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A problemática acerca da consulta aos serviços de proteção ao crédito como critério de seleção a vaga de emprego

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10/09/2015 às 16:22
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5        O PROJETO DE LEI DO SENADO 465/2009

 

Em 13 de outubro de 2009, o Senador Paulo Paim apresentou o Projeto de Lei do Senado nº 465/2009, que visa alterar a Lei nº 9.029, de 13 de abril de 1995, para incluir entre as práticas discriminatórias e limitativas para efeito de acesso à relação de emprego, ou sua manutenção, aquelas motivadas por consulta a cadastro de inadimplentes. Segundo Paim, a discriminação por inadimplência pune duas vezes o trabalhador, já que, muitas vezes, é com os rendimentos do novo emprego que a pessoa poderá quitar suas dívidas. Para justificar o referido projeto o Senador observa que

O que se pretende com esta proposição é assegurar que os candidatos ao emprego possam competir em grau de igualdade e imparcialidade e que os princípios atribuídos pela Constituição Federal do direito ao trabalho, à igualdade, à dignidade da pessoa humana, bem como o combate a qualquer ato discriminatório, sejam assegurados nos processos de seleção. (SENADO, Projeto de Lei do Senado 465/2009)

Os senadores da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) aprovaram um projeto de lei que proíbe a discriminação de inadimplentes no processo de seleção para emprego. A legislação em vigor veda o preconceito por sexo, origem, raça, cor, estado civil, idade ou situação familiar. Pela proposta aprovada, as empresas não poderão utilizar informações constantes de banco de dados ou cadastro de inadimplentes para fins de admissão ou rescisão de contrato de trabalho.

Também a CAS (Comissão de Assuntos Sociais) do Senado, emitiu parecer favorável salientando que a matéria tem relevância e comporta duas vertentes: a do trabalhador busca emprego e que, por situação adversa, consta de um ou de alguns cadastros de inadimplentes, tais como Serasa, Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) e outros, mantidos por associações comerciais e financeiras. Por outro viés, a prática discriminatória levada a efeito tem como resultado a manutenção da inadimplência, o aumento de risco de crédito e, por conseqüência, a elevação da taxa de juros ao consumidor. Por todas essas razões, além de salientar que os valores do “trabalho e da livre iniciativa” estão ladeados no mesmo dispositivo precursor de nossa Carta Magna” (art. 1º, IV), ressalte-se o sentido social e econômico desta proposição.


6        CONSIDERAÇÕES FINAIS

Analisando a situação que ensejou o questionamento proposto no presente trabalho, qual seja a utilização pelo empregador de informações creditícias como critério de seleção à vaga de emprego, conclui-se que há um desvirtuamento da função dos cadastros negativos de crédito. Destarte, aqueles foram criados com uma finalidade específica de realização de análise de risco de crédito e/ou subsidiar a concessão ou extensão de crédito e a realização de venda a prazo ou outras transações comerciais e empresariais que impliquem risco financeiro, conforme se verifica na redação do art. 7º da Lei 12.414/11.

De igual forma, resta patentemente violado o direito à isonomia do trabalhador, uma vez que extremamente discriminatória a prática de se julgar uma pessoa apenas pelo fato de ela ter o nome com alguma restrição creditícia, mormente num país como o Brasil, onde o endividamento da população é sensível, sem falar nas inscrições indevidas perpetradas pelas empresas como forma apenas de se cobrar o crédito. Além disso, o trabalhador que não se vê em condições de pagar suas dívidas por causa do desemprego é obstado de conseguir angariar a renda que o tiraria do suposto estado de insolvência, causando maior endividamento.

Nesse diapasão, a recente decisão proferida pela Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho, no Recurso de Revista nº 38100-27.2003.5.20.0005, a par de se revelar avessa à realidade do brasileiro, mostra-se em total contradição com demais decisões proferidas no âmbito da mesma Corte, bem como distanciada do dispositivo legal que disciplina a utilização dos bancos de dados com informação de adimplemento das pessoas físicas e jurídicas.

O Projeto de Lei do Senado n. 465/2009 mostra ser mais um instrumento que permitirá ao trabalhador exercitar seu direito fundamental ao trabalho. A proposta que já foi aprovada no Senado consolida o valor do trabalho como fundamental na ordem social vigente, bem como a ideia de que o processo de seleção de candidatos a uma vaga de emprego deve se centrar na avaliação das habilidades técnicas e aptidões profissionais dos candidatos, razão pela qual é indevida a perquirição de aspectos da vida pessoal do trabalhador que não influenciem a forma como ele desempenhará as atividades propostas.


REFERÊNCIAS

BESSA, Leonardo Roscoe. Bancos de Dados e Cadastros de Consumo. In: MARQUES, Cláudia Lima; BENJAMIN, Antônio Herman; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de Direito do Consumidor. 3ª Ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010;

BUSSINGUER, Elda Coelho de Azevedo; ROCHA, Sara Hora. A consulta a serviços de proteção ao crédito pelo empregador como critério de seleção: uma afronta aos direitos do trabalhador. Disponível em < http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=1cc8a8ea51cd0add > Acesso em 22 de out. de 2013;

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 11ª Ed. São Paulo: LTr, 2012;

GUGLINSKI, Vitor. Os arquivos de consumo e o abuso de direito decorrente do desvirtuamento de sua função. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3170, 6 mar. 2012 . Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/21226>. Acesso em: 27 jan. 2014;MALLET, Estêvão. Igualdade, discriminação e Direito do Trabalho. Revista do Tribunal Superior do Trabalho. São Paulo, SP, v. 76, n. 3, p. 17-51, jul./set. 2010. Disponível em http://aplicacao.tst.jus.br/dspace/bitstream/handle/1939/18077/001_malletestevao.pdf?sequence=1 Acesso em 29 de out. de 2013;

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MALHEIROS, Nayron Divino Toledo. Seleção de emprego: empresas não devem consultar nomes de candidatos no SPC/SERASA. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3166, 2 mar. 2012 . Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/21198>. Acesso em: 10 de jan. 2014;

MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. Nota de esclarecimento. Disponível em:

<http://portal.mpt.gov.br>. Acesso em: 21 ago. 2012;

ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO ESCRITÓRIO NO BRASIL. Convenção nº 111 da OIT. Disponível em < http://www.oitbrasil.org.br/convention > Acesso em 29 de out. de 2013;

SILVA NETO, Manoel Jorge e. Curso de Direito Constitucional. 8ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2013


Notas

[2] ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO ESCRITÓRIO NO BRASIL. Convenção nº 111 da OIT. Disponível em < http://www.oitbrasil.org.br/convention > Acesso em 29 de out. de 2013.

[3] DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 11ª Ed. São Paulo: LTr, 2012, p. 642.

[4] SILVA NETO, Manoel Jorge e. Curso de Direito Constitucional. 8ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 689.

[5] MALLET, Estêvão. Igualdade, discriminação e Direito do Trabalho. Revista do Tribunal Superior do Trabalho. São Paulo, SP, v. 76, n. 3, p. 17-51, jul./set. 2010. Disponível em http://aplicacao.tst.jus.br/dspace/bitstream/handle/1939/18077/001_malletestevao.pdf?sequence=1 Acesso em 29 de out. de 2013

[6] Op. cit.

[7] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. O conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3.ed.atual. São Paulo: Malheiros, 1997. Apud BUSSINGUER, Elda Coelho de Azevedo; ROCHA, Sara Hora. A consulta a serviços de proteção ao crédito pelo empregador como critério de seleção: uma afronta aos direitos do trabalhador. Disponível em < http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=1cc8a8ea51cd0add > Acesso em 22 de out. de 2013.

[8] BESSA, Leonardo Roscoe. Bancos de Dados e Cadastros de Consumo. In: MARQUES, Cláudia Lima; BENJAMIN, Antônio Herman; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de Direito do Consumidor. 3ª Ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 280

[9] BARROS, Suzana Toledo. O princípio da proporcionalidade. Apud BESSA, Leonardo Roscoe. Bancos de Dados e Cadastros de Consumo. In: MARQUES, Cláudia Lima; BENJAMIN, Antônio Herman; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de Direito do Consumidor. 3ª Ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 288

[10]  MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. Nota de esclarecimento. Apud. BUSSINGUER, Elda Coelho de Azevedo; ROCHA, Sara Hora. A consulta a serviços de proteção ao crédito pelo empregador como critério de seleção: uma afronta aos direitos do trabalhador. Disponível em < http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=1cc8a8ea51cd0add > Acesso em 22 de out. de 2013.

[11] RECURSO DE REVISTA. EMPRESA DE BANCO DE DADOS. OBTENÇÃO DE INFORMAÇÕES SOBRE ANTECEDENTES CRIMINAIS, TRABALHISTAS E CREDITÍCIAS RELATIVAS A EMPREGADOS OU CANDIDATOS A EMPREGO. DANO MORAL COLETIVO. I - Trata-se de discussão que envolve o direito de informação do empregador, diante da contratação pela empresa de serviços Innvestig, que vendia informações acerca de antecedentes criminais, trabalhistas e creditícias de candidatos a vagas de emprego, versus, o direito à intimidade. II - O constituinte de 1988 ao estabelecer um capítulo na Carta Magna, dedicado exclusivamente aos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos, em nenhum momento conferiu a qualquer deles um caráter absoluto. E, não tendo conferido nenhuma hierarquia entre os direitos fundamentais, a solução a ser utilizada é a ponderação de interesses. III - Observa-se, pois, que a pesquisa de antecedentes criminais, trabalhistas e creditícias relativa a empregados ou candidatos a emprego revela-se discriminatória, configurando-se como verdadeiro abuso de poder e violação da intimidade das pessoas, tendo em vista a constatação de que a obtenção das informações era realizada a revelia dos candidatos. IV - A Subseção I Especializada em Dissídios Individuais consagrou a tese de que, em se tratando de danos morais, e não materiais, a única prova que deve ser produzida é a do ato ilícito, se presentes os pressupostos legais para a caracterização da responsabilidade civil, quais sejam, a culpa e o nexo de causalidade, porquanto tal dano constitui, essencialmente, ofensa à dignidade humana (art. 1º, inciso III, da Constituição da República), sendo desnecessária a comprovação do resultado, porquanto o prejuízo é mero agravante do lesionamento íntimo. V - Diante disso, tem-se que o ato da reclamada, ao contratar uma empresa para investigar os antecedentes criminais, trabalhistas e creditícias, viola o artigo 5º, X, da Constituição Federal. Recurso de revista conhecido e provido (Processo: RR - 9891800-65.2004.5.09.0014, Data de Julgamento: 09/06/2010, Relator Ministro: Emmanoel Pereira, 5ª Turma, Data de Publicação: DEJT 18/06/2010).

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CORREIA, Giovanna Bastos. A problemática acerca da consulta aos serviços de proteção ao crédito como critério de seleção a vaga de emprego. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4453, 10 set. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/42189. Acesso em: 23 abr. 2024.

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