A publicidade no serviço público em face do art. 37, § 1º da Constituição Federal

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6. Publicidade: Limites, vedações e implicações

A Constituição Federal não proíbe a divulgação de atos, obras, serviços ou propagandas de órgãos públicos, ao contrario, ela determina que o agente público o faça por meio de amplo acesso social, não importando se este meio seja oficial do Estado, como o Diário Oficial, o que contrate, por meio licitatório, empresa privada para tal ato.

O que a Constituição não aceita é o excesso na propaganda de forma que possa promover o agente público.

A norma constitucional estabelece diversos princípios de observância à administração pública, tais como a legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade que enseja a transparência dos diversos atos administrativos, e por fim a eficiência. Porem, é por meio do princípio da publicidade que todos os órgãos republicanos, nas diversas esferas da federação, utilizam-se para a devida prestação de contas e eventuais controles populacionais, como ação civil pública e ação popular contidas na Constituição Federal.

Nesse entendimento, Maria Sylvia Zanella de Pietro entendi deve-se buscar a real intenção do agente público/politico em uso da publicidade:

[...] a rigor, qualquer violação aos princípios da legalidade, da razoabilidade, da moralidade, do interesse público, da eficiência, da motivação, da publicidade, da impessoalidade e de qualquer outro imposto à Administração Pública pode constituir ato de improbidade administrativa. No entanto, há de se perquirir a intenção do agente, para verificar se houve dolo ou culpa, pois, de outro modo, não ocorrerá o ilícito previsto na lei. (PIETRO, 2001, p. 687)

Em ano eleitoral é muito comum que potenciais candidatos ou já devidamente reconhecidos candidatos procurem divulgar suas glorias administrativas à sociedade. Quanto a publicação, em época de eleição, faz parte da transparência, deste que exista razoabilidade na publicidade. A jurisprudência entente que estas divulgações não caracterizam improbidade em face do §1º do art. 37 porque resta configurado lesão ao erário publico e promoção pessoal.

APELAÇÃO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - PREFEITO MUNICIPAL - PUBLICIDADE - PROMOÇÃOPESSOAL - LESIVIDADE AO ERÁRIO - AUSÊNCIA - RECURSO NÃO PROVIDO. A publicidade de atos, programas, obras e serviços dos órgãos públicos de conteúdo informativo e educativo, sem indicar promoção pessoal e lesividade ao erário, se revela infensa à improbidade. Recurso não provido

(Apelação Cível nº. 1.0525.08.150243-3/001, rel. Des. Kildare Carvalho, DJ 01/10/2009).

Caso a administração deseje promover a publicação de seus atos administrativos por meio do erário publico, será perfeitamente possível deste que respeitado o caráter educativo, informativo ou de orientação social do ato. É nesse sentido que jurisprudência do Tribunal de Justiça de Minas Gerais:

AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - CAMPANHAS PUBLICITÁRIAS - ART. 37, § 1º, DA CF. 1 - O art. 37, § 1º, da CF admite a "publicidade de atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos", desde que tenham "caráter educativo, informativo ou de orientação social", vedando, apenas, que se conste nomes, símbolos ou imagens que caracterizem a promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos. 2 - Não constitui ato de improbidade administrativa a aprovação de propagandas de ações e serviços implementados pelo Governo, sem conotação de autopromoção, podendo, em casos tais, ser utilizado os recursos públicos para custear a divulgação das realizações governamentais.

(TJMG, Apelação cível nº.: 1.0024.00.059064-6/001, Rel.: Silas Vieira, DJ: 05/04/2006)

AÇÃO CIVIL PÚBLICA - REPARAÇÃO DE DANOS AO ERÁRIO PÚBLICO - PREFEITO E VICE - PUBLICIDADE - PROMOÇÃO PESSOAL - NÃO CONFIGURAÇÃO - A promoção pessoal do agente político fica indemonstrada, se não suficientemente evidenciada na publicação impugnada, mormente se nesta prepondera matéria de cunho informativo, de interesse dos munícipes. O propósito de informar à comunidade as obras realizadas na administração municipal descaracteriza a figura da promoção pessoal.

(TJMG, Apelação cível nº. 1.0000.00.326496-7/000, Rel.: Des. Hyparco Immesi, DJ: 30/03/2004)

No mesmo sentido, é o entendimento do Tribunal de São Paulo, senão vejamos:

Ação Civil Pública. Improbidade administrativa. Publicidade pessoal custeada com dinheiro do erário municipal. Fotos do prefeito inseridas em reportagem comemorativa de aniversário da cidade, com referência a obras públicas realizadas. A promoção de realizações governamentais, não proibida, embora deva ser impessoal, contém, em si mesma, a promoção pessoal do administrador público. Por isso, o fato de o Administrador aparecer fotografado, com outras pessoas, no ato de inauguração da obra, não comporta, só por isso, tipificação de improbidade administrativa e a exigência de ressarcimento ao erário municipal. Ação improcedente. Condenação do "Estado" ou o Ministério Público no pagamento de honorários de advogado em verbas de sucumbência. Inadmissibilidade. Inaplicabilidade do art. 20 do CPC. A regra é a da isenção absoluta de ônus para as partes, nos termos do art. 18 da Lei 7347/85. Recurso provido em parte.

(TJSP,Apelação Cível nº.: 82.293.5/4-00, Rel.: Des. José Santana, DJ: 16/11/1999)

A publicidade dos atos administrativos deve moldar-se nos comandos constitucionais, sempre contendo o caráter educativo, informativo ou de orientação social. Havendo distorção ou indicação contraria na forma de publicidade, configurará benefício ou o proveito individual.

É este caráter educativo, informativo ou de orientação social que deve vincular os atos públicos, mediante uma análise de razoabilidade e interpretação em cada caso.

Analisando, em uma breve leitura do §1º do art. 37 da Constituição Federal, podemos pautar nosso entendimento que aquele preceito legal apenas quis vedar a promoção pessoal de autoridade ou agente publico, ou mesmo acharmos que a publicidade deve ser tão explicita que possa causa prejuízo ao erário publico.

Como comentado anteriormente neste trabalho, publicidade, moralidade e impessoalidade são princípios que se apresentam intimamente ligados, atuação recíproca, de modo que a inobservância de um acarreta a do outro8.

Desta forma, a vedação a promoção pessoal por meio da publicidade dos atos administrativos não se restringe apenas às autoridades administrativas e servidores públicos, mas comumente aos partidos a que pertencem9.

Também há conteúdos subliminares passiveis de identificação de partidos políticos, governantes ou agentes públicos, já caracteriza promoção pessoal. Em outros termos, existindo a possibilidade de reconhecimento ou identificação de partido, governantes ou agente publico, há promoção pessoal com o rompimento da lisura tutelado pelo constituinte originário.

É este o entendimento proferido pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

A inclusão de slogan na publicidade dos atos da administração pública, com conteúdo subliminar que o identifica com o partido político dos governantes, constitui propaganda pessoal ilícita, vedada no art. 37, § 1º, da CF" (Ap. 592131882, 9.6.93, 2ª CC TJRS, rel. Des. Élvio Schuch Pinto, JTJRS 160/325).

Percebe-se que a publicidade não pode se desvirtuar do real sentido posto pelo Constituinte Originário, devendo seus atos administrativos seguir a estrita legalidade que, no caso em estudo, o caráter que deve seguir o ato os atos públicos.


CONCLUSÃO

A Constituição Federal de 198810, em seu art. 37, caput, consagrou os princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência de observância pela administração pública, direta e indireta, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios de forma que aqueles princípios estão ligados de forma intima, que o descumprimento de um implicará na inobservância de outro.

O constituinte desejou preservar atos administrativos de eventuais pretensões pessoais, não associadas aos interesses primários.

Desejou também que todos os atos administrativos sejam púbicos e transparentes, cabendo a cada cidadão requer informações à administração pública sobre atos que estes venham a tomar. Cabendo, se necessário, controle popular para ilidir o ato.

Para resguardar ainda o uso da res, o constituinte além de afirmar que todos os atos sejam públicos, feitos por meios que todos possam ter acesso, determinou como estes seriam, determinando limites e implicações.

A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos não poderá conter outro caráter que não seja educativo, informativo ou de orientação social. Vedando ainda que nestes atos não conste nomes, símbolos ou imagens para que não caracterize nenhum tipo de promoção pessoal, tanto para autoridades quanto para servidores públicos.


REFERÊNCIAS

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Outras fontes

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Notas

1 Promotor de Justiça do Estado da Bahia com atribuição para a Proteção da Moralidade Administrativa e do Patrimônio Público e promotor de Justiça Eleitoral da 4ª Zona (Salvador-Ba).

2 Promotor de Justiça. Especialista em direito penal e processo penal pela Universidade Cândido Mendes/RJ. Mestre em direito pela Universidade de Coimbra. Ministério Público do Estado do Amazonas, Manaus, Amazonas, Brasil.

3 Monografia submetida à Universidade de Brasília para obtenção do grau de Bacharel em Direito, sob orientação do Professor Mestre Henrique Araújo Costa.

4 Disponível em <http://www.portaldatransparencia.gov.br/glossario/DetalheGlossario.asp?letra=p>

5 Programas de Governo no âmbito Federal.

6 Disponível em <http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portugues-portugues&palavra=campanha>

7 Dicionário Houaiss da língua portuguesa.

8 MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno, Revista dos Tribunais, 2ª ed., p. 136.

9 “Publicidade de atos governamentais. Princípio da impessoalidade. (...) O caput e o parágrafo 1º do artigo 37 da Constituição Federal impedem que haja qualquer tipo de identificação entre a publicidade e os titulares dos cargos alcançando os partidos políticos a que pertençam. O rigor do dispositivo constitucional que assegura o princípio da impessoalidade vincula a publicidade ao caráter educativo, informativo ou de orientação social é incompatível com a menção de nomes, símbolos ou imagens, aí incluídos slogans, que caracterizem promoção pessoal ou de servidores públicos. A possibilidade de vinculação do conteúdo da divulgação com o partido político a que pertença o titular do cargo público mancha o princípio da impessoalidade e desnatura o caráter educativo, informativo ou de orientação que constam do comando posto pelo constituinte dos oitenta." (RE 191.668, Rel. Min. Menezes Direito, julgamento em 15-4-08, DJE de 30-5-08)”

10 Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998.

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Sobre os autores
Donato Araújo

Advogado, especialista em Direito Previdenciário, membro do conselho de Saúde/Idoso da Seccional Sobral.

Vitoria Regia Moreira Dourado

Bacharel em Direito

Iarla Bruna Oliveira de Aguiar

Bacharel em Direito pela Faculdade Luciano Feijão

Informações sobre o texto

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