Responsabilidade civil do empregador em acidentes do trabalho

20/07/2015 às 17:51
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O presente artigo discute a responsabilidade civil do empregador nos acidentes do trabalho, as teorias aplicáveis e a tendência da jurisprudência

1. INTRODUÇÃO


Como conceito de acidente do trabalho temos que é o infortúnio ocorrido em razão do trabalho, gerando incapacidade ou morte, ou, de acordo com a definição do artigo 19 da Lei 8213/91, com redação dada pela Lei Complementar nº 150, de 2015, é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ou de empregador doméstico ou pelo exercício do trabalho dos segurados especiais, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.

Ao lado da conceituação acima, de acidente de trabalho típico, por expressa determinação legal, as doenças profissionais e/ou ocupacionais equiparam-se a acidentes de trabalho. Os incisos do art. 20 da Lei nº 8.213/91 as conceitua:

Art. 20. Consideram-se acidente do trabalho, nos termos do artigo anterior, as seguintes entidades mórbidas:

I- doença profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social;

II- doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente, constante da relação mencionada no inciso

Além disso, o art. 21 do mesmo disposto determina outros acidentes que se enquadram na definição de acidente do trabalho por equiparação.


1.1 DA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO NAS AÇÕES POR ACIDENTE DO TRABALHO

A competência para processar e julgar as ações indenizatórias decorrentes dos acidentes do trabalho gerou controvérsias e decisões contraditórias que se tornaram mais acentuadas com a promulgação da Emenda Constitucional 45/2004.  Contudo, no julgamento do Conflito de Competência nº 7204-1, ocorrido no dia 29 de junho de 2005, o Supremo Tribunal Federal, em sua composição plenária, pacificou de vez o entendimento quanto à competência da Justiça do Trabalho e não mais da Justiça Comum dos Estados.

Pacificando a discussão, o Supremo Tribunal Federal, em dezembro de 2009, editou a Súmula Vinculante nº 22, no seguinte teor: “A Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar as ações de indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente de trabalho propostas por empregado contra empregador, inclusive aquelas que ainda não possuíam sentença de mérito em primeiro grau quando da promulgação da Emenda Constitucional nº 45/04.”


1.2 DA RESPONSABILIDADE CIVIL

Responsabilidade civil é a obrigação de reparar o dano que uma pessoa causa a outra. Em direito, a teoria da responsabilidade civil procura determinar em que condições uma pessoa pode ser considerada responsável pelo dano sofrido por outra pessoa e em que medida está obrigada a repará-lo. A reparação do dano é feita por meio de uma indenização, que é na maioria das vezes de ordem pecuniária. O dano pode ser à integridade física, à honra ou aos bens de uma pessoa.

Entende-se como pressuposto para a responsabilidade civil, a existência de ato ilícito, dano e nexo causal.  O ato ilícito em sentido estrito é a conduta, pela qual o comportamento humano voluntário, através de uma ação ou omissão, contraria o ordenamento jurídico e produz consequências jurídicas. Já o dano é a redução ou subtração de um bem jurídico, que afeta o patrimônio do ofendido, no caso o dano material; ou a sua personalidade, quando atinge os atributos da honra, imagem, integridade física, liberdade, no caso o dano moral. E por fim, o nexo causal, que é a necessária relação de causa e efeito, ou seja, o liame em que o ato ilícito seja a causa do dano e que o prejuízo sofrido pela vítima seja resultado daquele.


1.3 TEORIAS SOBRE A RESPONSABILIDADE CIVIL EM ACIDENTE DO TRABALHO


São dois os fundamentos da responsabilização civil do agente: de um lado, a culpa, baseada na teoria subjetiva , e, de outro lado o risco, fundamentado pela teoria objetiva.

A responsabilidade civil subjetiva surge a partir do momento em que uma pessoa pratica ato ilícito afrontando à lei por conduta culposa ou dolosa. Sendo que a prova da culpa do agente, passa a ser pressuposto para culminar em indenização do dano causado.

A responsabilidade civil objetiva vem fundamentada na teoria do risco, ou seja, ela é aferida independentemente de dolo ou culpa, onde o agente, no caso o empregador responde por danos eventualmente causados ao empregado mesmo se não restar verificada a existência de conduta dolosa ou culposa do empregador.

Nesse tipo de responsabilidade o empregador restará obrigado ao ressarcimento pela simples existência do dano sofrido pelo empregado (material ou moral, ou ambos) e da correspondente imposição legal de indenização, independentemente de culpa ou dolo.

Na teoria da responsabilidade subjetiva, por sua vez exigem-se como pressupostos, a culpabilidade do agente, cumulada com a efetiva caracterização do dano sofrido e do nexo de causalidade entre o ato (comissivo ou omissivo) praticado pelo empregador, seja na forma de culpa propriamente dita (negligência, imprudência ou imperícia) ou do dolo, que pode ser traduzido como a intenção deliberada de produzir um resultado danoso para a vítima.

Em se tratando do Direito Laboral a doutrina e jurisprudência se pacificaram no sentido de que a responsabilidade por danos eventualmente causados ao empregado pelo empregador deve ser aferida pela teoria da responsabilidade subjetiva, contudo, com o advento do Código Civil de 2002, mais especificamente no parágrafo único do artigo 927 do Código Civil, ganhou força o entendimento de aplicação da teoria da responsabilização subjetiva pela indenização civil, mesmo no Direito do Trabalho:

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo
 
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Desse modo, duas são as possibilidades de imposição da responsabilidade objetiva de acordo com o citado dispositivo: 1) a existência de expressa disposição legal estabelecendo a responsabilidade objetiva ou; 2) quando a atividade normalmente desenvolvida pelo agente causador do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Teoria da responsabilidade subjetiva. Para os defensores da teoria subjetiva tem-se que a responsabilidade do empregador pela reparação dos danos causados por acidente do trabalho é sempre subjetiva, assim mesmo onde há atividades de risco, o empregador somente poderá ser responsabilizado se existentes os pressupostos exigidos pelo artigo 7º, XXVIII da Constituição Federal, no caso o dolo ou a culpa.

Art. 7º
[...]
XXVIII - seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa;

Para defensores da teoria da responsabilidade subjetiva pura, o preceito constitucional do inciso XXVIII do artigo 7º da Constituição é específico de maneira que não admite interpretação diferente, e por tratar-se de um dispositivo Constitucional, a legislação ordinária como o artigo 927, § único do Código Civil, fundamento legal da teoria objetiva, não poderia com ela confrontar.

Para a corrente da responsabilidade civil subjetiva, a obrigação de indenizar o acidentado é devida se restar comprovada culpa do empregador no evento que provocou o dano, mesmo que de maneira omissiva, ou seja, não fornecendo equipamento de segurança exigido para a função.  Assim, só caberá a indenização se estiverem presentes o dano, o nexo causal do evento danoso e a culpa do empregador. Pressupostos estes elencados no artigo 186 do Código Civil.

Dos Atos Ilícitos
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Teoria da Culpa presumida. A teoria da responsabilidade subjetiva que assume a culpa presumida é uma variação da tese primária visando atingir o objetivo social da teoria objetiva, ou seja, fornecer maior segurança para a parte hipossuficiente da relação de trabalho contraída, o trabalhador.

Não seria possível sustentar em todos os casos a responsabilidade objetiva do empregador, pois a regra geral fixada no artigo 7º, XXVIII da Constituição Federal é a da responsabilidade subjetiva, e por tratar-se de uma responsabilidade fixada na Carta Magna, não haveria qualquer possibilidade em permitir que regras ordinárias, como a dos artigos 2º, da CLT ou do artigo 927, parágrafo único do Código Civil prevaleçam sobre a norma Constitucional.

Desse modo, a teoria da culpa presumida traz um diferencial em relação à teoria da responsabilidade subjetiva pura, qual seja a de que a norma do artigo 7º, XXVIII deve ser interpretada em conformidade com a Constituição Federal e com princípios do Direito do Trabalho, em especial o indicado no caput do próprio artigo 7º da Constituição que diz respeito a proteção que trabalhador detém.

Pelo princípio do ônus da prova, nos termos do o art. 818 da CLT, combinado com o art. 333, Inciso I do CPC, cabe à parte autora, aquela que alega determinada circunstância e proclama por direitos, comprovar os fatos constitutivos do quanto alegado. Entretanto, é comum que no processo do trabalho nem sempre é possível que o trabalhador consiga se desincumbir desse ônus, frente a sua condição de hipossuficiente, especialmente pelo fato do empregador deter maior disponibilidade dos meios de prova.

No caso de um acidente de trabalho, é indiscutível que o empregador tem muito mais facilidade em demonstrar que cumpria com as normas de saúde, higiene e segurança do trabalho do que o empregado em provar a não observância dessas normas.

A teoria da responsabilidade civil subjetiva com culpa presumida é o meio termo,  entre o rigor excessivo de que o ônus da prova recaia sobre a vítima e a exagerada teoria objetiva de que a reparação ocorra tão somente pelo risco da atividade.

O empregador terá que comprovar em juízo que observou todas as normas de segurança do trabalho e que também o meio ambiento do trabalho estava equilibrado quando do sinistro, sendo o acidente um infortúnio. Caso o empregador faça essa prova, o ônus da prova de demonstrar a culpa transfere-se ao empregado.

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Teoria da responsabilidade objetiva. Pela teoria da responsabilidade objetiva o empregador responde objetivamente pelos danos causados à saúde do empregado já que, com sua atividade econômica, gerou uma situação de risco para o empregado.

A teoria da responsabilidade objetiva prescindem da comprovação da culpa. Desse modo, a demonstração do nexo entre a conduta do empregador e o dano sofrido pelo empregado é suficiente para que ocorra o dever de indenizar.

Quanto a possibilidade da aplicação da responsabilidade objetiva ao empregador,  os defensores da corrente objetiva sustentam a possibilidade. O fundamento da responsabilização objetiva é o artigo 2º, da CLT, já que o empregador assume os riscos da atividade econômica, o artigo 927, parágrafo único do Código Civil que prevê a reparação independente de culpa e o caput do artigo 7º da Constituição que dispõe que “são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social”.

Art. 2º - Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.


Embora o artigo 7º, inciso XXVIII, da Constituição da República estabeleça a obrigação do empregador, quando incorrer em dolo ou culpa, de indenizar o empregado em razão de acidente de trabalho, o caput desse dispositivo ressalta que os direitos ali previstos não o são de forma taxativa, ao dispor acerca da possibilidade de outros direitos que visem à melhoria da condição social do trabalhador.

Em caso de dano sofrido pelo empregado em razão das atividades exercidas em favor do empregador não haverá controvérsia jurídica sobre a responsabilidade do empregador na primeira hipótese, ou seja, quando a Lei impõe ao empregador a responsabilidade pelo dano sofrido pelo empregado independentemente de culpa não haverá discussão sobre esta responsabilidade (Ex.: o dever do empregador assumir o pagamento de salários do empregado nos primeiros 15 dias de afastamento por doença, mesmo que não seja doença ocupacional).

Cumpre ressaltar que a obrigação do empregador de assumir o pagamento durante o afastamento por doença tinha sido ampliado para 30 dias (MP 664/2014) conforme redação originária, mas após perda da vigência dessa Medida Provisória e por ter sido convertida na Lei 13.135/2015 que nada dispôs sobre referido prazo, entende-se que o empregador é responsável pelo pagamento do salário e demais vantagens pelo prazo de 15 dias, a contar do acidente, sendo que o INSS assume a responsabilidade a partir do 16º dia de afastamento.

A grande controvérsia jurídica tem surgido quando se trata de aplicar a segunda hipótese prevista no parágrafo único do artigo 927 do Código Civil, vez que fica a critério do julgador definir que tipo de atividade normalmente implica em risco para o empregado.

Muito se tem discutido a respeito da implicação da responsabilidade objetiva, contudo, verificamos que a maioria dos doutrinadores é resistente à aplicação desta responsabilidade em matéria de Direito do Trabalho.

Nesse sentido, inúmeros julgados têm afastado a aplicação da responsabilidade objetiva, conforme precedentes de nossos Tribunais Regionais:

“ACIDENTE DE TRABALHO - INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS - INEXISTÊNCIA DE CULPA OU DOLO DO EMPREGADOR - INEXISTÊNCIA DE RESPONSABILIDADE OBJETIVA. A responsabilidade civil que justifica a reparação de danos morais e materiais pressupõe o preenchimento concomitante de vários requisitos, quais sejam o dano experimentado pela vítima, a ação ou a omissão do causador, o nexo de causalidade, bem como a culpa ou o dolo do agente. Trata-se da verificação da efetiva existência de um nexo etiológico entre a lesão sofrida pelo empregado que foi vítima de acidente de trabalho e a conduta omissiva ou comissiva do empregador,sabendo-se que o direito do trabalho pátrio alberga, como regra geral, a teoria da responsabilidade subjetiva do tomador dos serviços, derivada de culpa ou dolo (CF, art. 7º, XXVIII). Se os elementos de convicção dos autos não apontam, como no caso examinado, para qualquer dolo ou culpa do empregador, e, ainda, a prova pericial produzida evidencia que a Reclamante não apresenta quaisquer sequelas do infortúnio sofrido, encontrando-se plenamente apta ao exercícios de atividades profissionais, descabe cogitar-se em condenação da Ré ao pagamento de indenização por danos morais e materiais. Recurso Ordinário obreiro conhecido e não provido.”
TRT2 – Proc.: 01602-2006-313-02-00-8 ANO: 2009 TURMA: 5ª – Rel.: ANELIA LI CHUM – Fonte: DOE de 02/07/2010
Fonte: http://www.trtsp.jus.br/pesquisa-jurisprudencia-por-palavra-acordaos


PERDA AUDITIVA. AUSÊNCIA DE DANOS. INDEVIDAS AS INDENIZAÇÕES CORRESPONDENTES AOS DANOS MATERIAIS E MORAIS. No que tange à responsabilidade por danos materiais, morais e estéticos de origem acidentária, a despeito da noção de atividade de risco introduzida pelo parágrafo único do artigo 927 do Código Civil, que prevê a obrigação de reparar o dano independentemente de culpa, vale dizer, a responsabilidade objetiva do empresário, vigora no ordenamento jurídico brasileiro, por força do artigo 186, também do Estatuto Substantivo Civil, e do artigo 7º, inciso XXVIII, da Constituição Federal, como regra geral, a responsabilidade subjetiva do empregador, segundo a qual o dever de indenizar decorre do preenchimento de três requisitos essenciais: 1) ação ou omissão culposa ou dolosa do empregador (ou agente); 2) dano experimentado pelo empregado (ou vítima); e 3) relação de causalidade verificada entre a ação ou omissão dolosa ou culposa do empregador e o dano experimentado pelo empregado (nexo causal). Havendo prova pericial que constate a existência de perda auditiva sem comprometimento da capacidade laboral e sem prejuízo do convívio social e familiar do trabalhador, ou seja, sem a presença de dano, tornam-se inaplicáveis os artigos 186, 927 e 950 do Código Civil, não sendo devidas as indenizações por danos morais e materiais pleiteadas.
TRT2 – PROCESSO TRT Nº 013880069.2007.5.02.0361 - ACÓRDÃO Nº: 20121197861
RECURSO ORDINÁRIO DA 01ª V.T. DE MAUÁ Rel.: MERCIA TOMAZINHO – Fonte: 19/10/2012
Fonte: http://www.trtsp.jus.br/pesquisa-jurisprudencia-por-palavra-acordaos


“EMENTA: ACIDENTE DE PERCURSO – INDENIZAÇÃO – AUSÊNCIA DE CULPA OU DOLO. Não cabe falar em indenização, ainda que o acidente tenha ocorrido pelo exercício do trabalho a serviço da empresa, se não há como conferir à empregadora qualquer parcela de culpa pelo ocorrido. Também, não é o caso de se aplicar a responsabilidade objetiva, já que a atividade desempenhada pelo empregado não o expunha a risco em nível superior ao da coletividade em geral.” (TRT3 - RO 00786-2008-049-03-00-0, Turma Recursal de Juiz de Fora, Exmo. Juiz Convocado Maurício Ribeiro Pires, pub. 01-07-09).
Fonte: https://as1.trt3.jus.br/juris/consultaBaseSelecionada.htm

Contudo, não obstante os julgados transcritos, muitos defendem a aplicação da responsabilidade objetiva na reparação civil no âmbito do Direito do Trabalho, entendendo que negar o cabimento deste instituto atenta quanto ao comando previsto no artigo 927, parágrafo único do Código Civil.

Vale destacar que o C. TST tem aplicado a teoria da responsabilidade objetiva do empregador nos casos em que o acidente configura risco inerente à atividade do empregado, como por exemplo, a atividade de motoboy, ementas transcritas abaixo:

RECURSO DE REVISTA.
ACIDENTE DE TRABALHO. MOTOCICLISTA. APLICABILIDADE DA TEORIA DA RESPONSABILIDADE OBJETIVA. RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR.  O envolvimento em acidentes automobilísticos nestes casos, principalmente nos dias de hoje, configura risco inerente à atividade do profissional em questão, ainda que o acidente seja causado por terceiro. Por essa razão, o acidente relaciona-se com o risco assumido pela reclamada, devendo ela ser responsabilizada pelos danos suportados pelo reclamante. Recurso de revista conhecido e provido.
Processo:  RR - 4910-76.2011.5.12.0050  Data de Julgamento:  24/06/2015, Relatora Ministra: Delaíde Miranda Arantes, 2ª Turma,  Data de Publicação: DEJT 01/07/2015.
Fonte: http://www.tst.jus.br/consulta-unificada


RECURSO DE REVISTA.
MOTOBOY. ATIVIDADE DE RISCO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO EMPREGADOR. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL
1. O entendimento perfilhado pela SbDI-1 do TST orienta no sentido de que o caput do art. 7º da Constituição da República constitui-se tipo aberto, vocacionado a albergar todo e qualquer direito quando materialmente voltado à melhoria da condição social do empregado.
2. Cede espaço, assim, ao reconhecimento da
responsabilidade objetiva do empregador, prevista no art. 927, parágrafo único, do Código Civil, quando a atividade desenvolvida pelo empregado revela-se eminentemente de risco, a exemplo da função de "motoboy".
3. Acórdão regional que reconhece a responsabilidade objetiva do empregador, por acidente do trabalho, envolvendo empregado no desempenho da função de "motoboy", e acolhe o pedido de pagamento de indenização por dano moral e estético.
4. Recurso de revista da
Reclamada de que não se conhece.
Processo:  RR - 1199-45.2010.5.01.0037  Data de Julgamento:  03/06/2015, Relator Ministro: João Oreste Dalazen, 4ª Turma,  Data de Publicação: DEJT 12/06/2015.
Fonte: http://www.tst.jus.br/consulta-unificada

O legislador, ao determinar o direito de reparação para as atividades que normalmente exponham outrem a risco, independentemente de culpa, assim o fez para resguardar aquele que se submete ao risco causado pelo empreendimento, risco este que, no âmbito do Direito do Trabalho, é de responsabilidade do empregador.

A problemática na aplicação da responsabilidade objetiva é que inúmeros julgados têm aplicado este instituto pela mera aplicação do risco do empreendimento no âmbito estritamente trabalhista (art. 2º da CLT), não realizando uma análise a respeito dos requisitos civis para aplicação desta responsabilidade.

Com efeito, da leitura do parágrafo único do artigo 927 do Código Civil podemos verificar que o dolo e a culpa são pressupostos não exigidos na responsabilização do empregador, desde que verificado o nexo de causalidade entre os riscos existentes no ambiente laboral e o dano efetivamente sofrido pelo empregado.

Nesse diapasão, haverá o dever de indenizar o empregado, por exemplo, em caso de redução da capacidade laborativa por perda ou redução da audição de determinado empregado exposto a ruído no ambiente laboral, mesmo que este não tenha se utilizado dos equipamentos de proteção fornecidos pelo empregador, pois na teoria do risco, cabe ao empregador o dever de fiscalizar a utilização dos equipamentos, bem como adotar medidas para minimizar os riscos existentes no ambiente laboral.

De outro lado, havendo a existência de um determinado acidente do trabalho sem que o empreendimento cause risco ao trabalhador de forma permanente e habitual, como, por exemplo, a queda eventual de um trabalhador de uma escada, a responsabilidade do empregador deve ser verificada de forma subjetiva.

Portanto, grande é a problemática a respeito da aplicabilidade da responsabilidade objetiva no Direito do Trabalho, o que atribuímos, em grande parte, à inexistência de regramento específico para a responsabilização do empregador.

Nos casos onde a própria Lei estabelece a responsabilidade objetiva pelo risco do empreendimento não há como o empregador se eximir de suas obrigações, afinal, vige a regra insculpida no inciso II do artigo 5º da CF “II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;”.

Destarte, à míngua de regramentos específicos quanto às obrigações civis do empregador haverá sempre a discussão sobre sua responsabilidade, sem afastar, contudo, a teoria da responsabilidade subjetiva, esta aplicável a todas as relações civis.


1.4 DA CUMULAÇÃO DAS INDENIZAÇÕES

Antes de apontar os dois posicionamentos existentes quanto à possibilidade de cumulação ou não de dano moral e estético, e ainda a cumulação com os benefícios recebidos da Previdência Social, cumpre esclarecer acerca do seu conceito do dano estético em razão de acidente do trabalho.

Quando existe uma lesão, decorrente de um acidente de trabalho, que compromete ou, ao menos, altera a harmonia física da vitima, tem-se configurado um dano estético. Pode se dizer, portanto, que o dano estético é concebido como “qualquer alteração morfológica do acidentado, como, por exemplo, a perda de algum membro ou mesmo de um dedo, uma cicatriz ou qualquer mudança corporal que cause repulsa, afeiamento ou apenas desperte a atenção por ser diferente”  (DINIZ, Maria Helena, Curso de direito civil brasileiro. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 1995, v. 7. p. 61/63).

Cumpre dizer que há na doutrina e na jurisprudência dois posicionamentos quanto à cumulação ou não do dano estético com o dano moral.

A corrente que nega a cumulação das indenizações é a corrente minoritária. De acordo com os juristas que defendem a proibição de cumulação, o conceito de dano estético estaria atrelado ao conceito de dano moral. Acreditam estes que o dano estético seria, na literalidade, uma lesão à beleza física da pessoa. Assim, esta deformidade física sempre acarretaria prejuízos de ordem moral e, às vezes, material, e por isso já estaria sendo englobada quando do alegado dano moral ou material.

Cabe salientar, todavia, que o posicionamento contrário à cumulação vem perdendo cada vez mais espaço em nosso ordenamento, pois o entendimento que prevalece nos dias atuais é o de que mesmo estando o dano estético compreendido no gênero dano moral, estes danos são passíveis de apuração em separado, pois tem causas inconfundíveis.

Para os que defendem a cumulação, o dano estético encontra-se vinculado ao sofrimento pela deformação com sequelas permanentes, facilmente percebidas, enquanto o dano moral está ligado ao sofrimento e todas as demais consequências nefastas provocadas pelo acidente.

O posicionamento em questão é compreensível uma vez que, se o dano estético materializa-se no aspecto exterior da vítima, enquanto o dano moral reside nas entranhas ocultas dos seus dramas interiores, por óbvio que o primeiro é visível por todos enquanto o dano moral é mais encoberto, onde poucos percebem. O dano estético fica no corpo a mostra, uma dor “pública”, já o dano moral caracteriza-se por uma dor mais privada.

Importante salientar que o próprio constituinte, quando especificou as três espécies de dano no art. 5º, V da Constituição (dano patrimonial, moral e à imagem) não incluiu o dano à imagem dentro do dano moral.

Há argumentos para ambos os posicionamentos, todavia, parece que é muito mais aceitável entender que o dano estético é uma espécie de dano moral sim, mas que deste é independente. Assim, a dor intrínseca e o abalo psicológico são indenizáveis a título de dano moral, e os reflexos visíveis no corpo da vítima devem ser indenizados a título de danos estéticos.

Contudo, essa discussão perdeu força por conta do C. Superior Tribunal de Justiça, em 2009 ter aprovado a Súmula nº 387 pacificando o entendimento a respeito da possibilidade da cumulação do dano estético e moral: “É lícita a cumulação das indenizações de dano estético e dano moral”. E, em que pese argumentos de a Súmula em questão não é Lei e nem ter força vinculante, porém, mostra que desde antes de 2009 o posicionamento dos Tribunais Superiores já vinha caminhando neste sentido.

Quanto à cumulação com os benefícios previdenciários. A indenização em razão do dano culposo ou doloso do empregador é de natureza diferente daquela paga pelo INSS, diferem quanto a sua natureza e destinação. Uma vez fixada a diretriz constitucional pela cumulação, ficou superada também a pretensão do empregador de compensar a parcela recebida pela vítima, ou seus dependentes, da Previdência Social, porquanto o deferimento de um direito não exclui, nem reduz o outro.

Assim os proventos recebidos mensalmente do INSS, pela vítima do acidente do trabalho ou por seus dependentes, não devem ser compensados ou deduzidos do valor da indenização por responsabilidade civil atribuída ao empregador.


1.5 CITÉRIOS PARA FIXAÇÃO DA INDENIZAÇÃO

Quanto à apuração do valor da indenização por danos morais, deve-se procurar assegurar ao ofendido o retorno da situação anterior à lesão, preferencialmente de forma específica ou mesmo in natura. O valor da indenização por dano moral tem sido fixado por arbitramento do juiz, de acordo com as circunstancias do caso, já que não existe, dispositivo legal estabelecendo parâmetros objetivos a respeito.

O valor da indenização por danos morais não obedece os mesmo critérios de pagamento aplicado aos danos materiais. Em vez de possibilitar um valor mensal na forma de pensão, deve-se arbitrar uma indenização para pagamento imediato, em parcela única, o que também é possível na indenização por danos materiais, por força do quanto disposto no parágrafo único do Art. 950 do Código Civil.


Art. 950. Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização, além das despesas do tratamento e lucros cessantes até ao fim da convalescença, incluirá pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu.
Parágrafo único. O prejudicado, se preferir, poderá exigir que a indenização seja arbitrada e paga de uma só vez.

Assim podemos afirmar que, não há parâmetros ou limites normativos para estipular o valor da indenização por dano moral e estético, ficando ao prudente arbítrio do juiz a sua fixação, diante das especificidades do caso concreto.

Quanto ao cálculo da pensão mensal vitalícia prevista no artigo 950 do CC. Sendo reparatória a natureza jurídica da pensão, a sua base de cálculo deve ser apurada considerando os rendimentos que a vítima percebia.

O cálculo da indenização tem como objetivo restaurar, do ponto de vista material, a situação existente antes do acidente, e a capacidade laboral anterior, ora diminuída. Para atingir esse propósito, a apuração do quantum da pensão deverá retratar com lealdade os ganhos que efetivamente o acidentado auferia.

Para a fixação de qualquer quantum indenizatório, deve-se ter em mente o princípio da restitutio in integrum (danos materiais), bem como a função compensatória (danos morais).

Na quantificação do dano moral, há que se estar atento para a finalidade do instituto que é garantir o direito da vítima de ser reparada, sem que isso lhe proporcione um enriquecimento ilícito. De outro lado, não se pode esquecer que a fixação da condenação deve se dar de forma a apenar o autor da conduta ilícita para que ele não se veja estimulado a reincidir no ato diante da insignificância da condenação.

1.6 BIBLIOGRAFIA

GONÇALVES, Carlos Roberto, Direito Civil Brasileiro, Responsabilidade Civil, Volume 4, Ed. Saraiva, 7ª. edição, 2012;
MARTINS, Sérgio Pinto, Direito do Trabalho, 29ª. Edição, 2012, Editora Atlas;
NASCIMENTO, Amauri Mascaro, Direito do Trabalho, 26ª. Edição, 2011, Editora Saraiva;
SAAD, Eduardo Gabriel e outros, CLT Comentada, 45ª. edição, 2012, Editora LTr;
SAAD, Eduardo Gabriel e outros, CLT Comentada, 2014, 47ª. edição, 2014, Editora LTr, e-Book;
THEOTONIO NEGRÃO e outros, Código de Processo Civil, 44ª. edição, 2012, Editora Saraiva;
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm
Fonte: http://www.tst.jus.br/consulta-unificada

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Sobre a autora
Idinéia Perez Bonafina

Advogada Trabalhista/Inscrita nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional de São Paulo desde 1992, Especialista em Direito do Trabalho pela COGEAE/PUC-SP, Especialista em Direito de Família e Sucessões pela ESA/OAB-SP, Associada da AATSP – Associação dos Advogados Trabalhistas de São Paulo; Membro da Comissão da Mulher Advogada da OAB-SP, Sócia do Escritório Simas, Passos & Perez Sociedade de Advogados.

Informações sobre o texto

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