A aplicação da Lei nº 11.340/06 (Lei Maria da Penha) para homens

09/09/2015 às 15:39
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A presente Iniciação Científica visa fornecer um panorama geral da aplicação da Lei 11.340/06 (Lei Maria da Penha) para homens, tema em crescente discussão em face das recentes decisões de magistrados a favor dos homens.

A lei 11.340, de 7 de agosto de 2006, denominada Lei Maria da Penha, muito antes de entrar em vigor, trouxe e continua a trazer inúmeras controvérsias e perplexidades. Muito se têm discorrido sobre a teoria das penas, sua evolução histórica e sua finalidade.

O nome dado à lei é uma homenagem à um símbolo da luta contra a violência familiar e doméstica, a biofarmacêutica brasileira Maria da Penha Maia Fernandes, que lutou para que seu agressor viesse a ser condenado. Em 1983, seu ex-marido, o professor universitário colombiano Marco Antonio Heredia Viveros, tentou matá-la duas vezes. Na primeira vez atirou contra ela, simulando um assalto, e na segunda tentou eletrocutá-la. Por conta das agressões sofridas, Penha ficou paraplégica. A punição do agressor só veio dezenove anos e seis meses depois.

O episódio chegou à Comissão Interamericana dos Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) e foi considerado, pela primeira vez na história, um crime de violência doméstica. Hoje, Maria da Penha é coordenadora de estudos da Associação de Estudos, Pesquisas e Publicações da Associação de Parentes e Amigos de Vítimas de Violência (APAVV), no Ceará. Estava presente à cerimônia da sanção da lei brasileira, que leva seu nome, junto aos demais ministros e representantes de movimentos feministas.

A Lei reconhece a gravidade dos casos de violência doméstica, e retira dos juizados especiais criminais (que julgam crimes de menor potencial ofensivo) a competência para julgá-los, pois esta prática jurídica, na maioria dos casos, gerava arquivamento massivo dos processos, insatisfação das vítimas e banalização da violência doméstica.

A maioria dos segmentos da sociedade, incluindo a Igreja Católica, consideraram a lei muito bem-vinda, um marco na luta contra a violência doméstica. No contra-senso do movimento mundial de ressocialização, menor intervenção estatal e conciliação, veio para impor, através do Direito Penal, um freio para conter a violência doméstica ou familiar.

A polêmica decisão de um magistrado do Juizado Especial Criminal de Cuiabá-MT, que aplicou, segundo o próprio “por analogia”, as medidas de proteção da Lei Maria da Penha em favor de um homem que estaria sofrendo violência doméstica praticada por uma mulher, trouxe a tona antigas discussões sobre a constitucionalidade da Lei Maria da Penha.

Embora mais rara, a violência contra o homem, evidentemente, também é um problema sério, minorizado pela vergonha que sentem em denunciar agressões sofridas por parte de companheiras agressivas. É caracterizada pela coação psicológica, estelionato (como casamentos por interesse), arremesso de objetos e facadas. Assim, não se nega que os homens podem ser vítimas de violência doméstica, tal como não se ignora que as mulheres são perfeitamente capazes de praticá-las.

Um dos pontos chave na discussão é que o artigo 5º da constituição garante direitos iguais a todos, portanto o termo "violência contra a mulher" é incompleto, pois separa a violência contra as mulheres dos demais.

O presente trabalho busca assim, diante das recentes discussões acerca do tema e pautado nos princípios de nossa Constituição Federal, demonstrar a possibilidade da aplicação da Lei Maria da Penha para homens.

1.    O conceito e amplitude da violência doméstica e familiar contra a mulher

                        A Lei Maria da Penha cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher. Assim, antes de qualquer coisa, é preciso ao menos tentar identificar seu âmbito de abrangência, ou seja, saber o que é violência doméstica.

                        Entende-se por violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão que cause à mulher morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico, dano moral ou patrimonial, em razão de vínculo de natureza familiar ou afetiva, independente da orientação sexual no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas; no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa e em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.  (vide art. 5º da Lei 11.340/2006).

                    

1.1 Das formas de violência doméstica e familiar contra a mulher

                        Conforme disposto no artigo 7º da Lei, são formas de violência doméstica contra a mulher, entre outras, in verbis:

“I – a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda a sua integridade ou saúde corporal;

II – a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição de auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que se vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;

III – a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;

IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;

V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.”   

1.1.1 Violência Física

                        Ainda que a agressão não deixe marcas aparentes, o uso da força física que ofenda o corpo ou a saúde da mulher constitui vis corporalis, expressão que define a violência física.

                        “Não só a lesão dolosa, também a lesão culposa constitui violência física, pois nenhuma distinção é feita pela lei sobre a intenção do agressor”[1].

1.1.2 Violência Psicológica

                        Essa violência está elencada no artigo 7º, II, pois visa a proteção da auto-estima e da saúde psicológica. Refere-se à agressão emocional.

                         “O comportamento típico se dá quando a agente ameaça, rejeita, humilha ou discrimina a vítima, demonstrando prazer quando vê o outro se sentir amedrontado, inferiorizado e diminuído, configurando a vis compulsiva.”[2]

 

                        A doutrina critica a expressão violência psicológica, que poderia ser aplicada a qualquer crime contra a mulher, pois “todo crime gera dano emocional a vítima, e aplicar um tratamento diferenciado apenas pelo fato de a vítima ser mulher seria discriminação injustificada de gêneros”[3]. Não se pode esquecer que a violência contra a mulher tem raízes culturais e históricas, merecendo ser tratada de forma diferenciada.

                        Essa violência é a mais freqüente e talvez seja a menos denunciada. A vítima muitas vezes nem se dá conta que agressões verbais, silêncios prolongados, tensões, manipulações de atos e desejos, são violências e devem ser denunciados.

1.1.3 Violência Sexual

     

                        A Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Doméstica – chamada Convenção de Belém do Pará – também reconheceu tal violência como violência contra a mulher. Ainda assim, houve uma certa resistência da doutrina e da jurisprudência em admitir a possibilidade da ocorrência de violência sexual nos vínculos familiares.

            A tendência sempre foi identificar o exercício da sexualidade como um dos deveres do casamento, a legitimar a insistência do homem, como se estivesse ele a exercer um direito.

            O Código Penal é mais severo com relação aos crimes perpetrados com o abuso da autoridade decorrente de relações domésticas. Assim, reconhece como circunstâncias que sempre agravam a pena o fato de o crime ter sido praticado (CP, art. 61, II, e): “contra ascendente, descendente, irmão ou cônjuge”; e (CP, art. 61, II, f):”com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade.” A Lei Maria da Penha inseriu neste dispositivo legal mais uma hipótese: “com violência contra a mulher na forma da lei específica”. Com este acréscimo, assim ficou redigido o dispositivo (CP, art. 61, II, f): “com abuso de autoridade  ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, ou com violência contra a mulher na forma da lei específica.”

1.1.4 Violência Patrimonial

            A partir da nova definição de violência doméstica, assim reconhecida também a violência patrimonial, não se aplicam as imunidades absolutas ou relativas dos artigos do Código Penal, in verbis:

artigo 181 - “é isento de pena quem comete qualquer dos crimes previstos neste título, em prejuízo: I – do cônjuge, na constância da sociedade conjugal; II – de ascendente ou descendente, seja o parentesco legítimo ou ilegítimo, seja civil ou natural.”

artigo 182 - “ somente se procede mediante representação, se o crime previsto neste título é cometido em prejuízo: I – do cônjuge desquitado ou judicialmente separado; II – de irmão, legítimo e ilegítimo; III – de tio ou sobrinho com quem o agente coabita.” 

           

            Não há mais como admitir o injustificável afastamento da pena ao infrator que pratica um crime contra a sua cônjuge ou companheira, ou, ainda, alguma parente do sexo feminino.

            A Lei Maria da Penha reconhece como violência patrimonial o ato de “subtrair” objetos da mulher, o que nada mais é do que furtar, portanto não se pode mais reconhecer a possibilidade de isenção da pena.

1.1.5 Violência Moral

            A violência moral encontra proteção penal nos delitos contra a honra, quais sejam: calúnia, difamação e injúria. São denominados delitos que protegem a honra, mas, cometidos em decorrência de vínculo de natureza familiar ou afetiva, configuram violência moral.

            Estes delitos, quando são perpetrados contra a mulher no âmbito da relação familiar ou afetiva, devem ser reconhecidos como violência doméstica, impondo-se o agravamento da pena (CP, art. 61, II, f).

2.    CAMPO DE ABRANGÊNCIA DO RECONHECIMENTO DA VIOLÊNCIA  DOMÉSTICA

                        Para o reconhecimento da violência doméstica preocupou-se o legislador em identificar seu campo de abrangência.

2.1 Unidade Doméstica

                        O artigo 5º, I, define unidade doméstica como o: “espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas”. “A expressão unidade doméstica deve ser entendida no sentido de que a conduta foi praticada em razão dessa unidade da qual a vítima faz parte” [4]. “A tendência é reconhecer que neste contexto estão incluídas as empregadas domésticas” [5].

 

                        E conforme entendimento de Damásio de Jesus:

 

“A denominada “diarista”, que trabalha apenas um, dois ou três dias por semana, não está protegida pela Lei em razão de sua pouca permanência no local de trabalho. Porém, a que trabalha durante a semana diariamente, mas não mora no emprego, a aplicação da Lei está condicionada a sua participação no ambiente familiar, ou seja, deve ser observado se ela considerada por todos e por ela própria membro da família. Por fim, a que trabalha e mora na residência da família, desfrutando de uma convivência maior com todos, deve ser considerada um de seus membros, merecendo ser receptora da especial tutela legal.”[6]

                       

                        A convivência que decorre da tutela ou curatela também deve estar inserida no conceito de unidade familiar, mesmo que o tutor ou curador não tenham vínculo de parentesco com a tutelada ou curatelada. A relação entre eles permite ser identificada como um espaço de convivência.

                        Como alerta Guilherme Nucci:

A mulher agredida no âmbito da unidade doméstica deve fazer parte dessa relação doméstica. “Não seria lógico que qualquer mulher, bastando estar na casa de alguém, onde há relação doméstica entre terceiros, se agredida fosse, gerasse a aplicação da agravante trazida pela Lei Maria da Penha.”[7]

 

2.2 Família

                        A Lei Maria da Penha define família no artigo 5º, II: “comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa”.

                        “Pela primeira vez o legislador, de forma corajosa, define o que é família trazendo um conceito que corresponde ao formato atual dos vínculos afetivos. Fala em indivíduos e não em um homem e uma mulher” [8].

                        Conforme Altamiro de Araújo Lima Filho:                     

“Deve ser gizado que a definição fornecida pelo presente estatuto em comento estendeu-se além dos conceitos da união estável entre o homem e a mulher; bem como da comunidade formada por qualquer dos pais e os seus descendentes (naturais ou legais); e da sociedade conjugal formada pelo matrimônio religioso ou civil, contidos na Constituição Federal, artigo. 226, caput e no Código Civil. Salvo melhor juízo, o enunciado no parágrafo único, em conjunto com o disposto nos incisos I, II e III do artigo 5º dessa Lei, permite entender também a família como qualquer relacionamento afetivo íntimo e estável de pessoas independentemente do sexo. Isto porque claramente diz ela formar-se a unidade familiar por quaisquer relacionamentos íntimos de afeto (inciso III), em espaço de convívio (inciso I), por vontade expressa (inciso II) independente da orientação sexual das pessoas envolvidas (parágrafo único)”[9].

                        Podemos citar, também, as uniões paralelas que de uma forma geral são mantidas pelos homens. Cada um dos vínculos constitui uma unidade familiar, portanto, qualquer das companheiras que sejam agredidas pelo homem tem a proteção da Lei Maria da Penha.

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                        Está evidente que o conceito de família trazido pela Lei Maria da Penha estende-se a todas as estruturas de convívio marcadas por uma relação íntima de afeto.

2.3 Relação íntima de afeto 

            Conforme disposto na Lei 11.340/2006, artigo. 5º III: “em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação”, será configurada a violência doméstica, portanto, a mulher terá a proteção independentemente de ter morado junto. Incluem-se relacionamentos afetivos de namorados e noivos, estendendo-se aos relacionamentos homossexuais femininos.

            Guilherme de Souza Nucci afirma:

“A Lei, ao proteger as relações de intimidade extrapola o espírito dos tratados ratificados pelo Brasil, uma vez que a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher prevê como doméstica exclusivamente a violência ocorrida dentro da família ou unidade doméstica”. [10]

            Cabe trazer a manifestação de Eliana Ferreira:

A família modernamente concebida tem origem plural e se revela como o núcleo de afeto no qual o cidadão se realiza e vive em busca da própria da felicidade. Abandonou-se o modelo patriarcal e hierarquizado da família romana, ao longo dos anos e firmou-se no direito das sociedades ocidentais um modelo de atuação participativa, igualitária e solidária dos membros da família”.[11]

            Diante de tal realidade fica claro o alcance da previsão legal, portanto, vínculo afetivo pode ser marcado pela violência doméstica e familiar contra a Mulher.

3. COMPETÊNCIA

                        Para garantirmos a efetividade da Lei Maria da Penha podemos citar algumas definições em matéria de competência.

                        A Lei Maria da Penha criou o Juizado de Violência Doméstica e Familiar – JVDFM, órgãos de justiça comum (competência de jurisdição), não especializada, ou seja, o que não é da competência das justiças especiais, quais sejam: eleitoral, trabalhista e militar. Esses órgãos têm competência civil e criminal para o processo, inclusive o julgamento e a execução das práticas que decorrem de violência doméstica e familiar contra a mulher.

                        Normalmente as causas decorrentes da violência doméstica e familiar contra a mulher são amparadas pela justiça comum estadual, porém, os processos que envolvem violência doméstica e familiar podem ser deslocados para justiça federal. O Procurador Geral da República pode suscitar perante o Superior Tribunal de Justiça, incidente de deslocamento de competência para a justiça federal.  

                        Quando a Lei Maria da Penha entrou em vigor a violência doméstica e familiar contra a mulher foi excluída do âmbito dos Juizados Especiais Criminais – JECrims (artigo. 41), pois um dos propósitos da Lei foi afastar qualquer hipótese do crime contra a violência doméstica e familiar ser considerado de infrações de pequena lesividade, como são considerados os crimes que são apreciados pelos Juizados Especiais Criminais, portanto está evidente que a violência doméstica contra a mulher não é crime de menor potencial ofensivo.

                        No início, quando a lei entrou em vigor, não foi imposta a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar, porém, a competência dos Juizados Especiais Criminais foi migrada para as Varas Criminais. Foi atribuída ao juiz criminal competência cível e criminal, para conhecer e julgar as causas decorrentes da violência doméstica e familiar, mas não para o processo executório. O processo, o julgamento e a execução de competências cíveis e criminais podem ser apreciados pelos JVDFMs, (competência de juízo).

             “A Lei Maria da Penha nada diz sobre competência funcional. Enquanto a Lei dos Juizados Especiais admite a participação de juízes leigos e conciliadores (Lei 9.009/1995, art. 7º), em sede de violência doméstica o legislador quedou-se em silêncio.”[12]

 

                        Em sede de violência doméstica, a competência ratione personae é firmada em razão da pessoa da vítima, ou seja, da mulher, observando-se o vínculo pessoal com o agente de fato e a ambiência doméstica, familiar e íntima.

                        Para o processo, julgamento e execução das causas cíveis e criminais do âmbito da Lei Maria da Penha é determinada a aplicação subsidiária tanto das normas dos Códigos de Processo Penal e Processo Civil, como o ECA e o Estatuto do Idoso, (vide artigo. 13).

                        O estatuto processual civil elegeu a competência territorial, ou seja, o local da residência do réu, com algumas exceções. Já no âmbito do Direito Processual Penal, a competência se dá pelo local da prática do delito.

                        Conforme disposto no artigo. 15 da Lei 11.340/2006, in verbis:

“É competente, por opção da ofendida, para os processos cíveis regidos por esta Lei, o Juizado:

I – do seu domicílio ou de sua residência;

II – do lugar do fato em que se baseou a demanda;

                                                            III – do domicílio do agressor”.

 

                        O legislador se preocupou com a valorização e proteção da ofendida, conferindo-lhe o privilégio de definir, por sua opção, a competência territorial para a tramitação e julgamento dos processos cíveis.

3.1 Foro de Eleição

                        A Lei Maria da Penha tem natureza híbrida, pois por mais que ela seja voltada aos aspectos criminais da violência doméstica, traz disposições do âmbito do direito civil.

                        No caso da mulher, ao representar contra o ofensor, pode requer que ele seja afastado do lar, bem como que lhe seja deferida a guarda dos filhos com a fixação dos alimentos. Essas medidas protetivas, têm natureza cível, mas desencadearão expediente elaborado pela autoridade policial a ser remetida a juízo. O pedido envolve natureza civil, mas a competência para apreciar o pedido é do Juizado de Violência Doméstica e Familiar, e na ausência deste, da Vara Criminal. Até o momento da propositura da ação a vítima pode optar e indicar o foro competente para apreciação da medida.

3.2.1 Audiências de Justificação 

                        É facultado ao juiz designar audiência de justificação, quando as autoridades policiais não formam convicção dos fatos levados pela vítima. Observa-se o princípio da celeridade, visto que, a audiência deve ser realizada dentro do menor prazo.

                        Intima-se a vítima pessoalmente e a mesma poderá levar testemunhas a serem ouvidas. O Ministério Público é intimado. Se a vítima não estiver com um advogado, ser-lhe-á nomeado um defensor. O agressor não é intimado e nem citado.

                        Se nenhuma medida protetiva for deferida e a partes presente na audiência não recorrerem, decorre o prazo recursal e o expediente será arquivado. Se entender o magistrado que a situação jurídica merece ser definida, deve determinar o encaminhamento da vítima ao serviço de assistência judiciária.

3.2.2 Audiência de Conciliação

                        Para essa audiência serão intimados a vítima, o ofensor e o Ministério Público. A vítima e o ofensor deverão estar assistidos de um advogado.

                        A audiência de conciliação não está prevista em lei, porém, é recomendável que o juiz a designe, pois pode ter indeferido ou deferido uma medida liminar sem ouvir o agressor e o Ministério Público. É uma tentativa de solver consensualmente temas guarda dos filhos, etc.

Se o acordo for homologado, seguirá o rito de cumprimento de sentença e o pedido será formulado perante o JVDFM, pois tem competência para a execução das causas competentes de violência doméstica.

3.2.3 Retratação à representação

                        Quando a vítima manifesta o interesse de desistir da representação, tal interesse deve ser comunicado ao juiz que designará audiência para ouvi-la, dando ciência ao Ministério Público.

                        A retratação pode ocorrer por conta da reconciliação do casal e de acordo solvendo questões geradoras de conflitos, como guarda dos filhos e etc.

                        Em hipótese nenhuma o agressor deve estar presente na audiência. Homologada a retratação, será comunicada a autoridade policial para que arquive o inquérito, por ter ocorrido extinção da punibilidade.

4. MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA

                        A Lei 11.340/2006 assegura à mulher o direito a uma vida sem violência e elenca um rol de medidas para dar efetividade ao seu propósito.

“São previstas medidas inéditas, que são positivas e mereceriam, inclusive, extensão ao processo penal comum, cuja vítima não fosse somente a mulher” [13]

                        Conforme disposto no artigo. 22 da Lei, in verbis:

“Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras”:

I – suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei nº 10.826 de 22 de dezembro de 2003;

II – afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;

III – proibição de determinadas condutas, entre as quais:

{C}a)    {C}aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor:

{C}b)    {C}contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação;

{C}c)    {C}freqüentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida;

IV – restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar;

V – prestação de alimentos provisionais ou provisórios.

§ 1º As medidas referidas neste artigo não impedem a aplicação de outras previstas na legislação em vigor, sempre que a segurança da ofendida ou as circunstâncias o exigirem, devendo a providência ser comunicada ao Ministério Público.

§ 2º Na hipótese da aplicação do inciso I, encontrando-se o agressor nas condições mencionadas no caput e incisos do artigo. 6º da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, o juiz comunicará ao respectivo órgão, corporação ou instituição as medidas protetivas de urgência concedidas e determinará a restrição do porte de armas, ficando o superior imediato do agressor responsável pelo cumprimento da determinação judicial, sob pena de incorrer nos crimes de prevaricação ou de desobediência, conforme o caso.

§ 3º Para garantir a efetividade das medidas protetivas de urgência, poderá o juiz requisitar, a qualquer momento, auxílio da força policial.

§ 4º Aplica-se às hipóteses previstas neste artigo, no que couber, o disposto no caput e nos §§ 5º e 6º do artigo.461 da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de Processo Civil).

                       

                        Ainda como medidas protetivas de urgência, dispõe o artigo. 23 da Lei 11.340/2006, in verbis:

Poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas: 

I – encaminhar a ofendida e seus dependentes a programa oficial ou comunitário de proteção ou de atendimento;

II – determinar a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao respectivo domicílio, após afastamento do agressor;

III – determinar o afastamento da ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos filhos e alimentos;

IV – determinar a separação de corpos.

                        Dispõe também como medidas protetivas de urgência o artigo. 24 da Lei 11.340/2006, in verbis:

Para a proteção patrimonial dos bens da sociedade conjugal ou daqueles de propriedade particular da mulher, o juiz poderá determinar, liminarmente, as seguintes medidas, entre outras:

I – restituição de bens indevidamente subtraídos pelo agressor à ofendida;

II – proibição temporária para a celebração de atos e contratos de compra, venda e locação de propriedade em comum, salvo expressa autorização judicial;

III – suspensão das procurações conferidas pela ofendida ao agressor;

IV – prestação de caução provisória, mediante depósito  judicial por perdas e danos materiais decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a ofendida.

Parágrafo Único. Deverá o juiz oficiar ao cartório competente para os fins previstos nos incisos II e III deste artigo.

                 

                        A Lei traz providências que não se limitam às medidas protetivas de urgência previstas nos artigos 22 a 24. Encontram-se espraiadas em toda a Lei diversas medidas também voltadas à proteção da vítima que cabem ser chamadas de protetivas.

                        A autoridade policial deve tomar as providências legais cabíveis e necessárias quando do conhecimento da violência doméstica. O Ministério Público também requer medidas protetivas, inclusive a revisão das que já foram concedidas. O juiz precisa ser provocado para agir. A vítima deve se manifestar quando quiser pedir proteção em sede de tutela antecipada.

“Exclusivamente na hipótese de a vítima requerer providências é que cabe ao juiz agir de ofício, adotando, contudo, medidas outras que entender necessárias, para tornar efetiva a proteção que a Lei promete à mulher[14].

                        Também tem o magistrado a faculdade de requisitar o auxílio da força policial (art.22, § 3º) ou decretar a prisão preventiva do agressor (art.20).

                        Uma forma de assegurar a aplicação das medidas protetivas que dispõe a Lei Maria da Penha é a possibilidade de aplicação das medidas previstas no caput e nos §§ 5.º e 6.º do artigo 461 do Código de Processo Civil (artigo.22, § 4.º). Verificam-se as regras das obrigações de fazer e não fazer.

                        A multa também é uma alternativa de obrigar o agressor a cumprir com a sua reprimenda e pode ser imposta pelo magistrado independentemente de pedido da vítima.

                       

4.1  Dos Recursos

                        Se a medida protetiva for concedida, indeferida, revisada ou substituída, a decisão é interlocutória, portanto, sujeita a recurso.

                        Das medidas de natureza cível o recurso é de agravo. Das medidas de natureza criminal cabe recurso em sentido estrito. A vítima dispõe do direito de preferência, devendo esta circunstância ser averbada no rosto dos autos quando do recebimento do recurso no Tribunal.

5. DELITOS E PENAS

                        Para atender aos propósitos da Lei Maria da Penha, introduziram-se alterações no Código Penal, no Código de Processo Penal e na Lei de Execução Penal. Não houve a previsão de novos tipos penais, porém, o legislador inseriu mais uma agravante, uma majorante e alterou a pena do delito de lesões corporais. Admitiu-se também mais uma hipótese de prisão preventiva e o sujeito ativo tem como imposição, a obrigação de comparecer a programas de reeducação e recuperação.

                        Conforme disposto no artigo. 61 do Código Penal, observa-se que foi inserida a alínea f no inciso II, para atender aos propósitos da Lei 11.340/2007, in verbis:

São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime:

II – ter o agente cometido o crime:

f) com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, ou com violência contra a mulher na forma da lei específica;”

                        Quando o agressor cometer o delito prevalecendo-se das relações domésticas de coabitação ou de hospitalidade a pena sempre será agravada.

                        Quando falamos do crime de violência doméstica, como forma qualificadora do delito de lesão corporal, devemos observar o disposto no § 9º do artigo. 129 do Código Penal: “Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade”.

 

                        A Lei Maria da Penha não alterou o texto, porém, trouxe alterações nos limites máximo e mínimo da pena, pois antes a pena era de seis meses a um ano e agora é de três meses a três anos.

                                                           “Ainda que a proposta da Lei seja tratar a violência doméstica mais severamente, estranhíssima a opção do legislador ao reduzir a pena mínima à metade.”[15]

 

                        Quanto à majorante trazida pela Lei 11.340/2006, verificamos o disposto no § 11º do artigo. 129: “Na hipótese do § 9º deste artigo, a pena será aumentada de um terço se o crime for cometido contra pessoa portadora de deficiência.”

                        Outra mudança para atender os propósitos da Lei 11.340/2006 alcançou e alterou também o Código de Processo Penal, com o acréscimo do inciso IV ao artigo. 313, in verbis:

“Em qualquer das circunstâncias, previstas no artigo anterior, será admitida a decretação da prisão preventiva nos crimes dolosos:

IV – se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos da lei específica, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência”.

                        Mudanças ocorreram em face da Lei de Execução Penal, pois foi acrescentado um parágrafo único ao artigo. 152, in verbis:

 

“Poderão ser ministrados ao condenado, durante o tempo de permanência, cursos e palestras, ou atribuídas atividades educativas”.

Parágrafo Único: Nos casos de violência doméstica contra a mulher, o juiz poderá determinar o comparecimento obrigatório do agressor a programas de recuperação e reeducação”.

 

                        Pela alteração introduzida, quando houver a conversão da pena de privativa de liberdade por pena restritiva de direitos consistente na limitação de finais de semana, o agressor terá que comparecer obrigatoriamente a programas de recuperação e reeducação. Devem-se observar os requisitos da conversão da pena.

                        Conforme disposto no artigo. 17 da Lei 11.340/2006, in verbis:

“É vedada a aplicação, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária, bem como a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa”. Com esse dispositivo o legislador deixa claro que a integridade da mulher não tem valor econômico e não pode ser trocada por moeda.

                       

                        Como a pena do crime de lesão corporal qualificado pela violência doméstica é de três meses a três anos, conforme alteração da lei, “o agressor tem direito à suspensão condicional da pena, o chamado sursis (CP, art. 77), que voltará a revestir de importância ímpar nos delitos contra a mulher tutelados pela Lei Maria da Penha” [16]

 

                        O sursis está condicionado a quantidade da pena, desde que não tenha sido aplicada pena superior a dois anos. O sursis tem duração de dois a quatro anos e durante o primeiro ano, fica o réu sujeito à limitação de fim de semana (CP, art. 78, § 1º). Quando o réu foi condenado por violência doméstica e a ele for concedido o sursis, a freqüência a programas de recuperação e reeducação é obrigatória, conforme disposto no artigo. 152 da Lei de Execução Criminal.

6. A APLICAÇÃO DA LEI MARIA DA PENHA PARA HOMENS

 

            Para a configuração da violência doméstica não é necessário que as partes sejam marido e mulher, nem que estejam ou tenham sido casados. Também na união estável – que nada mais é do que uma relação íntima de afeto – a agressão é considerada como doméstica, quer a união persista ou já tenha findado.

            O sujeito ativo pode tanto ser um homem como outra mulher. Quando falamos na mulher como sujeito ativo, podemos citar o caso de uma neta que tenha agredido a sua avó. Igualmente no caso da relação homoafetiva, quando a parceira da vítima a agrediu (art. 5º, parágrafo único). Os conflitos entre mães e filhas, assim como os desentendimentos entre irmãs está ao abrigo da Lei Maria da Penha quando flagrado que a agressão tem motivação de ordem familiar.

            No que diz com o sujeito passivo, há a exigência de uma qualidade especial, ser mulher.” [17] Nesse conceito encontram-se as lésbicas, os trangêneros, as transexuais e as travestis, que tenham identidade com o sexo feminino. A agressão contra elas no âmbito familiar também constitui violência doméstica.

            Conforme citado acima, não só as esposas, companheiras e amantes são sujeitos passivos da violência doméstica contra a mulher, mas também as filhas e netas do agressor, como também mãe, sogra, avó ou qualquer outra parente que mantém vínculo familiar com ele podem integrar o pólo passivo da ação delituosa.

            Entende-se também que existe a possibilidade do homem figurar como no pólo passivo da ação delituosa, como podemos observar:

Decisão da Segunda Turma Recursal do TJMT: "HABEAS CORPUS. MEDIDAS PROTETIVAS, COM BASE NA LEI Nº. 11.340/2006, A CHAMADA LEI MARIA DA PENHA, EM FAVOR DO COMPANHEIRO DA PACIENTE. POSSIBILIDADE. PRINCIPIO DA ANALOGIA IN BONAM PARTEM. AFASTAMENTO DAS MEDIDAS PROTETIVAS E TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. PEDIDOS DENEGADOS SEJA PORQUE OS ATOS DA PACIENTE SÃO REPROVÁVEIS, POIS QUE CONTRÁRIOS AO ORDENAMENTO JURÍDICO, SEJA POR AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. ORDEM DENEGADA. DECISÃO EM CONSONÂNCIA COM O PARECER MINISTERIAL. Louve-se a coragem cívica do autor da representação, em procurar resolver a questão que lhe aflige, na justiça; louve-se o nobre advogado que teve o necessário discernimento para buscar na Lei Maria da Penha, arrimado no princípio da analogia, a proteção de seu constituinte, mesmo quando todas as evidências indicavam que a referida Lei não poderia ser invocada para proteger o homem, haja vista que esta norma veio e em boa hora, para a proteção da mulher; louve-se, por fim, o diligente e probo magistrado que ousou desafiar a Lei. Com sua atitude, o magistrado apontado como autoridade coatora, não só pôs fim às agruras do ex companheiro da paciente, como, de resto e reflexamente, acabou por aplicar a Lei em favor da mesma. O raciocínio tem sua lógica, levando-se em conta que, em um dado momento, cansado das investidas, o autor da representação poderia revidar e, em assim agindo, poderia colocar em risco a incolumidade física da paciente. Da análise de todo o processado, não vislumbrei possibilidade de atender aos reclamos dos impetrantes, em favor da paciente, seja para afastar as medidas protetivas em favor do seu ex-companheiro, (afinal as atitudes da beneficiária do HC são reprováveis, posto que contra o ordenamento jurídico); seja para determinar o trancamento da ação penal. (lembremos que ao tempo da impetração não havia ação penal instaurada e mesmo que houvesse, não foi demonstrada a justa causa para tal). (TJMT; HC 6313/2008; Segunda Turma Recursal; Rel. Des. Sebastião Barbosa Farias; Julg. 09/06/2009; DJMT 24/06/2009; Pág. 35)".[18]

O problema é sério e vem crescendo. A agressão física praticada por mulheres contra homens ainda é assunto tabu, mas se torna cada vez mais visível. Há aproximadamente duas décadas, essa mudança se tornou flagrante no Brasil. Antigamente, as agressões das mulheres eram muito pouco evidenciadas, inclusive as verbais, muito mais freqüentes que as físicas.

As mudanças atuais no comportamento de homens e mulheres é percebida inclusive pela psiquiatria, mas não  são perceptíveis nas estatísticas policiais porque o homem se sente constrangido de procurar o plantão policial para denunciar uma mulher por agressão.

Mas não se pode negar a evidência de que os homens podem ser vítimas de violência doméstica.

6.1       Igualdade perante a lei

A Lei Maria da Penha tem sido muito questionada desde a sua aprovação, já que muitos a consideram inconstitucional por ferir o princípio da isonomia, estabelecido no artigo 5° da Constituição Federal.

“Art. 5° Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição” (grifo nosso).  

Não é de hoje que a mulher busca conquistar o seu espaço dentre os demais, já que sempre se postou em situações inferiores às dos homens. Ocorre que esta barreira tem sido ultrapassada de tempos em tempos, com as visíveis alterações demonstradas em nossos ordenamentos e nos costumes da sociedade que deixaram as mulheres em um patamar quase que de igualdade perante os homens.

Entretanto, a busca pela igualdade pode acarretar uma desproporção a fim de atingir os interesses femininos, que é o que ocorre com a Lei Maria da Penha, não discordando em nenhum momento que a Lei visa prestar uma maior proteção à mulher, já que a prática de violência contra a mesma se torna muitas vezes corriqueira.

Deve-se atentar, contudo, que a vigência da lei proporciona a proteção desigual da mulher com relação ao homem e assim sendo, eleva o nosso patamar, deixando-nos em posição privilegiada com relação a eles. Discussões fundamentadas em sua inconstitucionalidade são de verdadeira importância, uma vez que visam uniformizar as relações entre qualquer pessoa, sendo esta homem ou mulher.

A família é a base da sociedade, recebendo maior proteção Estatal, conforme dispõe o artigo 226 da CF e deveria esta ter sido protegida com a promulgação da mesma. Com isso a Lei 11.340/06, deveria dar total proteção a todos que estivessem no seio familiar, homem ou mulher, e por conseqüência o instituto "família" também seria exaltado.

Vale demonstrar os parágrafos do artigo 226 da CF: 

“§ 5º - Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.

§ 8º - O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações”.

Mais justo seria, desse modo, se extraíssemos o termo "contra a mulher" existente na Lei, para que com isso assegurássemos um grupo maior de indivíduos.

Se suprimido o termo, como segue:

Art. 1° da Lei 11.340/06 - "Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8o do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e de outros tratados internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar".

O fato que milhares de mulheres sofrem violência doméstica é alarmante (para isso não resta dúvidas), mas o simples fato de agravarmos a punição de qualquer violência no âmbito doméstico, já promoverá uma justiça privilegiada a todos sem interferência em algo que dará seqüência a um outro problema .

Referências Bibliográficas

{C}·      CUNHA, Rogério Sanches e PINTO, Ronaldo Batista. Violência Doméstica. São Paulo: RT, 2007.P 37.

·      DE FREITAS, Jayme Walmer . Impressões Objetivas sobre a Lei de Violência Doméstica. Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 2129, 30 abr. 2009. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=12719>. Acesso em: 18 ago. 2009.

{C}·      DE JESUS, Damásio e SANTOS, Hermelino de Oliveira. A empregada doméstica e a Lei “Maria da Penha”. São Paulo: Complexo Jurídico Damásio de Jesus, nov. 2006.

·      DE MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. 21ª Ed. São Paulo: Atlas, 2007.

·      DE SOUZA, Sérgio Ricardo. Comentários à lei de combate à violência contra a mulher. 3ª Ed. Curitiba: Juruá, 2009. P13.

{C}·      DIAS, Maria Berenice. A Lei Maria da Penha na Justiça. 1ª Ed. São Paulo: RT, 2007. P.47.

·      GOMES, Luiz Flávio e BIANCHINI, Alice. Lei da violência contra a mulher: inaplicabilidade. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 1192, 6 out. 2006.  Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9009>. Acesso em: 26 set. 2009.

·      LIMA FILHO, Altamiro de Araújo. Comentários à Lei de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher. 1ª Ed. São Paulo: Mundo Jurídico, 2007.

·      MISAKA, Marcelo Yukio. Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher. Porto Alegre: Júris Plenum, 2007. P. 86.

·      NUCCI, Guilherme de Souza.  Leis penais e processuais penais comentadas. 4ª Ed. São Paulo: RT, 2009.

·      Revista da ESMP, São Paulo, v. 1, no 1, 1-200, janeiro/junho 2007.


[1] DIAS, Maria Berenice. A Lei Maria da Penha na Justiça. 1ª Ed. São Paulo: RT, 2007. P.47.

[2] CUNHA, Rogério Sanches e PINTO, Ronaldo Batista. Violência Doméstica. São Paulo: RT, 2007.P 37.

[3] MISAKA, Marcelo Yukio. Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher. Porto Alegre: Júris Plenum, 2007. P. 86.

[4] MISAKA, Marcelo Yukio. Op. Cit. P. 86.

[5] CUNHA, Rogério Sanches e PINTO, Ronaldo Batista. Op. Cit. P. 30.

[6] DE JESUS, Damásio e SANTOS, Hermelino de Oliveira. A empregada doméstica e a Lei “Maria da Penha”. São Paulo: Complexo Jurídico Damásio de Jesus, nov. 2006.

[7] NUCCI, Guilherme de Souza.  Leis penais e processuais penais comentadas. 4ª Ed. São Paulo: RT, 2008. P864.

[8] DIAS, Maria Berenice. Op. Cit. P 43.

[9] LIMA FILHO, Altamiro de Araújo. Comentários à Lei de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher. 1ª Ed. São Paulo: Mundo Jurídico, 2007. P36.

[10] NUCCI, Guilherme de Souza. Op. Cit. P 865.

[11] DE SOUZA, Sérgio Ricardo. Comentários à lei de combate à violência contra a mulher. 3ª Ed. Curitiba: Juruá, 2009. P13.

[12] DIAS, Maria Berenice. Op. Cirt. P 64.

[13] NUCCI, Guilherme de Souza Op. Cit. P 879

[14] DIAS, Maria Berenice. Op. Cit. P 79.

[15] CUNHA, Rogério Sanches e PINTO, Ronaldo Batista. Op. Cir. P 140.

[16] GOMES, Luiz Flávio e BIANCHINI, Alice. Lei da violência contra a mulher: inaplicabilidade. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 1192, 6 out. 2006.  Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9009>. Acesso em: 26 set. 2009.

[17] DE FREITAS, Jayme Walmer . Impressões Objetivas sobre a Lei de Violência Doméstica. Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 2129, 30 abr. 2009. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=12719>. Acesso em: 18 ago. 2009.

[18] TJMT, HC 6313; Segunda Turma Recursal, rel. Des. Sebastião Barbosa Farias, v.u., j. 09.06.2009, DJMT 24.06.2009; p. 35.

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