Evolução penal

26/07/2015 às 20:14
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O espirito liberal da revolução francesa consistiu no principal fator de incentivo para o fim das penas cruéis, uma vez que influenciou no sentido do abrandamento das legislações.

RESUMO

O presente artigo tem como objetivo apresentar e demonstrar como evoluiu o Direito Penal e suas sanções no decorrer do tempo e como o desenvolvimento das sociedades ou agrupamentos sociais influenciou na evolução e na modificação das penas a serem aplicadas aos crimes, desde o inicio com a religião permeando-o, até os dias atuais. O direito está presente na maneira de organização social desde os primórdios da humanidade, mesmo não sendo registrado em documentos no período anterior ao surgimento da escrita e tendo suas tradições, costumes e regras transmitidas oralmente entre os membros dos grupos, não tendo uma única vertente ou um que influenciasse mais por haver diferentes costumes. Fase compreendida no Brasil no período pré-colonização onde os índios viviam de acordo com suas regras tribais, existindo desde pena de morte há açoites para crimes menos graves, variando também de acordo com a tribo a que pertencia, não tendo influenciado o Direito Penal brasileiro pelo fato de ter sido colonizado por um país europeu. Abordará ainda o período marcado pelas vinganças divina, privada, limitada e pública, que em seu princípio não distinguia crime de pecado pela forte influencia religiosa dentro do Direito, misturando-se a moral e religião, até o período publico onde o Estado passa a intervir na solução dos delitos se tornando o responsável pela aplicação das sanções aos infratores penais. Com o desenvolvimento social, mesmo ocorrendo certa regressão com o Direito Canônico e com o Direito Germânico com aplicação de Ordálias, àqueles que não podiam cumprir com as penas pecuniárias, ou quando acreditavam que a divindade ficaria ao lado de quem fosse inocente, fazendo assim com que sobrevivesse a essas torturas chamadas de punição, começando a se perceber que penas mais humanas e com intuito de reabilitar o criminoso para que retornasse a vida em sociedade seriam mais eficazes ao invés de infligir sofrimento, causar lesões corporais graves ou até mesmo dizimar grupos inteiros. A atual Constituição Federal brasileira, de 1988, traz no texto do inciso XLVI do artigo 5° as espécies de penas que poderão e deverão ser adotadas pelos demais ordenamentos jurídicos, sendo elas possíveis nas formas de privação de liberdade, restrição de direitos, pagamento de multas, perdas de bens e prestação social alternativa. Já no inciso seguinte do referido artigo proíbe, explicitamente, a adoção de penas cruéis que inflijam sofrimento físico ao transgressor, assim como, sanções de banimento, de trabalhos forçados ou que possuam caráter perpétuo. Sendo aceita a pena de morte apenas em caso de guerra. A declaração dos Direitos Humanos trouxe uma preocupação maior com o respeito à dignidade da pessoa, garantindo assim, que ninguém será maltratado mesmo que seja um delinquente.

Palavras-chave: Evolução Penal. Regimes de detenção e privação. Penas do ordenamento brasileiro.

1.0        INTRODUÇÃO

As penas sofreram mutações durante o decorrer dos anos, desde que o homem surgiu na terra é possível dizer que existe direito e consequentemente o direito penal também se fez presente. Com a tradição e costumes sendo passados de um a outro membro do grupo social por meio da oralidade, passando pelo período das vinganças e por fim chegando à fase de humanização do direito.

Após a ditadura militar que durou 21 anos no Brasil, a Constituição Federal de 1988 trouxe a proibição de penas cruéis, que obrigassem qualquer delinquente a banimento do território nacional, a realizar trabalhos forçados e qualquer sanção de caráter perpetuo.

O presente artigo tem como objetivo trazer a evolução histórica das penas e do próprio Direito Penal, desde seu início na pré-história quando ainda não havia registros escritos das leis que regiam a ordem social de cada agrupamento até o presente momento.

Contribuirá com o esclarecimento, fatos históricos e apontamentos de legislação que demonstrem a aplicação das penas atuais, dessa forma concluir o desenvolvimento social que o país teve no decorrer do tempo.

Este artigo se trata de uma pesquisa bibliográfica, pois as informações que servirão de base para o conteúdo apresentado serão encontradas em livros, revistas e outras fontes de pesquisa de cunho bibliográfico.

Trata-se do levantamento de toda a bibliografia já publicada em forma de livros, revistas, publicações avulsas em imprensa escrita. Sua finalidade é colocar o pesquisador em contato direto com tudo aquilo que foi escrito sobre determinado assunto com o objetivo de permitir ao cientista o reforço paralelo na analise de suas pesquisas ou manipulação de suas informações. (LAKATOS E MARCONI, 2001, p. 43-44),

3.0        DESENVOLVIMENTO DA PESQUISA

3.1         Pré-história penal: Direito Penal pré-histórico e Direito Penal brasileiro

Da mesma maneira que não se pode apontar exatamente o momento do surgimento do homem, não há como afirmar corretamente quando o direito se fez presente, mas pode se dizer que ambos nasceram juntos, já que o homem sempre viveu em agrupamentos sociais visando segurança onde era necessário ao menos um conjunto, mesmo que mínimo, de regras.

Nesse período as regras eram transmitidas de maneira oral e se mantinham conservadas pela tradição alimentada pelo grupo, por esse motivo os direitos eram numerosos e variavam de acordo com o agrupamento. Ainda existia a impregnação da religião havendo uma confusão entre moral, religião e direito. Já no Brasil, o Direito pré-histórico ou primitivo pode ser considerado durante a fase pré-colonização, quando ainda vigoravam as leis e os costumes indígenas.

Ao tempo do descobrimento, nossos índios não apresentavam o mesmo estagio civilizatório de outros povos da América, como os Astecas, os Incas, ou os Maias. Encontravam-se em verdade, bem próximos da idade da pedra lascada. (PIERANGELI, p. 41, 2001).

Como os relatos sobre esse período são um tanto quanto contraditórios, até mesmo pela grande variedade de agrupamentos, trazem registros de bárbaros e canibais, assim como de um povo dócil e sem vícios. Os primeiros habitantes brasileiros conheceram diversas formas primitivas de sanções, desde a vingança divina a composição.

A pena de morte também existia entre os indígenas, como não podia deixar de ser, e era geralmente executada com o uso do tacape. A execução da pena capital, todavia, às vezes era feita com crueldade, pois sepultavam-se as pessoas vivas, especialmente crianças, e outras vezes recorria-se a venenos, ao enforcamento e ao afogamento. A prisão, como pena, era desconhecida, existindo somente como estágio de recolhimento daquele que recebera a pena capital, principalmente os inimigos da tribo capturados em operações de guerra. Aplicavam-se, também, castigos com açoites aos membros do grupo, pela pratica de faltas menos graves. (PIMENTEL, p. 128 1983).

3.2      Surgimento da escrita, Vingança Privada, Divina e Pública

Com o surgimento da escrita, muda-se a forma de entender e estudar o direito, podendo-se encontrar documentos e códigos já escritos ao invés de tradições orais repassadas a cada membro do agrupamento. Os documentos jurídicos mais antigos datam de aproximadamente 5.000 anos, egípcios e mesopotâmicos, que relatam atos da vida cotidiana, como contratos, decisões de magistrados testamentos.

O código mais antigo que se conhece hoje é o de Ur-Nammu, fundador da terceira dinastia de Ur por volta de 2.000 a.C. Já o mais conhecido e citado é o código de Hamurabi, composto por 282 artigos com varias disposições criminais.

Sob forte influência sacral, talvez por não conhecer seus próprios limites e não entender sequer os fenômenos naturais que ocorriam, o homem atribuía todos os fatos a seres sobrenaturais que o premiava ou castigava de acordo com as ações que tinham. É nesse período do desenvolvimento humano que surgem os totens, que eram as materializações das entidades nas quais acreditavam, geralmente com formas de animais. A violação desta obediência, comungada pelos integrantes do grupo, era severamente punida, pois se acreditava que, se passasse sem resposta, poderia despertar a ira da divindade.

É dessa época também que surgem os chamados tabus, proibições ou vedações de atos ou comportamentos que os integrantes do grupo não podiam descumprir.  As infrações totêmicas ou as desobediências ao tabu eram de índole coletiva, buscando acalmar a fúria dos deuses, assim, todos deviam participar da punição para que assim, não existisse vingança sobrenatural.

O homem também fazia justiça pelas próprias mãos, à vingança privada é marcada por  reações violentas, em sua grande maioria exageradas e desproporcionais. Eram impostas penas como a perda da paz e vingança de sangue. A primeira era a sanção contra o membro do próprio grupo, onde ocorria  o banimento do convívio com seus pares deixando-o a mercê dos inimigos.

Já a vingança de sangue era a pena aplicada aos integrantes de grupos rivais. Dava – se inicio uma guerra entre os agrupamentos sociais, pois as reações eram desordenadas e gerava um ciclo infindável em que cada resposta existia ainda mais sangue e rancor o que acabava por dizimar grupos inteiros.

Após um processo civilizatório, surge a necessidade de existir proporcionalidade e equilíbrio entre o crime e a aplicação da pena. Nesse período isso ocorria através do talião, que de acordo com Garcia (2008) é um processo de justiça em que o mal praticado por alguém devia corresponder, tão exatamente quanto possível, um mal igual e oposto. O vocábulo latino “tálio” é afim de “talis” (tal).

A expressão que simboliza o talião é a famosa frase “olho por olho, dente por dente”. Era uma forma rudimentar de proporção entre mal e castigo, mas trouxe uma conquista para o direito penal. A partir desse período a pena começa a ser proporcional e individual, alcançando apenas o delinquente e não os demais que lhe eram solidários. Mas ate mesmo o talião trazia alguns inconvenientes.

É fácil pensar nas consequências nefastas para os grupos tribais, ocorrendo sucessivas mortes ou mutilações, por força das retaliações de ofensas. Olho por olho, o resultado era a cegueira parcial de duas pessoas. Braço por braço, aa consequência era a invalidez de dois homens, enfraquecendo-se o grupo frente aos inimigos externos. (PIMENTEL, p. 122, 1983).

O talião acaba por ser substituído por outros processos de justiça, como a troca do ofensor por um escravo e, posteriormente, a composição pecuniária, oferecimento de uma compensação pelo mal produzido. Ao realizar a introdução da composição como sanção, acentuava- se a intervenção estatal e seu poder.

As organizações sociais começam a se desenvolver e a se tornar cada vez mais complexas, tornando as formas de punição apresentadas pelas vinganças divina e privada inadequadas e obsoletas. Nesse período o Estado passa a intervir como o único responsável e legitimado a impor penas criminais. Isso acaba por lhe garantir e assegurar a integridade territorial, politica e social de seus súditos.

A pena publica garantia a existência do próprio Estado, figurando, desde o inicio deste período e por boa parte dos séculos que se seguiram, como um dos mais graves crimes, o de lesa-majestade - por representar uma agressão ao soberano e á sua divina autoridade.

3.3        Direito Romano, Germânico e Canônico – Direito Penal na idade média

A história de Roma é dividida em três frases com base nos regimes políticos existentes no país, sendo eles: a Monarquia, a República e o Império.  O ultimo dividido em alto e baixo império. Tendo a evolução jurídica subdivida em épocas: Antiga, Clássica e do Baixo Império.

A época antiga tem como características o direito arcaico, primitivo, próximo ao da pré-história do Direito Penal, ou seja, haviam poucos registros escritos, vasta diversidade de regras de acordo com as famílias e clãs, com sua preservação através dos costumes. É desse período que data a Lei das Doze Tabuas, o texto legal mais antigo do ocidente. No tocante a matéria penal, o que vigorava era a vingança privada, tendo como responsável pela aplicação das sanções a própria vitima ou sua família. O Estado intervia apenas em situações de maior gravidade, como no delito de traição. Existiam alguns preceitos relacionados ao talião e composição.

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É na época clássica que se começa a identificar uma ciência jurídica coerente racional, onde o direito era fixado predominantemente por juristas. Nesse momento surge a Summa Divisio entre os ramos do Direito em público e privado, com textos jurídicos numerosos e aprofundamentos dos estudos dedicados à compreensão das leis e dos costumes. Segundo Glissen (2002), os escritos dos jurisconsultos, pelos comentários às leis existentes e pelo modo como supriam lacunas, podem ser consideradas a primeira construção de uma verdadeira ciência do Direito.

Com  o domínio do absolutismo imperial e a influencia do cristianismo, no período do Baixo Império surgem as primeiras codificações com intuito de representarem uma compilação das leis editadas. No império oriental, sob domínio de Justiniano, recolheram-se sob um corpo as fontes antigas do Direito Romano colocando-as em harmonia com as leis da época, tendo como resultado o trabalho intitulado Corpus Juris Civilis. É deles o mérito de retirar o direito das mãos dos deuses, trazendo a punição para o plano terreno.

Esse foi um período de maior desenvolvimento dos sistemas de punição. É formado principalmente pelas decisões, onde o delito não recebe mais o mesmo conceito de pecado. Nesse momento os crimes são separados entre dolosos e culposos, ou seja, começa-se a analisar se o crime ocorreu com intenção ou não.

Muitos de seus conceitos ainda são aplicados no Direito Penal atual, sendo alguns deles:

- Erros;

- Culpa e Dolo;

- Imputabilidade;

- Coação irresistível;

- Agravantes e atenuantes;

- Legitima defesa;

- Estado de necessidade.

Assim como a estipulação de penas legalmente aceitas, como:

- Suplicium (execução);

- Danum (lesões);

- Poena (penas em dinheiro).

O Direito Romano efetivou o processo penal possibilitando a participação da vitima, de defensores e acusadores capazes de produzirem provas. Estipulou a fase recursal.

A Idade Média é constituída por dois grandes períodos: a alta idade média, que se estende dos séculos V a IX, é marcada pelos direito romano e germânico, bem como pela formação e desenvolvimento do direito canônico; e a baixa, dos séculos IX a XV, pelo direito feudal e pelo renascimento do direito romano nas universidades. Podemos, pois, vislumbrar esse momento histórico embasado na vigência de quatro grandes ordenamentos jurídicos: um direito de povos germânicos; o direito oriundo da organização eclesiástica, chamado de direito canônico; o direito feudal; e um processo de sobrevivência e renascimento do direito romano.

A organização jurídica dos povos germânicos; o direito canônico e as formações jurídicas eclesiásticas; o direito feudal; o renascimento do direito romano e a formação das universidades e da cultura do ensino jurídico; os significados do medievo para a construção da modernidade; e, por fim, as conexões e genealogias da idade média na formação do direito penal moderno, a partir de uma contribuição de Michel Foucault.

Fruto de um processo de descentralização política, a Europa medieval e a antiga organização política romana tiveram seus territórios invadidos por uma multiplicidade de povos, a quem os romanos designaram bárbaros. Tais povos, mais conhecidos e melhor designados por germânicos caracterizavam-se por se encontra em um período anterior de desenvolvimento sócio-econômico-cultural. Era povos ligados a terra, não tinham desenvolvido a escrita, não tinham organizações territoriais ou políticas. Seu principal elemento desorganização social eram as famílias, baseadas na autoridade do pai.

Quanto ao seu direito, devido à pequena centralização e uniformidade, tinham formações jurídicas calcadas na oralidade e no costume, com cada tribo dispondo de uma tradição própria, tal é a característica de direito consuetudinário. No entanto, tais povos dominantes nos primeiros momentos do período medieval, mantiveram um princípio de pessoalidade das leis, não impondo seu direito sobre os diferentes povos, que mantiveram o estatuto de suas tribos de origem, o que também permitiu uma sobrevivência do direito romano.

Essa fase do direito é o inicio do conceito do direito positivado, ou seja, das leis escritas, do ordenamento jurídico. O crime era visto como ação contraria ao sistema.

As penas aplicadas nesse período as pecuniárias, em outras palavras, as sanções eram pagamentos de multas, caso o criminosos não pudesse pagar as penas pecuniárias eram substituídas por penas de torturas corporais.

O Direito Canônico classificou os delitos e estabeleceu regras processuais, também passou a aplicar penas mais brandas vinculadas ao crime cometido. Os crimes eram separados pelo teor, ou seja, se fossem crimes contra a igreja ou laicos. Eram divididos da seguinte maneira:

- Crime: Delicta eclesiástica. Pena: religiosa – penitencia. Julgador: tribunal religioso.

- Crime: Delicta mere secularia. Pena: comum. Julgador: tribunal comum.

- Crime: Delicta mixta. Pena: penitencia ou comum. Julgador: tribunal que primeiro soube do crime.

São criadas as penitenciarias, lugares de condições sub-humanas onde se deixava os criminosos presos no fundo de cavernas insalubres. No período da inquisição presava-se a aplicação de penas no combate ao hereges e apóstatas. Para conseguir atingir esses objetivos era realizados julgamentos sem critérios legais e a aplicação de torturas.

Pode-se dizer que a base do Direito Penal medieval se dá com os direitos Romano, Germânico e Canônico, vindo desde ultimo os primeiros passos dados em direção à humanização das penas. Esta passava a ser vista como expiação, vem dai o motivo para a substituição da pena de morte pela restrição de liberdade, isto é, com conservação da vida do agente, permitia-se que se regenerasse por meio da penitencia.

Um valor externo e quase absoluto era dado à confissão, pois essa etapa era necessária para que o réu demonstrasse seu real arrependimento. Essa era exigida a qualquer custo, incluindo o emprego de tortura para que o objetivo fosse alcançado, o que hoje são conhecidos como os excessos cometidos durante a inquisição.

Dessa forma, O Direito Penal dessa época é caracterizado pela fusão entre Estado e Religião, que promoveu intensamente o arbítrio judicial quase ilimitado, seja na definição de crimes como na aplicação das penas, o que impregnou a justiça com uma aura de incerteza, insegurança e terror.

3.4        O Direito Penal na idade moderna

A idade moderna trouxe consigo a transição fundamental para o Direito Penal. Este enquanto esteve sob os alicerces do absolutismo era caracterizado pela difusão e imposição do terror, que com o passar dos tempos tornasse mais humano. É inerente desse período também que os países começam a formar um conjunto de normas uniformes, como no caso de Portugal, colonizador brasileiro, que criam as Ordenações do Reino português – Afonsinas, Manuelinas e Filipinas.

Vigoravam as Ordenações Afonsinas na época do descobrimento, sendo substituído 74 anos depois pelas Ordenações Manuelinas muito semelhantes à primeira. Porém, até 1530, a justiça penal brasileira se fazia ao arbítrio dos titulares das capitânias, chegando a obter do governo português autorização para julgar e processar sem apelações, podendo ser aplicada a pena capital.

O Código Manuelino vigorou em terras brasileiras por pouco mias de 80 anos, sendo substituída pelas Ordenações Filipinas, esta tendo sua parte penal. Vigendo por mais de 200 anos, chegando a se estender até 1830, ano da promulgação do Código Criminal do Império, a primeira legislação penal propriamente dita do Brasil.

Tais ordenações eram ainda o reflexo da legislação arcaica, isto é, refletiam o “Direito Penal do terror”, do qual se utilizava em grande escala penas cruéis.  Assim, a morte era a modalidade penal mais comum entre as sanções, combinadas com penas de caráter corporal, como acoites e mutilações. Exemplo disso, são as quatro formas de aplicação da pena capital que as Ordenações Filipinas traziam: Morte natural cruelmente; morte natural de fogo; morte natural e morte natural para sempre.

A morte natural cruelmente se dava a partir do cortejo das antigas execuções, dependendo da crueldade do executor e dos caprichos do juiz, que possuíam arbítrio de decisão. Enquanto a de fogo, consistia na queima viva do réu. A morte natural se baseava na expiação do crime resultante dela o enforcamento do condenado no pelourinho. Já a ultima modalidade, morte natural para sempre, tinha como modo de execução o enforcamento do sentenciado, onde morria e ficava pendente até cair podre sobre o solo não era sepultado e sim tinha seus ossos soterrados no dia de finados.

A ideia de humanização e busca por justiça é incutida no pensamento filosófico do Direito Penal, Influenciado pelo ideal iluminista, no final do século XVIII, com destaque a publicação da obra de Cesare Bonessana, o Marques de Beccaria, intitulada de Dos delitos e das penas. O autor postulava a distribuição da “mínima felicidade dividida pelo maior numero”, advertindo que: “Um dos maiores freios dos delitos não é a crueldade das penas, mas sua infalibilidade. [...]. A certeza de um castigo, mesmo moderado sempre causará mais intensa impressão do que temor de outro mais severo, unido à esperança da impunidade”. (BECCARIA, p. 87, 2002).

No Brasil, a reflexão das penas humanitárias de Beccaria, fez-se sentir no Código Criminal do Império de 1830 que tinha sua parte geral divida em duas: a primeira denominava-se “dos delitos” e a segunda “das penas”.

3.5        Códigos Penais brasileiros: Direito Penal Positivo

As Ordenações portuguesas foram os primeiros diplomas jurídicos que o Brasil possuiu, estas traziam os resquícios arcaicos do Direito Penal. As ultimas a vigorarem em território nacional foram as Filipinas, que como suas antecessoras em matéria criminal, traziam como características a busca de promover a intimidação pelo poder, a confusão do crime com moral e pecado, imposição de penas cruéis, assim como algumas podiam ser aplicadas com total arbítrio do julgador, existia  a desigualdade entre os delinquentes, inexistência de uma parte geral e a aglutinação de normas penais e processuais.

Sob as luzes do iluminismo, buscando um marco para simbolizar uma ruptura com a dominação colonial, entra em vigor no ano de 1830, o primeiro Código Criminal do país, tirando assim a legislação da “idade das trevas”, a adaptando-se às ideias da “idade das luzes” que se formulavam a época.

Começavam a surgir os grandes movimentos de renovação das ideias jurídicas e politicas A obra dos enciclopedistas francesas prega a filosofia politica do individualismo. A revolução francesa universaliza os direitos do homem e do cidadão. Nesse clima de inquietação espiritual afirmava-se a autonomia do individuo contra todas as formas de opressão. E, como é, justamente, no campo do direito penal, que mais vivamente repercutem as ideias politicas, não poderia ele furta-se a influencia das reformas e revoluções que estas prenunciavam e promoviam. Os estadistas brasileiros do 1° Império também sentiram a inquietação e se prepararem para dotar o país com as leis que a sua nova estrutura social e politica exigia, de modo que os fatos encontrassem, em ordenamento jurídico mais adequado, as condições que propiciassem o desenvolvimento pacifico do país e as manifestações do espirito e das peculiaridades nacionais. (MARTINS, p. 96, 1957).

A Constituição Outorgada de 1824, consagrou princípios penais que eram incompatíveis com o Código Filipino, foi prodiga na previsão de direitos e garantias aos cidadãos brasileiros presentes em seu art. 179. Foi Sob tais influencias, como cumprimento do comando constitucional inserido no inciso XVIII do dispositivo citado, o Código Criminal de 1830 foi promulgado, esse fora resultado de dois projetos, um de Bernardo Pereira de Vasconcelos -  o que prevaleceu -, e outro de José Clemente Pereira, considerado inovador à época.

Entretanto, como toda obra humana, a legislação apresentava falhas, tais como: a falta de definição de culpa, a desigualdade no tratamento do escravo, a ausência de separação entre igreja e estado e a previsão da pena de morte e da pena de galés – com fundo cruel.

Dividido em quatro partes: I que tratava dos crimes e das penas; II dos crimes públicos; III dos crimes particulares; e a IV que cuidava dos crimes policiais. Atualmente, essas correspondem a parte geral, especial e as definições de contravenções, respectivamente. Como já mencionado, a primeira parte recebera grande influencia de Beccaria.

No que dizia respeito à função do Direito Penal, o Código refletia o pensamento dominante em boa parte, a sociedade era vista como um conjunto de sujeitos que deveriam obedecer, obrigatoriamente, à autoridade, tendo o delito como representação de um ato de desobediência, sendo que seu fator decisivo era a atitude interior de rebeldia, embora por meio de uma legislação mais humanitária e equitativa.

Após a proclamação da República, em 1889, viu-se a necessidade de uma reformulação no direito positivo nacional, ocorrendo a reforma, primeiramente, do Código Penal em 1890 e somente no ano seguinte a modificação constitucional. Tratava-se de outros tempos para o país, pois havia se consolidado como nação já não dependendo da Igreja Católica, justificando a separação entre Estado e Igreja. Sua forma de governo fora alterada, a escravatura abolida, excluindo o sentido de se manter as disposições que conferiam tratamento diferenciado aos escravos e homens livres. Mas tais alterações vieram rápido demais, sem uma reflexão e maturação, tornando o então Código Penal alvo de criticas acidas.

Isso ocasionou uma serie de defeitos na legislação, assim que entrou em vigor sofreu tentativas de mudanças. Com seu antecessor era, também, dividido em quatro livros: I dos crimes e das penas, II dos crimes em espécie: III das contravenções em espécies e IV disposições gerais.

Ao tempo da elaboração do “Código da República”, na Itália, realizavam-se esforços para ditar um Código Penal unitário, e o Código de 1889, como espirito clássico, influenciou na reforma brasileira. Percebia-se na estrita proporcionalidade entre delito e pena e em sua determinação quase absoluta, a influencia da Escola Clássica como sua fonte suprema de inspiração.

Elaborado na vigência da  Constituição de 1937, conhecida como “Constituição Polaca”, entra em vigor no dia 1° de janeiro de 1942 um novo Código Penal, o Decreto-lei n. 2.848 de 07 de dezembro de 1940, projeto do jurista Alcântara Machado. o atual Código pode ser qualificado como eclético, pois traz a conciliação entre o pensamento clássico e o positivismo.

Atribuía assim, ao Direito Penal no contexto legislativo, finalidade retributiva e preventiva, isso pode ser demonstrado na adoção do sistema binário, a aplicação de medidas de segurança aos casos de crime impossível e a participação impunível, Caracterizando, dessa forma, a evolução do Direito Penal e de suas sanções em âmbito nacional.

3.3      Penas aplicadas pelo ordenamento brasileiro atual

            Uma das modalidades penais elencadas pela Constituição Federal em seu art. 5º, XLVI é a pena privativa de liberdade adotada pelo Código Penal de 1940, subdividida em reclusão  detenção. A primeira é prevista para infrações de maior gravidade, como, por exemplo, o crime de homicídio. Enquanto a detenção é prevista para infrações menos graves, como crimes contra a honra. Assim, a reclusão tem um regime mais severo que a detenção. Existe ainda, a prisão simples para as contravenções penais.

            Com essa subdivisão surgem diferenças entre os delitos apenados com reclusão e os apenados com detenção. O regime inicial de cumprimento de pena na reclusão pode ser o fechado, o semiaberto ou o aberto, enquanto na detenção o regime já se inicia no semiaberto ou diretamente no aberto.

            No caso da medida de segurança, aplicada aos inimputáveis ou semi-imputáveis por doença mental, deverá ser como internação para os crimes praticados apenados com reclusão e podendo, dar-se em sistema de tratamento ambulatorial quando ocorrer infrações apenadas com detenção.

            Caso ocorra a punição por dois crimes, um reclusivo e outro detentivo, por ser mais grave o delito apenado com reclusão, a pena cumprida primeiramente será a reclusiva. Prioridade prevista na parte final do art. 69º “[...] no caso de aplicação cumulativa de penas de reclusão e detenção, executa-se, primeiro aquela”. E também no seu art. 76º “no concurso de infrações, executar-se-á primeiramente a pena mais grave”.

            O art. 6º da lei de contravenções penais, decreto lei nº 3.688, datado de 3 de outubro de 1941, traz as regras para a prisão simples, adotadas nos casos de contravenções. A pena de prisão simples só pode ser cumprido nos regimes semiaberto e aberto, sendo vedada a regressão de regime ao fechado sob qualquer fundamento. Devendo ser cumprida sem rigor penitenciário, tendo o sentenciado que cumprir pena em separado dos condenados por crimes, tendo a faculdade de escolher trabalhar quando a pena não superar 15 dias.

 Art. 6º A pena de prisão simples deve ser cumprida, sem rigor penitenciário, em estabelecimento especial ou seção especial de prisão comum, em regime semiaberto ou aberto.

§ 1º O condenado a pena de prisão simples fica sempre separado dos condenados a pena de reclusão ou de detenção.

§ 2º O trabalho é facultativo, se a pena aplicada, não excede há quinze dias. (decreto-lei nº 3.688, LEI DE CONTRAVENÇÕES PENAIS, 1941).

            No decorrer do desenvolvimento do histórico da pena privativa de liberdade diversos sistemas foram adotados. Como, por exemplo, o sistema do Filadélfia, adotado em 1775 na prisão de Walneir Street Jail. Esse sistema tem como característica o isolamento do preso em sua cela para que este pudesse refletir e se arrepender dos atos praticados, sem contato com outros presos.

            Em 1816, no Estado de Nova York - EUA surge o sistema de Auburn que mantinha o isolamento do preso em sua cela durante a noite e trabalhando em silencio na companhia de outros presos durante o dia. E havendo ainda o sistema progressivo inglês, que consistia em um cumprimento da pena em diversos estágios. Dessa forma havia progressão de um regime inicial mais rigoroso para outras fases mais brandas de acordo com os méritos do condenado tempo de pena. Este sistema progressivo consagrou-se no Brasil, já que o art. 33, §2º, do Código Penal estabelece que a pena deva ser executada de forma progressiva, de acordo com os méritos do condenado de um regime mais gravoso para outros menos rigorosos, sempre que cumpridas exigências legais.

Art. 33 - A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semiaberto ou aberto. A de detenção, em regime semiaberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado.

§ 2º - As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso.(CÓDIGO PENAL, 1940).

            As penas alternativas, formadas pelas restritivas de direitos de multa, têm como finalidade evitar a prisão do condenado, substituindo-a privação da sua liberdade por restrições, como, por exemplo, a perda de bens, interdições de direitos, limitação de fim de semana, de obrigações, como, prestação pecuniária, prestação de serviços á comunidade.

            Existem as penas restritivas genéricas e especificas, a primeira é assim chamada por poder ser aplicadas a todas as infrações penais desde que observadas às limitações legais, como, penas não superiores há quatro anos, crimes cometidos sem uso de violência ou grave ameaça. Enquanto as especificas só são cabíveis quando a condenação disser respeito a delitos que se revestem de características especiais.

O art. 43 do Código Penal traz expressamente em seus quais são as espécies de penas restritivas de direitos incisos, sendo elas: prestação pecuniária, perda de bens ou valores, prestação de serviço a comunidade ou a entidades publicas, interdição temporária de direitos, limitação de fim de semana. As penas restritivas de direitos são autônomas, podendo substituir as privativas de liberdade, conforme “caput” do art. 44 “as privativas de direitos são autônomos e substituem as privativas de liberdade quando: [...]” Também sendo precária, pois podem ser reconvertidas em penas privativas de liberdade no juízo das execuções caso o sentenciado cometa alguma das transgressões previstas em lei.

            As prestações pecuniárias têm suas regras estabelecidas no art. 45, §1º do Código Penal, onde é estabelecido quem serão os titulares do pagamento, assim como os valores a serem pagos. Não se confunde com a multa, pois os valores desta são destinados ao fundo penitenciário e não são deduzidas de uma futura indenização a vitima.

Ocorre na perda de bens ou valores, o juiz estabelece na sentença os bens ou valores que considera perdidos. Esses bens ou valores são pertencentes ao condenado e são perdidos em favor do Fundo Penitenciário, tendo como teto o montante do prejuízo causado ou o proveito obtido pelo agente ou por terceiro em consequência da pratica do crime, baseado no que for maior.

Pode ainda, o condenado receber penas alternativas onde seja necessária a prestação de serviço a comunidade, tenha interdição temporária de direitos e ainda ocorra à limitação de fim de semana a primeira sanção consiste na atribuição de tarefas gratuitas em estabelecimentos assistenciais ao condenado, conforme art. 46, §§ 1º e 2º, do Código Penal. Já a interdição temporária de direitos consiste na proibição do exercício de determinados direitos pelo prazo correspondente ao da pena substituída.

No caso de limitação de fim de semana o condenado tem de ficar, necessariamente, por 5 horas diárias aos sábados e domingos em casa do albergado ou outro estabelecimento adequado.

A pena de multa, como citado anteriormente, tem seu valor destinado ao Fundo Penitenciário. É uma sanção de caráter patrimonial. A multa se subdivide em Originária e substitutiva, a primeira é abstrata descrita de forma isolada, cumulativa ou alternativa com a pena privativa de liberdade.

A pena de multa de substitutiva é aplicada em substituição a uma pena privativa de liberdade quando fixada na sentença um montante não superior que 1 ano e que o réu não seja reincidente em crime doloso, sem uso de violência contra a pessoa ou grave ameaça.

4.0       CONSIDERAÇÕES FINAIS

Penas ou sanções penais tem como principal finalidade a prevenção da prática de ilícitos penais, mas torna-se meio de readaptação daqueles  indivíduos que, mesmo com todas as tentativas de evita-los previstas em lei, cometem tais infrações para que possam retornar ao convívio em sociedade.

Com a evolução da humanidade e, por consequência, seu desenvolvimento social, as penas também passam por um processo evolutivo e de aprimoramento quando se começa a perceber que, sanções que inflijam sofrimentos físicos em detrimento de desobediências totêmicas, ou ainda aquelas que coloquem em guerra grupos inteiros ocasionando seu fim, não são mais eficazes como deveriam ser.

O fato de tirar das mãos de particulares o direito de exercer punições ou sanções um contra os outros, torna-se uma maneira de assegurar uma penalização humana e justa quando passada ao poder do Estado, isto é, ao invés de dizimar um grupo todo tendo a sanção ao alcance de todos os membros, ou causar deficiências e inutilização de seus componentes, aplica-se uma pena individual e proporcional ao delito cometido visando à recuperação do delinquente, reabilitando-o para a vida em sociedade.

REFERÊNCIAS

BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. Tradução de Vicente Sabino Jr. São Paulo: CID, 2002.

BRASIL. Constituição Federal de 1988. TÍTULO II Dos Direitos e Garantias Fundamentais. CAPÍTULO I DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS.

BRASIL. Decreto-lei n° 2.848 de 7 de dezembro de 1940. Código Penal – Capitulo I das espécies das penas.

BRASIL. Decreto-lei n° 3.688 de 3 de outubro de 1941.  Lei das Contravenções Penais.

GARCIA, Basileu. Instituições de direito penal, 7° ed. São Paulo: Saraiva 2008. V. I t. I (Serie Clássicos Jurídicos).

MARTINS, José Salgado.  Sistema de direito penal brasileiro. Rio de Janeiro: José Konfino Editor, 1957.

MARCONI, M. de A.; LAKATOS, E. M. metodologia do trabalho cientifico. 5 ed. rev. Ampl. São Paulo: Atlas, 2001.

PIERANGELI, José Henrique. Códigos penais do Brasil: evolução histórica. 2° ed. São Paulo: Saraiva 1989.

PIMENTEL, Manoel Pedro. O crime e a pena na atualidade. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1983.

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