termos do art. 55, § 2º, da Constituição.

Assim sendo, verifica-se que o questionamento do presente trabalho foi respondido. Contudo, não se tem a pretensão de encerrar o debate sobre o tema. Consoante os ditames constitucionais, a doutrina majoritária, bem como a jurisprudência orquestrada pelo Supremo Tribunal Federal, compreende-se que a perda do mandato parlamentar decorrente de condenação transitada em julgado não é automática, isto é, não configura efeito comum da condenação, sendo imperioso, ainda, que ocorra deliberação na respectiva Casa Legislativa para que possa haver a decretação da perda do mandato de um parlamentar eventualmente condenado, aplicando-se, desta forma, a especialidade da norma específica contida no art. 55, §2º, da Constituição Federal de 1988, falecendo ao Poder Judiciário a análise do mérito sobre esta questão.


NOTAS

[1] A doutrina costuma classificar os regimes democráticos em três espécies: a) democracia direta, em que o povo exerce por si o poder, sem representação; b) democracia representativa, na qual o povo, soberano, elege seus representantes, outorgando-lhes poderes, para que em nome deles, administrem seus interesses políticos; e c) democracia semidireta, um sistema híbrido, isto é, uma democracia representativa com peculiaridades da democracia direta.

[2] Conforme decidiu o Tribunal Superior Eleitoral, “as condições de elegibilidade e as causas de inelegibilidade devem ser aferidas ao tempo da eleição. Precedentes: Acórdãos nS518.847 e 647” (TSE - AgRegAI n. 4.598/PI - Rei. Min. Fernando Neves, Diário da Justiça,Seção 1,13-8-2004, p. 401).

[3] A Constituição Federal, no entanto, reservou ao brasileiro nato – aquele que possui nacionalidade originária – o exercício de alguns cargos elencados em seu art. 12, § 3º.

[4] De acordo com o art. 14, § 3º, VI, a faixa etária do cidadão é crucial para determinar a que cargo eletivo ele poderá vir a concorrer, caso queira. Para concorrer ao mandato de Presidente, Vice-Presidente ou Senador, a exigência é que o candidato tenha no mínimo 35 anos de idade; para que concorra ao mandato de Governador e Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal, a exigência mínima é de trinta anos de idade; Já para os mandatos de Deputado Federal, Deputado Estadual e Distrital, Prefeito, Vice-Prefeito e os Juízes de Paz,aidade mínima é de vinte e um anos de idade; Por fim, para se candidatar ao cargo de Vereador, o candidato terá que ter dezoito anos de idade completos.

[5] Leciona José Afonso da Silva que “os estrangeiros não adquirem direitos políticos, só atribuídos a brasileiros natos e naturalizados. Portanto, não são alistáveis eleitores nem, por consequência, podem votar ou ser votados (art. 14, § 2.j. Por isso também é que não podem ser membros de partidos políticos, que é uma prerrogativa da cidadania" (Curso de direito constitucional positivo, 17. ed., p. 340-341).

[6] Presentemente, por força da Emenda Constitucional n. 76/2013, alterou-se a redação do art. 55 do texto constitucional e aboliu-se a votação secreta nos casos de perda de mandato de Deputado Federal ou Senador da República, sendo extensível e obrigatória, da mesma forma, a votação aberta nas hipóteses de cassação dos demais parlamentares estaduais, distritais e municipais.

[7] No mesmo sentido: “Da suspensão de direitos políticos - efeito da condenação criminal transitada em julgado - ressalvada a hipótese excepcional do art. 55, § 2a, da Constituição – resulta por si mesma a perda do mandato eletivo ou do cargo do agente político’’ (STF - Ia T. - Rextr. n- 418.876-7/MT - Rei. Min. Sepúlveda Pertence, Diário da Justiça, 4 jun. 2004 - Ementário n“ 2154-4).

[8] Neste sentido: “a suspensão dos direitos políticos, prevista no inciso III, do art. 15 da Constituição Federal é efeito automático da condenação criminal transitada em julgado” (TSE - Pleno - Agravo Regimento em Medida Cautelar 193-26/MG – Rel. Min. Arnaldo Versiani, decisão: 12-5-2011); “Ementa: Registro de candidatura. Inelegibilidade. Art 15, inciso III, da Constituição. Término do cumprimento da pena posterior ao pedido de registro e anterior as eleições. É inelegível o candidato que à época do pedido de sua candidatura encontrava-se com seus direitos políticos suspensos, não importando que a causa da inelegibilidade tenha cessado antes da realização das eleições.” (TSE - Pleno - Recurso especial eleitoral n° 13.324/ BA-Acórdão n° 13.324 (11-3-97) - Min. Ilmar Galvão).


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Sobre o autor
Victor Rocha

Advogado. Pós-graduando em Ciências Criminais (Estácio de Sá) e em Direito Público (ESBAM). Bacharel em Direito pela Universidade do Estado do Amazonas. Cofundador da ONG Democratizando nas Escolas. <br><br>

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