Partes, curador especial, pessoas casadas em juízo e deveres das partes em juízo: estudos comparativos no CPC em vigor e no novo CPC

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09/08/2015 às 23:35
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O presente artigo colima uma análise sucinta e precisa sobre partes, curador especial, pessoas casadas em juízo e deveres das partes em juízo com base nas previsões do CPC em vigor e o novo CPC.

  1. A MATÉRIA NO CPC EM VIGOR
    1. Partes

Todas as pessoas, físicas e jurídicas, e até entes despersonalizados possuem capacidade de ser parte em uma ação judicial.

Importante não confundir a capacidade de ser parte, genérica e possível a todos sem restrições, com a capacidade processual. Diz o art. 7º do CPC:

Art. 7º. Toda pessoa que se acha no exercício dos seus direitos tem capacidade para estar em juízo.

Assim sendo, os incapazes, sem plena capacidade de gerir a própria vida, não tem capacidade processual. Eles possuem capacidade de ser parte, mas, para litigarem em juízo, carecem do devido representante legal (no caso de incapacidade absoluta) ou assistente (no caso de incapacidade relativa).

Conforme exposto no princípio desta matéria, entes despersonalizados também podem figurar como partes em litígios. Embora não tenham personalidade jurídica, podem possuir direitos e obrigações, de maneira que devem ser aceitos em juízo.

Alguns exemplos de entes despersonalizados:

  1. Massa falida;
  2. Espólio;
  3. Herança jacente ou vacante;
  4. Condomínio por edificações;
  5. Sociedades sem personalidade jurídica (ex: sociedades irregulares que pratiquem atividade comercial sem registro na Junta Comercial[2]);
  6. Nascituro.

Entes despersonalizados e pessoas jurídicas carecem de representação legal para figurarem em juízo. Regulando estes casos, o CPC, art. 12, prevê o seguinte:

Art. 12. Serão representados em juízo, ativa e passivamente:

I - a União, os Estados, o Distrito Federal e os Territórios, por seus procuradores;

II - o Município, por seu Prefeito ou procurador;

III - a massa falida, pelo síndico;

IV - a herança jacente ou vacante, por seu curador;

V - o espólio, pelo inventariante;

VI - as pessoas jurídicas, por quem os respectivos estatutos designarem, ou, não os designando, por seus diretores;

VII - as sociedades sem personalidade jurídica, pela pessoa a quem couber a administração dos seus bens;

VIII - a pessoa jurídica estrangeira, pelo gerente, representante ou administrador de sua filial, agência ou sucursal aberta ou instalada no Brasil (artigo 88, parágrafo único);

IX - o condomínio, pelo administrador ou pelo síndico.

§ 1º. Quando o inventariante for dativo, todos os herdeiros e sucessores do falecido serão autores ou réus nas ações em que o espólio for parte.

§ 2º. As sociedades sem personalidade jurídica, quando demandadas, não poderão opor a irregularidade de sua constituição.

§ 3º. O gerente da filial ou agência presume-se autorizado, pela pessoa jurídica estrangeira, a receber citação inicial para o processo de conhecimento, de execução, cautelar e especial.

  1. Curador Especial

O curador especial é figura prevista no art. 9º do CPC:

Art. 9º. O juiz dará curador especial:

I - ao incapaz, se não tiver representante legal, ou se os interesses deste colidirem com os daquele;

II - ao réu preso, bem como ao revel citado por edital ou com hora certa.

Alguns aspectos peculiares destacam-se na análise da figura do curador especial, também conhecido como curador à lide.

O réu preso em regime semiaberto ou aberto não carece de curador especial, bem como o réu preso que já tenha um advogado próprio. Só o réu preso sem advogado é que precisa de um curador especial.

O curador especial, nomeado pelo juiz, pode, se representar o réu, optar pela negativa geral, hipótese de defesa prevista no CPC, art. 302, parágrafo único.

O curador especial nomeado para defender o réu que não apresentar defesa no prazo legal não conduz à ocorrência de revelia. Se o curador não cumprir sua tarefa no prazo legal, sem justo motivo, poderá ser substituído, mas sofrerá as devidas sanções administrativas (se for advogado, pode existir ofício para a OAB abrir procedimento administrativo disciplinar contra o relapso advogado).

Uma grande polêmica envolve a necessidade ou não de nomeação de curador para o executado revel. Entendemos que esta polêmica resta superada com a Súmula 196 do STJ, que diz o seguinte: “Ao executado que, citado por edital ou por hora certa, permanecer revel, será nomeado curador especial, com legitimidade para apresentação de embargos”.

O curador especial não pode apresentar reconvenção, não pode fazer denunciação da lide, nomeação à autoria ou chamamento ao processo, não pode fazer transação. Sua atividade, quando defende o réu, limita-se à defesa.

A falta da nomeação de um curador especial implica em nulidade do processo se redundar em prejuízo para aquele que deveria ter em seu favor um curador nomeado.

  1. Pessoas casadas em juízo

Diz o caput do art. 10 do CPC:

Art. 10. O cônjuge somente necessitará do consentimento do outro para propor ações que versem sobre direitos reais imobiliários. (Redação dada ao caput pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)

Nas ações que versem sobre direitos reais imobiliários, o autor necessitará da chamada “outorga uxória”, ou seja, a autorização de seu cônjuge para o ajuizamento da ação.

Uma dúvida surge: a outorga uxória é exigida em todos os regimes? E no regime de separação absoluta de bens?

Sobre o tema, assim expõe Marcus Vinícius Rios Gonçalves[3]:

“ O novo Código Civil, que entrou em vigor em 11 de janeiro de 2003, manteve a exigência de outorga uxória, mas criou uma exceção: não há mais necessidade de o cônjuge obter a autorização do outro para o ajuizamento de ações que versem sobre direitos reais imobiliários quando o regime for da separação absoluta de bens (art. 1647, II).

Também merecem atenção especial os §§ 1º e 2º do art. 10 do CPC:

§ 1º. Ambos os cônjuges serão necessariamente citados para as ações: (Redação dada pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)

I - que versem sobre direitos reais imobiliários; (Redação dada ao inciso pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)

II - resultantes de fatos que digam respeito a ambos os cônjuges ou de atos praticados por eles;

III - fundadas em dívidas contraídas pelo marido a bem da família, mas cuja execução tenha de recair sobre o produto do trabalho da mulher ou os seus bens reservados;

IV - que tenham por objeto o reconhecimento, a constituição ou a extinção de ônus sobre imóveis de um ou de ambos os cônjuges.

§ 2º. Nas ações possessórias, a participação do cônjuge do autor ou do réu somente é indispensável nos casos de composse ou de ato por ambos praticado. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)

O §1º do art. 10 do CPC prevê um autêntico caso de litisconsórcio passivo necessário, de maneira que a ausência de citação de um dos litisconsortes necessários pode redundar em extinção do processo (CPC, art. 47, parágrafo único).

O art. 11 do CPC trata da hipótese de suprimento judicial do consentimento marital para ajuizamento de ações:

Art. 11. A autorização do marido e a outorga da mulher podem suprir-se judicialmente, quando um cônjuge a recuse ao outro sem justo motivo, ou lhe seja impossível dá-la.

Parágrafo único. A falta, não suprida pelo juiz, da autorização ou da outorga, quando necessária, invalida o processo.

O suprimento judicial, que deve ser obtido em processo de jurisdição voluntária, só será deferido se a recusa de autorização de um cônjuge para que o outro ajuíze ação real imobiliária seja completamente injustificada.

A ausência de autorização judicial é matéria que pode ser reconhecida de ofício ou mediante provocação do réu. Trata-se de pressuposto processual, ou seja, está ligado à validade do processo, de maneira que pode ser arguida pelo réu a qualquer tempo no processo.

  1. Deveres das partes e dos procuradores

A Lei 10.358/01 alterou a redação originária do art. 14 do CPC. Além de acrescentar um novo inciso (V), passou a atribuir obrigações não só às partes e procuradores, mas também a todos aqueles que participam no processo, sejam testemunhas, terceiros, servidores do Judiciário, peritos, o Ministério Público.

O art. 14 destaca o seguinte:

Art. 14. São deveres das partes e de todos aqueles que de qualquer forma participam do processo: (Redação dada pela Lei nº 10.358, de 27.12.2001, DOU 28.12.2001, em vigor 3 (três) meses após a data da publicação)

I - expor os fatos em juízo conforme a verdade;

II - proceder com lealdade e boa-fé;

III - não formular pretensões, nem alegar defesa, cientes de que são destituídas de fundamento;

IV - não produzir provas, nem praticar atos inúteis ou desnecessários à declaração ou defesa do direito.

V - cumprir com exatidão os provimentos mandamentais e não criar embaraços à efetivação de provimentos judiciais, de natureza antecipatória ou final. (Inciso acrescentado pela Lei nº 10.358, de 27.12.2001, DOU 28.12.2001, em vigor 3 (três) meses após a data da publicação)

Parágrafo único. Ressalvados os advogados que se sujeitam exclusivamente aos estatutos da OAB, a violação do disposto no inciso V deste artigo constitui ato atentatório ao exercício da jurisdição, podendo o juiz, sem prejuízo das sanções criminais, civis e processuais cabíveis, aplicar ao responsável multa em montante a ser fixado de acordo com a gravidade da conduta e não superior a vinte por cento do valor da causa; não sendo paga no prazo estabelecido, contado do trânsito em julgado da decisão final da causa, a multa será inscrita sempre como dívida ativa da União ou do Estado. (NR) (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 10.358, de 27.12.2001, DOU 28.12.2001, em vigor 3 (três) meses após a data da publicação)

Cumpre tecer alguns comentários sobre os dispositivos em tela.

A necessidade de expor a verdade em juízo não é só um imperativo moral e ético. Quando o CPC, no art. 14, fixa tal ditame como dever de todos que integram o processo, dá força jurídica a este preceito.

Entretanto, o conceito de “verdade”, no processo e no Direito, é muito relativo. Muitas vezes alguém faz determinada alegação que, após o decorrer do processo e uma apuração mais cuidadosa, verifica-se não verídica. Contudo, quem fez tal afirmação acreditava piamente estar dizendo a verdade. A forma como pessoas interpretam fatos e direitos é inevitavelmente heterogênea.

Assim sendo, só há que se falar em burla ao disposto no CPC, art. 14, I, quando ficar comprovada má-fé, ou seja, ficar atestado que quem fez determinada intenção tinha o dolo, ou seja, a deliberada e intencional vontade de mentir em juízo e tentar ludibriar o magistrado, as partes e outros partícipes do processo.

A ideia de compelir aos participantes do processo a proceder com boa-fé e lealdade está intimamente ligada ao instituto da litigância de má-fé, previsto no CPC, arts. 16/18[4]. Todo aquele que fere premissas éticas no processo e não apresenta probidade, honestidade, lisura e respeito à Justiça pode sofrer as severas sanções inerentes aos que são condenados pela litigância de má-fé[5].

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No que concerne ao dever de não formular pretensões, nem alegar defesa, ciente de que são destituídas de fundamento, também impera o pensamento de que só viola tal dever quem dolosamente quer apresentar uma inverdade em juízo. Contudo, há também quem entenda que o erro grosseiro, sem dolo, na formulação de uma pretensão ou na apresentação da defesa, que não pode ser escusado, também redunda na litigância de má-fé.

Merece atenção especial o inciso V do art. 14, novo na legislação processual. A necessidade de cumprir com exatidão ordens judiciais tem ligação com o sonho de efetividade do Direito, umas das bandeiras principais da luta pelo acesso à Justiça.

O descumprimento deste preceito também redunda em sanção ao infrator, mas com preceito diferente dos casos dos outros quatro incisos do art. 14. Nestes casos, a sanção é a prevista no art. 18 do CPC, ou seja, “o juiz ou tribunal, de ofício ou a requerimento, condenará o litigante de má-fé a pagar multa não excedente a um por cento sobre o valor da causa e a indenizar a parte contrária dos prejuízos que esta sofreu, mais os honorários advocatícios e todas as despesas que efetuou”. Já no caso do inciso V, o fixado é multa de até 20% do valor da causa, que não se reverte para a parte contrária, mas sim para o Estado.

Outra grande polêmica refere-se aos deveres dos advogados em juízo.

Uma grande crítica deve ser lançada ao parágrafo único do art. 14 do CPC.  Tal dispositivo simplesmente excluiu o advogado das regras de sanção destinadas a todos os outros participantes do processo. Segundo tal dispositivo, o advogado que descumpre ordens judiciais se sujeita exclusivamente a regime administrativo disciplinar do Estatuto da OAB.

Tal dispositivo foi reputado por alguns até como inconstitucional, na medida em que fere ao princípio da isonomia.

Também desperta muitos comentários o debate sobre a possibilidade de condenação ou não do advogado nas penas da litigância de má-fé.

A opinião majoritária é negativa, até argumentando que o art. 18 do CPC, ao fixar tal sanção, só prevê tal sanção para as partes litigantes. Assim sendo, no caso da parte ser prejudicada em juízo pela má ação de seu advogado, poderia ressarcir seus prejuízos em ação regressiva.

Finalmente, mister invocar o dever de educação e urbanismo no trato das partes no processo. A ofensa a esse dever não é acatada pelo CPC, que assim se posiciona:

Art. 15. É defeso às partes e seus advogados empregar expressões injuriosas nos escritos apresentados no processo, cabendo ao juiz, de ofício ou a requerimento do ofendido, mandar riscá-las.

Parágrafo único. Quando as expressões injuriosas forem proferidas em defesa oral, o juiz advertirá o advogado que não as use, sob pena de lhe ser cassada a palavra.

      Civilidade e ética são ditames indispensáveis para a condução de qualquer processo judicial.

  1.  A MATÉRIA NO NOVO CPC

Se compararmos as concepções de partes, curador, pessoas casadas em juízo e deveres processuais, há de se constatar que as mudanças com o novo CPC não foram muito contundentes.

Possui capacidade processual todo aquele que tenha plena capacidade civil, ou seja, esteja apto para atos da vida civil. Isto resta firme no art. 70 do novo CPC. Na ausência de capacidade civil, a parte deverá se representada em juízo por seu representante legal, o qual, em caso de menor serão os genitores (na falta destes, será o tutor), e, em se tratando de maior, será o curador. (novo CPC, art. 71).

Quanto ao curador especial, pequenas alterações precisam ser estudadas.

O curador especial continuará sendo nomeado em favor do incapaz despido de representante legal ou com conflitos com tal representante. (novo CPC, art. 72)

Quanto ao réu preso revel, o curador especial só será nomeado se tal réu não tiver constituído advogado próprio. O novo CPC incorporou entendimento doutrinário, jurisprudencial e utilizado sem maiores controvérsias na praxis jurídica. Este é o papel das grandes codificações: transformar em lei o que já está compilado pela rotina do Direito....

No que tange ao curador especial, o que nos causa temor é tal atividade ser, no novo CPC, munus apenas da Defensoria Pública.

O grande problema, a nosso aviso, é ausência de infraestrutura para atender à esta nova demanda pela Defensoria Pública, que não é presente em todas as Comarcas e, infelizmente, não possui servidores, logística, número de Defensores suficiente para atender aos reclames dos mais necessitados por uma busca do acesso à Justiça sem custos. O flagelo da Defensoria Pública é gritante exemplo do descaso estatal e da opacidade da sociedade em questões fulcrais sobre combate às desigualdades sociais.

Sobre o cônjuge em juízo nas ações reais imobiliárias, tornou-se expresso algo que na doutrina e na jurisprudência já era claro, ou seja, o casado em regime de separação de bens não precisa de vênia marital para ajuizar tais ações (novo CPC, art. 73). Nos outros regimes de bens, continua existindo a necessidade da outorga uxória. Na ausência de tal anuência, cabe, judicialmente, o suprimento, ou seja, o juiz autoriza o ajuizamento da ação desde que não exista justo motivo na recusa de outorga marital pelo cônjuge. Contudo, insta dizer que a ausência total, e com justo motivo, de vênia marital impede completamente o ajuizamento da ação, tanto é que o processo deve ser extinto. (novo CPC, art. 74).

Em várias hipóteses, os cônjuges, bem como os companheiros (a união estável foi expressamente reconhecida pelo novo CPC), formam litisconsórcio passivo necessário. Isto se dá facilmente em ações reais imobiliárias (salvo, repita-se, nos casamentos de regime de separação de bens), ações em casos de composse, dívidas contraídas a bem da família, etc....(novo CPC, art. 73, § 1º).

A representação judicial de certos entes estatais e pessoas jurídicas públicas e privadas não foi substancialmente alterada pelo novo CPC, especificamente no art. 75. Alguns temas merecem destaque. A União deve ser representada em juízo pelo Advogado Geral da União, diretamente ou por representante vinculado. A massa falida deve ser representada pelo administrador judicial (não mais utilizamos a terminologia “síndico, tudo em função da existência de legislação de recuperação judicial e falência posterior ao CPC em voga- Lei 11101-05). As autarquias e fundações de Direito Público devem ser representadas em juízo pelas figuras elencadas por lei.

Segundo o art. 75, § 4º, do novo CPC, “Os Estados e o Distrito Federal poderão ajustar compromisso recíproco para prática de ato processual por seus procuradores em favor de outro ente federado, mediante convênio firmado pelas respectivas procuradorias.” Tal previsão processual gera mais eficiência e celeridade do Estado para atuar em juízo.

Capacidade processual e regularidade de representação são pressupostos processuais. Na ausência destes, cumpre ao juiz designar prazo para que tal falha seja sanada. Na lacuna de correção do vício, se a falta for reputada ao autor, o processo será extinto; se for o réu, restará revel; se for terceiro, será excluído do feito. Na seara recursal, se a falha for do autor, seu recurso será inadmitido; em se tratando do réu, suas contrarrazões serão inadmitidas. (novo CPC, art. 76).

A cooperação processual, um dos nortes para o bom exercício da prática processualista, tem ampla conexão com o cumprimento de um conjunto de regras e preceitos éticos. O processo é um instrumento. O que o processo almeja é a satisfação de uma pretensão lídima. O processo se distancia de sua natureza se estiver eivado de práticas refratárias aos caminhos lícitos, morais, razoáveis.

O processo pode ser entendido como um jogo repleto de regras. O descumprimento de regras basilares do processo desqualifica o jogador que se portar com incúria.

No que tange aos deveres das partes, alguns acréscimos foram feitos pelo novo CPC.

Cumpre aos litigantes “declinar, no primeiro momento que lhes couber falar nos autos, o endereço residencial ou profissional onde receberão intimações, atualizando essa informação sempre que ocorrer qualquer modificação temporária ou definitiva” (novo CPC, arts. 77, V).

Também é dever das partes “não praticar inovação ilegal no estado de fato de bem ou direito litigioso” (novo CPC, art. 77, VI).

Nos casos de descumprimento de mandamentos judiciais e inovação ilegal, a parte pode ser compelida a pagar multa, em favor do Estado, na órbita de até 20% do valor da causa. (novo CPC, art. 77, § 2º). Nas causas de valor irrisório, tal multa pode ser fixada em até 10 salários mínimos. (novo CPC, art. 77, § 5º). A multa é fixada conforme a gravidade da falta.

Advogados, públicos ou privados, e o Ministério Público, não se submetem aos rigores do art. 77, devendo responder por imputações próprias da legislação corporativa a qual estão submetidos. Novamente apresentamos crítica à tal fixação, inobstante trate-se de padrão também acatado na jurisprudência.[6]

As partes devem se comportar judicialmente com urbanismo. Na falta de cumprimento de tal premissa, e havendo uso de palavras indecorosas, em falas em audiência ou em petições, cumpre ao juiz vedar a reiteração de tais práticas e até autorizar a emissão de certidão na qual constem impropérios utilizados em juízo. Cabe, além disto, que termos pesados sejam riscados do processo. (novo CPC, art.78).

É da lavra de Pablo Neruda o seguinte dizer: somos livres para fazer escolhas, contudo somos escravos das consequências do que escolhemos....

Sartre, no mesmo sentido, disse que o ser humano é condenado à liberdade.

A liberdade deve estar atrelada à racionalidade, à ação ética, e demanda responsabilidades. A lei universal de Kant nos explica que devemos agir de tal maneira que nossa ação não seja incompatível com o que esperamos como melhor comportamento do outro em relação à nós. Existe uma acrasia quando temos comportamentos contraditórios, isto é, quando prometemos algo e nos portamos de forma diferente daquilo que aparentamos em relação ao outro, que gerou expectativas e moldou suas posturas de acordo com nossas perspectivas iniciais de comportamento.

A responsabilidade processual das partes demanda um estudo forte do dano processual e da litigância de má-fé.

A ausência de cumprimento de preceitos legais quanto ao comportamento em juízo gera sanções pecuniárias às partes e a terceiros que participarem do processo. A inclusão expressa da punição a terceiros é uma novidade do novo CPC.

A litigância de má-fé é elencada no art. 80 do novo CPC, com um rol o qual, particularmente, entendemos não ser numerus clausus.

Agir deliberadamente com má-fé no processo, alterando a verdade dos fatos, tentando ludibriar a parte ex adversa, juiz e todos que atuam no processo, bem como apresentar indevida resistência ao cumprimento de ditames legais e judiciais, propor incidentes processuais manifestamente inadequados, protelar o curso normal do processo com recursos, práticas de chicana e procrastinação de feitos, tudo isto, merece severa punição.

De ofício, ou a requerimento, cumpre ao juiz, fixar multa pela litigância de má-fé, que pode ir de 1 até 10% do valor da causa. Nas causas de valor irrisório, a multa pode ser fixada em até 10 salários mínimos. Tal multa se volta em proveito da parte prejudicada, que pode cumular tal recebimento com o de indenização pelas perdas e prejuízos processuais, em valor não pré-fixado pela lei. Cabe ainda ao litigante de má-fé arcar com honorários advocatícios da parte prejudicada, custas e despesas processuais.

Pode o valor da indenização ser fixado pelo juiz, mas caso não seja possível um cálculo rápido, é possível a liquidação por arbitramento.

Fato é que as imposições de multa em favor do Estado por não cumprimento de mandamento judicial ou inovação ilegal, multa de litigância de má-fé, indenização por danos processuais e materiais e condenação a pagar honorários advocatícios da parte prejudicada pode ser cumulativa, cabendo, sim, forte condenação ao participante de processo que não obra com acuro e probidade.

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Sobre o autor
João Fernando Vieira Silva

Mestre em Teoria do Estado e Direito Constitucional pela PUC- Rio; Especialista em Direito Civil- UNIPAC; Professor nos Cursos de Direito das Faculdades Doctum- unidades Leopoldina e Juiz de Fora; Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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