Os juros moratórios são considerados como indenização pelo atraso na entrega do que se devia prestar, ao passo que juros compensatórios representam uma compensação pela aplicação de um capital[1].
De há muito a jurisprudência do STF já havia proclamado a natureza indenizatória dos juros moratórios, afastando a ideia de acréscimo patrimonial, objeto de tributação pelo imposto de renda (RREE ns. 548.828, 487.121, 559.964 e 591.140)
Em todos esses julgados foram reconhecidos que não incide o imposto de renda sobre os juros moratórios.
O STJ, por sua vez, editou as súmulas 125 e 136, isentando do IR as férias e licenças-prêmio pagas em dinheiro, exatamente por enxergar nelas cunho indenizatório.
Mas, para abalar a convicção dos tribunais, veio à luz a Lei complementar nº 104, de 10 de janeiro de 2001, acrescentando o § 1º, ao art. 43, do CTN, nos seguintes termos:
“§ 1º A incidência do imposto independe da denominação da receita ou do rendimento, da localização, condição jurídica ou nacionalidade da fonte, da origem e da forma de percepção”.
A reação legislativa à jurisprudência que favorece os contribuintes já se incorporou na rotina do Poder Legislativo, que tem acolhido todos os projetos legislativos de iniciativa do Executivo nesse sentido.
Não tardou muito para a semente da confusão florescer no seio dos tribunais.
O E. TRF4, por meio da sua Corte Especial (Plenário), reconheceu “a não recepção do parágrafo único do art. 16 de Lei nº 4.506/64 pela Constituição de 1988 e declarou a inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, do § 1º do art. 3º da Lei nº 7.713/1988 e do art. 43, inciso II, § 1º do Código Tributário Nacional, de forma a afastar a incidência do imposto de renda (IRPF) sobre os juros de mora legais recebidos, dada a natureza indenizatória da verba.” (Arguição de Inconstitucionalidade nº 5020732-11.2013.404.0000).
Não houve interposição de Embargos Declaratórios por qualquer das partes, apesar da visível contradição.
Contra essa decisão do TRF4 foi interposto pela União o competente Recurso Extraordinário.
O STF, em recente decisão, reconheceu a existência de Repercussão Geral sobre o tema constitucional versado, conforme ementa abaixo:
“TRIBUTÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO, INCIDÊNCIA DO IMPOSTO DE RENDA PESSOA FÍSICA. JUROS DE MORA. ART. 3º, § 1º, DA LEI Nº 7.713/1988 E ART. 43, INCISO II, § 1º, DO CTN. ANTERIOR NEGATIVA DE REPERCUSSÃO. MODIFICAÇÃO DA POSIÇÃO EM FACE DA SUPERVENIENTE DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DE LEI FEDERAL POR TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL.” (RE Nº 855.091-RJ, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe 30-6-2015, PUBL. 01-7-2015).
É de se esperar que a Corte Suprema, coerente com a sua jurisprudência mansa e pacífica, promova a interpretação conforme a Constituição, retirando a eiva de inconstitucionalidade do inciso II, do art. 43, do CTN, imputada pelo V. Acórdão recorrido, pois aquele inciso legal é exatamente o dispositivo que não permite a incidência do IR sobre renda ou proventos que NÃO se traduzam em ACRÉSCIMOS PATRIMONIAIS.
Diga-se de passagem, a Lei nº 5.172/65, atual Código Tributário Nacional, é uma das raras leis que não contém qualquer dispositivo inconstitucional, como tem revelado a jurisprudência do STF ao longo de quase meio século de aplicação.
Nota
[1] Cf. nosso Desapropriação doutrina e prática, 11ª ed. São Paulo: Atlas, 2015, p.162.