O artigo 17 da Lei de Crimes do Colarinho Branco

22/04/2015 às 11:36
Leia nesta página:

O artigo traz a discussão o artigo 17 da Lei 7.492/86.

Prevê o artigo 17 da Lei 7.492/86, a chamada lei de crimes do colarinho branco:

Tomar ou receber, qualquer das pessoas mencionadas no art. 25 desta lei, direta ou indiretamente, empréstimo ou adiantamento, ou deferi-lo a controlador, a administrador, a membro de conselho estatutário, aos respectivos cônjuges, aos ascendentes ou descendentes, a parentes na linha colateral até o 2º grau, consangüíneos ou afins, ou a sociedade cujo controle seja por ela exercido, direta ou indiretamente, ou por qualquer dessas pessoas:

Pena - Reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa.

Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem:

I - em nome próprio, como controlador ou na condição de administrador da sociedade, conceder ou receber adiantamento de honorários, remuneração, salário ou qualquer outro pagamento, nas condições referidas neste artigo;

II - de forma disfarçada, promover a distribuição ou receber lucros de instituição financeira.

A Lei 4.595, em seu artigo 32, I, proíbe as instituições financeiras conceder empréstimos ou adiantamentos a seus diretores e membros dos conselhos consultivo e administrativo, fiscais e semelhantes, bem como os respectivos cônjuges.

O  controlador e os administradores da instituição são  assim considerados os diretores e gerentes, o interventor, o liquidante, o sindico. Aliás, o Administrador da Companhia, do que se lê do artigo 153 da Lei das S.A  “ deve empregar, no exercício de suas funções, o cuidado e a diligência que todo homem ativo e probo costuma empregar na administração dos seus próprios negócios.”

O crime é elevado à categoria de delito, punido com a pena de reclusão de um a quatro anos(artigo 34, § 1º, Lei 4.595). Para os casos em que a concessão do empréstimo é proibida,  mas não constitui crime, estão previstas sanções pecuniárias(multa igual ao dobro do valor do empréstimo), de natureza administrativa(artigo 43).

O Código Penal de 1969(artigo 191) determinava que era crime: “autorizar o responsável por instituição financeira a concessão de empréstimo a diretor, membro do conselho consultivo ou administrativo, fiscal ou semelhante, ou ao respectivo cônjuge”. A pena era de reclusão de um a quatro anos, além do pagamento de dez a cinquenta dias-multa.

Objetiva o artigo 17 da Lei 7.492/86 a tutela jurídica do patrimônio da instituição financeira e a probidade administrativa de seus dirigentes, que devem atuar no benefício da sociedade e não se servindo dela.

O crime é de perigo presumido, não se exigindo a superveniência de qualquer resultado de dano ou prejuízo.

O crime é próprio, pois os sujeitos ativos serão os responsáveis pela instituição financeira, diretor, superintendente ou gerente que tenham poderes para conceder o empréstimo. Por sua vez, o beneficiário do empréstimo não pratica crime mesmo quando contribuir para a ação delituosa solicitando o empréstimo ou induzindo os responsáveis a concedê-lo.

A vítima é a instituição financeira que concede o empréstimo.

O tipo objetivo é conceder empréstimo. Ora, como explicou Heleno Cláudio Fragoso(Lições de direito penal, artigos 121 a 212, 7ª edição, pág. 467), conceder o empréstimo é autorizá-lo, fato que consuma o delito, independentemente do recebimento efetivo pelo beneficiário. Ora, empréstimo, como bem lembraram Paulo José da Costa Jr. e outros(Crimes do colarinho branco, 2000, pág. 117) pressupõe da parte do devedor, vontade efetiva de restituir. Se tal vontade inexistir, se o empréstimo foi pretexto para deitar as mãos  sobre bens da sociedade, o diretor não responde pelo delito em discussão, mas pelo de apropriação agravada.

É certo que o empréstimo poderá ser concedido em condições vantajosas para a sociedade, que sejam pactuados juros em taxas não inferiores ao do mercado; que sejam pactuados juros em taxas não inferiores às do mercado; ou mesmo que a operação não venha a privar a sociedade de meios necessários para outros investimentos.

É punível somente o empréstimo que o diretor estipule com a sociedade por ele administrada. A esse respeito, ensinou Paulo José da Costa Jr.(Comentários ao código penal, 5ª edição, 1997, pág. 585-5): “Isto se verifica quando o diretor contrata consigo mesmo, desempenhando os papéis contrapostos de representante legal e de terceiro contratante. O tipo legal, prevendo o fato do diretor que ‘toma empréstimo’, compreende apenas relações contratuais creditícias realizadas com sociedade a que ele pertença. Tal não significa que o diretor deva figurar, abertamente, como parte contratante. Toma empréstimo igualmente aquele que agir por meio de interposta pessoa. O essencial é que o diretor seja o real beneficiário do empréstimo. Não recaem no molde legal empréstimos que o diretor, exorbitando do objeto social, faça com que a sociedade conceda a outras pessoas a ele vizinhas, ou a sociedade a que está interessado. Em casos semelhantes, o diretor que se aproveitar do cargo, poderá ser responsável pelo uso de bens sociais em proveito de terceiros”.

Exige-se o dolo genérico, que consiste na vontade consciente e livre de realizar o que a lei impede.

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Necessário que haja consciência sobre a prática de tal delito, uma vez que, se não houver, estar-se-ia diante de um erro de proibição, ou erro sobre a ilicitude do fato, a teor do artigo 21 do Código Penal, o que afastaria a culpabilidade do agente.

Não se admite tentativa no crime em discussão.

Há ainda o entendimento de que as chamadas “pedaladas fiscais” do governo detectadas pelo Tribunal de Contas da União estariam capituladas no artigo 17 da Lei 7.492/86. Isso porque um Banco Público não pode emprestar dinheiro para o governo.

Para os que assim pensam o argumento é de que a lei veda adiantamentos a controlador, que foi o que teria acontecido. Tanto que a Caixa Econômica Federal pediu ao Tesouro Nacional pagamento de juros e o BNDS cobrou o tesouro pelo que lhe deve. Assim, nessa linha de pensar, os administradores da Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil e Banco Nacional do Desenvolvimento Social poderiam ter cometido esse delito. Mas há de se cogitar que a fiscalização do Banco Central teria falhado ao não detectar a manobra contábil proibida pela Lei de Responsabilidade Fiscal(artigo 36) e pela Lei do Colarinho Branco.  

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Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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