RESUMO
É inegável que a responsabilidade civil é tema dentre os mais tradicionais do Direito contemporâneo. Em virtude de sua importância prática e teórica, ocupa posição de destaque no ordenamento e protagoniza férteis discussões doutrinárias e jurisprudenciais. No nosso sistema jurídico, esse instituto evolui na mesma proporção que as relações tornam-se mais complexas. E de outra forma não poderia acontecer, uma vez que quase tudo em Direito acaba em responsabilidade e a sociedade sempre clama por mais justiça nas soluções conferidas aos conflitos de interesses. O presente artigo trata das implicações sociais e econômicas decorrentes do acidente de trabalho na atual conjuntura constitucional, por meio da aplicação da responsabilidade civil e da possibilidade de cumulação do benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez com a pensão vitalícia fundamentada no artigo 950 do Código Civil de 2002, como forma de garantir a máxima proteção reparação aos trabalhadores vitimados por esses sinistros.
Palavras-chave: Responsabilidade civil. Acidente de trabalho. Aposentadoria por invalidez. Pensão vitalícia.
ABSTRACT
It is undeniable that the civil liability issue is among the most traditional of contemporary law. By virtue of their practical and theoretical importance, occupies a prominent position in order and protagonist fertile doctrinal and jurisprudential discussions. In our legal system, this institute develops at the same rate that the relationships become more complex. Otherwise it could not happen, since it almost everything in Law ends up in responsibility and society always calls for more justice in the solutions conferred conflicts of interest. This article deals with the social and economic implications of the accident at work in the current constitutional conjuncture, by the application of liability and the possibility of cumulation of social security benefits for disability retirement with a lifetime pension based on article 950 of the Civil Code 2002 in order to guarantee maximum protection of workers.
Keywords: Civil liability. Work accident. Disability retirement. Lifetime pension
1 A APLICAÇÃO HARMÔNICA DOS INSTITUTOS DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E DA PENSÃO VITALÍCIA NA RESPONSABILIZAÇÃO POR ACIDENTE DE TRABALHO
O Direito do Trabalho é um ramo autônomo e especializado da ciência jurídica, que disciplina a relação de emprego e algumas relações de trabalho equiparadas e visa, prioritariamente, o estabelecimento de normas que protegem a parte vulnerável das referidas relações – qual seja, o empregado/trabalhador – com a consequente promoção de melhores condições à classe.
Não obstante sua inquestionável autonomia, com princípios, regras, teorias, institutos, metodologia e métodos próprios, a evolução e complexidade das relações trabalhistas e dos seus meios de produção deram ensejo ao surgimento de lacunas dentro deste ramo do direito e reforçaram a premente necessidade de se invocarem meios para suprir tais vazios.
Ocorre que o Direito do Trabalho, como bem enfatiza Godinho (2012, p. 74), não corresponde a uma categoria jurídica incomunicável com outras categorias correlatas de ramos jurídicos próximos, mitigando-se, assim, a necessidade de formulação de teorias próprias, no tocante a temas já estudados pelo Direito Comum.
Com vistas a fundamentar o exposto até então, o art. 8º da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT (Decreto-Lei 5.452, de1º de Maio de 1943) explicita o caráter integrativo exercido pelos princípios na seara justrabalhista. Ademais, o seu parágrafo único reforça que, neste ramo, o Direito Comum será utilizado como fonte subsidiária. Vejamos:
Art. 8º - As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por eqüidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público.
Parágrafo único - O direito comum será fonte subsidiária do direito do trabalho, naquilo em que não for incompatível com os princípios fundamentais deste.
No que toca à responsabilidade civil, embora haja extenso estudo, notadamente no campo civilista, trata-se de tema que atinge qualquer relação em que alguém vê seu direito lesado, em razão da prática de um ato ilícito violador de norma jurídica preexistente, subordinando-se, o autor do referido ato, à obrigação de reparar (STOLZE e PAMPLONA, 2013, p.53).
A responsabilidade civil é, pois, instituto idealizado com vistas a possibilitar a reparação de danos, qualquer que seja a sua natureza – se de ordem patrimonial, moral ou estética, quando da prática de atos contrários ao Direito. Ademais, busca precipuamente restabelecer o equilíbrio da ordem jurídica, desestruturado pela prática de uma conduta ilícita, não apenas responsabilizar alguém pelo ato perpetrado.
No caso da responsabilidade civil do empregador decorrente do acidente de trabalho, inexiste, no ordenamento jurídico trabalhista, tratamento próprio – leia-se, teorias próprias – atinente ao assunto, recorrendo-se, assim, com fundamento no princípio da subsidiariedade (parágrafo único, do art. 8º da CLT), ao Direito Civil.
Importante ressalvar, neste momento, que a Constituição Federal de 1988, no art. 7º, inciso XXVIII, preconiza a reparação por acidentes de trabalho sob dois diferentes regimes legais, concorrentemente: o previdenciário, onde independe a verificação de culpa; e o civil, cuja reparação dependerá de uma análise subjetiva da conduta do empregador.
Especificamente nas situações em que o empregado sofre um acidente de trabalho no qual o empregador incorre em dolo/culpa e a vítima fica com sequelas definitivas, ainda é corrente a ideia de que a vítima deverá ser amparada tão somente pelo Estado, através da Previdência Social, na medida em que lhe é assegurada a percepção do benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez, quando cumpridos os requisitos exigidos pela legislação específica.
Todavia, em que pese o arraigado entendimento, faz-se mister demonstrar os fundamentos que autorizam e legitimam a responsabilização civil do patrono, viabilizando a cumulação da percepção do benefício de aposentadoria por invalidez e da pensão vitalícia, entabulada no art. 950, do Código Civil de 2002, aplicável subsidiariamente ao Direito do Trabalho por força da regra constante do parágrafo único, do art. 8º do Diploma Trabalhista.
Posto isso, justifica-se a abordagem do tema por ser a Responsabilidade Civil um instituto jurídico caracterizado por uma dinâmica que acompanha a evolução das relações jurídicas em seus vários âmbitos e que, particularmente no Direito do Trabalho, exerce o papel de assegurar a efetiva proteção e amparo dos trabalhadores em face da desídia do empregador.
Além disso, o estudo da aplicação do art. 950 do Código Civil na reparação de danos decorrentes de acidentes de trabalho reveste-se de atualidade, vez que o ordenamento justrabalhista vem se utilizando cada vez mais da condenação ao pagamento de pensão vitalícia, como forma de responsabilizar os patronos que negligenciam o cumprimento dos preceitos relacionados à implementação de condições adequadas para os empregados exercerem suas atividades.
Os direitos sociais preconizados na Constituição Federal de 1988 foram implementados com a finalidade de beneficiar os hipossuficientes e promover a melhoria das condições de vida, com vistas à realização da igualdade real.
Bulos (2011, p. 791) dispõe que os direitos trabalhistas interligam-se aos direitos sociais, e o art. 7º da nossa Carta Magna é integrado por um rol de incisos que direcionam e disciplinam o tratamento infraconstitucional do Direito do Trabalho.
O inciso XXVIII, do art. 7º da CF/1988 contém a disposição sobre o seguro de acidentes de trabalho a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa.
Assim, a partir de 1988 o ordenamento constitucional inovou no que atine à reparação dos empregados/trabalhadores vitimados em acidentes de trabalho, tendo em vista que na Constituição imediatamente anterior (Constituição Federal de 1967), só lhes era garantido o seguro de acidentes, como se pode observar a seguir:
Art. 158 - A Constituição assegura aos trabalhadores os seguintes direitos, além de outros que, nos termos da lei, visem à melhoria, de sua condição social:
(omissis)
XVII - seguro obrigatório pelo empregador contra acidentes do trabalho;
Acerca do aludido, o Professor Bullos (2011) enfatiza que:
A indenização por dolo ou culpa – ingressou no ordenamento constitucional pátrio só a partir de 5-10-1988. Caso fique comprovada aquela manifestação livre de vontade, pela qual o agente produz o resultado ou assume o risco de produzi-lo (dolo) ou negligência, imprudência ou imperícia (culpa), o seguro contra acidentes não exime o patrão do dever de indenizar. (p. 807)
Com isso, além do direito à percepção do benefício previdenciário, a vítima do acidente de trabalho poderá recorrer à ação indenizatória do direito comum a fim de responsabilizar o empregador que agiu com dolo ou culpa no sinistro.
Impende ressaltar que segundo o art. 2º, caput da Lei n. 6.367/76 o acidente do trabalho é aquele que ocorrer pelo exercício do trabalho a serviço da empresa, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte, ou perda, ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.
Embora se ressalte a complexidade em elaborar um conceito para o instituto, Dallegrave Neto (2014) arrisca-se e coloca à disposição a sua contribuição, aduzindo que a responsabilidade civil:
[...] é a sistematização de regras e princípios que objetivam a reparação do dano patrimonial e a compensação do dano extrapatrimonial causados diretamente por agente – ou por fato de coisas ou pessoas que dele dependam – que agiu de forma ilícita ou assumir o risco da atividade causadora da lesão. (p. 95)
Nessa senda é também a lição de Maria Helena Diniz (2003):
A responsabilidade civil é a aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros em razão de ato do próprio imputado, de pessoa por quem ele responde, ou de fato de coisa ou animal sob sua guarda (responsabilidade subjetiva), ou, ainda, de simples imposição legal (responsabilidade objetiva). (p. 34)
Sendo assim, pode-se inferir que é unânime na doutrina que a responsabilidade civil surge a partir da prática de uma conduta danosa e ilícita, e tem por corolário a necessidade de reparação do dano (em busca do restabelecimento da situação anterior da coisa ou da situação, ou na impossibilidade disso, recorre-se à reparação pecuniária).
Outrossim, Gonçalves (2010, p. 19) ensina que a responsabilidade destina-se a restaurar o equilíbrio moral e patrimonial (e estético) provocado pelo autor do dano, de modo que restabelecer a harmonia e o equilíbrio violados pelo dano constitui a sua fonte geradora.
No Código Civil de 1916, a matéria não ocupava muito espaço, e isso pode se justificar em razão do intricamento e pouco desenvolvimento do assunto à época. Todavia, o Código Civil de 2002 sistematizou a matéria, dedicando lugar na Parte Geral, nos arts. 186, 187 e 188, dedicando-lhe também um Título autônomo (na Parte especial) denominado “Da Responsabilidade Civil” (GONÇAVES, 2010, p. 22).
Conforme já mencionado, o referido instituto é aplicado ao Direito do Trabalho por força do princípio da subsidiariedade insculpido no parágrafo único, do art. 8º da CLT.
Acerca do caráter integrativo que os princípios exercem no ordenamento jurídico e a possibilidade de aplicação subsidiária e coerente de muitas leis e fontes do direito privado sob a luz da Constituição Federal de 1988, faz-se indispensável mencionar a lição de Cláudia Lima Marques (2009) sobre a tese do “diálogo das fontes”:
É o chamado “diálogo das fontes” (di + a = dois ou mais; logos: lógica ou modo de pensar), expressão criada por Erik Jayme, em seu curso de Haia, significando a atual aplicação simultânea, coerente e coordenada das plúrimas fontes legislativas, leis especiais (como o CDC, a lei de seguro-saúde) e gerais (como o CC/2002), com campos de aplicação convergentes, mas não iguais. (p. 89)
Introduzindo tal conceito, a autora explicita a necessidade de aplicação coerente das leis de direito privado e de coordenação entre elas no mesmo ordenamento. Além disso, a referida tese tem como essência a ideia de complementaridade das normas jurídicas, não obstante pertencerem a ramos distintos da ciência do Direito.
A autora, em sua obra, aplica a teoria diálogo das fontes, quase que exclusivamente, em exemplos envolvendo o Direito Civil e o Direito do Consumidor. Entretanto, como mencionado alhures, anseia-se pela aplicação coerente das leis de direito privado, e em sendo o Direito do Trabalho ramo do Direito Privado, nada obsta a viabilidade do diálogo entre ele o Direito Civil.
Sobre o tema, alude Tartuce (2014):
Conforme o artigo 8º da CLT, o direito comum e, logicamente, o Direito Civil são fontes subsidiárias do Direito do Trabalho. Na verdade, pela aplicação da tese do diálogo das fontes, o que se propõe é uma nova leitura desse comando legal. Não se deve mais considerar o Direito Civil como simples fonte subsidiária, mas, em alguns casos, como fonte direta do Direito do Trabalho.
Isso porque, em muitas situações atualmente comuns à prática trabalhista, não há normas de Direito do Trabalho regulamentando a matéria. Em casos tais é que as normas do Código Civil terão aplicação. Outro argumento interessante é que, quando a CLT entrou em vigor, não vivíamos esse momento de complexidade legislativa atual. Trazendo clarividência a essa complexidade, anote-se que a Emenda Constitucional 45/2004 ampliou enormemente a competência da Justiça do Trabalho para tratar de casos que antes eram da competência da Justiça Comum, como a responsabilidade civil por acidente de trabalho ou em decorrência do contrato de trabalho. Como não há legislação trabalhista a tratar do tema, o aplicador do Direito deve procurar socorro nas normas do Código Civil que tratam da responsabilidade civil. (p. 65)
O estudo da responsabilidade civil tornou-se indispensável no ordenamento justrabalhista a partir da Constituição Federal de 1988, quando se dissociaram definitivamente o seguro de acidentes e a responsabilidade civil do empregador, que passaram a constituir institutos autônomos e distintos entre si.
Conforme a interpretação corrente que é atribuída ao inciso XXVII, do art. 7º da Carta Magna, o seguro de acidentes será devido ao empregado/trabalhador acidentado, independente da verificação de culpa do empregador no acidente, e o respectivo benefício ficará a cargo da Previdência Social.
A parte final do inciso contempla a possibilidade de reparação civil do empregado (de responsabilidade do patrono), em razão dos danos decorrentes do infortúnio laboral, nos casos de culpa ou dolo.
Diante disso, observa-se que ambos os sistemas coincidem nos acidentes de trabalho, permitindo a cumulação do benefício previdenciário com a indenização devida pelo empregador.
No presente trabalho, dar-se-á enfoque aos acidentes em que os empregados são acometidos por sequelas definitivas, e, consequentemente, tornam-se incapacitados para o labor.
A Constituição Federal de 1988 previu a adoção do Estado do Bem Estar Social, colimando, precipuamente, alcançar o grau máximo de proteção social. Um dos meios pelos quais se efetiva tal proteção é a Seguridade Social, que engloba um conjunto de ações do Estado, com vistas a atender às necessidades básicas da população no que toca à saúde, à assistência social e à previdência social.
Desde então, passou a ser incumbência do Estado a implementação deste direito fundamental de segunda geração – direito social, através da Previdência Social, a qual concede benefícios previdenciários àqueles que contribuem com o sistema de custeio.
De acordo com o art. 201, inciso I do Texto Maior, a previdência social atenderá, nos termos da lei e observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, a cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada.
Na ocorrência de um acidente de trabalho em que o segurado empregado for acometido por sequelas definitivas que o incapacitem para o exercício de uma atividade, incumbirá ao Estado promover condições mínimas de subsistência a este cidadão, por meio da concessão do benefício de previdenciário de aposentadoria por invalidez, independente da verificação de como se deu o sinistro.
Ibrahim (2014) apresenta a seguinte acepção para o referido benefício:
A aposentadoria por invalidez é concedida ao segurado que, estando ou não em gozo do auxílio doença, for considerado incapaz para o trabalho e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nessa condição. (p. 601)
O fundamento legal da aposentadoria por invalidez encontra-se nos arts. 42 a 47 da Lei nº 8.213/91 (Lei de planos de benefícios), e nos arts. 43 a 50 do Decreto nº 3.048/99. O caput do art. 42 dispõe o seguinte:
Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
Como se pode notar, para a concessão do benefício basta que o empregado/trabalhador, na qualidade de segurado, observe a carência exigida (que será de doze meses de contribuição), inexistindo, qualquer outro requisito a ser atendido. Assim, afirma-se que, no campo do seguro de acidentes, vigora a responsabilidade civil, fundada na teoria risco profissional.
A responsabilidade civil do empregador decorrente do acidente de trabalho, que em nada se confunde com a prestação de benefício abordada acima, possui natureza subjetiva, haja vista a necessidade de prova da prática de alguma conduta culposa ou dolosa de sua parte, e incide, como já consignado em outro momento, de forma independente do seguro acidentário.
Observe-se que se considerar a regra da responsabilidade subjetiva e conforme a interpretação corrente do art. 186 do Código Civil26, de 2002, a culpa é elemento substancial para a configuração da responsabilidade civil no Brasil. Esta culpa deve ser compreendida em sentido lato, englobando, portanto, o dolo e a culpa stricto sensu (imprudência, negligência e imperícia).
Dallegrave Neto explica que a indenização por acidente do trabalho pode se dar em três hipóteses: no caso de morte da vítima, no case de incapacidade temporária da vítima e nos casos de incapacidade permanente (total ou parcial), aplicando-se, respectivamente, os arts. 948, 949 e 950 do Código Civil. (2014, p. 457)
No Brasil, além de se observar a evolução da responsabilidade civil pelos acidentes de trabalho, nota-se uma crescente, nos julgados envolvendo esse tipo de lide, na condenação dos empregadores ao pagamento de pensão mensal fundamentada no art. 950, do Código Civil de 2002. In verbis:
Art. 950. Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização, além das despesas do tratamento e lucros cessantes até ao fim da convalescença, incluirá pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu.
Parágrafo único. O prejudicado, se preferir, poderá exigir que a indenização seja arbitrada e paga de uma só vez.
O teor deste dispositivo faz alusão aos casos em que há perda permanente da capacidade laborativa, e o empregador, em razão da prática de uma conduta danosa ilícita, deverá arcar com a reparação, que se dará sob a forma de pensionamento, ou, conforme disposto no parágrafo único, a indenização poderá ser paga de uma só vez.
Acontece que, do ponto de vista social, se houver a perda total e permanente da capacidade de trabalhar, a fixação de uma pensão à vítima configura-se como a melhor maneira de se reparar o dano sofrido.
Nesse prisma, os tribunais vêm sedimentando entendimento pela fixação do pensionamento mensal vitalício que será pago cumulativamente ao benefício de aposentadoria por invalidez. Vejamos:
RECURSO DE REVISTA. PRESCRIÇÃO BIENAL. DANO MORAL E MATERIAL. ACIDENTE DE TRABALHO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. SUSPENSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO. Considerando que a aposentadoria por invalidez é causa apenas de suspensão do contrato de trabalho (CLT, art. 475), ajuizada a presente demanda antes do decurso do prazo quinquenal estabelecido pela Carta Magna para os contratos em curso, não há prescrição do fundo do direito a ser pronunciada. Precedentes da SDI. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. TERCEIRIZAÇÃO. ATIVIDADE-FIM. SUBORDINAÇÃO DIRETA. Consignada no acórdão regional a terceirização de serviços ligados à atividade-fim da tomadora, bem como a subordinação direta do reclamante a segunda reclamada, que contratou a prestação de serviços, não há falar em ofensa ao art. 265 do CCB. INDENIZAÇÃO. DANOS MATERIAIS. ACIDENTE DE TRABALHO. PENSÃO VITALÍCIA. CUMULAÇÃO COM PARCELAS DE NATUREZA PREVIDENCIÁRIA . Consoante o entendimento desta Corte Superior, não há impedimento à percepção cumulada de pensão vitalícia, que visa à reparação de ato ilícito de que decorra incapacidade laborativa total ou redução dessa capacidade, e benefício previdenciário. Precedentes. Recurso de revista integralmente não conhecido. (TST - RR: 284004020075030076 28400-40.2007.5.03.0076, Relator: Rosa Maria Weber, Data de Julgamento: 08/06/2011, 3ª Turma, Data de Publicação: DEJT 17/06/2011) (original sem grifos)
RECURSO DE REVISTA. 1. ACIDENTE DE TRABALHO E/OU DOENÇA PROFISSIONAL. DANO MATERIAL E/OU MORAL. PRESCRIÇÃO . Tratando-se de pedido de dano moral e/ou material decorrentes de acidente de trabalho e/ou doença profissional, esta Corte pacificou entendimento no sentido de que, quando a lesão for anterior à Emenda Constitucional nº 45/2004, o prazo prescricional aplicável será o previsto no Código Civil de 2002, observada a regra de transição prevista no art. 2.028 deste mesmo diploma legal, bem assim que, quando a lesão for posterior à referida emenda, o prazo prescricional aplicável será o trabalhista, previsto no art. 7º, XXIX, da CF. No caso dos autos, a lesão ocorreu em maio de 1995, portanto, anterior à Emenda Constitucional nº 45/2004, sendo aplicável, assim, a prescrição civil. Nessa esteira, como a ação foi ajuizada em 17/12/2001, ainda na vigência do Código Civil de 1916, não tem lugar a regra de transição prevista no art. 2.028 do atual Código Civil, sendo aplicável ao caso em tela o prazo prescricional previsto no art. 177 daquele diploma legal, qual seja, de 20 anos, contados da ciência da lesão ocorrida em maio de 1995. Dessarte, tendo a ação sido ajuizada em 17/12/2001, não há falar em prescrição. Recurso de revista não conhecido. 2. PAGAMENTO DE PENSÃO E BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. CUMULAÇÃO . Considerando que da doença profissional ou do acidente de trabalho emergem consequências distintas, uma relacionada ao benefício acidentário a cargo do Instituto de Previdência Social, em relação ao qual vigora o princípio do risco social, e outra associada à reparação pecuniária dos danos deles oriundos a cargo do empregador, na conformidade do artigo 7º, inciso XXVIII, da Constituição, em relação ao qual prepondera o princípio da responsabilidade subjetiva, entende-se que não é vedado o percebimento e a cumulação de pensão vitalícia com o benefício previdenciário, porque oriundos de institutos diversos que não se confundem. Ilesos, em consequência, os artigos 1539 do Código Civil de 1916, 944 e 950 do Código Civil de 2002 e 5º da CLT. (TST - RR: 2115 2115/2005-030-04-00.1, Relator: Dora Maria da Costa, Data de Julgamento: 04/11/2009, 8ª Turma,, Data de Publicação: 13/11/2009) (original sem grifos)
A discussão acerca do tempo pelo qual perdurará o pagamento desta pensão ganha importância quando se considera que artigo 950 do Código Civil não fixa nenhuma limitação em relação ao período em que a referida indenização deva perdurar, de modo a garantir que de forma protetiva a obrigação do pagamento de pensão mensal em virtude de dano que diminua a capacidade ou incapacite o ofendido para o exercício da sua profissão, garantindo o restitutio in integrum, que deve corresponder ao valor que o reclamante deixou ou deixará de receber em decorrência da incapacidade advinda da doença.
Assim, na ausência de previsão legal que limite temporalmente o pagamento da pensão, esta deve ser estendida por todo o período de vida do empregado, como forma de privilegiar o princípio da reparação integral que norteia o sistema de responsabilidade civil.
Apesar de ainda inexistir posicionamento sedimentado quanto ao assunto, é neste sentido que envereda a melhor jurisprudência.
REFERÊNCIAS
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DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. Vol.7. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 34
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________. Lei n.º 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. 6ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014.
________. Decreto-Lei n.º 5.452, de 1º de maio de 1943. Consolidação das Leis do Trabalho. 6ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014.
________. Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991. Lei de Planos de Benefícios da Previdência Social. 6ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014.
________. Decreto nº 3.048, de 6 de Maio de 1999. Regulamento da Previdência Social.
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________. Tribunal Superior Do Trabalho. Disponível em <http://www.tst.jus.br> Acesso: 04/01/2015.